Saturday, 20 de April de 2024 ISSN 1519-7670 - Ano 24 - nº 1284

Terra Magazine

TELEVISÃO
Márcio Alemão

BBC – Big Brother Caipira

"Eles continuam a fazer a contagem regressiva a partir do 1000. E dessa forma tivemos mais um domingo de tortura total na Fazenda da Record. Sei que não é difícil ser o mais chato. Qualquer zé mané consegue ser enfadonho, aborrecido, irritante. Logo, evitar que isso aconteça também não chega a ser tão complicado.

Não para o diretor de A Fazenda. Ou ele ou alguém que secretamente trabalha para as demais emissoras, está apostando que a embromação, que o ritmo arrastado de tudo prende o telespectador.

Não creio.

Ontem o Fantástico estava bem melhor. Como não quis cometer suicídio enquanto as moças desciam uma escadaria de 367 degraus para chegar até o que seria uma praça de eliminação, fui mudando de canal.

Antes disso tivemos muitos minutos dentro da casa onde nada, absolutamente nada acontecia. O diretor de Tv que está acompanhando essa trágica situação deveria ter alí no celeiro da Fazenda, de plantão, um mutante da gloriosa novela de mesmo nome. Quando o nada absoluto se instalasse ele deveria invadir a Fazenda e, sei lá, transformar o Dado Dolabella em galinha, fazer a boca da Babi voltar ao tamanho original; qualquer coisa para tentar manter a audiência.

Fui para a Globo e tive a sorte de ver o novo quadro de Regina Casé, por culpa dela, é muito bom. A idéia é boa mas digo ‘por culpa dela’ porque é muito difícil imaginar outra pessoa fazendo esse quadro. Ritmo bom, boa edição, muita informação e variações em poucos minutos. Em resumo, uma ótima diversão.

Vejo o quadro todo e volto para a Fazenda.

Nada de novo havia acontecido.Britto Jr. lembrou dezenas de vezes que era um momento difícil mas a vida é assim e, como diz o sábio árbitro, a regra é clara e uma das moças seria eliminada.

Ele chegou a perguntar para a mulher do Latino se naquela semana ela teria feito alguma amizade profunda. Enfim, não vou entrar em detalhes sobre esse BBC Big Brother Caipira. O que tenho visto é que esse tem problemas sérios de direção, ritmo, de edição, de imaginação e condução.

Algo precisa mudar.

Infelizmente o assunto da semana foi o acidente com o Airbus. É muito difícil nesse caso dizer se houve ou está havendo excesso nas tentativas de se levar ao telespectador alguma notícia nova, algum fato novo que seja revelador, tranquilizador.

Por mais que em certos momentos eu consiga ver o tal excesso, não consigo deixar de prestar atenção. Tudo foi muito triste e terrivelmente misterioso."

 

MÍDIA & CINEMA
Ana Paula Sousa

Que Hollywood é a maior indústria de cinema mundial, todo mundo sabe.

"Que Bollywood, a máquina de fazer filmes indiana é a segunda, muita gente sabe.

Mas quem apostaria que a Nigéria aparece em terceiro lugar nesse ranking?

Pois o país africano produziu, em 2007, nada menos que dois mil títulos. Entre 1997 e 2005, foram feitos 6.221 filmes.

Para escoar essa produção existem, no país, cerca de 500 mil locadoras de vídeo e distribuidoras.

O caso das indústrias audiovisuais de Nigéria e Gana foi apresentado por Alessandra Meleiro, pós-doutoranda pela Universidade de Londres e pesquisadora do Cebrap, no V Encontro de Estudos da Cultura (Enecult), em Salvador.

A vasta produção de filmes na Nigéria e em Gana tem, segundo Alessandra, influenciado outros países do continente, que também começam a olhar para o mercado cultural como uma possibilidade concreta.

‘Na Nigéria, o governo começou a dar apoio a essa produção’, diz a pesquisadora. ‘Mas, claro, os desafios ainda são muitos.’

O video-maker Socrate Safo, de Gana, mexe em dezenas de filmes piratas

De acordo com ela, há problemas de pirataria, baixa qualidade técnica, falta de infra-estrutura em todos os elos da cadeia e também ausência de escolas para preparar os profissionais.

Boa parte dos vídeos nigerianos tem um quê de amadorismo. Mas, de alguma maneira, esse formato atende ao gosto do público, aos anseios de entretenimento da população.

Como escreve Françoise Balogun, num dos livros da coleção Cinema no Mundo (Escrituras/Iniciativa Cultural), os filmes africanos, durante muito tempo, dependiam da ajuda financeira externa.

‘Isso levou a uma cinematografia em sintonia com os filmes de arte ocidentais, não necessariamente bem recebidos pelas massas africanas’, pontua Françoise.

‘O vídeo é uma resposta econômica a um desejo por imagens que sejam compreensíveis ao grande público’, aposta.

Os filmes costumam mesclar comédia, suspense e ação. Geralmente, são longos, com três horas ou mais. E os blockbusters costumam ser seriados.

‘Hoje, todas as salas de cinema têm projetor de vídeo para poder atender a essa demanda’, diz Alessandra.

‘O vídeo começou como fenômeno urbano, mas rapidamente se espalhou pelo campo. Os vídeos de Gana são vendidos em sites e locadoras que atendem imigrantes africanos na Europa ou nos Estados Unidos.’

Cabe observar que, lá, tudo é pirateado. Além disso, a lógica do mercado segue, estruturalmente, os princípios norte-americanos.

