Thursday, 25 de April de 2024 ISSN 1519-7670 - Ano 24 - nº 1284

O Estado de S. Paulo

SEGUNDO MANDATO
Gerusa Marques e João Domingos

Lula quer rede de rádio para divulgar obras

‘O governo planeja criar uma espécie de A Voz do Brasil 24 horas, rede de rádio pública a ser transmitida para todo o País via satélite. Assim o presidente Luiz Inácio Lula da Silva acredita poder estabelecer um canal de comunicação direto com a população para divulgar seus feitos.

Pelos planos divulgados, a programação basicamente reproduziria o conteúdo das emissoras do Sistema Radiobrás, além das Rádios Câmara, Senado e Justiça. Mas poderão ser abertos espaços para notícias regionais, estaduais e municipais. A estimativa de assessores que participam do projeto é de que com R$ 50 mil seja possível montar no interior uma pequena estação que alcance pelo menos cinco cidades.

Em fevereiro, por ordem de Lula, o ministro das Comunicações, Hélio Costa, deverá mostrar o projeto final. Dia 3, ao anunciar o plano, Costa disse que a intenção é fazer convênios com governos estaduais, Câmaras Municipais, prefeituras e entidades para que a rede tenha cobertura nacional.

Pelos estudos realizados, deverá ser ampliada a estrutura federal existente hoje da Rádio Nacional, que pertence ao Sistema Radiobrás. ‘No momento em que se criar essa estrutura de rádio nacional, pode-se começar a conversar sobre a possibilidade de acabar com A Voz do Brasil’, adiantou o ministro.

‘Nossos satélites transmitem por via digital e analógica’, disse o presidente da Radiobrás, Eugênio Bucci. ‘É assim que A Voz do Brasil chega a todo o País. Temos condição de fazer a transmissão para qualquer lugar. Só que ainda não fui procurado.’

O projeto, segundo técnicos, já pode ser implantado, mas terá condições melhores de começar a operar com o surgimento do rádio digital, previsto para este ano. A proposta deve acompanhar o detalhamento da criação da rede pública de TV digital, prevista no decreto que definiu regras para a implantação do novo sistema.

Diferentemente do projeto da TV digital, que prevê a criação de vários canais públicos, no caso da rede de rádio seria só uma estação, com uso compartilhado da grade de programação.

O coordenador-geral do Fórum Nacional pela Democratização das Comunicações (FNDC), Celso Schrõder, lamenta a forma como o ministério está conduzindo o processo. Segundo ele, um dos pontos preocupantes para o FNDC é a sinalização de que, com a nova rede, o governo pode acabar com A Voz do Brasil. Esse é um debate que tem de ser feito com bastante cuidado, observou, já que o programa é um dos poucos espaços públicos da radiodifusão. O FNDC reivindica maior participação da sociedade nas discussões e admite que a idéia da criação da rede não é ruim; o problema é que não estão claros detalhes do projeto.

Durante a escolha do padrão para TV digital, entidades da sociedade civil, como o FNDC, reclamaram da falta de transparência das Comunicações, que escolheu o padrão japonês, aprovado pelas emissoras de TV.’



GOVERNO SERRA
Carlos Marchi

Serra amplia governo digital em SP

‘O governo José Serra recorre ao mundo digital – o computador e a internet – na intenção de modernizar o Estado, apressar a integração entre os órgãos estaduais e se aproximar dos cidadãos, criando o que o secretário de Gestão Pública, Sidney Beraldo, chama de e-governo. ‘Quanto mais informações públicas disponíveis, maior será a eficiência do governo e a possibilidade de fiscalização dos cidadãos’, opina o secretário de Justiça, Luiz Antonio Marrey.

Um dos primeiros projetos a brotar do governo, o programa Cidades Digitais – menina dos olhos do secretário e vice-governador Alberto Goldman – vai criar incentivos para a criação de zonas com infra-estrutura de redes de tecnologia da informação (TI) para atrair a instalação de empresas que fazem uso intensivo de TI. As primeiras áreas estão definidas: o bairro da Luz, em São Paulo, que deve ser revitalizado, e a cidade de São Caetano, no ABC paulista.

