Thursday, 18 de April de 2024 ISSN 1519-7670 - Ano 24 - nº 1284

Mulheres são minoria no setor de tecnologia

Folha de S. Paulo, 17/3

Amanda Demetrio

Falta mulher

Barack Obama decidiu reunir os líderes do mundo da tecnologia para um jantar. Sentaram-se à mesa, levantaram seus copos para um brinde, tirou-se a foto oficial. O que ninguém percebeu foi que a imagem escancarou um problema do setor da tecnologia: a falta de mulheres.

Na mesa, Carol Bartz, executiva-chefe do Yahoo!, era a única líder do sexo feminino. As outras duas mulheres presentes na foto de divulgação eram Ann Doerr, acompanhando seu marido John Doerr (importante investidor do Vale do Silício) no jantar, e Valerie Jarrett, representante da Casa Branca.

Carol está entre poucas. Na lista da revista ‘Fortune’ que elege as 500 maiores empresas dos Estados Unidos são apenas 15 mulheres no cargo de executivas-chefes de suas companhias. Das 15, apenas duas estão ligadas ao mercado da tecnologia (o próprio Yahoo! e a Xerox).

A situação também se apresenta na formação do conselho administrativo de cinco empresas em grande ascensão no Vale do Silício. Twitter, Facebook, Zynga, Grupon e Foursquare não têm mulheres em seu quadro de diretores, que dá orientações sobre as atividades das empresas.

No Brasil, o cenário se repete. Dados da Catho Online (catho.com.br) mostram que a área de tecnologia ainda tem um baixo índice de atuação de mulheres -apenas 12,56%.

A falta de mulheres no topo é reflexo da ausência delas na base da pirâmide.

Dados do Centro Nacional para Mulheres e Tecnologia da Informação dos Estados Unidos mostram que, logo no ensino médio, elas têm menos familiaridade com os computadores e com o conhecimento de programação do que os meninos.

Na universidade, o efeito cascata continua: elas obtêm menor porcentagem de diplomas na área de ciências da computação, quando comparadas a eles.

Os dados são preocupantes, mas a maior contradição está no fato de as mulheres serem, algumas vezes, maioria entre os consumidores dos serviços prestados por empresas com poucas em seu time de líderes.

No Brasil, por exemplo, elas lideram o acesso a redes sociais como Facebook, Twitter e Orkut, segundo estudos recentes da consultoria TNS Global Research.

DESTAQUES

Mas nem tudo está perdido. Aos poucos, elas têm cavado seus lugares no mundo da tecnologia. Nesta edição, conheça executivas de sucesso que trabalham em empresas como Facebook, Google e Yahoo!. Conheça também as mulheres que fundaram e lideram startups -empresas iniciantes- que se destacam no competitivo mercado do Vale do Silício.

Saiba mais sobre empreendedoras brasileiras que buscaram seu espaço com a ajuda da internet e veja redes sociais e sites voltados a elas.

 

Folha de S. Paulo, 17/3

Noam Cohen, do New York Times

Mulheres criam pouco para Wikipédia

Em apenas dez anos, a Wikipédia atingiu metas notáveis. Mais de 3,5 milhões de artigos em inglês? Feito. Mais de 250 idiomas disponíveis? Claro. Mas outro número se provou ser um obstáculo para a enciclopédia on-line: pesquisas sugerem que menos de 15% de suas centenas de milhares de colaboradores é formada por mulheres.

Há cerca de um ano atrás, uma pesquisa da base de colaboradores da Wikipédia mostrou que o índice de representantes do sexo feminino era de cerca de 13%. O estudo é da Universidade das Nações Unidas e da Universidade de Maastricht.

Sue Gardner, diretora-executiva da fundação Wikimedia (que mantém a Wikipédia), estabeleceu a meta de aumentar as contribuições femininas para 25% até 2015, mas ela está correndo contra as tradições do mundo da informática.

Seu esforço não é só pela diversidade, ela diz. ‘[Estabeleço essa meta] por querer garantir que a enciclopédia esteja tão boa quanto pode ser’, disse Gardner. ‘A diferença entre a Wikipédia e outros produtos editoriais é que os colaboradores da Wikipédia não são profissionais, eles são chamados para trazer o que sabem.’

Com tantos assuntos representados na enciclopédia on-line -quase tudo tem um artigo na Wikipédia- a disparidade entre os gêneros frequentemente aparece. Um tópico geralmente restrito a meninas adolescentes, como pulseiras de amizade, parece pequeno quando comparado a artigos sobre itens de interesse de meninos adolescentes, como soldadinhos de brinquedo.