‘O produtor é o distribuidor e também o exibidor. O produtor, ao investir num filme, já tem o ponto de distribuição’, conta a pesquisadora. No fim, todos os filmes se pagam.

Trata-se, ainda assim, de um mercado que movimenta a economia e que nos oferece lições sobre a produção alternativa de imagens num mundo marcado por um cinema hegemônico.

‘Gana e Nigéria enfatizam a participação do setor cultural na erradicação da pobreza’, diz Alessandra.

‘E, além dos filmes populares, há também os filmes de autor, que chegam a festivais internacionais e chamam cada vez mais atenção.’"

 

MÍDIA & CULTURA
Pablo Calvi

Em Times Square, com Marshall Berman

"Nova York, Estados Unidos – A Broadway e a Sétima Avenida se cruzam à altura da Rua 46, em Times Square, o centro de Manhattan, esse banho de luz e arranha-céus que o mítico escritor Jack Kerouac descreveu como sendo o ninho no qual ‘acordam as grandes torres da terra’.

Marshal Berman escolhe essa esquina para o nosso encontro – uma confusão de trânsito, sirenes, cheiro de chuva e hot dogs envelhecidos, coroada por um luminoso enorme em azul e branco nupcial que anuncia o musical Mamma Mía e, no meio da rua, a moça robô da propaganda da Svedka Vodka.

Berman, autor de Tudo que é sólido desmancha no ar, um dos livros que marcou a crítica cultural e urbanística a fogo, no início dos anos 1980, me espera encostado sobre um canteiro de flores deserto. Começa a chover e o homem, vestindo calças de aviador e a tradicional camiseta de John Lennon na Estátua da Liberdade, cumprimenta-me e imediatamente propõe um passeio pela ‘Praça Urbana’, esse espaço que há poucos dias a diretora de transportes da cidade, Janette Sadik-Khan inaugurou como se fosse um marca-passo no coração da Times Square.

O novo calçadão, de mais de 5.500 metros quadrados, povoado de cadeiras e mesinhas coloridas, soma-se às recentes ciclovias com 1.500 quilômetros de extensão e transformam Nova York em uma cidade mais amigável e habitável. Além de tumulto, a medida gerou vários questionamentos. Um, entre eles, é de especial interesse para Berman, como será a Nova York do futuro?

On the Town, o mais recente trabalho do autor, tem a ver com essa evolução. No livro, Berman traça uma historia cultural dos cem anos da Times Square, desde o início como centro de lazer até a sua mais recente transformação.

Entre uma maré de pedestres, somos poucos os que, sob uma chuva fraca, sentamos nas cadeiras oferecidas pela prefeitura. Berman, que parece satisfeito com a mudança, chama a minha atenção para uma moça que, sentada a poucos metros de onde estamos, lê um livro protegida por um guarda-chuva.

‘O prefeito mais querido de Nova York foi Fiorello La Guardia’, começa a dizer enquanto arruma a enorme barba. ‘Foi o prefeito da cidade e das pessoas durante os anos 1930 – 1940. Era italiano, tinha sangue judeu, nasceu e cresceu no East Harlem. Foi advogado dos trabalhadores e de diferentes movimentos sindicais. De fato, transformou-se na voz das pessoas comuns de uma forma nunca antes vista na cidade. No entanto, tinha orgulho de ter abolido os cafés nas calçadas da cidade. Tirou centenas de cafés das calçadas, pois para ele esses cafés eram a encarnação da maldade, da decadência. Eram a manifestação de algo alheio a Nova York, podiam fazer parte de uma cidade de desocupados, de pessoas sem nada para fazer, sem trabalho, mas não eram dignos desta cidade. Ele dizia: ‘Nova York não é Paris, Nova York não é Veneza, somos uma cidade que trabalha’. Hoje vemos como essa afirmação era ridícula. Sem dúvidas, com todos os pontos positivos que teve La Guardia, isso mostra o lado mais reacionário e provinciano da esquerda de Nova York.’

Apaixonado pela cidade ‘como conceito’, Berman afirma que há anos não passa as férias na praia ou na montanha, e que dedicou praticamente a vida toda a compreender como estes gigantescos conglomerados de pessoas e trânsito nascem, atingem a maturidade e, em algumas ocasiões, desaparecem.

‘John Lindsay foi prefeito da cidade entre 1965 e 1973, e seu primeiro ato de governo foi, por decisão do executivo, reabrir os cafés nas calçadas’, lembra. ‘A sua segunda medida executiva foi proibir o acesso de carros aos parques da cidade. O Central Park tinha se transformado em uma espécie estrada no meio da cidade. Ele limitou a circulação de carros, e a proibiu durante os finais de semana, para que as pessoas pudessem levar a sua família ao parque e divertir-se, correr, andar de bicicleta. Basicamente criou o Central Park que temos hoje, muitas vezes nem pensamos sobre ele. Ninguém lembra que há poucos anos o parque era completamente diferente, muito menos amigável.

O senhor acredita que comparar o lazer à improdutividade é um conceito introduzido pelo capitalismo moderno?

Não tenho certeza. Penso que para ele (o prefeito La Guardia), o lazer – e este tipo de praças e cafés em particular – trazia uma imagem da aristocracia e das pessoas que não necessitam trabalhar para viver. Mas o que La Guardia não entendia é que a natureza do trabalho mudou com o passar dos anos, e que as pessoas podem estar em um lugar como este – fala com um amplo gesto do braço esquerdo que envolve da Rua 46 até a 42 – e estar trabalhando. É possível trabalhar intensamente estando em um parque com um computador portátil ou com um caderno, não acha?