Na área da Segurança, as três principais medidas do novo governo usam TI. A primeira é a implantação, a partir de 28 de março, da rede de comunicação digitalizada da polícia, que funcionará num raio de 100 quilômetros de São Paulo e promete ser imune a escutas de bandidos; a segunda será o aumento da informatização interna da Secretaria de Segurança, para facilitar a integração dos sistemas; e a terceira será a criação de um centro de inteligência junto ao gabinete do secretário para armazenar informações-chave.

MUNDO ELETRÔNICO

Na Secretaria da Fazenda, novidade será a adoção da nota fiscal eletrônica em todo o Estado, a começar pelas empresas inscritas no supersimples. Outra novidade, definida num decreto assinado pelo governador Serra no primeiro dia de governo, é a obrigatoriedade do pregão eletrônico, daqui por diante, para todas as compras feitas pelo Estado. Uma terceira é que o secretário Mauro Ricardo Costa determinou a informatização de todo o processo administrativo fiscal.

No primeiro dia de governo Serra também decretou a criação de um novo Programa Estadual de Desburocratização. Parece uma medida com a cara dos anos 70 – quando surgiram as primeiras ações para simplificar a relação dos governos com cidadãos e empresas – mas ela remete para conceitos bem atuais. O secretário de Emprego e Relações do Trabalho, Guilherme Afif, presidente do Comitê Estadual de Desburocratização, faz planos para criar um Poupatempo para empresas.

Ele sonha baixar o tempo de criação de uma empresa em São Paulo, dos atuais 154 dias, para 3 ou 4 dias. Goldman explica que o governo pretende usar TI para melhorar o ambiente dos investimentos no Estado, combatendo gargalos que dificultam a criação de empresas e a concretização de negócios. Beraldo explica que os gargalos mais notórios já identificados são as licenças ambientais e as do Corpo de Bombeiros.

Afif menciona um terceiro gargalo – os alvarás da própria Prefeitura de São Paulo, de onde saiu Serra. E explica: o ex-prefeito criou um grupo de trabalho para erradicar esses entraves, presidido pelo então vice-prefeito Gilberto Kassab. Agora prefeito, Kassab prestigia o grupo, mas ainda não conseguiu soluções. ‘Burocracia esteriliza, impede que os empreendedores evoluam’, constata Afif, que considera urgente criar facilidades para atrair pequenos empreendedores que ainda estão na informalidade para o que chama de ‘a luz’ – o mundo formal dos negócios.

Mas há outras constatações curiosas. Por exemplo: só agora o governo paulista descobriu que não tem um cadastro dos seus mais de 700 mil servidores. Decidiu fazer um recadastramento e assentá-lo num banco de dados confiável, o que lhe permitirá implantar um sistema único de gestão de pessoal e, também, passar a calcular o custo atuarial das futuras aposentadorias dos servidores – antes, essas duas medidas, apesar de essenciais, eram impraticáveis. O decreto do governador que definiu a medida recomendou que os servidores deverão se recadastrar ‘preferencialmente pela internet’.

Inovações são rivais de ditaduras

Houve um tempo em que as inovações tecnológicas eram temidas como armas de controle de governos totalitários. Na novela 1984, escrita em 1948, Eric Arthur Blair, conhecido pelo pseudônimo George Orwell, coloca a nascente televisão como arma da ditadura de Oceânia para controlar os cidadãos. Através da teletela, o ditador Big Brother vigiava os ‘oceânicos’ – Big Brother is watching you (‘O Grande Irmão está de olho em você’), dizia o lema do alegórico governo.

Orwell mirava em Stalin, mas acabou disseminando um temor indiscriminado de que governos totalitários de variados matizes, que grassaram dos anos 40 aos 80, usariam tecnologias modernas para controlar as sociedades. O tempo reverteu esses temores.

O videocassete ajudou a desmascarar, na URSS, as mentiras do regime soviético. Poucos anos depois, junto com o muro de Berlim, desabariam em dominó os regimes ditos socialistas. Ao longo dos curtos anos em que existe, a internet, temida lá atrás como um possível instrumento de controle a serviço das ditaduras, se tornou uma sólida e incontrolável ferramenta a serviço da liberdade e dos cidadãos.’

