Thursday, 28 de March de 2024 ISSN 1519-7670 - Ano 24 - nº 1281

O Estado de S. Paulo


SEGUNDO MANDATO
Daniel Piza


Baile de mentiras


‘Mentira, como se sabe, ganha jeito de verdade pela repetição, enquanto toda verdade que é dita muitas vezes termina com semblante falso. Na minissérie Amazônia, até onde acompanhei, a cada capítulo se ouvia que ‘Manaus não deve nada às melhores capitais do mundo’; ou seja, tinha lojas com artigos de luxo importados da Europa. Não foi nem é a única capital brasileira a ser comparada assim. O Rio, afinal, é a cidade mais linda do mundo e São Paulo tem uma agenda cultural como a de Nova York. O carnaval também desfila mentiras em série. O Brasil foi criado especialmente pelo criador, que caprichou nas belezas naturais e harmonia racial. Pelo menos é o que diz todo samba-enredo.


Enquanto isso, as cidades são tomadas por violência e a natureza é mais explorada que comprador de abadá em Salvador, onde nada menos que 41 ônibus sofreram arrastão, para não falar da conversão das ruas em banheiro a céu aberto. Sugeriram suspender o carnaval em luto pelo menino João Hélio, mas, se a cada assassinato ocorrido no Brasil fosse feito o mesmo, o ano teria 365 Quartas-Feiras de Cinzas. Nas estradas federais, o número de mortes em acidentes, depois do recorde de fim de ano, superou sua marca mais uma vez; parece que a Operação Tapa-Buraco não resistiu à primeira chuva de verão. Mas quem quer falar sobre isso, se as ‘autoridades’ estão nos camarotes de cerveja ou então isoladas do mundo real em alguma praia militar?


Carnaval, segundo os estudiosos, seria a festa da espontaneidade e do riso, em que o povo expressaria seu desejo de liberdade, etc., etc. Mas o brasileiro, maledicente pelas costas e servil pela frente, não parece mais a fim de gozação no sambódromo. Será porque as escolas são todas patrocinadas por estatais e pelos grandes grupos privados, cuja ligação vai muito além da lei Rouanet? Não vi ninguém tirando sarro dos corruptos, jogando limão em caricatura de político, lembrando como Joãosinho Trinta que quem gosta de miséria é intelectual. Só se fala em impérios do passado, na mãe África, nos otomanos e sei lá mais o quê. O Brasil, ali, é apenas um gigante à espera do futuro grandioso. A mentira oficial se propaga nos botequins.


Não espanta que, nesse contínuo baile de máscaras, se saiba tão pouco sobre o passado e o presente do Brasil. As escolas continuam a ensinar que ‘em se plantando tudo dá’, que dom Pedro I deu o grito do Ipiranga, que Tiradentes é um mártir da liberdade, que Getúlio deu soberania ao Brasil, que os anos JK foram dourados, que o único ‘problema’ do regime militar foi a tortura, que José Sarney reconduziu a nação à democracia… Aleijadinho traduziu a alma barroca do brasileiro, Santos-Dumont é o pai único da aviação, a Semana de 22 fundou a arte modernista no Brasil, o futebol é patrimônio genético da fusão racial… É uma das historiografias menos contestadas do Ocidente; Afonso Celso e Policarpo Quaresma continuam assinando os livros didáticos.


O Brasil, como resultado, ignora o Brasil. Um dos melhores diálogos de Entreatos, o documentário de João Moreira Salles sobre a campanha de Lula, é aquele em que o atual presidente diz ao assessor, Gilberto Carvalho, que não acredita que existam 30 milhões de pessoas passando fome no Brasil, ainda que fizesse essa afirmativa todo dia e fosse basear nesses dados duvidosos sua principal campanha social do início de governo. Ok, dirão que político mente em toda em parte. Verdade – e eis um recurso típico da mentira, que é se alimentar de uma dose de verdade. Nos países sérios, as mentiras dos políticos terminam desbaratadas, cedo ou tarde. Agora me diga qual instituto de pesquisa já chegou a um número confiável sobre desnutrição no Brasil.