De fato – Berman aponta em direção a um cartaz verde e branco da rede de cafeterias que se destaca na Rua 42 – Starbucks fez fortuna vendendo não só café, mas por ser uma estação de trabalho aberta, uma espécie de porto livre de internet; foi o primeiro lugar da cidade ao qual era possível ir com um computador, conectar-se à internet e trabalhar confortavelmente o dia todo. Eu estou agradecido a Starbucks, por isso e porque também melhorou a qualidade do café na cidade.

Então, o senhor propõe que nas cidades do futuro não haverá separação clara entre o local de trabalho e o de lazer?

Penso que as fronteiras não estão definidas como eram. Bom, se você trabalha em uma mina de carvão, as fronteiras continuam sendo bem limitadas. Esse tipo de trabalho tem o seu ritmo próprio, claro. Mas La Guardia tinha uma ideia bastante mecanicista a respeito das jornadas de trabalho, uma concepção ligada à linha de montagem. Tudo o que se afastasse da linha de montagem tinha um potencial maligno, destrutivo.

O senhor acredita que esta nova configuração da Times Square retrata um movimento da cidade em direção a um paradigma mais amigável, mais bucólico, até?

Não tenho certeza. Veja, isto não é muito bucólico, brinca. É difícil sentir-se muito confortável, principalmente hoje, com esta chuva. Mas no sol, este lugar se transforma em uma região onde as pessoas, os pedestres, se olham nos olhos. O ambiente continua sendo moderno, urbano e diverso, mas o modo de interagir dos pedestres urbanos não é mais mecânico.

O primeiro livro que descreveu este tipo de interação foi Cartas Persas, escrito no século XVIII pelo filósofo Montesquieu. Ele não compreendia o que é que todas essas pessoas faziam de pé, olhando o que acontecia ao seu redor. Aos poucos começa a compreender que estar ali faz parte da atividade da cidade, faz parte da sua vida urbana. Muitas pessoas não compreendem bem por que isso ocorre, nem que essa forma ociosa de contemplação urbana é parte da atividade da uma cidade.

Agora, a esquerda é mais fechada do que a direita nesse sentido? Não sei. Pode ser.

Há um debate entre aqueles que querem uma cidade mais aberta às bicicletas e os que afirmam que o uso de bicicletas é elitista. O senhor acredita que esse debate é razoável ou que as reivindicações podem ser atendidas?

Penso que é um debate um pouco fútil, não acha? Como se o trabalhador não soubesse pedalar, diz.

Imediatamente Berman me convida para caminhar mais um pouco, desta vez para proteger-nos da chuva, no Starbucks da Rua 41.

Penso que o debate tem origem no fato de que as pessoas mais pobres têm, estatisticamente, viagens mais longas até o local de trabalho, diz. Isso é verdade, mas muito poucas pessoas podem chegar até Manhattan de carro.

Leva meio dia encontrar uma vaga para estacionar, é muito caro e há poucos lugares no centro onde é possível deixar o carro na rua. Penso que o debate se estabelece porque muitas pessoas ainda não veem com clareza os benefícios de uma cidade mais aberta às bicicletas.

O senhor acredita que a construção de ciclovias tem sentido em Nova York?

Penso que é um fenômeno interessante. Há muito tempo estive na China, em Shangai, e havia milhares de bicicletas. E, claro, tem pistas especiais para as bicicletas. Peguei um taxi e o chofer ficou o tempo todo reclamando dos ciclistas e dirigindo na ciclovia. Tudo isso na frente de vários guardas de trânsito que não se importavam nem um pouco com o que o motorista estava fazendo. Como se houvesse uma regra não escrita para não proteger os ciclistas.

Em Sadik-Khan, diferente do que acontecia na China, há uma política de proteção ao trânsito de bicicletas. Se temos que falar de heróis do urbanismo na cidade, em primeiro lugar está (Frederic Law) Olmsted. Foi ele que criou o Central Park. Robert Moses construiu as ciclovias nos parques e, basicamente, não as destruiu. Moses foi muito bom por ter construído praças de jogos e piscinas públicas. Essa foi a sua grande contribuição. Ele pertencia à equipe de natação de Yale, e dizia que nadava 1,5 km por dia. Claro, ninguém pode provar isso, mas era assim que ele se apresentava.

Quais tipos de tensões se originam na cidade entre aqueles que querem mudá-la e os que não querem?

Tensão sempre existe. A Universidade de Columbia, por exemplo, comprou muitas propriedades no Harlem e isso está gerando grandes polêmicas. Mas eles compraram terrenos e prédios, tudo praticamente em ruínas, não havia nada que pudesse ser preservado. Depósitos abandonados…

Mas essas compras valorizaram a região. E muitos vizinhos, que são pessoas pobres, se queixam justamente disso.

Sim, mas na verdade esses vizinhos não sofreram o impacto da subida dos preços, porque Nova York ainda tem uma lei que estabelece teto de reajuste do aluguel, outro dos grandes feitos de La Guardia. Sem o teto, isso teria acontecido em uma escala muito maior e muito antes.

O senhor acha que o colapso de Wall Street está, de alguma forma, relacionado com essas novas políticas de abrir a cidade para as bicicletas e os parques?

Não. Penso que em Wall Street as bicicletas e os parques serão bem recebidos.

No entanto, a cultura ‘verde’ pareceria estar em uma direção bem diferente da que propõe a cultura corporativa de Wall Street.