Considere também as diferenças entre os artigos relacionados a duas séries da HBO. A entrada sobre ‘Sex and the City’ inclui pequenos resumos de cada episódio, às vezes com apenas duas ou três frases. Já a sobre ‘Família Soprano’ inclui longos e detalhados artigos sobre cada episódio.

A noção de que um projeto colaborativo e aberto a todos é tão inclinado aos homens pode ser surpreendente. Afinal, não existe um time de executivos favorecendo os homens, como pode acontecer no mundo corporativo. A Wikipédia é mais como um experimento de escrita, um jogo em que cada um adiciona um pouco para construir um trabalho maior.

Os colaboradores mais antigos da Wikipédia compartilham várias características com a multidão hacker, diz Joseph Reagle, da Universidade de Harvard. Isso inclui uma ideologia que resiste aos esforços de impor regras ou até objetivos -como a diversidade-, assim como uma cultura que pode desencorajar as mulheres.

‘É irônico’, ele disse, ‘porque eu gosto dessas coisas -liberdade, abertura, ideias igualitárias-, mas eu acho que, em certa medida, elas estão escondendo problemas que você encontra no mundo real.’

Adotar a abertura significa ‘aceitar cada dificuldade, incluindo pessoas difíceis, até misóginos’, ele afirmou. ‘Então, é preciso haver uma grande discussão sobre se existe um problema.’

Sue Gardner contou que o artigo da Wikipédia sobre uma de suas autoras favoritas, Pat Barker, tinha meros três parágrafos quando ela o encontrou. Ela é uma escritora aclamada de 67 anos, que vive na Inglaterra.

Do outro lado, Niko Bellic tinha um texto quase cinco vezes maior que o de Barker. É tudo uma questão de demografia: Bellic é um personagem do videogame Grand Theft Auto IV.

Cada vez mais, o público vai à Wikipédia para fazer pesquisas. De acordo com um estudo recente do Pew Research Center, a porcentagem de adultos norte-americanos que usa o site para procurar informações subiu para 42% em maio de 2010 -em fevereiro de 2007, o número era de 25%.

Tradução de AMANDA DEMETRIO

 

Folha de S. Paulo, 17/3

Graciela Natansohn e Karla Brunet

No mundo da tecnologia, há uma brecha digital de gênero, raça e classe

Recentemente, surgiram notícias de que as mulheres lideram no uso de redes sociais como Facebook, Twitter e Orkut. Um dado relevante, que mostra a familiaridade delas com o uso das redes sociais. Ao mesmo tempo, nos questionamos: onde estão as mulheres na liderança nesses serviços de internet?

Se pegarmos, por exemplo, os maiores êxitos da internet dos últimos anos -Google, Facebook e Twitter, por exemplo-, notamos que todos foram criados por homens. Ainda assim, elas representam a maioria dos usuários desses serviços.

Outra constatação similar surge quando comparamos a quantidade de mulheres e homens em cursos e congressos de computação, informática e software. A grande maioria de participantes apresentando trabalhos teóricos e práticos são homens. Onde estão as mulheres?

Nesse cenário, elas não partilham de igual a igual com eles no acesso à cultura digital. Mesmo um olhar leigo perceberá que a relação entre mulheres e internet não é muito diferente da entre mulheres e mídias tradicionais: a imagem delas é superexplorada para a pornografia e, na maioria das vezes, com viés preconceituoso.

Do outro lado, portais dirigidos à mulher repetem estereótipos sexistas tradicionais, que remetem a mulher ao lar, às compras, à beleza, à saúde e ao consumo.

Há uma brecha digital de gênero, raça e classe: ser mulher e ser negra é estar entre as mais pobres dentre as pobres. O acesso ao computador é afetado pela pouca inserção feminina em postos de decisão técnica, no desenvolvimento de tecnologias úteis para elas e na produção de conteúdo.

O Brasil tem grande quantidade de mulheres interessadas no tema, que trabalham e sabem muito de tecnologia, mas elas não estão nas mais altas instâncias de poder: na Anatel, no Comitê Gestor de Internet e no Ministério das Comunicações.

Há temas mais prioritários na agenda das mulheres, dizem uns: perante a violência, o assédio moral e sexual, os problemas de saúde e moradia, a tecnologia é menor.