Há um monte de outros dados sobre o Brasil que não conhecemos com segurança. Nesta semana, por exemplo, houve de novo invasão do MST no Pontal, em propriedades que eles dizem ser improdutivas. Você acha que o governo tem o mapeamento completo das propriedades improdutivas do Brasil? E você acredita, por exemplo, nas medições das áreas desmatadas na Amazônia? Dizem que diminuíram nos últimos dois anos, justamente depois do escândalo causado pelas estatísticas divulgadas em 2004, que envergonharam a ministra Marina Silva. Mas como? A fiscalização aumentou? Até onde se sabe, como podem lhe informar em qualquer reserva nacional, a carência de vigias florestais é enorme. Isso para não falar no desconhecimento da biodiversidade. Os dados oficiais, no entanto, são lançados assim; quem quiser que conte outros.


Os subprodutos desse carnaval de mentiras são muitos. O mais claro é a impunidade. Exemplo: se todos os partidos fazem caixa 2, como garantiu o presidente, ninguém apura quanto dinheiro é desviado (e como, onde, etc.); portanto, não há punição nenhuma, como estão aí Marcos Valério, Eduardo Azeredo e Delúbio Soares – entre tantos outros – para provar. Outro subproduto aparece na auto-imagem nacional. Dizem que países precisam de mitos, de referências simbólicas que tragam unidade e inspiração. O mito brasileiro, por exemplo, seria o da civilização tropical, do progresso adoçado pela alegria, pelo ‘calor humano’. Mas de nada serve um mito se ele se opõe tão frontalmente à realidade, se ele se torna um carro alegórico de lorotas, se ele é a musa de tanta enganação. Como na fábula da tartaruga e da lebre, a mentira pode ter pernas curtas, mas no Brasil sempre termina com vitória.


SKINDÔ, SKINDÔ


Quanto ao carnaval propriamente dito, é curioso como as belezas e inovações agora estão relacionadas à produção e à tecnologia. Os carros estão cada vez maiores e mais funcionais, com efeitos especiais surpreendentes, como os da Viradouro e aquele livro da Mocidade. Mas continuo sem entender o que faz um jurado dar 9,9 em vez de 10 ou 9,8 para um determinado quesito. E, como disseram Paulinho da Viola e Osvaldinho da Cuíca, os sambas-enredo não acompanharam a evolução: continuam muito parecidos e marciais.


CADERNOS DO CINEMA


Hoje é dia do Oscar e não gosto de ficar adivinhando resultado, até porque ainda não vi alguns filmes que têm indicações. Mas vale notar que a aproximação das obras com a não-ficção continua a ser uma tendência clara, contrariando a previsão de muitos de que o 11/9 abriria uma época de escapismos e fantasias em Hollywood. Tanto Cartas de Iwo Jima como A Rainha e O Último Rei da Escócia têm trechos documentais ou, ao menos, a pretensão de recriar fatos históricos; Dreamgirls não é uma cinebiografia de artista, mas parece ser mais uma; e Babel discursa sobre a realidade contemporânea da globalização. Eu gostaria que Clint Eastwood vencesse, por seu olhar que recusa o simplismo. E acho que Os Infiltrados, de Martin Scorsese, não é tão bom quanto Os Bons Companheiros, de Martin Scorsese.


Como no ano passado, trata-se de uma boa safra sem nenhum filme cinco-estrelas. Há um pouco de cada gênero: ‘road movie’, filme de guerra, de gângster, político, etc. Muitos, curiosamente, se sustentam no talento de seus protagonistas, de atores de gerações distintas – de Peter O’Toole a Forest Whitaker, de Judi Dench a Kate Winslet, passando, claro, por Helen Mirren. Isso tudo significa que há material e público para fazer filmes ainda melhores.


RODAPÉ


Breve esclarecimento: Alain de Botton, autor de The Architecture of Happiness, nasceu na Suíça e se naturalizou inglês. Aproveito para corrigir também, no texto sobre o centenário do escritor inglês W.H. Auden publicado na quarta-feira, que o ator que lê o poema Funeral Blues no filme Quatro Casamentos e Um Funeral é John Hannah, e não Simon Callow.


HAI KAI DO CAFÉ


Caldo de rubiácea


Fumegando por dentro –


O texto esquenta e flui.