Não sei. Por que os operadores de Wall Street não poderiam sentar nos parques com os seus notbooks e comprar e vender opções, ações, ou bônus, seja qual for a sua especialidade? Eu penso que eles fariam isso. O mundo das finanças e o mundo dos meios de comunicação se expandiram e funcionam 24 horas por dia. Isso implica que o horário de trabalho seja mais flexível do que era antes. Penso que é possível trabalhar a qualquer hora e em qualquer lugar. Além disso, as mulheres, por exemplo, não têm que deixar de trabalhar para criar os seus filhos, o que gera uma grande diferença qualitativa nas suas vidas, e nas vidas dos seus maridos e família.

Nesse sentido, penso que as cidades e o seu ritmo de trabalho – sempre com a premissa de gerar valor agregado – estão muito menos alienantes do que eram, por exemplo, na época em que eu cresci, nos anos 1950 e 1960.

O senhor é especialista em marxismo, mas pelo que lembro, o conceito de alienação tem a ver em parte com a impossibilidade que o capitalismo gera de apropriar os frutos do próprio trabalho, as rotinas de produção e a nossa ligação com o mundo, essa que nos garante a sobrevivência e a felicidade. Nesse sentido, por mais que trabalhemos em um parque ou em uma praça, ou mesmo que andemos de bicicleta, não continuaremos estando alienados na cidade?

Sim, embora nesse sentido, continuaríamos estando alienados vivendo em um regime do tipo socialista em que os meios de produção estivessem em mãos de estado. Seria outra forma de alienação. Agora, um dado importante é que neste novo tipo de cidade, as pessoas podem olhar para o seu vizinho nos olhos e interagir com ele de uma forma muito mais humana. Agora é possível realmente estabelecer vínculos humanos. Isso, de certa forma, o afasta da alienação. É importante entender que talvez estejamos criando uma forma melhor de viver.

Claro, sem dúvidas o capitalismo é regido pela necessidade de multiplicar o capital, de gerar mais dinheiro. Mas a direção que as novas cidades estão seguindo é, com certeza, uma forma de capitalismo que parece ser um pouco mais benevolente. De fato é um capitalismo muito menos benevolente do que havia na minha adolescência, mas sem dúvidas é muito mais humano do que o capitalismo de três décadas atrás. Assim como as praças e parques, uma grande parte da economia atual está destinada a cuidar das pessoas: empresas de saúde e alimentos, por exemplo. Além disso, boa parte dos impostos vai para a seguridade social. Claro, isso não quer dizer que o mercado deva decidir tudo. Se fosse assim, muitas pessoas que perderam os seus trabalhos devido à crise ficariam simplesmente na rua.

Mas voltando a falar da alienação, antes o Central Park era um pântano, um terreno baldio. Nada crescia ali. As pessoas não se aproximavam dali para nada. E o governo investiu muito dinheiro para transformá-lo no que é hoje, um dos lugares mais bonitos do mundo. Olmsted o construiu do zero, o Parque foi construído para ser um lugar tão especial que as pessoas pudessem se olhar nos olhos e se encontrar. Esses parques são modelos de urbanismo, foram criados do nada por centenas de milhares de operários e o resultado é um espaço que todos podem usufruir. O Central Park é, de certa forma, tudo o que podemos ter em termos de cultura. E que o hoje vemos aqui, na Times Square, esta nova praça, também é um exemplo disso. Muitas grandes cidades do mundo estão nesse processo e talvez as cidades dos Estados Unidos sejam as mais atrasadas nesse movimento.

Se o senhor tivesse que escrever novamente Tudo que é sólido desmancha no ar, consideraria estes novos movimentos?

Bem, quando escrevi Tudo que é sólido, há 27 anos, não sabia praticamente nada das cidades sobre as quais estava escrevendo. Hoje, penso que escreveria mais a respeito das mulheres e o seu impacto nestas novas concepções de cidades. Janette Sadik-Khan, a diretora de transportes de Nova York, que está construindo estas praças, é uma dessas figuras. Mas também escreveria mais sobre Jane Jacobs, a urbanista que no final de 1960 publicou The Death and Life of Great American Cities, um texto realmente revolucionário. Ela dizia que as cidades só podem ser vistas em nível do solo.

Dos lugares que não brilham, que não são particularmente bonitos, que não são glamorosos. As cidades têm que ser vistas dos lugares mais pobres, mais escuros. Porque esse é o seu coração. Apenas desses lugares é possível começar a recriá-las.

Como dizia Baudelaire as cidades são uma mistura particular. Viver em uma cidade é como tomar a comunhão num bordel. Mas as cidades são fundamentalmente um lugar no qual as pessoas podem se encontrar e se olhar nos olhos. E esse encontro enriquece a nossa vida. Por isso, não tenho dúvidas, alguém no escritório de Sadik-Khan deve ter lido Baudelaire."

 

INTERNET & POLÍTICA
Thais Bilenky

Twitter de Obama inspira parlamentares do Brasil

"Alguns parlamentares avisam que tecnologia só se for ‘sinal de fumaça’ ou ‘toque de tambor’. Outros, antenados em Barack Obama, investem na internet para dialogar com a sociedade. O Congresso Nacional agora mira o twitter. Políticos pulam do site pessoal diretamente para esta plataforma de mensagens breves, sem passar sequer pelo blog.

Vide o senador Inácio Arruda (PC do B-CE), cujo site está em reformulação para acomodar o twitter. Seu blog tende ao abandono.

