Thursday, 25 de April de 2024 ISSN 1519-7670 - Ano 24 - nº 1285

O Estado de S. Paulo

ELEIÇÕES 2006
Fátima Pacheco Jordão

Novo elenco na TV. A campanha em tempo real

‘Na semana que passou as campanhas presidenciais mudaram e os número captados pelo Ibope e divulgados ontem também mudaram. No campo tucano, os aliados de Geraldo Alckmin começaram a falar e exigir mais contundência nos discursos, postura mais oposicionista, até pedidos de socos diretos na fuça do adversário. A campanha na TV respondeu. Palavras como corrupção, quadrilha, e membros do governo relacionados a deslizes foram apontados.

A campanha de Lula tornou-se claramente mais olímpica, o candidato se configurou como futuro presidente, apresentou programa do novo governo, a imprensa já discute indicações de ministros e ministérios. Alguns aliados e analistas desenharam a perspectiva de coalizão para governabilidade e configuração de reformas mais rápidas. Na TV a figura de Lula foi estabilizada em um cenário sóbrio. Dá a impressão de cenário de telejornal antigo. Fundo cinza, tom claro, bandeira brasileira meio encolhida e candidato de sorriso paternal.

Essas novas táticas dos principais candidatos recompuseram, ainda que de forma discreta, o quadro de intenções de voto. Os eleitores se mexeram um pouco. Menos na Região Nordeste, bastião aparentemente inexpugnável de Lula. Lá nada mudou, ele continua com 75% dos votos válidos e seus adversários com 25%.

Nas outras regiões, no entanto, Lula já não mantém vitória no primeiro turno. Na conta dos votos válidos do Ibope, que não inclui brancos, nulos e indecisos, Alckmin cresce no Centro Oeste (6 pontos percentuais), no Sul (11) e no Sudeste (4). A soma de votos de todos os candidatos supera a do petista no Norte/Centro-Oeste, no Sul e empata no Sudeste.

Os eleitores nordestinos estão , neste momento, garantindo vitória no primeiro turno, pois o candidato do PT detém ainda 57% dos votos válidos do total do eleitorado.

Há três referenciais em eleições do Executivo que são dominantes: a avaliação do atual governo/governante; proposta das oposições e a confiança ou adesão à personalidade, e atributos pessoais dos candidatos. No primeiro caso, a avaliação positiva do governo de Lula permanece em patamar acima de 40 pontos porcentuais. No segundo caso, as oposições não configuraram alternativas sólidas para contrapor à continuidade. O terceiro não podemos saber pela série de pesquisas Ibope, pois elas não investigam atributos de candidatos. Apenas lemos que há cerca de 30% do eleitorado que ainda não consolidou seu voto. São eleitores que buscam nesta fase de campanha justamente esses referenciais da personalidade do candidato e do contexto político em que ele se insere.

Em algumas pesquisas – e este é o caso do Ibope – a lista apresentada ao entrevistado não associa os nomes dos candidatos aos partidos que os apóiam, o que acrescenta algum elemento de dúvida para o entrevistado.

Por outras razões, o próprio Lula, na TV, busca descolar-se do PT e, na vida real, Alckmin não tem um suporte consistente ou coerente do PSDB.

A campanha de Alckmin começou a expor ligações perigosas do petista. O mesmo ocorrerá contra os tucanos na campanha dos rivais. Ou seja, a propaganda na TV entrou em tempo real e os 30% de eleitores indecisos começarão a fazer suas escolhas com mais dados na mão e dúvidas na cabeça. Muita coisa pode acontecer, mas não é razoável saber para que lado o quadro vai se mover. Essa pesquisa nos diz, de forma um pouco mais clara que a anterior, que um segundo turno não está fora da conta.’



