Saturday, 20 de April de 2024 ISSN 1519-7670 - Ano 24 - nº 1284

Mais ciência nas bancas

A partir deste mês, os aficionados por astronomia, amadores ou não, terão a sua disposição a versão brasileira de uma das mais importantes revistas do mundo sobre o assunto. Astronomy Brasil será lançada oficialmente no dia 12, em evento no Sesc Pompéia, e deverá chegar às bancas no dia 22. Com 84 páginas, a publicação trará a tradução integral, feita por astrônomos brasileiros, da prestigiosa revista americana Astronomy, que circula desde 1973. Dessas 84 páginas, seis serão dedicadas a notícias e artigos produzidos e escritos no Brasil.

Segundo o editor da Astronomy Brasil, Ulisses Capozzoli, a revista visa atender a grande comunidade de astrônomos amadores existente no Brasil, além dos profissionais. O objetivo é sensibilizar a sociedade sobre a importância da astronomia e da ciência em geral. Essa sensibilização tem conseqüências diversas e promissoras. Uma delas está na possibilidade de as pessoas descobrirem que a ciência, em vez de representar um universo fechado, acessível apenas a iniciados, na realidade conta uma história de todos os homens, já que articula um relato para a criação e a evolução do Universo e o aparecimento da vida, entre outros fenômenos. Neste sentido, a ciência participa de um processo profundo de ‘humanização’, à medida que localiza o homem de um ponto de vista cósmico.

Espaço para o Brasil

Outra conseqüência, de natureza prática, é que uma revista com a qualidade técnico-científica de Astronomy Brasil, expressa em linguagem clara e acessível, deve trazer estímulo, ampliação e consolidação da astronomia amadora no Brasil.

A intenção dos editores é que a revista chegue às escolas, devido à carência no Brasil de informações e material didático sobre astronomia. A publicação trará informações sobre cosmologia e ciência planetária, além de, todos os meses, mapas do céu e calendário de eventos astronômicos, como passagens de cometas, eclipses e outros. A revista pretende incrementar o mercado que gira em torno da astronomia, com aumento das vendas de equipamentos, como telescópios e binóculos, e deve estimular a criação de observatórios astronômicos municipais, que tanto podem auxiliar a rede de ensino regional como atrair turistas, gerando renda e empregos locais.

A tiragem inicial de Astronomy Brasil será de 40 mil exemplares, a maior parte em princípio vendida em banca a R$ 10,90. Aos poucos, no entanto, a intenção é conseguir assinantes em maior número do que os exemplares vendidos em banca, seguindo o exemplo da original. Da tiragem de 150 mil da Astronomy, 85% são destinados a assinantes. A assinatura anual de Astronomy Brasil custa R$ 117. Depois que a revista estiver consolidada, a idéia é aumentar o número de páginas para 100, dando mais espaço a textos e reportagens feitos no Brasil.

O tempo é relativo

A história de capa da edição número 1 de Astronomy Brasil trata do choque de buracos negros, uma das mais exóticas criaturas do zoológico cósmico. Buracos negros, sorvedouros cósmicos de que nem a luz escapa, costumam refugiar-se em núcleos galácticos, onde a densidade estelar é maior que nas regiões mais externas. No caso de choques de buracos negros, o único corpo formado pela fusão do par costuma ser atirado para fora de sua galáxia original numa viagem sem retorno pelas profundezas do espaço, onde se reúne com outros ‘buracos negros errantes’.

A edição zero, voltada para divulgação e anúncios, traz como matéria de capa viagens no tempo, um tema que pode trocar a ficção científica pela sólida realidade. Na verdade, embora a maioria das pessoas não desconfie, quando embarcamos num jato e voamos a alta velocidade, em torno de 1.000 quilômetros/hora, retornamos ao solo frações de segundos mais jovens que os que ficaram em terra. Esse fenômeno está previsto na teoria da relatividade especial de Albert Einstein.