No Senado, dos 81 gabinetes, 10 já aderiram ao twitter e aos seus recados de no máximo 140 caracteres, informa o diretor-adjunto do Prodasen (Secretaria Especial de Informática do Senado), Deomar Rosado. Na Câmara, a maioria dos 513 deputados federais possui sites pessoais, segundo o diretor de comunicação, Sergio Chacom.

Quanto ao twitter, eles correm atrás.

Da bancada do PSDB, em torno de 15% dos 58 deputados já têm twitter. No PDT, 3 dos 25; no PC do B, dos 12 comunistas, 2 aderiram; 5 dos 56 democratas o utilizam; e na bancada do PDT, 3 dos 25 deputados. Já no PMN, nenhum. Só o líder Uldorico Pinto (PMN-BA) se aproximou da internet e construiu um site. Sempre de acordo com as assessorias de imprensa das lideranças de cada partido.

Efeito Obama

O grande inspirador da invasão ao Twitter é o presidente dos Estados Unidos, Barack Obama. Na última campanha presidencial, o democrata investiu cerca de 47 milhões de dólares na internet, registra Sérgio Chacom, o que em parte explica os 5 milhões de pageviews únicos obtidos em somente um vídeo postado no site oficial da campanha.

‘Obama revolucionou a internet na campanha. Ele lançou o candidato à vice-presidência pelo Twitter. Tinha 150 mil pessoas acompanhando, hora a hora. Teve 92 milhões de acessos em seu portal’, admira-se o senador Aloizio Mercadante (PT-SP), em entrevista a Terra Magazine.

‘Obama mostra uma mudança de atitude na democracia’, afirma Mercadante. O petista acaba de lançar nova plataforma na internet. Um portal que acomoda blog, Twitter, Orkut, Ning, Slide Share, Flickr, RSS, televisão e rádio. ‘Com isso, a gente agiliza a troca de informações, melhora a qualidade do mandato e cria uma relação interativa que é muito importante para a democracia’, justifica.

‘Estou lendo ‘Leite Derramado’. Uma análise crítica da história da elite brasileira, bem ao estilo do grande poeta Chico Buarque’, postou o líder petista no Senado.

No Brasil, as campanhas políticas de 2010 prometem uma corrida online. Pré-candidato à Presidência, o governador paulista José Serra (PSDB-SP) já possui twitter. Seu colega mineiro, Aécio Neves (PSDB), está preparando o seu ‘login’. Da Bahia, o governador Jacques Wagner (PT-BA) foi um dos primeiros a se comprometer com os 140 toques, várias vezes ao dia.

Em abril, a presidência da República anunciou a criação de um blog. A ver.

O deputado Ronaldo Caiado (DEM-GO) liga da sessão plenária para um assessor e avisa que uma medida provisória foi aprovada. ‘Faça um post no twitter’, pede. ‘Se a pessoa quer se demorar no tema, ela pode’, elogia o deputado, líder do Democratas na Câmara. Ele tem seu portal na web, e um blog. ‘Mas o twitter é mais ágil’, compara. ‘O retorno do eleitor é muito grande, especialmente universitários’, relata Caiado.

Acompanha twitters ou blogs de colegas políticos?

Não, diz Caiado. Tampouco o faz o senador petista Delcídio Amaral (MS). Ambos, governo e oposição, confiam nos jornalistas.

Delcídio é entusiasta das ferramentas online. ‘Eu me divirto!’, exclama o senador, pronto a explicar por quê. Porque é ‘aberto, menos formal’, garante. No Twitter, ele se alegra em poder falar de arte, de cultura, de música, dos problemas de George Harrison com os outros Beatles. Alegria maior ao promover debates entre os seguidores.

Os seguidores do Twitter de Delcídio se multiplicaram rapidamente após a viagem de inauguração do Trem do Pantanal. Colado no presidente Lula, no vagão reservado à cúpula do governo, Delcídio fez as vezes de repórter e twitou de seu celular, a cada parada, notícias exclusivas da viagem.

‘O meu twitter acabou se tornando fonte pra própria imprensa aqui em Campo Grande (MS). Você posta uma mensagem, a mídia vê, começa a pesquisar e vira matéria’, proclama o senador.

Delcídio Amaral alerta, apesar do entusiasmo, para o mau uso da ferramenta. Sem maiores dificuldades, o político pode fazer do twitter uma obrigação vazia de se atualizar e ‘deixar para a assessoria todo o trabalho’, teme."

 

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Mercadante: Internet amplia democracia no Brasil

"O senador Aloizio Mercadante (PT-SP) é considerado na bancada do PT um dos parlamentares mais antenados na internet. Autor do projeto de lei que determina a instalação de computadores com banda larga em todos as escolas públicas de educação básica e superior até 2013, Mercadante arrisca:

– A internet é um processo histórico que vai promover grandes mudanças na democracia e na cidadania.

O senador lançou nesta segunda-feira, 1º de junho, seu novo portal na internet, www.mercadante.com.br . E conta:

– Tem o Orkut, o Facebook, o Ning, o Flickr, o Slide Share, RSS. Tem a TV Mercadante, a Rádio AM – Rádio Aloizio Mercadante, com os pronunciamentos que eu faço.

Para quem acredita que ‘o mundo vai estar cada vez mais dividido entre analógicos e digitais’, como afirma Mercadante, já se sabe em qual metade o petista quer se posicionar.

Leia a entrevista na íntegra com o senador Aloizio Mercadante.

Terra Magazine – O senhor acredita que o twitter pode servir como fonte de informação, mas também como escape para o político fugir de entrevistas?