POR QUE NÃO ME UFANO


Dizem que o ano só começa amanhã. O segundo governo Lula, com certeza, não começou. O ministério não está definido, as obras do PAC não desempacam, não há nenhuma reforma à vista – política, tributária, etc. – e a educação continua piorando de qualidade. Sistemas como o aeroviário, o prisional e o energético continuam à beira do colapso, mas o governo prefere isso a fazer qualquer coisa que lembre aquela palavra feia, ‘privatização’. Não há, portanto, pista nenhuma de que as promessas de crescer mais e de melhorar os serviços públicos vão ser cumpridas tão cedo. Feliz ano velho.’




TV DIGITAL
Agnaldo Brito


Zona Franca aposta na TV digital para manter crescimento acelerado


‘A Zona Franca de Manaus (ZFM), que comemora 40 anos na quarta-feira, vive uma nova onda de expansão no Pólo Industrial de Manaus (PIM), onde as 450 empresas beneficiadas com renúncia fiscal estão puxando um ritmo acelerado de crescimento.


Além da ampliação da produção de motos e o já tradicional pólo eletroeletrônico (que respondeu por 34,4% das receitas do pólo no ano passado), novos negócios prometem dar novo impulso à região.


O primeiro e mais promissor é a TV digital, que deve ganhar força a partir de 2008, quando o sistema começar a tomar lugar da TV analógica. No anúncio do Programa de Aceleração do Crescimento (PAC), o governo federal elegeu Manaus como o pólo produtor dos produtos de consumo da TV digital. Entre os produtos estão o próprio aparelho de TV digital, como o conversor de sinal analógico para digital, o chamado set top box.


A Zona Franca disputava com outras regiões do País o direito de produzir o item. Outras regiões, como Santa Rita do Sapucaí (MG), negociava a concessão de incentivos semelhantes aos da ZFM para a produção desses produtos em qualquer região do País. Manaus venceu a briga e agora começa a estimar o efeito econômico positivo que isso vai produzir.


O segundo meganegócio avaliado pela Superintendência da Zona Franca de Manaus (Suframa), agência do governo federal responsável pela gestão do desenvolvimento da região, está num plano já pronto de industrialização do gás natural produzido pela Petrobrás no campo de Urucu, no meio da floresta amazônica.


Segundo José Alberto da Costa Machado, coordenador-geral de Estudos Econômicos e Empresariais da Suframa, o investimento previsto no pólo gasoquímico alcança US$ 1,1 bilhão e, quando pronto, poderá gerar receita anual de US$ 1,6 bilhão com os insumos usados na indústria petroquímica ou de fertilizantes. A previsão é que o gás natural deverá chegar a Manaus em 2008.


A Suframa ainda não mensurou os investimentos totais, mas avalia que os ingressos sejam tão ou mais fortes que aqueles que entraram na economia da região desde o início da década. ‘O total de investimentos aplicados no pólo nos últimos cinco anos soma US$ 8 bilhões. A expansão dos negócios já consolidados e o surgimento de novos vai atrair mais capital’, diz Machado.


RECEITA


O volume de investimentos nos últimos anos e a transformação da Zona Franca numa região não apenas importadora, mas produtora dos próprios insumos, resultou em crescimentos constantes de faturamento na região. ‘A idéia de que o Pólo Industrial é uma região maquiadora é antiga e equivocada. Mais da metade dos insumos industriais usados na região são comprados no Brasil’, afirma o coordenador de estudos da Suframa.


Segundo ele, dos 52% dos insumos industriais consumidos por Manaus, 38% são produtos adquiridos no próprio pólo. ‘Há uma cadeia industrial sendo montada na área’, sustenta Machado. O resultado, explica, refletiu-se no balanço geral do faturamento.


A receita do conjunto da indústria do Pólo Industrial cresce anualmente acima de dois dígitos, o que fez o faturamento dobrar em três anos, passando de US$ 10,5 bilhões para US$ 22,8 bilhões no ano passado. A previsão da Suframa é que a indústria local eleve em 15% o faturamento neste ano, com perspectiva de crescimentos ainda mais fortes a partir de 2008, devido aos novos setores.