***

Em lugar de bilhetinhos, governador manda e-mail

‘A proposta de um e-governo cai bem na gestão de José Serra, um aficionado pela internet. No lugar dos bilhetinhos, que ficaram célebres com o presidente Jânio Quadros, o governador paulista despacha pelo correio eletrônico. São famosos os e-mails emitindo ordens a subordinados, dando respostas a perguntas de jornalistas ou avaliando sugestões. Os amigos de Serra sabem que o melhor acesso a ele não é um telefonema, mas uma mensagem dirigida a seu endereço eletrônico. Sidney Beraldo conta que, no segundo dia de governo, recebeu um e-mail do governador às 3:05h da madrugada.

O secretário dá duas razões para seu projeto de transformar os paulistas em usuários do computador, como Serra: a primeira é que assim os cidadãos poderão acessar mais serviços do Estado; a segunda é que, via internet, eles fiscalizarão as ações do governo. Beraldo promete ampliar para mil os atuais 400 postos do Acessa São Paulo – onde pessoas de baixa renda podem usar gratuitamente, por 20 minutos, um computador conectado à internet.

O secretário de Gestão quer também ampliar o programa Farmácia Eletrônica, um controle centralizado das farmácias dos hospitais estaduais para a distribuição de remédios gratuitos, que bloqueia a retirada de remédios em mais de uma farmácia hospitalar. Só o controle centralizado nas farmácias do Hospital das Clínicas gerou uma economia de 36%, diz.

Beraldo pretende também ampliar o e-Poupatempo, atendimento pela internet que visa a desafogar os postos físicos do Poupatempo. Ele vai estimular o uso dos computadores do Acessa São Paulo para solicitações que não demandem a presença física dos cidadãos num posto.’



TECNOLOGIA DA INFORMAÇÃO
Ethevaldo Siqueira

Conectividade, a nova aposta de Bill Gates

‘‘Estamos vivendo a década digital por excelência. Ela nos assegura chips de 64 bits, softwares de produção gráfica, games incríveis, realidade virtual, alta definição, recursos de armazenamento quase ilimitados, de gigabytes a terabytes e, logo, petabytes. Vejam o que aconteceu com a fotografia. A cada dia, 2 bilhões de pessoas fotografam com câmeras de até 16 megapixels. Mais de 2,5 bilhões de seres humanos utilizam o celular. A internet conecta mais de 1 bilhão de usuários. Quarenta por cento dos domicílios norte-americanos dispõem de pelo menos um PC ligado à web. Cresce em todo o mundo o número de usuários de redes sem fio WiFi, WiMax ou celular 3G. O que mais falta? Falta interligar tudo. O mundo precisa de conectividade. É o que vem por aí’.

Essas palavras são de Bill Gates, ao falar, na semana passada, pelo décimo ano consecutivo, na véspera da abertura do Consumer Electronics Show, em Las Vegas. Diferentemente das apresentações anteriores, como keynote speaker, o fundador e presidente da Microsoft preferiu dar mais destaque às suas idéias de visionário da tecnologia digital e de apóstolo da conectividade do que de marqueteiro da Microsoft. Por isso, falou muito menos do novo sistema operacional Windows Vista do que de um conceito que parece despertar sua paixão atual: conectividade ou, para os especialistas, convergência digital.

É claro que o conceito de conectividade foi utilizado também como argumento poderoso para introduzir produtos capazes de concretizar alguns sonhos de todos nós, usuários. Bill Gates tem hoje outro estilo em suas apresentações: explica tudo de forma muito mais didática e acessível. Confiram: ‘Que é conectividade? É um novo caminho, que nos permite ouvir música onde estivermos, trabalhar onde quisermos, buscar experiências no momento e no lugar mais desejado.’

Recorrendo a exemplos de conectividade e convidando especialistas da Microsoft para demonstrá-los ao vivo, durante sua palestra, Bill Gates mostrou a idéia exata da sinergia entre o Windows Vista, o Windows Live e o Office. Mas não ousava apertar nenhuma tecla e sempre convocava um especialista para cada demonstração. E, para sua alegria, tudo saiu perfeito, sem nenhum travamento, como ocorreu algumas vezes no passado. Por isso, o público aplaudia com entusiasmo o sucesso de cada demonstração dos recursos realmente incríveis do Vista.

