Monday, 18 de March de 2024 ISSN 1519-7670 - Ano 24 - nº 1279

O Estado de S. Paulo


TV PÚBLICA
Wilson Tosta


Governo intervém na TV Educativa e demite diretores


‘Presidente da TV pública afirma que tentativas de harmonização foram
infrutíferas


A dois dias da estréia da TV Brasil, nova emissora pública de televisão, o
governo federal interveio ontem na Associação de Comunicação Educativa Roquette
Pinto (Acerp), gestora da TV Educativa, demitindo diretores e mudando rumos da
instituição. Em reunião de mais de seis horas, o conselho de administração da
empresa, controlado pelo Palácio do Planalto, decidiu substituir Beth Carmona
pelo jornalista Arnaldo César na presidência da Acerp. Segundo informou ontem o
Estado, Beth encaminhara ao órgão carta dizendo-se sem condições de ficar,
devido à ‘dualidade de comando’ na TVE, com diretores da nova estatal dando
ordens à sua revelia. A presidente da TV Brasil, Tereza Cruvinel, porém,
contestou a afirmação.


‘Fizemos sucessivas tentativas de harmonização da Empresa Brasil de
Comunicação (EBC, a estatal que controla a TV Brasil) com a diretoria da Acerp’,
disse ela ao Estado. ‘Todas foram infrutíferas, porque a Acerp continuou detendo
o controle da TVE. A Acerp estava exercendo um comando que é de outra
instituição, a EBC. Falou-se em duplo comando, porque o comando não foi entregue
pela Acerp. Gostaria que tivesse havido harmonização.’ Tereza lembrou que a
Medida Provisória 398, que criou a EBC, estabeleceu que os canais de televisão
da União passam a ser explorados pela nova empresa. ‘Na medida em que a
exploração do canal é da EBC por força da MP, o comando da Acerp deveria ter
sido transmitido à EBC’, argumentou.


A presidente da EBC afirmou respeitar profissionalmente Beth e Rosa
Crescente, também demitida ontem, do cargo de diretora-geral de televisão, e
lamentou não ter conseguido ‘uma composição’. ‘Gostaria que fossem integradas ao
projeto da TV Brasil, sob direção da EBC. Não houve entendimento.’ Teresa
ressaltou que a EBC ‘precisa ter o controle dos quatro canais’, referindo-se às
emissoras do Rio, de São Paulo, de Brasília e do Maranhão e declarou que a
resistência da antiga direção da Acerp gerou ‘uma situação de ambigüidade que
dificultava o trabalho e criava desconforto interno’ na TVE. O Estado também
procurou o ministro da Comunicação Social, Franklin Martins, para comentar a
crise na Acerp. Sua assessoria informou que o ministro não daria entrevista, por
considerar que o assunto deve ser tratado pela EBC.


MUDANÇAS


Na reunião, o conselho de administração também nomeou Antonio Crescenti
Júnior para a Diretoria de Tecnologia, que estava vaga. O jornalista Walter
Clemente ocupará uma vaga no conselho. Os conselheiros discutiram como
harmonizar a Acerp com as novas funções estabelecidas pela medida provisória, a
qual determina que a EBC assuma a produção a ser exibida nos canais da União. A
Acerp ficará com a função de formar mão-de-obra para as TVs públicas, focada na
nova tecnologia da TV digital, que começa oficialmente no Brasil amanhã. Foram
formados dois grupos de trabalho – um para preparar um novo estatuto e outro
para fazer um novo contrato de gestão com a União, pois o atual expira no
próximo dia 10.’


 


TV DIGITAL
Keila Jimenez


‘Fomos boicotados’


‘Horas antes do lançamento da TV digital, a Gazeta resolveu armar o maior
barraco. A emissora enviou um manifesto ao presidente Lula e a outras
autoridades ligadas ao setor alegando ter sido boicotada pelas emissoras no pool
que marcará o início das transmissões digitais em São Paulo, amanhã.


