Friday, 19 de April de 2024 ISSN 1519-7670 - Ano 24 - nº 1284

TV Digital vai ganhar
incentivos do BNDES


Leia abaixo os textos de segunda-feira selecionados para a seção Entre Aspas.


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O Estado de S. Paulo


Segunda-feira, 20 de novembro de 2006


TV DIGITAL
Nilson Brandão Junior


Banco terá linha especial para a TV digital


‘O Banco Nacional de Desenvolvimento Econômico e Social (BNDES) finaliza nas próximas semanas um grande programa de financiamento à cadeia da TV digital no Brasil. O programa deve ser oficialmente anunciado no início de dezembro, e prevê financiamentos em várias frentes – como adaptações fabris para o fornecimento de equipamentos digitais, troca da infra-estrutura de transmissores no País e compras das próprias empresas de radiodifusão.


O principal objetivo será capacitar a indústria nacional a abocanhar a maior parte das encomendas de programas e equipamentos que surgirão nos próximos dez anos. De forma geral, a idéia é ‘favorecer ao máximo a indústria nacional’ na produção dos equipamentos para atender o novo padrão digital.


O padrão a ser adotado no Brasil será o japonês, com a incorporação de algumas modificações elaboradas no Brasil. Isso exigirá adaptações e desenvolvimento de tecnologia local na cadeia.


O chefe do departamento de telecomunicação do BNDES, Allan Fischler, explica que o padrão híbrido foi escolhido justamente para dar uma oportunidade à indústria nacional de desenvolver uma geração de equipamentos e softwares, o que não seria possível com a simples importação de um padrão internacional. ‘Nesse caso, você simplesmente montaria equipamentos já existem no resto do mundo’, diz.


Além dos financiamentos às indústrias, o banco também deverá financiar as compras das empresas de radiodifusão (transmissoras e retransmissoras de televisão). Estima-se que a digitalização de toda a infra-estrutura de transmissão demandará investimentos da ordem de R$ 5 bilhões a R$ 6 bilhões – é nesta parte da cadeia que serão necessários os maiores investimentos até 2016.


A previsão é que o sistema digital de televisão comece a funcionar a partir do fim de 2007, a começar pela região metropolitana de São Paulo. Nos anos seguintes, o modelo será estendido para as demais localidades. No fim de junho de 2016, o sistema analógico será desligado.


Segundo especialistas, os principais equipamentos para o novo padrão deverão ser importados no ano que vem, por conta do pouco tempo e pelo fato de que, na prática, a indústria nacional não atua tanto nos equipamentos transmissores de alta potência. Nos transmissores de pequeno e médio portes, porém, já existem algumas empresas atuando no País, como a Telavo Digital e a Linear Equipamentos.


O presidente da Telavo, Jakson Alexandre Sosa, diz que a empresa já produz transmissores analógicos e digitais para exportação. Com o novo padrão brasileiro, a empresa tem um plano de investimentos de US$ 3,5 milhões na adequação do parque técnico e laboratórios. A empresa desenvolve, com a PUC/SP e o centro de tecnologia Ceitec, um chip para a modulação brasileira.


Outro aspecto levado em conta no setor é a possibilidade de exportar o padrão brasileiro de TV digital para países do continente. Segundo os técnicos do BNDES, isso permitiria aumentar a escala de produção e fornecimento dos fabricantes nacionais.’


TELEVISÃO
Keila Jimenez


‘A Record não estava preparada’


‘Mudança constante de horário, troca de diretores, falta de estrutura. Não foram poucos os problemas enfrentados por Lauro César Muniz em sua estréia na Record, com Cidadão Brasileiro, que chega ao fim hoje. Para o autor, que trocou a Globo pela rede da Barra Funda, houve um esforço da nova casa para colocar sua audaciosa história no ar, mas o desafio era maior do que a Record esperava.


‘Houve erros básicos, no início, que comprometeram todo o processo. Implantação equivocada com tom indefinido, erros técnicos elementares (iluminação, cenografia, figurinos), despreparo do diretor responsável, que foi substituído já com dois meses de novela no ar’, reclama Lauro César. ‘Depois, Ivan Zettel (diretor) assumiu a novela e tentou corrigir os erros, mas já havia um tom contraditório em vários núcleos da trama. Conseguiu melhorar a parte técnica, mas não contava com colaboradores à sua altura. O elenco principal também era muito bom, mas a emissora não estava preparada para um projeto tão complexo.’