MÍDIA & TECNOLOGIA
Ethevaldo Siqueira

Feira de Berlim antecipa nova convergência

‘Nenhuma outra feira de eletrônica de consumo do mundo mostra como a IFA 2006 uma visão de futuro tão ambiciosa para esse setor. Nesse aspecto, Berlim antecipa o que será a nova convergência, conceito que associa a integração de imagem e som digitais, comunicações pessoais, mobilidade, conectividade doméstica e jogos eletrônicos. A IFA 2006 antecipa, assim, muitos dos produtos que iremos usar nos próximos cinco a dez anos. É nessa arena que medem força gigantes como a holandesa Philips, as japonesas Sony e Toshiba, e as coreanas Samsung e LG.

E, para quem apostava no domínio fácil dos asiáticos, a feira traz a primeira grande surpresa: a Philips supera em inovações seus concorrentes. Como resultado direto do investimento anual de mais de 4 bilhões em pesquisa e desenvolvimento, a gigante holandesa exibe nesta feira novidades de impacto como o primeiro monitor de cristal líquido (LCD, sigla de liquid crystal display) de 100 polegadas ou 2,54 metros de diagonal, televisão tridimensional, novos media centers e quase uma centena de avanços em alta definição e aplicativos pessoais e domésticos.

Só num evento como este, podemos avaliar a massa de novidades geradas pela tecnologia das maiores corporações do mundo nessa área. A corrida dos monitores gigantes de LCD ou de plasma vem de alguns anos, com a evolução dos monitores de 42 a 50, 70, 80 e agora 100 polegadas, numa disputa que parece estar chegando ao fim entre os grandes fabricantes. Confesso que nunca vi nenhum evento com tal beleza de imagens, como a IFA 2006.

É claro que nem tudo é futuro aqui. Muita coisa exposta já se transformou em realidade cotidiana ou deverá tornar-se nos próximos meses. É esse o caso do Blu-ray Disc, o DVD de alta definição, em fase de lançamento em todo o mundo. Ou dos novos conceitos de casa digital conectada, do telefone sem fio com a tecnologia de voz sobre IP (VoIP) ou o do sistema de iluminação ambiental inteligente (Ambilight).

Um dos segmentos de crescimento mais surpreendentes é a área de entretenimento, com os jogos eletrônicos. O mercado mundial de videogames, que já supera os US$ 20 bilhões, poderá alcançar os US$ 50 bilhões em 2010. Um dos exemplos de maior impacto por seu realismo foi demonstrado por Rudy Provoost, executivo-chefe (CEO) de eletrônica de consumo da Philips, numa projeção que mais parecia ser de um super filme de ação, com a luta de criaturas gigantes, em alta definição e som surround.

BLU-RAY DISC

Provoost parece um showman ao falar dos recursos e ao mostrar a beleza da alta definição – avanço que passou a ser uma nova prioridade no sistema europeu de TV digital (DVB), que até aqui era voltado mais para a interatividade.

Em sua entrevista a mais de 200 jornalistas, na quinta-feira passada, véspera da abertura da IFA 2006, Rudy Provoost disse que a Philips e suas parceiras apostam no sucesso e na aceitação dominante do Blu-ray Disc, como mídia de alta definição, sucessor do DVD, e como meio de armazenamento de alta capacidade: ‘Estamos lançando nas próximas semanas o Blu-ray de 25 gigabytes e, até dezembro, teremos o de 50. Com isso, temos certeza, o Blu-ray deverá ganhar a preferência do consumidor no mundo, tanto em qualidade de imagem, quanto em capacidade de armazenamento de informação’.

Além dessas qualidades, o Blu-ray oferece ainda a vantagem da interatividade, o que lhe permitirá interagir com a internet, em especial no caso de jogos ou aplicações profissionais. O presidente da Fox, Mike Dunn, anunciou os primeiros 8 filmes já transcritos para os Blu-ray de alta definição, que serão lançados em conjunto com os toca-discos Blu-ray nos próximos meses. Segundo Dunn, já existem mais de 80 títulos de filmes de filmes disponíveis no formato Blu-ray. Os trailers em alta definição projetados impressionam pelo realismo das imagens e do som.