No manifesto, a Gazeta diz não ter sido convidada para integrar o pool e fala
que, mesmo procurando por conta própria os responsáveis pelo evento, foi
completamente ignorada.


A emissora acredita que o boicote tenha ligação com o fato de ser o único
canal a ter optado por equipamentos de transmissão de um fabricante
nacional.


O Fórum de TV digital, que reúne as maiores emissoras do País, desmente a
emissora. Garante que a Gazeta foi convidada a participar do pool, e acabou
pulando fora depois que calculou o gasto que isso implicaria, uma vez que além
da cerimônia de lançamento, as emissoras bancaram em parceria toda a campanha
publicitária da chegada da TV digital.


Outra alegação é que a Gazeta não tinha equipamento para a transmissão até
dias atrás e agora resolveu criar caso.’


 


AMÉRICA LATINA
Lourival Sant´Anna


Vídeos de reféns podem ajudar Chávez


‘O presidente da Venezuela, Hugo Chávez, disse ontem que os três homens
presos na Colômbia iam entregar as provas de vida que ele havia pedido para
levar adiante a mediação para a libertação de reféns nas mãos das Forças Armadas
Revolucionárias da Colômbia (Farc). ‘Agora os chamam de terroristas’, disse
Chávez, referindo-se ao governo colombiano, e à sua decisão de pôr fim à sua
mediação. ‘Eles não têm nenhuma consideração pela vida dos outros.’


O aparecimento das provas de vida dos reféns pode favorecer Chávez no
referendo de amanhã sobre a reforma constitucional, estima Luis Vicente León,
diretor do Datanálisis, o principal instituto de pesquisas da Venezuela. ‘Em
princípio, não deveria ser nada impactante’, disse León ao Estado. ‘Mas tudo
soma e ajuda Chávez a dizer que estava fazendo a sua parte para libertar os
reféns.’


‘Lembre-se que os ataques a Uribe têm sido vantajosos para Chávez, porque ele
busca aglutinar um importante grupo de chavistas que não gostam da reforma
constitucional’, prosseguiu o pesquisador. ‘Ele busca algo importante que os
una.’ Na visão de León, ‘fica claro que Chávez tinha razão’ na briga com o
presidente da Colômbia, Álvaro Uribe. ‘Ele saiu da mediação porque é
incontrolável do ponto de vista diplomático, não porque não estava conseguindo
fazê-la.’


Uribe pôs fim à mediação de Chávez dia 21, depois que o presidente
venezuelano telefonou para o comandante do Exército da Colômbia, general Mario
Montoya, por intermédio da senadora colombiana Piedad Córdoba, que também
participava das negociações. Chávez voltava de uma reunião com o presidente
francês, Nicolas Sarkozy, que também atua na mediação, por causa da ex-candidata
a presidente da Colômbia Ingrid Betancourt, que tem nacionalidade francesa.
Sarkozy cobrou de Chávez as provas de vida dos reféns.


Naquela noite, sem saber que tinha sido retirado das negociações, Chávez
vangloriou-se de seu papel de mediador, num discurso para 50 mil simpatizantes.
Uribe disse que havia negado permissão para Chávez falar diretamente com o
comandante. Chávez alegou que Uribe cedeu a pressões do governo americano, ao
perceber que ele ia conseguir a libertação de alguns reféns já no início deste
mês.


Numa escalada sem precedentes nas relações entre os dois presidentes, que
nunca foram muito boas, Uribe acusou Chávez de não estar preocupado com os
reféns, mas de apoiar o ‘terrorismo’ e ter um projeto ‘expansionista’. Chávez,
por sua vez, chamou-o de ‘peão do imperialismo norte-americano’ e jurou não ter
mais relações com o governo colombiano enquanto Uribe for presidente.’