Aloizio Mercadante – Acho que a internet é um processo histórico que vai promover grandes mudanças na democracia e na cidadania. Não só porque é o espaço da liberdade de informação, de relacionamento horizontal entre as pessoas, como permite a interatividade. A democracia originalmente se dava na praça pública na Grécia. Ali é que você discutia, debatia os grande temas. A praça pública do século 21 é a internet. Então, essa nova plataforma de comunicação que estou lançando no www.mercadante.com.br traz uma série de mecanismos de relações das redes sociais. Tem o Orkut, que é a mais difundida no Brasil onde as pessoas podem participar e debater, tem o Facebook, que nos Estados Unidos é a mais utilizada, no Brasil ainda não, tem Ning, que é uma rede similar ao Orkut, novidade no Brasil ainda pouco utilizada no Brasil, o Flickr, que é galeria de fotos, tem o Slide Share, que são compartilhamentos de documentos, palestras – as transparências que eu apresento nas minhas palestras estarão todas lá expostas. Tem o RSS, que também é uma ferramenta nova para acompanhamento de conteúdo do site através de envios do email, de celular ou navegador de internet. Tem a TV Mercadante onde os principais programas estão lá, a Rádio AM – Rádio Aloizio Mercadante, com os pronunciamentos que eu faço. Então eu já tinha certa visitação, certo interesse. Estou avançando mais, multiplicando essas relações, diversificando. Você também recebe críticas, sugestões.

Tem tido retorno?

Eu recebo mais ou menos mil e-mails por dia. É difícil processar tudo. Tenho que selecionar e responder às vezes com certo atraso. Acho que cada vez aumenta o número de emails. Estes mecanismos como Orkut e Facebook agilizam. Muita gente pede para eu mandar (discursos em ) palestras. Já estarão disponíveis no site, no dia seguinte. Com isso, a gente agiliza a troca de informações, melhora a qualidade do mandato e cria uma relação interativa que é muito importante para a democracia.

Muitos políticos estão aderindo aos meios de comunicação online. De modo geral, o senhor avalia que eles podem se tornar um instrumento esvaziado, e os assessores de imprensa acabarem ocupando mais o espaço que o político?

Depende do mandato. Quem utilizou pela primeira vez na história com grande ênfase, já vem fazendo esforço a muitos anos nesse sentido, foi o (presidente dos EUA, Barack) Obama. Ele revolucionou a internet numa campanha eleitoral. Ele lançou o candidato à vice-presidência dele pelo twitter. Ele tinha 150 mil pessoas acompanhando ele, hora a hora. Teve 92 milhões de acessos no portal dele. Então, ele usou, investiu e teve um retorno político. Um homem que tinha sido eleito deputado federal em 2001, depois se elege senador, derrota Hillary Clinton, derrota (John) McCain e se elege o presidente da maior economia do mundo. Assim como o Roosevelt (Franklin Delano Roosevelt, Presidente dos EUA entre 1933 e 1945) usou o rádio, ele soube usar a internet. E mostra uma mudança de atitude na democracia. Eu acho que este instrumento é muito importante. Já temos 57 milhões de usuários no Brasil. Eu fiz um projeto, que já aprovei por unanimidade no Senado e na Comissão Especial da Câmara, falta só o plenário da Câmara, que é um projeto que prevê colocar banda larga em todas as escolas públicas do Brasil. 49 milhões de alunos, com um computador na frente de cada aluno, um endereço eletrônico para cada aluno, produção de material didático, treinamento de professores. Usando o recurso do Fust (Fundo de Universalização dos Serviços de Telecomunicações), que é um fundo criado exatamente para patrocinar inclusão digital, e que tem sido contingenciado desde a época em que foi criado no governo anterior. Então é uma luta que venho fazendo porque acho que a revolução na educação vai vim pela internet, a sociedade do conhecimento, da informação… A sociedade moderna é a internet. E a política, a democracia vão passar cada vez mais pela internet.

Entre os brasileiros, ainda há resistência para se entender o funcionamento da internet. Políticos podem até sentir a necessidade de responder a uma demanda do eleitorado, mas na prática não tem na veia a iniciativa de criar um twitter, postar, dar eles mesmos uma informação. Como não banalizar essas ferramentas?

Acho que o mundo vai estar cada vez mais dividido entre analógicos e digitais. Uma mudança importante cultural, histórica. A nova geração vai ser cada vez mais uma geração digital. As pessoas conversam pelo skype, marcam encontros pela internet, se comunicam permanentemente, não mais por cartas, como era antes, mas por e-mail. Qualquer pesquisa, qualquer informação, entra no Google e tem acesso imediatamente. Novos celulares já têm acesso direto à internet. Te informam cada vez mais em tempo real, por podcast, pelos grandes portais – o Terra presta um serviço muito importante nesse sentido. Estamos assistindo a uma revolução da informação. Tem gente que vai ficar para trás. Tem gente que não vai entender. Para a minha geração, é muito mais difícil usar estes instrumentos do que para a nova geração. Eu vejo meus filhos, eles estão totalmente identificados. Faziam prova na universidade pela internet, mandavam o trabalho para o professor pela internet, recebiam a avaliação, comunicavam-se com os alunos, mobilizavam… Estão totalmente digitalizados. Na minha geração é mais difícil você ter a mesma facilidade, mas é indispensável. Mas é um processo que a história vai abafar. Quem imaginava que a política não ia passar pelo rádio, Roosevelt começou, depois todo mundo foi atrás. Ou que as campanhas não passariam pela televisão. Estamos vivendo uma revolução da informação que é a internet, que é este espaço cibernético fantástico, onde todas as inteligências do planeta e as relações mais dinâmicas estão se colocando. A democracia tem que acompanhar a velocidade da informação, então eu estou me preparando para isso, para essa forma de comunicação digital mais moderna, mais ágil, mais bonita, mais atrativa, e fomentando, estimulando este caminho.