Os pesquisadores que trabalharam no desenvolvimento do Blu-ray Disc dizem ainda que esse disco é imune à pirataria. Pelo menos nos primeiros anos.

TV-3D

O mundo espera há décadas a TV-3D, a televisão com imagem tridimensional que tem tudo para ser sucesso. Ainda em fase de laboratório e experimental, ela pode ser vista sem o uso de óculos especiais, e, por isso, atrai a atenção de milhares de visitantes ao pavilhão da Philips, na IFA 2006. Os efeitos são impressionantes, porque nos dão a idéia de que algo inusitado está acontecendo com os objetos que saltam da tela. E há, na verdade, dois processos para a produção dessas imagens tridimensionais.

O primeiro é feito por filmagem dupla, como se fosse a visão de cada um de nossos olhos. O segundo processo é obtido por superposição de imagens, com o uso de software que permite ao espectadores atuar sobre a imagem superposta.

Mais próximo da realidade cotidiana e já transformado em produto é o Ambilight, sistema de iluminação de fundo, nos televisores de alta definição de grandes dimensões, que regula automaticamente a imagem em função da luminosidade do ambiente, quebrando a dureza de contraste entre a escuridão e a luz da tela.’



VENEZUELA
Indira Lakshmanan

Novo renascimento ou a volta da censura?

‘Quando um drama sobre crime quebrou em Caracas todos os recordes de bilheteria no ano passado, atraindo aclamação da crítica e o status de cult nos guetos onde foi filmado, seu jovem diretor esperava que fosse o ponto de partida para um debate sobre como tratar a pobreza, a violência e a divisão de classes. Mas a obra, que retrata o seqüestro de um rico casal viciado em cocaína por um gângster da periferia, gerou uma reação feroz do governo. O vice-presidente José Vicente Rangel denunciou o filme como uma ‘falsificação sem valor artístico da verdade’. O diretor está sendo processado por ofensa ao presidente Hugo Chávez, mesmo que ele não apareça ou seja mencionado no filme. Em janeiro, o apresentador de um programa de TV oficial acusou o cineasta judeu de ser parte de uma ‘conspiração sionista contra Chávez’. Na manhã seguinte, o presidente pediria por leis que impedissem a produção de filmes que ‘denigrem nossa revolução’. Horas depois, o diretor Jonathan Jakubowicz deixava o país, temendo por sua vida.

A controvérsia em torno de Secuestro Express é um capítulo em uma guerra amarga sobre a cultura no governo Chávez. Críticos dizem que o governo está obcecado por promover uma imagem perfeita da vida sob Chávez, patrocinando arte que alimente sua personalidade. Jakubowicz diz que a mensagem de seu filme era que ricos e pobres precisam trabalhar juntos para resolver os problemas do país – uma idéia que, para ele, ameaça um governo que prefere perpetuar, e não resolver, a luta de classes. ‘As autoridades querem criar uma realidade artificial, na qual você só pode falar de problemas do passado. Se você vai retratar o presente, ele deve ser perfeito.’

O ministro da Cultura Francisco. arquiteto e escritor, Sesto descarta essas idéias como mentiras. ‘Há absoluta liberdade de expressão’, diz. ‘Chávez tornou a cultura menos elitista e tem encorajado artistas venezuelanos a sair da sombra da dominação cultural americana.’ Os apoiadores do presidente citam como argumentos um novo estúdio de cinema construído pelo governo, cujo objetivo é ajudar a produzir 12 documentários, 12 filmes e duas séries de TV por mês; a própria criação do ministério da Cultura; a realização de festivais de poesia; megaexibições que os museus de arte do país realizam, abertas a qualquer artista; e uma lei que obriga as rádios a dedicar 50% de sua programação à música venezuelana.