 


O Estado de S. Paulo


Nova Carta vai legislar sobre imprensa, diz Correa


‘O presidente equatoriano, Rafael Correa, disse ontem que a nova Carta do
Equador deve sancionar sobre os abusos cometidos pela imprensa no país. ‘A nova
Constituição terá de incluir controles e sanções mais rigorosos para os
cotidianos abusos cometidos pela imprensa’, disse o presidente na cerimônia
oficial de abertura da Assembléia Constituinte, em Montecristi. ‘Sabemos do
papel nefasto que a imprensa representou em todo o processo (da Constituinte) e
em todos os outros países da região.’


Ontem, o presidente venezuelano, Hugo Chávez, cancelou sua presença na
cerimônia e foi representado pelo chanceler Nicolás Maduro. De acordo com o
Ministério de Relações Exteriores equatoriano, Chávez cancelou sua participação
no evento por causa da situação interna de seu país diante do referendo popular
de amanhã que decidirá pela aprovação ou não da reforma constitucional.’


 


SUDÃO
O Estado de S. Paulo


Manifestantes pedem execução de britânica


‘Milhares de sudaneses saíram às ruas de Cartum ontem para pedir uma pena
mais dura para a professora britânica Gillian Gibbons. Sob alegação de blasfêmia
e de insulto ao Islã, ela foi condenada a 15 dias de prisão por ter permitido a
seus alunos darem o nome de Maomé para um urso de pelúcia. Muitos dos
manifestantes pediam a execução de Gillian.’


 


ARTE DRAMÁTICA
Geraldo Galvão Ferraz


O pai do teatro paulista moderno


‘A memória cultural brasileira é um mistério. Teses, biografias, exposições
esmiúçam a vida e a obra de alguns poucos vultos insignes e é só. Uma espécie de
conspiração silenciosa limita o estudo do que houve após a Semana de 22 e o
romance de 30. Claro, as exceções existem: Oscar Niemeyer, Clarice Lispector,
Guimarães Rosa, João Cabral. Mas há um buraco negro na produção de pesquisas e
análises sobre o que aconteceu dos anos 30 aos 60 da nossa vida cultural. Pode
ser a sombra da ditadura getulista obscurecendo o muito que aconteceu e se fez
em São Paulo e no Rio de Janeiro nessa época. Falar do resto do Brasil, então, é
uma brincadeira.


O Brasil não estava dormindo nesse período. Atrasado, afrancesado, vítima do
seu gigantismo, do autoritarismo e da guerra mundial, tinha uma efervescência
cultural, sobretudo nos centros maiores, que poderíamos invejar na atualidade.
Mas, mesmo assim, as deficiências deste canto de mundo eram grandes.


Foi nesse contexto que Alfredo Mesquita (1907-1987) exerceu seus dons de
mágico e milagreiro, sobretudo com a fundação da Escola de Arte Dramática (EAD)
em São Paulo. A jornalista e dramaturga Marta Góes pescou um peixe grande no seu
anzol, ao escrever Alfredo Mesquita – Um Grã-Fino na Contramão. É uma das
biografias que imploravam ser escritas. A figura que ela resolveu encarar não é
nada fácil. Tem, por certo, na sua personalidade e na sua trajetória, uma dose
de rebeldia, de estranheza. Certamente teria sido um caminho mais fácil se
seguisse os exemplos e destinos familiares . Como diz Marta, Alfredo ‘cresceu
entre homens formidáveis e distantes… pela vida toda, permaneceu à margem do
centro de poder’ representado pela família e pelo jornal familiar, O Estado de
S.Paulo.


Uma lenda que sempre cercou a figura de Alfredo Mesquita foi esse seu lado
‘ovelha negra’, que o livro encara. ‘Alfredo sentia imenso orgulho de sua
família, nunca teve a respeito dela uma palavra que não fosse elogiosa e a
recíproca é verdadeira.’ É verdade que se tratava de pólos diferentes. Alfredo,
primeiro como escritor, depois como homem de teatro, não era exatamente o modelo
ideal visto do prisma de uma família austera e discreta, que tinha muito poder e
influência. O sobrinho Ruy Mesquita conta que ele foi ‘paparicado pelas irmãs
até o fim’. E cita: ‘Uma vez ele levou à fazenda uma senhora que tinha se casado
de novo pela quinta vez… e ninguém se opôs.’ Um desacordo com parte da
família, quando da ocupação de O Estado de S.Paulo pelo governo getulista,
levou-o a se afastar de parte do círculo familiar, mas como sempre, de modo
discreto e tranqüilo.