PROJETOS APROVADOS


Em projetos enquadrados no Processo Produtivo Básico (PPB) e beneficiados com isenções tributárias de Imposto de Importação (II) e Imposto sobre Produtos Industrializados (IPI), a Suframa aprovou no ano passado 277 projetos. São projetos que prevêem a construção de novas fábricas ou a ampliação de indústrias já instaladas. O investimento previsto para esse conjunto de empreendimentos é de US$ 2,251 bilhões. Pelas regras do PPB, a empresa enquadrada no processo e beneficiada com as isenções tem três anos para viabilizar a implantação de indústrias, antes de expirar o aval da Suframa.


Nem todas saem do papel. Desde 2000, a Suframa aprovou mais de 1,6 mil projetos, que previam investimentos de mais de US$ 19 bilhões. Apenas US$ 8 bilhões se viabilizaram. Mesmo assim, o Pólo Industrial de Manaus se transformou num resultado promissor de uma política dirigida de governo. Principalmente como esforço para proteger a floresta amazônica. O Estado do Amazonas mantém 98% da cobertura vegetal intocada. ‘Sem o pólo, isso não seria possível’, diz Machado.’




INTERNET
Ethevaldo Siqueira


Second Life é um outro mundo virtual 3D


‘O mundo virtual não se opõe ao real. Tanto assim que falamos em realidade virtual. Na verdade, o oposto de virtual é atual. Nossa sensação inicial diante do virtual é curiosa: tudo que é virtual tem algo de misterioso e intrigante, seja internet, espelho ou arco-íris.


O mundo virtual não apenas nos encanta como intriga, mas pode oferecer coisas que há apenas cinco anos jamais poderíamos imaginar. A cada dia, a tecnologia nos faz entender melhor o mundo virtual: seja em realidade virtual, imagem virtual, máquina virtual, sexo virtual, texto virtual ou livro virtual.


O Second Life é o melhor exemplo do potencial da virtualização da internet, reproduzindo tudo que existe em nosso mundo concreto, de átomos. O sucesso desse projeto virtual tridimensional é impressionante. Ontem, eram 3.937.280 participantes do projeto.


Conheci o Second Life pelas mãos e palavras de um de seus fundadores, o cientista brasileiro Jean Paul Jacob, no Laboratório de Almadén da IBM, na Califórnia. Jean Paul é dono de uma ilha nesse mundo virtual. Em duas horas de grande papo, diante do computador, ele demonstrou tudo que o Second Life nos pode proporcionar como experiência inovadora.


Nesse novo mundo podemos ser visitantes ou moradores. Somos representados visualmente por um avatar, um boneco que criamos segundo nossas preferências. Utilizando os comandos do computador, podemos fazer nosso avatar andar, voar, correr, sentar, passear, discutir, pesquisar, aprender, comprar, vender ou, simplesmente, contemplar suas imagens.


Numa descrição mais precisa, Second Life é um mundo virtual tridimensional totalmente construído por seus moradores, que também são seus proprietários. Desde a sua abertura ao público, em 2003, ele tem crescido de forma explosiva e sua população já se aproxima de 4 milhões, com moradores de todo o planeta.


Nos últimos dias me registrei no Second Life. Sou um neófito, pois ainda estou trabalhando na construção de meu avatar e meu pseudônimo.


A partir do momento em que o visitante entra no Second Life, descobre um vasto continente digital, vibrante de vida, atividades humanas, entretenimento, experiências e oportunidades. Explorando mais um pouco esse novo mundo, esse visitante talvez queira adquirir um pedaço de terra para construir sua casa ou negócio.


O Second Life tem duas coisas essenciais: a) as criações, que são objetos e produtos que circundam os moradores e podem ser comprados e vendidos a outros residentes; e b) o mercado, que alcança milhões de dólares por mês em transações. Esse comércio é feito na moeda do Second Life: o dólar Linden, que pode ser convertido em dólares americanos, em câmbio feito online.


PARA EDUCAÇÃO


Jean Paul Jacob tem uma visão mais ambiciosa do Second Life e de sua aplicação em países emergentes; ‘Um tema que discuto e vejo com otimismo é o papel de projetos como esse na educação. É a esse tema que dedico minha ilha em Second Life, discutindo essencialmente como a educação poderá ser útil à economia de serviços no Brasil’.


Outro aspecto que ele sugere é o da inovação em serviços: ‘Algo como inovação às suas ordens, semelhante aos projetos do tipo wiki. A Wikipédia é o exemplo mais conhecido. Eu diria que o Second Life é um wiki que tomou fortificante. Poderemos usar os wikis como sistema de produção’.