Para os detratores de Chávez, no entanto, iniciativas como essas têm como único propósito promover o presidente e sua revolução nacionalista. Obter patrocínio oficial para projetos que critiquem abertamente Chávez é impossível, segundo artistas. Mas os leais a Chávez defendem que o governo está dando apoio a artistas de todas as camadas da população – e que os únicos reclamando são aqueles pertencentes à elite que um dia controlou toda a produção cultural. ‘O espaço cultural se abriu como nunca. Há atos de afro-venezuelanos e indígenas nas salas de concerto’, diz o pintor Régulo Pérez. A historiadora Beatriz Sogbe rebate: ‘Uma evolução real eleva a cabeça das pessoas. O que vemos aqui é populismo cultural, a idéia de que é preciso nivelar por baixo a produção.’’



TELEVISÃO
Keila Jimenez

Parece, mas não é

‘São poucas as certezas quando se começa assistir a uma obra aberta como uma novela. Os vilões provavelmente terão finais infelizes, uma onda de fertilidade se abaterá por todos os casais no desfecho da história, anos e anos de conflitos serão resolvidos em 2 minutos e José Mayer vai pegar todo o elenco feminino do folhetim antes que a história acabe.

Brincadeiras à parte, é fato que alguns atores de alto nível como Mayer acabam estigmatizados pela teledramaturgia em papéis que, por mais que ganhem novo corte de cabelo (no caso dele, nem isso), parecem sempre ser o mesmo. Falta de criatividade do autor, repetição da fórmula de sucesso, pedidos do público… São muitas as explicações para esses ‘repeteco’ que costumam ser uma via de duas mãos: pode dar certo, como também pode cansar a audiência.

Mayer coleciona uma galeria de garanhões conquistadores. Um dos primeiros foi o bem-dotado Osnar, de Tieta (1989). Depois vieram: Caíque em De Corpo em Alma (1992), Alberto Matos em Agosto (1993) – se bem que nesse caso eram todas as mulheres que o queriam e ele não cedia – e Carlos de História de Amor (1995). Mas são os mais recentes que lhe renderam o título: Pedro, de Laços de Família (2000), Fernando, de Presença de Anita (2001), dr. César, de Mulheres Apaixonadas (2003), e o atual, Greg, de Páginas da Vida.

Há quem brinque que esse estigma que caiu sobre Mayer faz parte de um contrato que ele tem com a turma dos cassetas, que adora parodiá-lo nas novelas.

‘O Zé (Mayer) pode fazer o que lhe derem para fazer, pois é um ator de primeira. No meu caso gosto de vê-lo às voltas com as mulheres, de preferência, com mais de uma de cada vez’, explica o autor de Páginas da Vida, Manoel Carlos, que acredita que, se um ator funciona bem em um papel, pode repetir a dose em outras novelas. ‘É como no cinema americano.’

Mayer é um exemplo clássico, mas há outros casos famosos de repetição. A surtada Ana, de Débora Evelyn em Páginas da Vida, é só mais uma da lista de mulheres à beira de um ataque de nervos que a atriz já viveu na TV. Pensou em Marcos Pasquim? Pensou em galã descamisado de novela das 7. Tony Ramos sempre será o bom moço – e a única tentativa de reverter isso não deu certo. Embora o autor Silvio de Abreu não assuma que a virada de Tony em Torre de Babel, vilão a mocinho, foi uma encomenda do público, fato é que ele começou a história mau-muito-mau e acabou bonzinho que só vendo. Já Daniel Dantas assume sem problemas que sempre faz o bonzinho atrapalhado na TV. Raul Cortez ria quando lhe passavam mais um personagem italiano. Ítalo Rossi coleciona mordomos na sua galeria. E Nair Belo… Ah, é atriz de um papel só, sim, e daí? Ninguém faz esse papel melhor que ela.

‘Eu não conheço regras na dramaturgia, nem na popular nem em teatro. Só sei falar da minha experiência. Claro que repito personagens, acredito que a maior parte dos escritores tem essa característica. Tento disfarçar, mudo a idade, o que for possível, mas repito’, assume Gilberto Braga, ao mesmo tempo que discorda que Malu Mader vive a mesma mocinha de sempre em seus enredos. ‘Se você comparar as heroínas que Malu fez em Força de um Desejo, Labirinto e Celebridade vai ver que são três tipos totalmente diversos. O único traço em comum é que foram heroínas.’