TUDO LIGADO

O mais admirado e surpreendente de seus recursos é, a meu ver, essa sinergia ou poder de associação dos recursos do trio Vista-Live-Office, permitindo tanto a correção de fotos como animação, recuperação de documentos apagados inadvertidamente e outras soluções. Um aplicativo denominado Live Search encantou a platéia quando projetou nas telas gigantes um sistema de localização que usa os recursos de Posicionamento Global via Satélite (GPS, em inglês), localizando endereços em Las Vegas, num vôo rasante virtual de helicóptero sobre a própria cidade.

Um dos pontos mais interessantes da apresentação de produtos foi o anúncio do servidor doméstico da Microsoft, o Windows Home Server. Para que serve um servidor doméstico? ‘Com esse equipamento’, diz Gates, ‘você faz backup de tudo, estabelece a conectividade total de seus equipamentos domésticos e, mais, leva a conectividade a pontos remotos, distantes da casa ou do escritório.’

O que era uma tendência quase futurológica nas apresentações anteriores da Microsoft se torna realidade, com o lançamento servidor doméstico.

O CES 2007

A Feira de Las Vegas (Consumer Electronics Show), que terminou na quinta-feira, confirmou, em grande parte, as tendências mostradas por Bill Gates, quais sejam:

1.Todos os tipos de imagens eletrônicas evoluirão para a alta definição graças aos recursos e aos custos decrescentes dos dois formatos de DVDs de alta definição recém-lançados: o Blu-ray disc e o HD-DVD.

2.Todos os equipamentos se conectarão na casa digital graças aos servidores domésticos que assegurarão não apenas conectividade, mas também armazenamento e backup para arquivos de computador, fotos, programas de TV, filmes e software.

3.Todas as redes sem fio de banda larga – Bluetooth, WiFi, WiMax e WiMesh – convergirão e darão acesso à internet e ao celular.

4.Todas as formas de televisão evoluirão para o padrão IPTV, isto é, televisão sobre protocolo da internet.

Esperamos que o mundo possa aproveitar ao máximo o que a tecnologia digital pode proporcionar no trabalho, na vida cotidiana, no entretenimento e nas novas experiências culturais. Em seus 40 anos de existência, o Consumer Electronics Show tem mostrado as grandes tendências desse setor em todo o mundo e, em especial, nos Estados Unidos. O faturamento anual de produtos eletrônicos no mercado americano, da fábrica aos distribuidores (ou seja, factory-to-dealer) em 2006 foi de US$ 155 bilhões, segundo levantamento da Associação da Indústria de Eletrônica de Consumo (CEA). Espera-se para 2007 um crescimento de 7% nessas vendas.’



TELEVISÃO
Shaonny Takaiama

Vale tudo pela bola

‘A Band lutou para sepultar o rótulo de Canal do Esporte, mas não perdeu o interesse pela bola. Até porque futebol, especificamente, é cardápio capaz de inflar a média de audiência de qualquer canal, independentemente da grade de programação. É por isso que no ano passado a Record se rebelou contra a imposição de horários e jogos da Globo e tentou comprar, pelo dobro da oferta inicial do plim-plim, os direitos do Campeonato Paulista a partir de 2008. Não levou, mas forçou a Globo a cobrir sua proposta.

O calendário que se inicia promete novos cenários esportivos na TV aberta. Ao contrário da Copa do Mundo, transmitida com exclusividade pela Globo, o Pan 2007, evento mais importante do ano, terá transmissão também na Record e na Band. E, no campo da bola, na divisão de jogos com a Globo, sai a Record e entra a Bandeirantes, a partir desta quarta, quando estréia o Campeonato Paulista.

Fazia quase seis anos que a Band não transmitia jogos nacionais. O acordo com a Globo, firmado no finzinho de 2006, inclui o Brasileirão, o Campeonato Paulista e a Copa do Brasil.

Segundo o vice-presidente da Band Marcelo Parada, o pacote comprado da Globo – 85 jogos, dos quais a Band transmitirá 32 jogos com exclusividade – foi uma ‘oportunidade irrecusável’. Tanto assim que uma das maiores apostas da Band em 2006, a novela Paixões Proibidas, deixará de ser exibida às quartas-feiras, dia de jogo.

‘O retorno em audiência e receita comercial é garantido’, justifica Parada. Nas contas da Band, o futebol poderá engordar em 20% o faturamento da casa, e olha que o investimento é alto. ‘É uma operação muito cara. Há direitos para pagar, contratação de equipe e viagens’, explica.

