Thursday, 25 de April de 2024 ISSN 1519-7670 - Ano 24 - nº 1284

Sueli Cotta e Jailton de Carvalho

‘A Polícia Federal fez ontem uma busca e apreensão na gráfica do jornal ‘O Tempo’, do deputado federal Vitório Mediolli (PSDB), em Betim, Minas Gerais. Dois diretores do jornal acabaram algemados: o diretor-geral, Almerindo Camilo, e o diretor de Redação, Teodomiro Braga.

A busca foi determinada pelo juiz Wauner Batista Ferreira Machado, da 316 Zona Eleitoral, depois de uma representação do Partido dos Trabalhadores. ‘O Tempo’ está sendo acusado de imprimir o jornal ‘Betim em Dia’, supostamente clandestino, que estaria fazendo propaganda eleitoral ilegal.

‘O periódico ‘Betim em Dia’ está sendo usado clandestinamente para a prática de crime e há fortes indícios de que o autor dessa conduta ilícita está usando as gráficas do jornal ‘O Tempo’ para imprimir periódico, seja por si próprio, pelos sócios do jornal representado ou por outrem’, sustenta Ferreira Machado no despacho.

O juiz determinou a apreensão dos exemplares do ‘Betim em Dia’, ‘onde e com quem se encontrem, bem como a prisão em flagrante de todos os autores da redação, elaboração, impressão e distribuição do jornal’. Também autorizou a PF e o oficial de Justiça encarregado de cumprir a ordem a ‘arrombar portas e demais obstáculos’.

O editor Almerindo Camilo considerou a ação um atentado à liberdade de imprensa.

— Pedi para ver o mandado, mas o delegado me deu voz de prisão e fui algemado. Nada foi encontrado. O mandado era para busca na gráfica, mas vistoriaram outros departamentos e revistaram gavetas.

O deputado Vitório Mediolli disse que a ação foi armação político-eleitoreira:

— A polícia constatou que não há qualquer vestígio deste jornal, que é clandestino. Essa ação foi uma armação política eleitoreira com o objetivo de causar constrangimentos.

Após duas horas de buscas, nada foi encontrado

Os policiais federais não encontraram nada e foram embora quase duas horas depois de vasculhar a gráfica do jornal ‘O Tempo’. Ninguém foi preso. Os documentos de Almerindo Camilo foram liberados pouco antes da saída dos policiais da gráfica.

O diretor-geral da PF, Paulo Lacerda, rebateu as críticas de que a polícia teria cometido excessos e disse que a PF cumpriu uma ordem da Justiça Eleitoral:

— Estamos cumprindo uma ordem. O importante é saber se a motivação para a diligência é legal e se a ordem foi cumprida dentro dos termos legais.’



Rui Nogueira

‘Para editor, petista induziu juiz’, copyright Primeira Leitura, 28/8/04

‘Teodomiro Braga, e editor-executivo da Sempre Editora, que publica os jornais O Tempo e O Tempo Betim, disse ao Primeira Leitura que ‘o juiz eleitoral foi induzido pela candidata do PT a tomar a decisão’ de mandar fazer a ação de busca e apreensão. Para ele, a ‘ação de intimidação’ só não foi bem sucedida porque os jornalistas e diretores da empresa reagiram à altura. Braga é um dos jornalistas mais premiados do jornalismo brasileiro, foi repórter e diretor do Jornal do Brasil e coordenador de comunicação do PSDB. Em abril passado, assumiu as novas funções na empresa mineira que edita O Tempo.

Primeira Leitura: O que significou para você, um jornalista experiente, essa ação de busca e apreensão da PF aos jornais O Tempo?

Teodomiro Braga: Isto faz parte de um contexto maior, um contexto nacional. É uma escalada de ações de iniciativa do governo federal, e a imprensa é um dos alvos. Essa ações visam a restringir a liberdade de imprensa, como demonstra a ação da PF em Minas e a idéia de o Planalto patrocinar a criação do Conselho Federal de Jornalismo (CFJ).

O jeito como a ação foi desfechado exibe segundas intenções?

Braga: Analisando a trajetória do caso, nos parece que o juiz eleitoral foi induzido pela candidata do PT a tomar aquela decisão. Acreditamos que houve motivação eleitoral clara. A intenção só não foi consumada porque nós reagimos à intimidação em curso. A intenção era acuar o jornal.

Por que vocês consideram uma violência a ação da PF nas sedes dos jornais em Contagem (O Tempo) e em Betim (O Tempo Betim)?

Braga: Nós pedimos para ver o mandado de busca e apreensão, e a reação da polícia foi agressiva. Se é dever da PF cumprir uma determinação judicial, é igualmente dever dela exibir o instrumento jurídico que permite entrar nos jornais. Em Betim, a polícia extrapolou claramente a determinação judicial e impediu, por três horas, que os jornalistas deixassem o prédio do jornal. Violou, inclusive, os terminais de computadores. Em Contagem, vasculhou até mesas do Departamento Comercial do jornal.

Minas gosta de se auto-intitular ‘terra da liberdade’. Que reações de apoio, ou não, vocês receberam?

Braga: O governador Aécio Neves se solidarizou com o jornal e disse que aquele ato não faz parte das tradições mineiras. Recebemos apoio do vice-presidente da República, José Alencar, do prefeito de Belo Horizonte e candidato à reeleição, Fernando Pimentel, da candidata do PT à prefeitura de Contagem, Marília Campos, do deputado Roberto Brant (PFL-MG), dos senadores Hélio Costa (PMDB-MG) e Eduardo Azeredo (PSDB-MG), do candidato João Leite (PSB/PSDB/PMDB) à prefeitura de BH e de muitos outros representantes da sociedade. O tiro saiu pela culatra porque a reação de apoio foi extraordinária. A Câmara de Vereadores apoiou o jornal.

O jornal O Tempo posicionou-se contra a criação do Conselho?

Braga: Posicionou-se desde o início, e esse é um direito que lhe assiste. Mas o jornal tem uma posição editorial democrática e abriu suas páginas ao debate. Temos publicado artigos contra e a favor da criação do Conselho Federal de Jornalismo. Esse equilíbrio é uma tradição editorial da casa. Aqui, publicamos uma coluna do ex-senador José Serra, do PSDB, assim como publicamos uma coluna da deputada federal Sandra Starling (PT). O espaço é o mesmo, mas em dias diferentes.’