Débora Evelyn, que depois da neurótica Beatriz de Celebridade encara agora a surtada Ana em Páginas da Vida, garante que não se preocupa com esse estigma.

‘Eu gosto muito de viver mulheres que sentem diferentes emoções, mas não acho que as personagens sejam tão parecidas. Apesar de terem emoções extremadas, elas têm motivos diferentes para viver à beira de um ataque de nervos’, fala a atriz, que revela que das ‘loucas das novelas’ não tem nada.

‘Não sou como elas. Me acho uma pessoa muito tranqüila. Tenho uma personalidade forte, mas sou muito mais controlada. Gosto de descarregar as emoções nestas personagens extremas. Às vezes, quando gravo muitas cenas fortes, chego em casa muito calma porque extravasei as emoções. Acho que a maior dificuldade para interpretá-las é não passar do tom certo.’

Culpa do close

Carlos Lombardi, que trabalha agora na próxima novela das 7 da Globo, Pé na Jaca, diz que sempre os autores serão acusados de repetir um ator ou tipo em TV, mas tem um diagnóstico para a rotulação de alguns profissionais.

‘Em TV, ao contrário do teatro, você vê close. Portanto, tipos físicos limitam a versatilidade possível na escalação – o mesmo se dá no cinema. No teatro, já vi Nicete Bruno em Dona Rosita, a Solteira, de Lorca(Garcia) começar a primeira cena com a personagem aos 15 anos e terminar com trocentos a mais. E acreditei em cada momento dela. Na TV não posso fazer isso’, fala Lombardi. ‘Outra questão é a imagem que o público projeta no ator. Silvio ( de Abreu) tentou fazer de Tony (Ramos) um vilão em Torre de Babel e teve essa imagem rejeitada – tanto que Tony terminou herói da novela.’

Por falar em Silvio de Abreu, rótulo por rótulo, justiça seja feita, o autor resolveu ressuscitar de fato dois personagens nos mesmos atores: Dona Armênia (Aracy Balabanian) e Jamanta (Cacá Carvalho) voltaram à cena, com êxito inabalável.

Já Lombardi, que também comete suas repetições, faz questão de defender Marcos Pasquim da fama de ator de um papel só. ‘A única vez que ele fez um conquistador desvairado foi em O Quinto dos Infernos. Em Uga Uga era um romântico acusado de ser galinha, em Kubanacan era um marido fiel de uma esposa infiel e sei que muita gente vai falar que o próximo papel dele é o mesmo. Mas, se me perguntam se ele faz um tipo sexy nas novelas, eu digo que faz’, completa o autor. Lombardi conta que sofre a mesma acusação com os papéis que cria para Danielle Winits.

Sempre eu

Com tantas ressalvas dos autores para assumir a repetição, fica parecendo que viver um único papel por muito tempo é caminho certo para a perdição de um ator. Mas não é. Há atores que carregam um mesmo personagem com a maestria que nenhum outro teria, por melhor que fosse. A brincadeira no meio é que ninguém faz Nair Belo melhor que ela mesma.

Com cadeira cativa nos folhetins de Carlos Lombardi – em Pé na Jaca não será diferente – Nair fará outra senhora debochada que deve matar os telespectadores de rir, como sempre. Isso se não repetir também a dobradinha com Lolita Rodrigues, outra marca registrada da dupla.

‘O meu trabalho não é mudar a Nair, é descobrir onde ela se encaixa como uma luva nas minhas tramas’, fala Lombardi.

‘Eu não colocaria o exemplo da Nair com tanta simplicidade’, ressalva Gilberto Braga. ‘Acho que há atores que procuram os personagens fora deles. Exemplo: Paulo Gracindo, Laurence Olivier. E há atores que procuram o personagem dentro deles: Regina Duarte, Katherine Hepburn. Mas a Regina, na Viúva Porcina, foi buscar fora’, acredita Braga.