Nada mais falso: a internet é uma excelente ferramenta para que elas possam se defender e se informar.

O desafio é fazer das mulheres sujeitos da comunicação em redes, e não meras usuárias. Devem ser agentes ativas nos processos de desenho, aplicação, recepção e avaliação de projetos em rede. E fazer da tecnologia, a sua aliada.

No bojo da luta pela democratização da comunicação, é preciso -e urgente- que as usuárias de internet percebam as tecnologias da informação e comunicação com um olhar estratégico, como ferramentas de criação, expressão, produção e fortalecimento individual e das organizações de mulheres.

GRACIELA NATANSOHN e KARLA BRUNET estudam cibercultura e feminismo na Universidade Federal da Bahia (labdebug.net)

Folha de S. Paulo, 17/3

Amanda Demetrio

Sexo feminino se destaca nas redes

As mulheres são maioria quando o assunto é uso de redes sociais, ao menos de acordo com pesquisas que envolvem brasileiras, mexicanas e norte-americanas.

No Brasil, elas são mais engajadas a redes como Facebook, Twitter e Orkut, quando comparadas a eles.

O estudo de outubro de 2010 da comScore mostra que as brasileiras consomem 31% mais conteúdo do que os brasileiros no Facebook.

Ainda assim, nenhuma das três redes tem mulheres em seu conselho de diretores, apesar de o Facebook ter colocado Sheryl Sandberg em uma posição determinante nas decisões da empresa.

Nos Estados Unidos, um balanço geral das mídias digitais de 2010 mostrou a tendências das norte-americanas de aumentar sua liderança quanto ao tempo gasto nos sites sociais.

A pesquisa, também da consultoria comScore, mostra que as norte-americanas passaram 16,8% do seu tempo em sites de redes sociais em dezembro de 2010 -um crescimento de 4,5 pontos percentuais em relação ao ano anterior.

Já os homens passaram 12% do seu tempo na mesma atividade, também em dezembro de 2010 -com um aumento de 2,9 pontos percentuais em relação ao mesmo período, em 2009.

A comScore afirma que, além de o tempo de uso das redes sociais por mulheres ser maior que o dos homens, ele cresceu de maneira mais acelerada entre os anos de 2009 e 2010.

Pesquisa realizada entre as contas ativas do Twitter no México mostrou que a maioria delas é comandada por mulheres, segundo informações do site milenio.com.

OPORTUNIDADE

Entre as várias mulheres presentes em redes sociais, a chef de cozinha Bridget Davis (@bridget _cooks) foi considerada uma das tuiteiras mais influentes do mundo pelo site Bitrebels.com.

Dona do theinternetchef.biz, ela conta que, até 2009, não tinha vida virtual -’mal tinha uma conta de e-mail’.

Foi o ano que seu marido aderiu ao Twitter e que ela decidiu segui-lo e experimentar a ferramenta, ‘sem grandes intenções de criar uma vida on-line’, conta.

‘Antes que eu percebesse, já tinha escrito meu primeiro artigo para o The Internet Chef’, contou, à Folha, a chef, que mora em Sydney, na Austrália.

Em seu site, ela publica, basicamente, informações, opiniões e vídeos relacionados à comida.

Comparando a indústria da tecnologia com a gourmet, ela conta que o mercado de chefs ainda é predominantemente masculino, ao menos na Austrália.

Ela é só elogios à internet. ‘Por outro lado, eu acho a internet uma fonte maravilhosa para me conectar com outras mulheres ao redor do mundo’, contou.

EGITO

Durante a onda de protestos que terminou com a queda de Hosni Mubarak, que governou o Egito por 30 anos, uma jovem de 26 anos mostrou ousadia por meio das redes.

Asmaa Mahfouz gravou um vídeo em 18 de janeiro, o postou no YouTube e o compartilhou por meio de sua página no Facebook (veja em bit.ly/egitoasmaa). Em dias, as imagens haviam se espalhado.

Olhando para a câmera, Mahfouz diz: ‘Quem diz que as mulheres não deveriam ir aos protestos porque irão apanhar, tenham honra e hombridade e venham comigo [para um protesto] no dia 25 de janeiro. Vocês não precisam ir para a praça Tahrir. Apenas vão a algum lugar e digam que somos seres humanos livres.’

De acordo com o site boingboing.net, alguns especialistas creditam ao vídeo o fato de o governo egípcio ter decidido bloquear a rede social Facebook no país na época do conflito.