Friday, 19 de April de 2024 ISSN 1519-7670 - Ano 24 - nº 1284

Mànya Millen


‘A terceira edição da Festa Literária Internacional de Paraty, a Flip, acabou há quase uma semana e, de lá para cá, muito já se escreveu e se comentou sobre ela. Seus erros e acertos, seus pontos altos e baixos (como alguns apontados aqui ao lado pelo nosso colaborador Elias Fajardo), seus pés-de-barro, seu passado, seu futuro. Uma das reclamações mais recorrentes foi a de que, durante os quatro dias de mesas de debates com grandes nomes da escrita brasileira e estrangeira, pouco se viu de literatura. Ou que a literatura, foco maior desse encontro que a cada edição se revela mais necessário — somos um país no qual se tenta desesperadamente conquistar novos leitores — acabou atropelada pelo cotidiano, pelas discussões motivadas por atentados terroristas, crise política, crise intelectual, crise do sujeito.


Para quem acompanhou todas ou parte das mesas, a observação é procedente. Entretanto, ela pode (e deve) ser lida não como sinônimo de desacerto entre objetivo e resultado, mas como uma garantia efetiva de que a literatura — mesmo se a entendermos aqui estritamente como narrativa de ficção — é um objeto vivo e que o escritor é capaz de dar conta de várias leituras, desde seu imaginário particular até a explosão das bombas em Londres ou o conflito entre israelenses e palestinos.


Literatura lida, debatida e questionada pelo público


Quem viu e ouviu estrelas estrangeiras como Salman Rushdie, David Grossman e Jeanette Winterson, para ficarmos só em alguns dos muitos romancistas presentes (os autores de ficção foram a grande maioria entre os convidados, é bom frisar), mesclando sua vida literária à ‘vida real’, tecendo comentários, a partir de sua condição de escritor, sobre o mundo que batia na porta da Tenda dos Autores — Jeanette, todos sabem, fez um libelo em defesa do meio ambiente de Paraty — se encantou. Os encontros evidenciaram, com a participação do público, o que parece um piegas lugar-comum: vida e literatura (como vida e toda forma de arte) são indissociáveis, como bem lembrou o português José Luis Peixoto na mesa intitulada ‘A força do romance’.


Esta, a propósito, foi uma das muitas ocasiões em que se discutiu de fato literatura. Houve espaço para a poesia (ainda que a mesa não tenha empolgado), para a literatura produzida hoje no Nordeste, para a obra da homenageada Clarice Lispector, para romances policiais e até para falar do escritor diante da impossibilidade de escrever (belo encontro entre o espanhol Enrique Vila-Matas e o português Gonçalo Tavares).


Houve ficção debatida, lida, questionada pelo público. Como nas outras edições da Flip, que também trouxeram momentos empolgantes na área da não-ficção (lembram-se de Eric Hobsbawm e da dupla Jurandir Freire Costa e Drauzio Varella, em 2003, e de Ferréz, em 2004?). Pode-se criticar a ausência de mais novos autores brasileiros e algumas leituras enfadonhas. Mas não se pode falar de pouca literatura. Ela esteve lá, todo o tempo, cumprindo seu papel de entreter e não se eximindo de tocar nas feridas abertas pelo cotidiano.’


 


Elias Fajardo


‘As mil e uma noites vividas em Paraty’, copyright O Globo, 16/7/05


‘Uma literatura em camadas em que as fronteiras entre os gêneros são cada vez mais tênues. Uma cidade em camadas onde séculos se misturam, o erudito dá as mãos ao popular, o caiçara usa celular e pessoas pós-modernas dividem as ruas com o boi de conchas, um folguedo tradicional vindo de Ubatuba.


Este foi o clima da terceira Flip, que tem muito a ver com ‘Mil e Uma Noites’, um dos livros homenageados: uma história puxa outra e outra, antes que a aurora venha, com seus dedos róseos, dourar o horizonte e saudar a maré que traz o peixe e encontra versos soltos no ar.


Se quisermos pensar em tendências, podemos falar numa ‘invasão’ da literatura strictu sensu. A realidade anda tão inflamada que não foi possível pensar apenas em contos e romances. A inglesa Jeanette Winterson, por exemplo, protestou contra uma obra da Petrobras na baía da Ilha Grande, que pode jogar toneladas de lodo em praias próximas de Paraty.


Um dos pontos altos foi o encontro dos críticos Roberto Schwarz e Beatriz Sarlo: ele analisou e relação de Machado de Assis com a sociedade e sua época e ela refletiu sobre Borges. Schwarz tratou das idéias fora do lugar, deformadas e reelaboradas, adquirindo novas tintas e pontos de vista e acabou ‘invadindo’ o campo literário com a política: segundo ele, Lula e Fernando Henrique suscitaram esperanças não realizadas, pois, com ambos, as estruturas básicas que geram a opressão não foram mexidas. Beatriz botou o dedo na ferida: segundo ela, mitos equivocados cultivados por intelectuais de esquerda têm sido responsáveis por muitas mortes na América Latina.