A Band entra na vaga da Record (parceira da Globo havia quatro anos), que já não aceitava mais exibir o mesmo jogo da Globo aos domingos e uma partida de menor importância às quartas-feiras. ‘Tínhamos interesse em transmitir eventos exclusivos, algo que a Globo não tinha como nos atender, pois isso poderia trazer um certo prejuízo à sua imagem’, ataca Eduardo Zebini, diretor de Esportes da Record.

‘A Record gostaria de levar para o público e para o mercado publicitário uma opção real na transmissão esportiva que privilegiasse novos horários e dias de competição, para que os jogos não ficassem restritos às quartas-feiras, às 21h45, e aos domingos’, completa Zebini. ‘Esses horários são inapropriados para o torcedor que quer ir ao estádio, para o adolescente que tem de ir para a escola no dia seguinte e até para o jogador que tem de entrar em campo no domingo às 15h, em pleno horário de verão’, completa. Mesmo sem o futebol nacional, Zebini não acredita em perda de audiência para a Record.

Segundo a Globo, não havia imposição no que diz respeito aos dias e horários das competições. ‘Os dias e horários que nós repassávamos para eles eram os dias e horários repassados pelos clubes com os quais firmamos contrato’, alega Marcelo Pinto, diretor esportivo da Globo.

Mas é fato que o horário do jogo noturno foi avançando conforme o horário da novela das 8, hoje vista às 9, também avançava. ‘É evidente que durante a negociação fomos barganhando horários dentro de uma série de itens que são de interesse da Globo e dos clubes’, admite Marcelo Pinto. ‘O horário de maior audiência da Globo é depois da novela e é interessante para os clubes que suas marcas apareçam no horário de maior audiência do canal’, justifica.

Segundo ele, no Campeonato Brasileiro de 2006, 29 jogos começavam às 19h30 e havia 7.738 assinantes do pay-per-view nesse horário, o que dava uma média de renda de R$ 84.870,74. Às 21h45, havia 15 jogos sendo transmitidos e 11.353 assinantes do pay-per-view. A média de renda nessa faixa de horário era de R$ 128.673,17. ‘O hábito do brasileiro mudou: ele está chegando em casa mais tarde, jantando mais tarde e vendo televisão mais tarde. Se tiver um jogo no Morumbi às 20h30, você não consegue chegar em casa a tempo de ver o primeiro tempo.’

Mas a controvérsia quanto ao horário não diz respeito à hora em que o torcedor chega em casa, e sim ao horário avançado em que ele terá de sair do estádio caso queira ver o jogo no local. Há um consenso de que a faixa das 21h45 inibe a ida do público aos estádios. Para os clubes, a bilheteria até se compensa com a venda do pay-per-view, dividido meio a meio com a GloboSat, detentora dos pacotes de futebol. Para o torcedor, não resta muita escolha.

Nem Globo nem Band revelam o valor do acordo alegando questões contratuais, mas sabe-se que a Band está pagando bem menos do que a Record pagava pelo pacote. A TV dos Marinhos facilitou as cifras para a TV dos Saads como último recurso para não digerir sozinha o bolo do futebol e sofrer, assim, o risco de ser acusada de monopolista. A Record repassava à Globo cerca de 20% do equivalente aos custos pagos pelo pacote completo. A Band estaria agora arcando com menos de 15% da conta. E os lucros vêm rápido. A Band já vendeu para a cerveja Itaipava a primeira das cinco cotas de patrocínio (cada uma vale R$ 53 milhões) para os jogos do Campeonato Paulista, da Copa do Brasil e do Brasileirão.

Pan 2007

A venda de cotas para os Jogos Pan-americanos também já movimenta o setor. A Band colocou à disposição do mercado publicitário cinco cotas de patrocínio no valor de R$ 25 milhões cada, sendo que três já foram fechadas: Correios, Caixa Econômica Federal e Ford. Além disso, a emissora vendeu uma cota de participação no valor de R$ 20 milhões para a Brasil Telecom. Na cota de participação, o anunciante entra apenas com inserções do comercial de 30 segundos em todo o break correspondente à programação do Pan 2007. A diferença é que ele não tem vinhetas de assinatura de patrocínio, e tem maior freqüência de inserções de 30 segundos.