Para Manoel Carlos, ‘perigoso, na carreira de um ator, não é ficar marcado por um estereótipo, é ser canastrão em qualquer papel’. ‘Se fizer um único papel e fizer bem, sem problema. Spencer Tracy fez o mesmo papel em 100 filmes. Todos iguais. E as pessoas se referem a ele dizendo: ‘aquele tipo de papel nunca ninguém fez melhor’, completa Maneco.

Aguinaldo Silva discorda. Diz que o público gosta de novidades e que um estereótipo pode acabar com qualquer um.

‘Tony Ramos, um grande ator que vem sendo desperdiçado trabalho após trabalho nos últimos anos, é um exemplo disso. Eu o vi na peça Novas Diretrizes em Tempo de Paz fazendo um policial cheio de ambigüidades e, ‘meu deus’. Eu me disse então: ‘ já tinha até esquecido o quanto esse ator é bom’, ataca o autor.

Além de Regina Duarte, Tarcísio Meira foi durante muitos anos acusado de viver o mesmo papel – o de galã. Duas exceções a essa regra são o cômico Araponga na novela homônima de Dias Gomes e o terrível Dom Jerônimo na minissérie A Muralha. O próprio Tide, de Páginas da Vida, passa longe de um conquistador e cala a boca de muita gente.

‘Eu transformei Arlete Salles, uma comediante de personagens do bem, na vilã de Porto dos Milagres. Foi um sucesso. Eva Wilma, depois de uma fileira de mulheres íntegras na TV, foi chamada para fazer Altiva, em A Indomada, e arrasou’, gaba-se Aguinaldo Silva, o homem que transformou Renata Sorrah em Nazaré Tedesco.

Cláudia Abreu e Fábio Assunção, que vinham de uma batelada de personagens do bem na TV, ganharam de Gilberto Braga a chance de personificar o mal em Celebridade e o fizeram com perfeição. A cachorra Laura Prudente da Costa e o ardiloso Renato Mendes marcaram para sempre a carreira dos dois – para o bem, é claro. São apostas no inusitado que deram certo.

No entanto, Braga promete uma novidade e uma ‘repetição’ que têm tudo para arrasar. Em Paraíso Tropical, sua próxima novela (a substituir Páginas da Vida), o até então bom moço Wagner Moura será mau-muito-mau. Já Joana Fomm fará uma personagem na mesma linha da vilã que arruinou a vida de Júlia Matos (Sônia Braga) em Dancin´ Days: a esnobe Yolanda Pratini. São obras da categoria ‘vale a pena ver de novo’.

Repetir ou inovar não é garantia

Quem pode garantir que repetir atores em determinados personagens sempre dá certo? E inovar então? Os autores se arrependem das duas práticas.

‘Em O Outro fiz José Lewgoy repetir o papel de velhinho desligado ao que ele vinha se dedicando nos últimos anos, e foi um desastre. Ele mesmo ficou muito infeliz e resmungão, e tive de matá-lo no meio novela. Em a Indomada eu fiz a Flávia Alessandra ‘mocinha ingênua’ e foi um erro de escalação. Ela é ótima atriz, mas mantê-la no estereótipo de mocinha é um desperdício’, revela Aguinaldo Silva.

Carlos Lombardi diz que suas maiores decepções vieram de Vira- Lata. O autor repetiu a dobradinha dos atores de Quatro por Quatro, Marcelo Novaes e Humberto Martins, mas inverteu os papéis. A troca não deu certo e mesmo assim ele foi acusado de repetição. ‘Botei o Novaes, que vinha do hilário Rai, para fazer o sério Fidel, e o Humberto, que vinha do sofrido Bruno, para viver o divertido Lênin’, recorda ele, também citando uma inovação sua que não deu certo. ‘A heroína de Vira- Lata, feita pela Andrea Beltrão, foi rejeitada por ser muito dividida entre qualidades e defeitos’, continua. ‘Já, provando que generalizar nem sempre funciona, em Perigosas Peruas o público adorou ver Vera Fischer como dona de casa.’’