A radicalização do embate literatura X política ficou por conta de Arnaldo Jabor, que se irritou com a platéia numa cena que lembrou Caetano Veloso vociferando contra os universitários que não o deixaram cantar na época dos festivais. Jabor dizia que o responsável por Fernando Henrique não ter aprofundado as reformas foi o boicote do PT, mas o pano de fundo das vaias agora é bem outro. O buraco hoje é mais embaixo, como se pôde ver no depoimento emocionado de MV Bill sobre a violência urbana.


Palavras de Clarice Lispector pareciam ecoar ao longe


Momentos preciosos de literatura ficaram por conta da verve de Salman Rushdie falando de exílio, de pessoas desenraizadas que o narrar de histórias pode aproximar, e também do inspirado José Luís Peixoto, autor de ‘Nenhum olhar’. Heloisa Buarque, acompanhada de Claudia Roquette-Pinto, Alberto Martins e Paulo Henriques Britto, tentou mostrar que a poesia contemporânea tem força para ‘encarar o tranco’.


No mais, é preciso realçar o caráter até certo ponto democrático da Flip, que põe telões para quem quer ver os autores sem pagar e procura valorizar a cultura local, apoiando artistas como o bonequeiro Jubileu. Nas ruas, inspiração e humor deram-se as mãos. Num recital em frente à igreja do Rosário, um jovem autor dizia: ‘O mundo é uma bola. Se fossem duas bolas seria um saco!’. Diante de tal diversidade, pareciam ecoar ao longe as palavras da homenageada Clarice Lispector: ‘Escrever é sentir até o último fim o sentimento que permaneceria apenas vago e sufocador. Por que eu escrevo? Para me manter viva’.’


 


MERCADO EDITORIAL


Beatriz Coelho Silva


‘Novo selo quer conquistar povo com livro de bolso’, copyright O Estado de S. Paulo, 16/7/05


‘A editora canadense Harlequim Books, especializada em literatura feminina, entrou de sola no mercado de livros de bolso, em parceria com a Record. A presidente do grupo, Donna Hayes, esteve no Rio para o lançamento oficial. Os livros já estão nas bancas de revista do Rio e de São Paulo desde abril. ‘Agora, vamos nos estender pelo Brasil, um mercado que nos interessa pelo tamanho e potencial de crescimento’, disse ela. ‘Nosso grupo existe desde 1949, vende 140 milhões de livros por ano, em 95 países e 27 idiomas. Temos 12 séries temáticas e vamos começar com cinco no Brasil. Nos EUA, lançamos 112 títulos por ano. Aqui serão dez por mês.’


A Harlequim faz literatura de entretenimento, ‘para atender a uma demanda do público e não à do autor, como acontece no mercado editorial normal’, explicou a diretora da editora no Brasil, Valéria Chalita. ‘Com o Plano Real, as classes C e D passaram a consumir novos produtos e livros estão entre os objetos de desejos desses grupo.’


Grandes Autores, Paixão, Destinos, Jéssica e Desejo são as séries lançadas no Brasil. As duas últimas são folhetins, em que personagens fixos e se envolvem em histórias românticas e/ou de aventuras. ‘Nosso público é a mulher entre madura, chefe da família, que apesar da dura jornada de trabalho, sonha e anseia por romance’, definiu Valéria. ‘Nossos livros custam entre R$ 3,90 e R$ 9,90, primeiramente em bancas de revistas, mas depois em farmácias, supermercados e até em livrarias.’


E a Record nessa história? Segundo o presidente do grupo, Sérgio Machado, com essa parceria, a editora quer aprender a metodologia do livro de bolso. ‘Não é só um formato nem um patamar de preço, mas um tipo de publicação que você só compra se tiver lido o anterior.’


Por enquanto, só serão lançados títulos traduzidos do inglês, língua de todos os mil autores (na verdade autoras, pois são só três homens, um deles escrevendo em parceria com a esposa). Mas é plano da Record e da Harlequim lançar, no futuro, histórias nacionais. ‘Mas isso é como novela de televisão. Primeiro a gente compra pronta, depois só o texto, para só então passar à produção própria. Neste caso, estamos ainda na época de Glória Magadam’, concluiu ele.’


 


HARRY POTTER


O Globo


‘Novo livro de Harry Potter provoca filas de fãs em livrarias de todo o mundo’, copyright O Globo, 16/7/05


‘LONDRES. O bruxinho conseguiu mais uma vez. Nas ruas de Londres, e de várias outras cidades do mundo, centenas de crianças faziam filas ontem nas portas de livrarias, para terem o privilégio de ler ‘Harry Potter e o príncipe mestiço’, cujas cópias começaram a ser vendidas nos primeiros minutos de hoje. Os recentes atentados terroristas não afugentaram os fãs, mas o esquema de segurança foi reforçado.