A Record também disponibilizou cinco cotas de patrocínio para o Pan, mas a R$ 28 milhões cada. Até agora foram vendidas quatro: Casas Bahia, Ford, Correios e Net.

A Globo silencia sobre valores e só divulga quem são seus patrocinadores do Pan: Telemar (com o produto Oi), Sadia, Caixa Econômica Federal, Petrobrás, Cerveja Sol e Olympikus.

Em relação aos horários de transmissão dos jogos, a Record também se sentiu prejudicada pela Globo, afirmando que todas as provas foram marcadas em horários convenientes para a Globo. ‘Estamos discutindo isso junto à organização do Pan e ainda não há definição. Mas a organização nos garantiu que todas as emissoras serão tratadas da mesma forma’, diz Zebini.

A Globo rebate as acusações de favoritismo da concorrente. ‘As queixas da Record são totalmente infundadas. Em eventos da magnitude de um Pan, de uma Olimpíada e de uma Copa do Mundo, os jogos são fixados de acordo com a maioria dos mercados consumidores. Nesses grandes eventos, há muitas transmissões acontecendo ao mesmo tempo em todo o mundo, imagina se os organizadores do Pan levassem em conta apenas os interesses da Globo? Eles não venderiam nada’, diz Marcelo Pinto.

É a competição esportiva fora de campo dando as cartas na TV, com mais sinais de acirramento que de trégua. O próximo round é a negociação da Copa do Mundo, cujos direitos já estão nas mãos da Globo para 2010 e 2014.’

Paulo Guilherme Holland

Do campo aos estúdios

‘Diante da parceria que volta a unir Globo e Band no futebol, pareceu-nos tentador juntar os comentaristas-chave das duas redes, ambos ex-jogadores, um já veterano e bem-sucedido na função, e outro recém-lançado no papel. Após uma série de tentativas, o Estado enfim promoveu o encontro entre Walter Casagrande Junior, o ‘Casão’, e Marcelo Pereira Surcin, o Marcelinho Carioca, em um restaurante de São Paulo. Casa tem 13 anos de experiência no ramo. Marcelinho, via Band, comentou só dois jogos (da seleção brasileira Sub-20) até quinta-feira, dia em que nosso bate-bola vingou. Segue aí um resumo da prosa.

Pluralidade x Monopólio

Marcelinho – A Band sempre teve muita força na área esportiva e, a meu ver, retomou isso de forma muito organizada e profissional.

Casa – Eu lamento que tenha saído uma emissora (Record) para entrar a Band. O ideal seria os canais se juntarem, até mesmo o campo de trabalho aumentaria. Mas não tem monopólio, discordo dessa acusação. O que acontece é que existe um preço para cada campeonato. A Globo vai lá e paga.

Professor Pasquale

Casa – No início sofri muito. Cheguei a fazer fono para falar com mais calma, melhorar a minha dicção. Também fiz aulas com o Pasquale (Pasquale Cipro Neto, professor de português) para parar de usar gírias.

Discordar do narrador é:

Casa – Tem que manter sempre a sua opinião, mesmo que ela divirja dos outros. É normal o narrador falar uma coisa e você ir lá e dizer outra, só é preciso os dois se respeitarem. Eu entro na hora que quero. Quando o narrador não dá uma deixa, dou um tapinha nele, avisando que quero fazer um comentário. Existem situações em que ele não vê determinada coisa e a função do comentarista é exatamente apontar isso.

Jogador que vira comentarista

Casa – Assim como há pessoas que nunca jogaram bola que entendem de futebol, existem ex-jogadores que não são bons comentaristas.

Marcelinho – Tem jogador que joga bola e tem jogador que joga futebol. O cara que joga futebol entende o funcionamento do jogo, vê os espaços que não estão preenchidos, possui a ‘Inteligência Futebolística’. Acho que eu, Marcelinho, Rogério (Ceni), entre outros, temos essa inteligência.

A dor da crítica

Marcelinho – Se o cara falar com propriedade e conhecimento não tem problema, existe a crítica construtiva. Não é necessário o cara ter jogado bola, existe muita gente que não jogou bola e entende bastante de futebol.