De acordo com Einstein, o tempo é relativo e depende da posição do observador. Se ele se desloca a alta velocidade, o tempo passa mais lentamente para ele em comparação a outros observadores. Daí, entre outras surpresas, o chamado paradoxo dos gêmeos. De dois irmãos gêmeos, um fica na Terra e o outro faz uma viagem até Alfa do Centauro, estrela tripla mais próxima do Sistema Solar, deslocando-se em frações significativas da velocidade da luz. Quando o irmão que viajou retorna, continua jovem, enquanto para o irmão que ficou o tempo passou mais rapidamente e ele envelheceu.

Astronomy Brasil está sendo produzida pela Ulisses Capozoli ME-Editora Andrômeda, empresa criada há cinco anos com o objetivo de produzir inicialmente uma revista de astronomia acompanhada de uma série de outros produtos, como livros especializados e material didático.

Lançamento: 12 de abril, das 20h às 22h, no Sesc Pompéia – Rua Clélia, 93, São Paulo.

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Por que uma revista de astronomia?

Ulisses Capozzoli, publisher e editor

Por que editar uma revista de astronomia no Brasil? Esta pergunta, que possivelmente já terá sido feita, tem várias respostas. A primeira delas deve-se ao fato de a astronomia ser interdisciplinar e, neste sentido, fazer interagir todos os campos do conhecimento e não apenas os reconhecidos como de natureza estritamente científica. É o caso da literatura, ou mesmo da arquitetura.Em 1848 o poeta e novelista norte-americano Edgard Allan Poe (1809-1849) publicou um de seus livros menos conhecidos Eureka, onde se perguntou pela primeira vez porque a noite é escura. Nesta obra, cujas vendas decepcionaram seu autor, Allan Poe atribuiu a escuridão noturna ao fato de o Universo ser finito. Se o universo fosse infinito, considerou ele, a quantidade de estrelas infinitas tornaria o céu seria tão claro que a noite não seria escura.

Conhecido na astronomia como Paradoxo de Olbers, o problema da escuridão noturna foi incorporado à astronomia como uma questão cosmológica que surgiu inicialmente na literatura. Já a geometrização do espaço, preparando um conceito em que ser apoiaria a mecânica clássica, aparece no início do século 15 (o Quattrocento), inicialmente como um jogo de luz e sombras. Por volta de 1425 Tommaso di Giovanni Guidi, o Masaccio, pintou numa parede da igreja de Santa Maria Novella, em Florença, sua Trindade, obra que os historiadores admitem ser a primeira expor uma noção consciente e sistemática da perspectiva linear. Recentemente, em Do Androids Dream of Electric Sheep?, que inspirou o filme Blade Runner, o caçador de andróides, o escritor americano de ficção científica Phillip Dick discutiu a clonagem e, no extremo, a humanidade dos clones.

Zoológico cósmico

Esses exemplos equivalem a dizer que o avanço do conhecimento manifesta-se nas mais diferentes áreas e não é um privilégio exclusivo da ciência. Equivale a dizer também que a ciência não é algo à parte da cultura, mas exatamente algo que é parte da cultura. Neste sentido, uma revista de astronomia, ainda que restrita à abordagem astronômica, como é o caso de Astronomy Brasil, pode recorrer às várias áreas da ciência, entre elas a história da ciência e história da astronomia em particular, para oferecer inteligibilidade possível aos temas de abordagens mais diversas.

Editar uma revista de astronomia, neste momento, remete a um conceito que os gregos antigos chamaram de cosmos, a idéia de harmonia, de se pertencer a um todo. O futuro, já disse Konstantin Tsiolkvski, o pai da astronáutica (‘A Terra é o berço da humanidade, mas ninguém vive eternamente no berço’), está no espaço. Assim, uma revista de astronomia, com a qualidade de Astronomy Brasil, também deve ajudar a preparar a sociedade para os tempos que se aproximam.

Uma revista de astronomia deve ajudar professores e alunos a desenvolver uma nova abordagem do céu e da Terra. Deve permitir que leitores de formação, idade e interesses diversos abram uma nova janela para o céu. Deve fazer com que uma sociedade, como a brasileira, neste início de século 21 se dê conta, de forma mais prática e próxima, da diversidade do que os astrônomos chamam de animais de zoológico cósmico.