O senhor está confortável?

Estou, estou muito feliz de ter feito. Há muito tempo venho batalhando por isso. Usei TV Digital ao vivo no passado, a uns três anos atrás, já estava com o twitter no ar há algum tempo, estou vendo outras lideranças fazerem o mesmo. Estou muito satisfeito, para mim é um prazer imenso fazer essa mudança de paradigma histórico."

 

TRAGÉDIA DO VOO 447
Aloisio Milani

Noticiário do Airbus tem ‘vazio de informação’

"As notícias sobre o acidente com o avião A330, da Air France, dominam sites, jornais, rádios e televisões desde segunda-feira, 01. Na maratona por informações exclusivas, também se vê um imenso mar de dúvidas sobre as causas do acidente. Para o sociólogo Venício Artur de Lima, pós-doutor em comunicação, o acidente aéreo e o noticiário sobre ele claramente se diferenciam dos anteriores no Brasil – da TAM e da Gol:

– Esse acidente não tem um local delimitado, uma imagem simbólica, um ícone, muito provavelmente não haverá corpos, o lugar é inacessível, então fica difícil…

Leia mais:

Em entrevista a Terra Magazine, o professor explica que o tema, obviamente, mobiliza leitores e telespectadores. ‘Com toda a certeza esse tipo de assunto aumenta a audiência. Mas tem uma duração, tem um crescimento, ele sobe e depois cai porque passado aquele primeiro momento de surpresa e curiosidade, você vê que não se sustenta’, diz.

Isso porque o tipo de acidente com o Airbus configura um ‘vazio de informação’. E, para Venício Lima, se não há novidade ao mesmo tempo em que as pessoas ‘estão loucas para saber algo’, fica claro o ‘despreparo da imprensa’. E, além disso, tentativas de ideologização do debate. Contudo, muito menores do que aconteceu com o acidente da TAM, em Congonhas.

– (Na terça-feira), em O Globo, havia: ‘Sarkozy consola parentes, Lula estava longe’ (…) É tipo de ilação absurda (…) insinua que o presidente Lula, ao contrário do presidente da França, não deu a devida atenção ao que estava acontecendo.

Leia a seguir a íntegra da entrevista:

Terra Magazine – Professor, há uma diferença entre a cobertura da imprensa hoje e o que aconteceu com os acidentes da TAM e com o da Gol, quando houve uma tentativa de partidarização do debate, não? Mas agora é diferente, não há um local específico, a imagem clara do acidente…

Venício Lima – Eu concordo com você que há diferenças significativas em relação à cobertura que está sendo dada para esse acidente se você comparar com o acidente da TAM. Acho que não há nenhuma dúvida quanto a isso. Esse acidente não tem um local delimitado, uma imagem simbólica, um ícone, muito provavelmente não haverá corpos, o lugar é inacessível, então fica difícil… Pela própria natureza do acidente, ele é diferente do que foi o da Gol e o da TAM. Embora haja uma coisa que não está sendo devidamente enfocada que é que a coincidência do equipamento do acidente da Air France e o da TAM – ambos eram da aviões Airbus. E isso é um fato muito significativo.

E, apesar disso, há outra coisa a se lembrar. Na terça-feira, o primeiro dia em que os jornais impressos trouxeram notícias do acidente aéreo, me chamou a atenção a manchete e a titulação do jornal O Globo. Tanto que eu até guardei o jornal. Me ocorreu até propor a alguns professores amigos, que dão aula de jornalismo, para fazer uma brincadeira, meio em tom de brincadeira e meio séria. Que é a seguinte: pegar tanto o texto da nota de primeira página, quanto dos textos internos e pedir para os alunos titularem a matéria. Isso porque a titulação obviamente não corresponde ao que está escrito na matéria ou na nota.

Daria até para fazer uma pergunta de múltipla escolha, sugerindo alguns títulos possíveis. E incluir os que foram publicados para ver o que dava. Estou me referindo ao fato de que o O Globo enfocou de modo muito particular o fato de que o presidente da França esteve naquela mesma manhã com os parentes das vítimas e o presidente do Brasil, não. Estou com o jornal aqui em minhas mãos. Na primeira página, tem: ‘Sarkozy vai e Lula manda vice’. E na página interna tem: ‘Sarkozy consola parentes, Lula estava longe’. E o que dou risada disso é que eu associei isso com uma música.

Uma música? Qual?

A música é da época em que fui a primeira vez aos Estados Unidos, em 1973, o ano do Waltergate. Eu fiquei entusiasmadíssimo com aquilo e o Paul Simon lançou uma música que chamava ‘Love’s me like what’ e que tinha um refrão que falava ‘Who do you think you are fooling’, ou seja, ‘Quem é que você pensa que está enganando?’. E isso se repetia várias vezes. E uma das interpretações da época era que ele se referia ao Nixon.

E isso tem a ver com as matérias de O Globo?

Eu juntei os títulos do O Globo com essa música. Isso porque dias antes, saíram os dados do IVC sobre a circulação dos jornais no Brasil. E dá uma queda significativa dos três primeiros jornalões (Folha de S.Paulo, O Globo, O Estado de S.Paulo) em relação ao mesmo mês de 2008. Então, é isso que eu penso. ‘Quem vocês pensam que estão enganando?’. A circulação está caindo, os jornais estão fechando. E você faz uma brincadeira dessa ao insinuar que o presidente Lula, ao contrário do presidente da França, não deu a devida atenção ao que estava acontecendo.