O autor conta que a trama também enfrentou problemas com as locações, que deveriam ser ambientadas em 1958, 1968, 1975 e 78, mas acabaram limitando a ação da novela às gravações em estúdios. No entanto, o que mais desagradou a Lauro César foram as constantes mudanças de horário do folhetim.


‘A novela estreou às 20h15 e inicialmente oscilou entre esse horário e 21 h, sem nunca se fixar. Depois passou para as 21h15, foi para as 22 h, onde cumpriu apenas dois capítulos, passando para as 22h25, 22h30, não sendo exibida às quartas por causa do futebol’, enumera o autor. ‘Isso desnorteou os telespectadores, que tiveram de perseguir a novela, sem a divulgação adequada para tantas alterações’, continua. ‘A audiência se ressentiu.’


Com o ibope na casa dos 15 pontos em sua estréia, a trama acabou se estabilizando na faixa dos 10 pontos em sua reta final, uma boa média para uma novela que trocou tantas vezes de horário.


‘Quis fugir dos padrões impostos hoje, do maniqueísmo exagerado, retomando um tipo de narrativa mais ambiciosa das décadas de 70 e 80’, explica ele.


‘Mas, o que sentia era que Cidadão não era uma novela que, por sua proposta temática, agradasse à cúpula dirigente da emissora’, conta o autor, que tempos atrás falou com a direção da Record sobre a possibilidade de fazer uma minissérie sobre a vida de Castro Alves. A Record acena com a possibilidade de tocar a idéia até 2008, quando vence o contrato de Lauro César com a casa.’


Etienne Jacintho


Lombardi se decepcionou com recusa


‘Pé na Jaca estréia hoje na Globo com Flávia Alessandra no papel da vilã Vanessa. Ela entrou no lugar de Luana Piovani, que reivindicava um salário maior. O autor Carlos Lombardi diz que não ficou ressentido com a mudança. ‘Fiquei decepcionado, mas como não sou eu que decido a carreira dela, não sou eu que pago e nunca participei de nenhuma negociação, não estou ressentido’, diz o autor. ‘Quando Mário Lúcio Vaz me falou que liberaria Flávia, que estava reservada para a novela do Walcyr Carrasco, vi que o problema estava resolvido.’


entre-linhas


Marcelo Médici apresenta a premiação da Turma do Bem aos maiores voluntários do Dentista do Bem em 2006. Hoje à noite, no Circo Roda Brasil, no Memorial da América Latina.


O Dentista do Bem, aliás, também está no Youtube. Vale a pena conhecer o projeto que cuida do sorriso de menores carentes, idealizado por Fábio Bibancos, no You Tube.


A TV Senado ganha sinal aberto em Salvador a partir de quarta-feira, pelo canal 53 UHF. Até aqui, a emissora só era visto por sinal aberto em Brasília.’


INTERNET
Ricardo Anderaos


O cordão da vida


‘Sara Herman é uma norte-americana que está no último mês de gravidez. Há um ano perdeu a mãe, vítima de câncer no ovário. Ela está muito preocupada com a possibilidade de sua filha desenvolver a mesma doença da avó no futuro.


Nas revistas que lê na sala de espera do consultório de seu obstetra, Sara é bombardeada por anúncios de bancos privados de cordões umbilicais. Empresas que congelam o sangue dos cordões para uso futuro, caso a criança desenvolva leucemia ou câncer. O sangue do cordão, assim como a medula, possui células-tronco que podem ser usadas na recuperação do sistema imunológico.


Os bancos privados cobram US$ 2 mil para congelar essas células. Preocupada, Sara começou a se informar sobre o assunto na internet. Quem faz uma pesquisa no Google com as palavras ‘umbilical cord bank’ encontra mais de 1,6 milhão de respostas. Logo no topo, é claro, aparecem anúncios de diversas empresas oferecendo esses serviços.


Mas os especialistas não recomendam pagar milhares de dólares por isso. Dizem que é muito melhor fazer a doação do cordão para bancos públicos. Assim, as células-tronco não ficam fora de circulação e podem ser usadas imediatamente, por qualquer pessoa que precise.


Segundo esses médicos, caso seu filho desenvolva leucemia, não será uma boa idéia dar a ele células de seu próprio cordão umbilical, pois elas já podem ter mutações pré-leucêmicas. Fora que a publicidade dessas empresas exagera o papel dessas células, afirmando, por exemplo, que elas podem ser usadas para tratar diabete.