Leila Reis

Freio no consumo

‘Desde quinta-feira, estão em vigor as novas normas éticas para propaganda dirigida a crianças e adolescentes e para os anúncios de alimentos e refrigerantes. Definidas pelo Código Brasileiro de Auto-Regulamentação Publicitária (seção 11), essas novas regras não têm força de lei, mas os anúncios que as contrariarem podem ser suspensos a pedido do Conselho Nacional de Auto-regulamentação Publicitária (Conar).

A iniciativa é muito bem-vinda, especialmente no amplo território de penetração da TV, em que tudo o que é endereçado à criança tem de ter algum controle de qualidade, inclusive a mensagem publicitária.

De acordo com o texto, fica vetado o apelo imperativo de consumo dirigido diretamente à infância. Assim, não valem mais frases como ‘peça para mamãe comprar’. Também não é permitido usar crianças e adolescentes como modelos para ‘vocalizar apelo direto, recomendação ou sugestão de uso ou consumo por outros menores na linha: ‘Faça como eu, use…’

O código vai mais longe ao formular recomendações mais amplas, conceituais, como aconselhar a publicidade a ter o cuidado de não ‘impor a noção de que o consumo proporcione superioridade ou inferioridade’ e nem ‘provocar situações de constrangimento com o propósito de impingir o consumo’.

Mas quando usa um parágrafo inteiro para recomendar que se afastem os pequenos dos anúncios de produtos com restrições legais – ‘crianças e adolescentes não deverão figurar como modelos publicitários em anúncio que promova o consumo de quaisquer bens e serviços incompatíveis com sua condição, tais como armas de fogo, bebidas alcoólicas, cigarros, fogos de artifício e loterias, e todos os demais igualmente afetados por restrição legal’ -, o Conar nos causa uma enorme surpresa. Esse tipo de cuidado para com a infância ainda não estava escrito em lugar algum neste país civilizado?

Quando junta criança e indústria de alimentos, o Conar toca em vícios que marcaram a programação por décadas. Recomenda que, se o anúncio de alimentos e refrigerantes for protagonizado por ‘personagens do universo infantil’ ou apresentadores de programas dirigidos a esse público-alvo, a sua veiculação seja feita apenas nos intervalos comerciais para evitar confusão. Quer dizer que com este item foi decretado o enterro da fórmula de experimentar iogurtes e guloseimas para estimular as glândulas salivares do público de casa.

Não é mais possível apresentar os produtos como substitutos das refeições (lembra do Danoninho que valia um bifinho?) ou empregar apelos de consumo ligados a status, êxito social e sexual. Nem desmerecer o papel dos pais e educadores como orientadores de hábitos alimentares saudáveis.

A preocupação da relação propaganda e público infantil é antiga em países da Europa e dos Estados Unidos. Na Europa se chegou à sofisticação de proibir anúncios de produtos destinados às crianças durante a programação infantil para não induzir o pequeno telespectador a desejos artificiais.

Portanto, se essa preocupação está chegando aqui, mesmo que seja em forma de normas de conduta, é sinal de que o mercado publicitário está amadurecendo e, por isso, consegue olhar melhor para o entorno e não só para o próprio umbigo.

Todo esse esforço do Conar – que incluiu a apresentação prévia do texto ao Congresso Nacional – é muito saudável. E mostra um rumo para a propaganda brasileira que, a despeito de ser criativa, premiada e antenada, ainda não tem dado mostras evidentes de seu compromisso com o social.’

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Clique nos links abaixo para acessar os textos do final de semana selecionados para a seção Entre Aspas.

Folha de S. Paulo – 1

Folha de S. Paulo – 2

O Estado de S. Paulo – 1

O Estado de S. Paulo – 2

O Globo

Veja

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