E engraçado que essa edição mostra uma semelhança com aquele primeiro momento da queda do avião da TAM. Aquela tentativa de culpar o governo…

Exatamente. E nesse caso está muito mais difícil. Evidentemente, não tem como fazer isso. Agora, sabe-se que o avião caiu em águas internacionais. O avião era de uma empresa não-brasileira. O fabricante é de um consórcio inglês-francês, há um histórico de problemas com esse tipo de avião, né, o Airbus tem dado problema. E apesar disso tudo, eu peguei esse caso específico porque me chamou a atenção. E pode mostrar como se constrói uma ilação, uma cobertura tendenciosa.

E quando penso sobre, não acho que eles não estão enganando ninguém, porque o eventual leitor não é burro. Essa idéia do leitor ou telespectador como semelhança do Homer Simpson não existe mais. Se já existiu algum dia, hoje, com a internet e a mídia interativa e as redes sociais, isso tem mostrado que o leitor, o ouvinte, o telespectadores não é nenhum idiota. Mas me ocorreu que esses jornalões estão escrevendo para eles mesmos. Estão numa estratégia de manter o que têm. Porque não há mais como crescer, porque a mídia impressa como existe hoje não tem como sobreviver. Nesse formato e fazendo esse tipo de ilação absurda. Os títulos internos, em comparação com as matérias, são obviamente títulos que tentam manipular leitores que não lêem a matéria.

O governo se expôs menos também e, no geral, a imprensa errou menos?

No acidente anterior, houve uma sequência de absurdos. Acidente aéreo é interessante de se analisar, porque o cidadão comum nunca sabe o que realmente aconteceu. O tempo passa, os relatórios finais, quando são divulgados, não se dá a mesma importância do que a época.

Ou são complexos e vagos demais…

Me lembro de um articulista que publicou na primeira página um texto chamando o governo de assassino. Isso, com certeza, não vai se repetir agora.

Aliás, tudo é muito efêmero agora, muitas vezes coisas inconsistentes…

Com toda a certeza esse tipo de assunto aumenta a audiência, o número de leitores. Mas tem uma duração, ele sobe e depois cai, porque passa aquele primeiro momento de surpresa e curiosidade. Você vê que não se sustenta. Ontem e hoje, por exemplo, já não há mais novidades. E não tem mais como ‘explorar’ essa sede de informação sobre o tema.

Não há o diálogo dos pilotos, e isso traz um vazio de informações…

Exatamente, um vazio. Agora o engraçado, eu enfatizo, que eu não vejo em nenhum lugar informações sobre o fabricante do avião. Sinto falta disso. O que existe sobre a Airbus? O que já aconteceu com esse tipo de avião? Quais foram outros acidentes? Quais as características? Enfim, discutir esse histórico da Airbus. Claro que é uma potência, um consórcio que envolve, pelo que eu saiba, três países – França, Alemanha e Espanha. E esse avião específico é produzido em quatro países. Ele é montado na França, mas é produzido na Inglaterra, na Alemanha, na Espanha. Só posteriormente montado em Toulouse. E a discussão sobre a segurança do software que comanda os aviões já existe há bastante tempo. Sinto falta disso na cobertura, sabe.

E são informações que não necessariamente explicam o acidente, mas podem questionar o modelo do fabricante…

Claro. São essenciais: o fabricante, o perfil do modelo, o histórico de problemas, que tipo de falhas são mais comuns.

E quais os procedimentos do fabricante que indicam correções de problemas…

Exato. Há uma informação publicada originalmente no The New York Times e chegou aqui no Brasil. A associação européia havia emitido um alerta em janeiro sobre esse tipo de avião. São essas coisas que fazem falta aqui no Brasil. Então, fica muito claro que como não tem novidade, há um vazio de informação, mas as pessoas estão loucas para saber algo, o despreparo da imprensa. Um exemplo: outro dia vi um âncora da Rede Globo falando que do acidente do ‘Boeing da Airbus’. Olha o absurdo. São duas empresas completamente distintas. Um Boeing não tem nada a ver com um Airbus. E começa a dar informações equivocadas e furadas.

Professor, e lá na França a discussão sobre a hipótese de um ataque terrorista é muito mais forte do que aqui também. É uma diferença…

Agora, essa constatação é óbvia. Por quê?. À França não interessa, por todas as razões possíveis, que o avião tenha caído por problemas técnicos. Porque envolve o fabricante com participação preponderantemente francesa. E a empresa aérea é francesa. Então, se for um ato terrorista, isso exime a empresa aérea como fabricante. Mas acho que essa hipótese só está sendo alimentada lá.

Aqui a gente quase não vê…

E que dado concreto existe? Fica parecendo coisa que você pode provar que é, mas não pode provar que não é. Porque é uma coisa totalmente absurda. E qual a razão para dinamitar um avião daqueles no ar sem ninguém reivindicar a ação. Não apareceu nenhum grupo? Não há nenhuma mensagem? Enfim, tem que arranjar alguma explicação. Isso é um devaneio completo. E se fosse uma bomba teria que ter havido uma explosão. Mas aparentemente desintegrou no ar e há manchas de querosene no mar. Não sou técnico, mas o argumento de que não pegou fogo porque há queresone no mar me parece óbvio."

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