Uma das sugestões dos criadores do Second Life é que todas as aplicações a serem desenvolvidas na área de educação na Ilha Almadén de Jean Paul Jacob sejam oferecidas pela IBM aos países do grupo BRIC (Brasil, Rússia, Índia e China).


Jean Paul é dono da Ilha Almadén, criada em abril de 2006 com o propósito de estudar a contribuição possível das novas mídias para a educação e o ensino, com o modelo colaborativo, redes sociais, jogos e outras formas. O tema inicial que escolheu foi Serviços, Inovação e SSME (Serviços, Ciência, Administração e Engenharia, sigla inglesa de Services, Science, Management & Engineering).


Para montar seu projeto, Jean Paul gastou a maior parte do tempo na criação de apresentações simples, curtas e de fácil entendimento sobre as três áreas: serviços, inovação e ferramentas (SSME). Essas apresentações estão em diversos pontos da ilha, mas destinam-se, antes de tudo, a serem vistas na Praça dos Serviços, ponto central de Almadén.


Jean Paul Jacob tem muitas idéias ainda a serem implementadas. ‘Recentemente, eu me interessei em ajudar alguns grupos diferentes, depois de encontrar uma jovem programadora autista de 19 anos, da França, que se ofereceu para construir uma miniatura do laboratório real de Almadén. Descobri, então, que não sei muito sobre a situação dos autistas e quero saber muito mais’.


Na Ilha de Almadén, há vários ambientes. Um deles é o auditório, o Jacob Hall. Ali todos devem, em princípio, prestar atenção a um orador ou palestrante, que organiza uma atividade. Numa tela no fundo do palco, são projetadas imagens de vídeo, que mostram a vida real.


Um curioso recurso oferecido ao visitante é o pôr-do-sol a la carte. A qualquer momento, o visitante ou morador pode sentar-se num banco, na praça, e pedir que o sol se ponha.’




A TRAJETÓRIA DE OCTAVIO FRIAS DE OLIVEIRA
O Estado de S. Paulo


Memórias atualizadas de Octavio Frias Filho


‘Office-boy, vendedor de aparelhos de rádio, funcionário público, incorporador imobiliário, banqueiro, Octavio Frias de Oliveira fez de tudo um pouco até comprar um jornal, a Folha de S. Paulo. E para falar de uma das figuras mais reservadas do jornalismo brasileiro, o jornalista e escritor Engel Paschoal analisou documentos durante seis meses, entrevistou jornalistas, políticos e amigos, pesquisou o passado e o presente. O resultado foi o primeiro perfil biográfico de Octavio Frias de Oliveira, agora relançado, em nova edição, pela Publifolha. A Trajetória de Octavio Frias de Oliveira ganhou nova roupagem para contar a história do publisher da Folha de São Paulo, desde o nascimento, em 1912, aos dias de hoje.


A Trajetória de Octavio Frias de Oliveira, Engel Paschoal, Publifolha, 328 págs., R$ 44′




TELEVISÃO
Leila Reis


Juízo moral


‘Pouca coisa mobiliza mais o brasileiro do que a possibilidade de assumir o papel de juiz. Só isso explica a monstruosa movimentação em torno do destino dos participantes do Big Brother Brasil 7. No penúltimo paredão na Globo, o ‘colégio eleitoral’ do BBB somou mais de 41 milhões de votos. Esse volume representa 40% dos votos colhidos no plebiscito do desarmamento no Brasil. E a votação recebida pelo skatista Felipe (eliminado) foi de 38 milhões de indicações, equivalente a 65% dos votos que levaram o presidente Lula ao Planalto, no segundo mandato (58 milhões).


No paredão seguinte, que contrapôs a interiorana Íris ao mineirinho Bruno (eliminado), o quórum decresceu para 30 milhões, mas, convenhamos, ainda é muito voto. É muita gente disponível para atender ao chamado da TV na brincadeira de carrasco/salvador.


Claro que a audiência do programa é boa: 41 pontos de média no Ibope (na Grande São Paulo) em dia de decisão, só 6 a menos que a principal novela da casa, Páginas da Vida.