— Estamos passando a mensagem de que a rotina foi retomada: Londres está aberta para negócios e queremos comemorar este livro — disse John Webb, responsável por livros infantis da rede de livrarias Waterstone’s, que espera 300 mil pessoas em suas cem lojas na Inglaterra.


Mas houve cancelamentos. A rede WH Smith pretendia lançar o livro à meia-noite na plataforma da estação King’s Cross do metrô. Mas o local foi um dos atingidos pelas bombas do dia 7. A porta-voz da rede, Sarah Hodson, disse que o evento seria inadequado, mas prometeu que as lojas abririam hoje cedo para vender o livro.


As livrarias ofereceram lanches e contrataram malabaristas e mágicos para aliviar a espera dos pequenos fãs.


A editora do livro na Grã-Bretanha, a Bloomsbury, selecionou, por concurso, 70 crianças de 8 a 16 anos que tiveram o privilégio de ouvir a a criadora de Harry Potter, J.K. Rowling, ler trechos do novo livro depois da meia-noite, em um castelo na Escócia.


Também houve filas em Nova York, Cidade do México, Calcutá e Sydney — onde, graças ao fuso horário, a venda começou primeiro. A rede BBC estima que hoje haverá um recorde na venda de livros. A Waterstone’s calcula que nas primeiras 24 horas serão vendidos dois milhões de exemplares na Grã-Bretanha e dez milhões em todo o mundo.


Mas o bruxinho não conseguiu evitar vazamentos. A editora canadense Raincoast recorreu à Justiça para evitar que o enredo fosse divulgado, depois que uma livraria de Vancouver vendeu, por engano, 14 exemplares semana passada.’


 


TV POR ASSINATURA


O Estado de S. Paulo


‘Operadoras de TV paga terão de cumprir metas’, copyright O Estado de S. Paulo, 16/7/05


‘A Agência Nacional de Telecomunicações (Anatel) vai aumentar o controle sobre os serviços de televisão por assinatura, que têm 3,9 milhões de clientes em todo o País. A partir de julho do próximo ano, as operadoras serão obrigadas a cumprir metas de qualidade, sob pena de serem multadas em até R$ 50 milhões. Também foram definidas regras para pequenas empresas conhecidas como antenistas, que prestam este serviço em vilas e favelas. As operadoras terão prazo de um ano para se adaptarem às novas exigências. A partir de então, terão de cumprir índices de atendimento. As metas também vão controlar o número de erros de cobrança e o tempo de atendimento ao cliente pelo telefone.’


 


CULTURA E REDE TV!


Cristina Padiglione


‘Festival une TV Cultura e RedeTV!’, copyright O Estado de S. Paulo, 16/7/05


‘Que a TV Cultura tem multiplicado suas horas de produção diária, isso é visível a olhos nus. Nas contas apresentadas pelo presidente da Fundação Padre Anchieta, Marcos Mendonça, para o seu primeiro ano no cargo, a Cultura produz hoje mais de 12 horas de programação, ante 4 horas de junho de 2004 – todo o restante vinha sendo preenchido à base de reprises. Ainda que aos olhos mais puristas cause espanto ver aquela batelada de comerciais – via patrocínio, apoio ou permuta – na tela da emissora, esse cálculo de reprises X produções inéditas endossa a eficiência da flexibilidade publicitária nas TVs públicas.


Ah, sim, desde que não se ultrapassem determinados limites: nada de anunciantes de bebida alcoólica ou de merchandisings na linha do charlatanismo, ressalta o diretor de Marketing e Vendas da casa, Cícero Feltrin. Óbvio, era só o que faltava.


Mas, feito assim, sob restrições éticas, o toma-lá-dá-cá comercial pode até incluir uma emissora como a RedeTV!, que não é exatamente o que se pode chamar de um canal que prima pela difusão da cultura – João Kléber, Luciana Gimenez e Pânico que o digam.


Em Campos do Jordão, no entanto, onde a RedeTV! estacionou unidade móvel e equipe para registrar a ferveção de celebridades durante o Festival de Inverno, a TV Cultura viu a vantagem de uma parceria: o canal comercial empresta equipamentos e pessoal para a Cultura, que assim registra cenas de concertos e espetáculos fora do target da RedeTV!.


O que a RedeTV! ganha com isso? Marcos Mendonça explica: ‘O que resultar desse trabalho em Campos, que possa ser comercializado pela Cultura Marcas, prevê uma parte de ganhos para a RedeTV!.’ Pode ser um DVD, exemplifica. ‘Eu não gasto com equipe ou equipamento, e torno mais aproveitáveis os gastos que a RedeTV! vem tendo em Campos.’’