Alfredo, que vivia no meio de artistas, era objeto de muita fofoca. Sobretudo
porque era da família Mesquita. Fosse parte de um clã mais comum, seria visto
certamente com mais naturalidade. Era um homem bonito, elegante, de maneiras
impecáveis. Por isso mesmo, um ponto controvertido sobre ele sempre foi sua vida
amorosa. ‘Alfredo viveu só. Mesmo num ambiente liberal como o de uma escola de
teatro, evitavam-se conjecturas sobre a vida íntima do diretor. Isso o magoaria
demais. Tampouco as cabeças arejadas de seus amigos de juventude o deixaram
confortável para tocar no assunto secreto da sua sexualidade. O segredo foi uma
escolha – e não um acidente de percurso.’ Marta encerra a questão com uma bela
frase: ‘Um homem que jamais se permitiu ter um amor em público merece ser
tratado com discrição até por seus biógrafos.’


A frase é exemplar para todo o livro. Alfredo sempre foi um homem que impunha
uma certa distância, até para sobrinhos e irmãos. Reservado, arredio e um tanto
severo, não é o sonho de um biógrafo preguiçoso. Marta optou pela sutileza e
pelo rigor da pesquisa. Abandonou em parte o estudo do homem Alfredo Mesquita,
embora fornecendo para o leitor muitos fatos e pistas da influência familiar
sobre ele e da sua personalidade, para se concentrar mais na sua obra tão
importante.


É tão destacada a porção da fundação e implantação da Escola de Arte
Dramática, que fica em segundo plano a obra literária de Alfredo, tão pouco
conhecida e estudada. Seus livros, sobretudo os de contos, mostram um escritor
original, com excelente timing para cenas divertidas e uma genuína ternura pelos
seus personagens de vida difícil.


Mas a EAD foi mesmo a grande obra de Alfredo. Marta abre o livro com uma
festa acontecida em 1985, quando ele já estava afastado da escola desde 1968,
dois anos depois da USP incorporar a EAD. Uma escolha perfeita, pois apresenta
um espetáculo protagonizado ou presenciado por todos os grandes nomes que haviam
passado pela escola como alunos ou professores. A descrição de Marta nos faz
querer estar lá, nesse momento único em que astros e estrelas homenageavam seu
mestre, o dr. Alfredo.


Sim, porque desde a abertura da escola, em 1948, Alfredo Mesquita virou o
‘dr. Alfredo’. Um pouco pela decisão dele de se manter um tanto distante de
alunos e professores, para manter uma autoridade indispensável. Um pouco pelo
respeito que todos tinham por sua cultura enciclopédica, pelo que já fizera em
teatro amador, na livraria Jaraguá, um bunker da intelligentsia paulista adoçado
por um bolo de fubá inigualável, e na revista Clima, uma revista cultural de
primeira, que fundou para dar voz a uma geração de intelectuais então
desconhecidos: Antonio Cândido, Paulo Emilio, Décio de Almeida Prado, Lourival
Gomes Machado e outros, que influenciam nossa cultura até hoje.


Alfredo Mesquita – Um Grã-Fino na Contramão é, a partir de agora, uma
referência inescapável na bibliografia de nossa vida cultural. Recupera, com
elegância e estilo, aspectos novos ou até então pouco conhecidos de um dos
construtores dessa vida, além de suas qualidades de revelações sobre a
trajetória dessa instituição, a EAD, que agora também tem sua biografia.


Geraldo Galvão Ferraz é jornalista e crítico literário, editor da revista
Cult’


 


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