A formação desse Big Brother meio que eliminou as diferenças sociais que marcaram as outras edições do programa. Não adianta a participante Íris insistir em mostrar que representa os necessitados, porque com cabelão loiro e corpo malhado fica difícil para o público acreditar. Nas edições passadas foi fácil para o telespectador fazer tudo pelo social porque a cara de Cida, Mara e Bam-bam era de pobre.


Na impossibilidade de fazer justiça social, a platéia opta pela justiça moral. Mas como se trata de Brasil, onde os valores têm uma flexibilidade peculiar – o carnaval esteve aí para mostrar a convivência harmônica de alas de crianças com exuberantes corpos nus femininos no mesmo metro quadrado da avenida – esse julgamento passa por critérios surpreendentes, até sutis.


Quer ver? Naquelas chamadas feitas durante a programação para o público declarar quem ama e odeia no BBB7, uma senhora, com cara de dona-de-casa, diz que quer que o Alemão vença a competição por ser ‘homem direito’. Muitos outros declararam ser simpatizantes do mesmo participante.


Vamos ver de quem se trata: Diego, um loiro fortão, tatuado, tipo cafajeste, que de primeira explicitou entrar na brincadeira para ‘pegar mulher’ e que mantém um triângulo amoroso – até agora platônico – com duas competidoras, Fani e Íris.


Para quem não acompanha o reality show, pode parecer que os brasileiros valorizam o ruim, o errado. Mas não é. Ao contrário dos mais ‘certinhos’ que estão na casa do Big Brother, Alemão é o que tem mais dado demonstrações de solidariedade, discernimento, fidelidade aos amigos e idoneidade. Em contrapartida, o participante Alberto, certinho, monogâmico (namora a sério a participante Bruna), guardião da ‘moral e dos bons costumes’, como explicita para se diferenciar do trio amoroso, tem angariado grande antipatia.


I sso não quer dizer que o brasileiro seja do mal. Pelo contrário, exibe certo refinamento na sua avaliação. Consegue ver além do estereótipo, focar na essência e não apenas no comportamento. O público mostra sabedoria ao valorizar atributos mais profundos. Rejeita Alberto porque, a despeito de seu comportamento ‘normal’, passa o tempo todo armando para jogar outros competidores contra Alemão e as suas protegidas, mente e dissimula.


O que talvez em outra sociedade pudesse representar o escândalo – o relacionamento a três – aqui ocupa a mais completa coadjuvância, porque é capaz de mostrar que, no fundo, nós tenhamos aprendido que a flexibilidade é a nossa tábua de salvação. E-mail: leilareis@terra.com.br’


O Estado de S. Paulo


‘Sigo meus instintos’


‘O AXN estréia, finalmente, a terceira temporada de Lost neste dia 5, às 21 horas, mas o público terá de esperar algumas semanas para ver Rodrigo Santoro em ação. O ator interpreta Paulo, que tem uma rápida aparição no terceiro episódio, intitulado Further Instructions, em que contracena com Jonh Locke, o ator Terry O’Quinn. Paulo é um dos 48 sobreviventes do acidente com o vôo 815 da Oceanic Air. Como o brasileiro assinou contrato de apenas um ano, seu personagem deve morrer antes do final desta terceira temporada.


Rodrigo está em alta no exterior. Chama a atenção do público na TV e no cinema. Esteve recentemente no Festival de Berlim, onde conversou com o jornalista Luiz Carlos Merten sobre o filme 300 (leia ao lado) e está morando no Havaí. Para conseguir entrevistá-lo, o Estado teve de ter paciência e persistência. O primeiro contato com a assessora de imprensa do ator foi feito no dia 15 de janeiro. Após insistir para falar com ele por telefone, esta repórter concordou em um papo via e-mail. E esperou.


As respostas de Rodrigo chegaram às 20 horas da última quinta-feira, dia do fechamento desta edição. Assim como seleciona seus trabalhos, o ator também escolhe as perguntas que quer responder. Deixou de comentar, por exemplo, por que assinou contrato para apenas uma temporada de Lost e também não falou sobre a comparação que fizeram entre ele e Tom Cruise.


Como você iniciou sua carreira no exterior?