Explosão de egos na TV e em campo

Casa – É claro que no futebol existe um jogador que é mais ou menos egocêntrico. Mas, na tevê, é uma guerra de egos impressionante, as pessoas vivem dele – do ego. Gosto de fazer televisão, mas na verdade ela nunca foi meu mundo, assim como não é até hoje.’

Leila Reis

Eis a mediocridade

‘Já faz sete anos que o País pára para acompanhar o doce Far niente de um bando de pessoas pela TV no Big Brother Brasil. O pioneiro dos realities shows tem lugar garantido na programação da Globo porque reúne todas as condições necessárias para ocupar o horário quase nobre: tem patrocinadores dispostos a pagar a conta (que inclui o milhão do prêmio) e boa audiência. O BBB7 estreou na noite de terça-feira com média de 43 pontos no Ibope (Grande São Paulo), mantendo-se na faixa da estréia das edições anteriores. A constância mostra um alto grau de fidelidade do público ao gênero que, ao contrário das profecias, não deve morrer tão cedo. Pelo menos aqui no Brasil.

Qual é a graça de assistir a um bando de privilegiados – é assim que eles se sentem e o público concorda – brincando de casinha noites e noites seguidas?

Deve-se creditar parte desse interesse ao intenso trabalho de divulgação que a Globo monta em torno de cada edição, às insistentes chamadas na programação e à ‘força’ que outras emissoras dão. (Esta semana, os pais e mães dos casais que foram para o paredão foram entrevistados por programas vespertinos para falar sobre… nada). Agregue-se a essa movimentação a torrente de fofocas produzidas por sites e revistas de celebridades. E cada BBB é alçado à condição de fenômeno, efêmero, mas que se repete a cada vez.

Isso justifica a loucura do público para participar. Mais do que levar a bolada no final, a fantasia dos que querem morar na casa da Globo é mudar o rumo da vida, sair do anonimato, virar artista. Como Grazi Massafera, que anda beijando Thiago Lacerda em Páginas da Vida. Ou Sabrina Sato, a partner dos escrachados do Pânico, e até Jean, que se tornou repórter do programa da Ana Maria Braga. São esses poucos que conseguiram entrar para o show biz.

A maioria dos que passaram pela casa do Big Brother vive um curto período de glória – cobra cachê para aparecer em festas, trata atores como colegas (para desconforto dos mesmos) e até levanta algum dinheiro com publicidade – mas depois cai no completo esquecimento.

É com a esperança de serem ‘descobertos’ que os 16 participantes do BBB7 entraram em cena. Não há como camuflar as intenções dizendo que precisam do dinheiro, porque a Globo encerrou a fase de aceitar despossuídos na casa. Concluiu que o público – quem decide a disputa em última instância – sempre faz justiça social no final da competição, dando a bolada aos pobres. Por espírito de corpo ou por caridade, o fato é que a maioria dos vencedores dos BBBs anteriores – esta semana eles estavam brincando no quadro da Angélica no Vídeo Show – saiu das classes populares.

A disputa pode até ser mais justa, mas empobrece um pouco o enredo. A trupe atual, formada por legítimos representantes da classe média doida para virar artista, é de uma mediocridade exacerbante. Os rapazes malhados, a moças saradas e zelosas do cabelão têm demonstrado uma limitação de repertório mais grave do que os de outras edições.

Pode ser que quando as intrigas no grupo ficarem mais apimentadas ou o lado negro do caráter das pessoas aflorar, olhar pela fechadura do programa fique um pouco mais divertido. É bom que isso aconteça logo, porque do jeito que anda o programa, nem o Pedro Bial tem conseguido se animar.’



INTERNET
Danny O’Brien

O levante pela liberdade online

‘No dia 8 de fevereiro de 1996, a jovem internet amanheceu de luto. Milhares de websites substituíram o colorido de suas páginas por preto. Mesmo sites que mais tarde se transformariam em gigantes multinacionais, como o Yahoo!, amanheceram negros. A razão? Bill Clinton havia assinado uma lei que imporia multas de até 250 mil dólares e penas de reclusão para qualquer um que levasse material indecente à internet.

A resposta foi tão chocante para os políticos e para a imprensa quanto a resposta no Brasil, agora, para este escândalo que envolve Cicarelli e YouTube. Em ambos os casos, aqueles que tomaram as decisões pensaram que entendiam a internet e acharam melhor limitá-la. Em ambos os casos, usuários da rede sabiam que a tentativa do Estado seria um tiro pela culatra – e que as conseqüências seriam muito mais nocivas do que juízes e congressistas poderiam imaginar.

