Friday, 26 de April de 2024 ISSN 1519-7670 - Ano 24 - nº 1285

Rosa Costa

‘Membro da subcomissão do Senado que avalia a proposta do Banco Nacional de Desenvolvimento Econômico e Social (BNDES) para fortalecer as empresas de comunicação, o senador Hélio Costa (PMDB-MG) vai propor que o total a ser liberado para o setor seja de R$ 4 bilhões e não de R$ 2 bilhões, como sugeriu o presidente da instituição, Carlos Lessa.

Hélio Costa também defende critérios mais favoráveis para o pagamento dos financiamentos. Segundo ele, as condições da primeira proposta feita pelo banco – prazo de pagamento de 60 meses e juros de 5% ao ano mais TJLP – não são satisfatórias, principalmente se comparadas a outra operações feitas pelo próprio BNDES.

‘Não é uma proposta boa, suas condições pouco diferem das oferecidas por bancos particulares’, afirmou. ‘Todos sabemos que o BNDES trabalha em condições bem melhores, com juros menores.’ O senador acredita que, diante de uma proposta ‘razoável’, os grupos representados pela Associação Nacional de Jornais (ANJ), Associação Nacional de Editoras de Revistas (Aner) e Associação Brasileira de Emissoras de Rádio e Televisão (Abert) podem rever a decisão, já manifestada ao BNDES, de desistir do programa.

O presidente da ANJ, Francisco Mesquita Neto, informou, na semana passada, que os motivos da desistência foram expressos em carta que as entidades enviaram a Lessa. ‘O banco levou muito tempo para apresentar uma proposta e, quando o fez, o teor mantém as empresas do setor em condições desfavoráveis quanto a prazo e limitação de recursos para a carteira’, explicou.

Hélio Costa acredita que o BNDES, além de não ter problemas de caixa, reconhece a posição estratégica das empresas de comunicação. ‘É importante lembrar que se trata do maior banco de fomento do hemisfério, do tamanho do Banco Interamericano de Desenvolvimento (BID). Só do Fundo de Amparo ao Trabalhador ele dispõe de R$ 45 bilhões para aplicar, o que corresponde a US$ 15 bilhões’, alega.

A subcomissão encarregada de analisar a proposta do BNDES, criada pelo presidente da Comissão de Educação (CE), senador Osmar Dias (PDT-PR), tem até 20 de agosto para apresentar o relatório sobre a proposta encaminhada pelo BNDES.

Hélio Costa disse que vai propor a seus colegas, no próximo dia 3, que recomendem ao banco a adoção de critérios ‘mais flexíveis’, que realmente atendam ao setor. Ele acredita que o BNDES tem condições de analisar a proposta da subcomissão no prazo de 30 dias. ‘O banco não tem obrigação de aceitar a proposta, mas tenho certeza de que o presidente Carlos Lessa terá boa vontade em examiná-la’, afirmou.

O senador avalia que a dívida do setor chega a R$ 10 bilhões, o que tem dificultado novos investimentos. ‘Daí porque os porcentuais sugeridos pelo banco têm de ser negociados, sob pena de comprometer os investimentos com pagamento de juros’, justifica.

Para Hélio Costa, sem apoiar o setor de comunicação, o País corre o risco de ter uma área estratégica na mão de estrangeiros. ‘Os estrangeiros vão comprar tudo’, prevê. Segundo ele, as dificuldades das empresas decorrem da valorização do dólar nos últimos anos. ‘A dívida do setor, a compra de equipamentos e de papel é toda feita em dólar, que, em relação à nossa moeda, triplicou de valor nos últimos oito anos’, constata.’



O Globo

‘Lessa: BNDES continua aberto para a mídia’, copyright O Globo, 22/07/04

‘O presidente do BNDES, Carlos Lessa, voltou a insistir ontem que as portas do banco continuam abertas para as empresas de comunicação, mesmo depois de as entidades que representam o setor terem recusado formalmente proposta de financiamento. Lessa disse que ainda espera manifestação do Senado sobre a sua proposta de auxílio à mídia, mas que não existem barreiras para as empresas se candidatarem aos empréstimos.

– Se algumas grandes empresas não estão interessadas, ninguém pode obrigá-las. Mas o setor tem 2.900 empresas e não conheço a opinião desse conjunto – disse o presidente do BNDES.

Ele informou que aguarda uma posição da Comissão de Educação do Senado para submeter a proposta de ajuda às empresas de comunicação à diretoria do BNDES:

– Por enquanto, a proposta é do Carlos Lessa. Encaminhei a minha proposta ao mesmo tempo ao Senado e à diretoria.

Segundo o diretor-executivo da Associação Nacional de Jornais (ANJ), Fernando Martins, a proposta apresentada por Lessa ao Senado foi considerada desvantajosa.’