O diretor Robert Allan Ackerman assistiu ao filme Bicho de 7 Cabeças no Festival de Biarritz e, via internet, propôs uma conversa sobre o filme The roman spring of Mrs. Stone. Este foi meu primeiro trabalho fora do Brasil. Filmamos em Roma e tive a oportunidade de contracenar com Hellen Mirren (favorita ao Oscar hoje) e Anne Bancroft. Foi uma experiência inesquecível.


A língua é ou foi empecilho? O que você fez para aprimorar seu inglês?


Nunca morei nos EUA ou me formei em curso de língua inglesa. Tinha apenas uma noção básica. Em 2002, viajei para os EUA e aprimorei o inglês com muita leitura e algumas aulas.


Muita gente te criticou por causa de ‘As Panteras Detonando’. Por que você acha que as pessoas cobram tanto?


Acredito que esta cobrança está relacionada à comparação da minha carreira no Brasil com as primeiras oportunidades que tive no exterior.


Conte um pouco sobre as dificuldades de atuar e conseguir papéis no exterior.


É difícil para um estrangeiro conseguir papéis interessantes que não sejam estereotipados. Lá, o mercado é enorme e oferece inúmeras oportunidades, mas a competição também é grande.


Como surgiu o convite para ‘Lost’?


Há dois anos fui convidado para participar do seriado Alias (de J.J. Abrams, criador de ‘Lost’, que já teve Sônia Braga no elenco). Na época eu estava gravando a microssérie Hoje é Dia de Maria e não era possível conciliar as agendas. Passou um tempo, tinha acabado de filmar o longa Não por acaso e os mesmo produtores fizeram novo contato. Desta vez era para Lost.


Como é participar de uma série tão bem-sucedida?


A série é extremamente popular e atinge espectadores no mundo inteiro. É um trabalho que exige muita dedicação e me sinto honrado em participar de uma produção tão querida.


Você já teve um feedback desta participação em ‘Lost’? O que mudou em relação ao público e à imprensa americana?


A série está no começo e ainda não tive a oportunidade de perceber este feedback do público. Em relação à imprensa americana, sim. O seriado é muito querido e pude notar um reconhecimento pela minha participação.


Como é morar no Havaí? É possível curtir?


Moro no Rio, mas nasci em Petrópolis. No Havaí tenho a oportunidade de unir a beleza da praia com a tranqüilidade da serra. Pratico ioga, surfo e estou sempre em contato com a natureza. Trabalho, na maioria das vezes, em locações lindas, com pessoas de um ótimo astral e estou muito satisfeito e agradecido.


Os atores de ‘Lost’ falam que a grande dificuldade de atuar na série é o desconhecimento do personagem. Como você lida com isso?


Está sendo uma experiência interessante, diferente de tudo o que já fiz. O ator, na condição de ser humano, tende a querer controlar as coisas. Trabalhar desta forma o coloca numa situação desconfortável e o obriga a viver o momento. Isso é extremamente rico. Estou aprendendo muito.


Quais são as diferenças entre fazer TV no Brasil e nos EUA?


A qualidade da TV brasileira é indiscutível. O ritmo de trabalho é parecido, mas a diferença é que estou trabalhando em outro idioma e cultura.


Você já fez novelas, minisséries e cinema. O que mais se aproxima de ‘Lost’?


Pelas características singulares, Lost é uma experiência única.


Cinema é sua preferência?


Não vou negar que estou encantado com o cinema. Tive experiências que me acrescentaram muito, mas não diria que é uma preferência. Acredito tanto na importância do teatro e da TV, quanto na do cinema, para a formação do ator.


É difícil ver um ator tão jovem em um nível tão alto. Você teve ótimos papéis na TV e, principalmente, no cinema. Como isso aconteceu? Você é muito seletivo nos trabalhos que escolhe?


Ser seletivo é importante e sempre procuro seguir e respeitar meus instintos. Acredito que a escolha certa é aquela que parece estar certa para você.


Depois de tantos trabalhos em cinema, você ainda tem disposição para fazer novelas ou isso já está descartado?


Aprendi muita coisa fazendo televisão e acredito na sua importância. Ainda tenho disposição para fazer muita coisa e não vejo motivos descartar possibilidades.’


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Folha de S. Paulo – 1


Folha de S. Paulo – 2


O Estado de S. Paulo – 1


O Estado de S. Paulo – 2


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