Aquelas pequenas ações em fevereiro de 1996 levaram ao crescimento de um movimento nos EUA para defesa da liberdade na internet; o escândalo Cicarelli, parece, levará ao mesmo no Brasil.

Usuários da internet em todo o Brasil reagiram com revolta quando um tribunal de São Paulo exigiu que as empresas de telecomunicação bloqueassem todo o YouTube para impedir que brasileiros pudessem assistir ao filmete de Cicarelli e seu namorado fazendo, aparentemente, sexo numa praia. Daniela Cicarelli foi inundada de e-mails. A MTV, sua empregadora, recebeu milhares de pedidos de retorno do YouTube, que bem pode ser visto como um de seus competidores.

Quando o tribunal em São Paulo deu para trás, devemos nos perguntar se não foi parcialmente por surpresa pela reação dramática que a decisão provocou.

Em 1996, como hoje, o problema é um mundo dividido entre aqueles que usam a internet e aqueles que pretendem governá-la. Muitas pessoas não só têm familiaridade com o funcionamento da internet como cresceram com ela. Para elas, a rede é íntima como um livro, um jornal, uma ligação telefônica. Elas a usam para aprender, para se comunicar com amigos, para dividir coisas com o mundo.

Outros percebem a internet apenas quando ela cruza repentinamente por sua frente. Neste caso, o juiz viu a internet como um jornal ou TV. Nada seria mais simples do que exigir deles a proibição das imagens.

Como muitos usuários da internet sabem, a rede não funciona assim. Online, todos publicam. Na rede, a comunicação privada, compartilhamento entre amigos e pronunciamentos públicos convivem. Um site como o YouTube permite todos estes usos sem distinção. Brasileiros usam o site para apresentar seus diários, manter contato com amigos e assistir ao que outros pelo mundo produziram.

A tentativa de impedir acesso ao vídeo de Cicarelli exigindo que provedores de acesso o controlassem é como bloquear estradas para controlar a distribuição de um livro banido. Pode até funcionar, mas as conseqüências são vastas. Neste caso, milhares de brasileiros se viram excluídos de uma parte importante da comunicação global – e por que motivo? Um vídeo que apenas uma fração deles tinha qualquer interesse de ver e que rapidamente esqueceriam tão logo o vissem.

O pior é que, apesar desta incrível inconveniência, o vídeo é trivial de encontrar. Digito Cicarelli num site de busca e em segundos o filme é localizado num site que a Justiça não bloqueou. Uma das lições é que censura apenas aumenta a notoriedade de algo online. Como observou um dos fundadores de minha organização, a Electronic Frontier Foundation, ‘a internet vê censura como dano e sempre arranja um jeito de contorná-la’.

Há dois futuros possíveis para este caso. Um é que o tribunal retome sua rota de colisão com a internet e insista na exigência de que os provedores arranjem um sistema de censura. Criarão um monstro: um sistema que espionará toda comunicação na rede brasileira para expurgar itens considerados ofensivos pelo Estado. Um sistema assim é desconhecido fora da China, retardará o crescimento da rede e provocará uma invasão de privacidade numa escala muito maior do que qualquer embaraço causado pelo passeio ao mar de Cicarelli.

Por outro lado, bom senso pode prevalecer e a Justiça perceberá o que a solução que sugeriu causa aos princípios que deve proteger – liberdade de expressão e diminuição de danos. Assim, tratará a internet com mais cuidado, como se ela já fosse uma instituição vital da sociedade.

Até que ela seja, até que cada juiz e cada político perceba isto, talvez seja necessário que usuários da internet brasileira tenham de se levantar e se organizar para proteção de suas vidas online e suas liberdades digitais. Foi o que fizeram cidadãos de outros países para proteger seus futuros interconectados e, principalmente, livres.

*Danny O’Brien é coordenador de ativismo da Electronic Frontier Foundation, com sede em San Francisco, nos EUA.’

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Folha de S. Paulo – 1

Folha de S. Paulo – 2

O Estado de S. Paulo – 1

O Estado de S. Paulo – 2

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