CAPITAL ESTRANGEIRO
Luiz Eduardo Borgerth

‘A fraude alheia’, copyright Folha de S. Paulo, 26/07/2004

‘Em sucinta coluna na Folha (‘Reacionário alheio’, 18/6, pág. A2), Claudia Antunes comentou a passagem pelo Brasil e as declarações do milionário venezuelano Gustavo Cisneros, filho de Diego Cisneros, um dos pioneiros da televisão venezuelana, fundador da Venevision -mal comparando, a Rede Globo da Venezuela.

Dono do mais bem-sucedido canal de televisão da Venezuela, sócio do sistema Univision, televisão de fala hispânica nos Estados Unidos, sócio da AOL (América Latina) e da DirecTV (idem), apresentado como a 50ª maior fortuna do mundo, veio lançar sua biografia em português, com prólogo laudatório do escritor mexicano Carlos Fuentes. Diz estar disposto a investir US$ 200 milhões no Brasil -não me perguntem em que, mas, seja lá onde for, é coisa apreciadíssima por aqui, muito embora hoje em dia não seja mais do que comprar uma ou outra empresa existente ou papéis que rendem mais do que em qualquer lugar do mundo.

Até hoje não sei o que ganha o país quando uma empresa passa das mãos de um dono para outro, muito menos quando passa das mãos de um nativo para as de um forasteiro. Problema meu, ignorante que sou das macroconseqüências da microeconomia.

A jornalista da Folha deteve-se na posição política do magnata venezuelano ‘vis-à-vis’ o presidente Chávez, do seu país, o que confesso desconhecer, exceto pela notícia de que estão discutindo um plebiscito encruado, que não anda, para saber se o presidente eleito deve ser ‘deseleito’ ou não.

Para mim, o notável da entrevista foi o milionário venezuelano ter dito que o limite máximo de 30% que a lei brasileira impõe aos estrangeiros interessados em comprar emissoras de televisão não é ‘empecilho’ para ele. Você compra os 30%, bota o resto na operação e faz um acordo com o acionista majoritário, passa a mandar na empresa e pronto. Não há empecilho. Nos EUA, no seu caso com a Univision, revela ele, a FCC (uma ‘agência’ federal) tem poderes para aceitar -e aceitou- esse drible no limite de 20% (lá são só 20!) permitido a estrangeiros. Já no Brasil, temos uma lei e não temos um potencial de 20 milhões de cidadãos de fala hispânica.

Todos nós -ou muitos de nós- sabemos que a fraude à lei é uma instituição brasileira de grande tradição e respeito. Tem dado guarida e posto a salvo valiosos ativos de muitos acusados e condenados por atos ilícitos. O que espanta no caso presente, o que é inusitado, é a fraude anunciada. Pode até ser que o empresário tenha sido informado, com alguma credibilidade, de que a prática da fraude nesse campo é operação de rotina, que, pela sua abundância, já se transformou em direito adquirido.

Não há dúvida de que o descaso governamental e a indiferença da sociedade e das sempre vigilantes autoridades (in)competentes podem fazer crer aos alienígenas que a lei brasileira é apenas uma indicação de preferência, uma recomendação, uma sugestão sem nenhum caráter obrigatório. Realmente, para quem está de fora, pode parecer que a fraude é um dos modos aceitos de aquisição de direitos e propriedades no Brasil e que apenas saudosistas românticos seguem as determinações legais. Até aqui, tudo bem.

Foram os próprios empresários que pediram e lutaram para poder vender ou aumentar seu capital com 30% de participação estrangeira. Mudou-se a Constituição, que o proibia. Mas, como vimos, os alienígenas não estão interessados em 30%, sem um ‘adendo’ apropriado. Existe até um projeto do senador Ney Suassuna que permite a venda integral, 100%, das televisões por assinatura. O bom do senador está convencido de que, se distribuída por assinatura, TV não é TV e que os concessionários podem prometer não fazer programas, só transportar.

Talvez esteja certo o senador. Talvez a própria televisão aberta não seja televisão, seja apenas um produto como outro qualquer, uma commodity a ser oferecida no mercado, uma soja sofisticada. Vamos acabar com o sentimentalismo e a superstição de uma cultura brasileira num mundo globalizado; vamos substituir a palavra desnacionalização por terceirização. Vamos atualizar nossa legislação, vamos ser pioneiros, vamos terceirizar o rádio e a televisão e evitar o ultrapassado e desnecessário constrangimento de conviver com a fraude, ainda por cima alheia. Luiz Eduardo Borgerth, 71, advogado, é consultor de empresas de radiodifusão e autor do livro ‘Quem e como Fizemos a TV Globo’ (editora Girafa).’