Descobri a história de Sara num fórum do site do jornal Chicago Tribune sobre esse assunto. Lá ela escreveu: ‘Se eu puder salvar milha filha da morte que minha mãe enfrentou, prefiro guardar o sangue de seu cordão umbilical. Meu médico disse para eu não me preocupar, mas quando o câncer toca sua vida, como tocou a minha, você é capaz de tudo para não deixar que aconteça novamente. Se não guardarmos o cordão para nós, vou doá-lo na hora do parto’.


Os argumentos são fortes. Dá para entender porque essa indústria cresce tão rapidamente. Semana passada, por exemplo, uma empresa criada na Índia com capital norte-americano anunciou seus planos de aproveitar as altas taxas de natalidade do país para alavancar seu negócio. Com 43 milhões de partos por ano, a Índia tem tudo para se transformar no maior fornecedor de células-tronco de cordão umbilical do planeta.


Batizada de LifeCell, a empresa vai iniciar sua operação no mês que vem. Qualquer pessoa, em qualquer parte do mundo, poderá solicitar as células, que serão convenientemente enviadas numa caixinha do Federal Express. Nos EUA, empresas de seguro saúde chegam a pagar US$ 18 mil por essas células quando algum de seus associados necessita de tratamento.


Como há casos de infanticídio de bebês do sexo feminino e comércio ilegal de órgãos na Índia, ONGs de direitos humanos que atuam no país vêem com muita preocupação iniciativas como a da LifeCell. A empresa garante que só vai aceitar doações espontâneas, como forma de coibir o comércio de órgãos.


Mas como deve demorar para a Índia regulamentar a atividade há o temor de que outras empresas possam entrar no negócio e começar a gerar células-tronco a partir de fetos abortados. O problema pode ter desdobramentos parecidos em vários países do terceiro mundo. Nos anos que estão pela frente, infelizmente, creio que vamos ver coisas que devem transformar livros como A Ilha do Dr. Moreau, de H. G. Wells, em história da carochinha.’


Pedro Doria


Troca de músicas via Zune


‘A imprensa estrangeira está caindo em cima do novo player de música da Microsoft, o Zune. Coitado: é difícil mesmo, até para a empresa de Bill Gates, enfrentar um produto já tão sólido no imaginário das massas como o iPod. E, bem, o iPod é tão bem pensado, tão simples e no entanto poderoso, que a comparação fica ainda mais difícil para qualquer um.


Mas em meio às críticas, uma característica do Zune periga sair desacreditada perante o iminente fracasso da maquineta. É o sistema de trocas de músicas entre usuários. O tipo da coisa que faz todo sentido num MP3 player.


No Zune, funciona assim: o player tem WiFi. Então, se há outro Zune nas proximidades, o feliz usuário pode enviar uma música – ou uma fotografia – para o próximo.


O diabo é que tudo sai feito à moda da Microsoft: quer dizer, dá um gostinho das possibilidades que a tecnologia permite, mas que o portador do Zune não se acostume. É pela metade. A música tem prazo de extinção: três dias após recebida; e tem número de vezes para ser ouvida. Três, também. Três vezes em três dias.


O que sobra para quem quiser ouvir no quarto dia ou na quarta vez é um link para a loja de músicas da Microsoft. O prezado é convidado a comprar.


Cá no Brasil, não temos acesso à loja de músicas da Apple e, por conta das dificuldades da legislação de direitos autorais, provavelmente não teremos também acesso à loja da Microsoft. Ao menos, não a princípio. Evidentemente, é justamente a legislação que se mete no caminho do compartilhamento de músicas. Dar música de graça, não pode. Tem dono: as gravadoras.


Só que é feito de qualquer jeito. É feito desde os tempos das fitas cassete que fazíamos para as namoradas, que adiante continuaram fazendo tão logo vieram os CDs graváveis e que hoje se faz enviando por email, pendrive ou seja lá o que for.


Existe uma lição por trás desse precário mecanismo de compartilhamento da Microsoft. É uma coisa que todo mundo quer que aconteça, que os engenheiros sabem que acontecerá, que as gravadoras resistem e por fim permitem – embora só um pouquinho.


Música, antes de haver gravadoras, era uma coisa social. Não deixou de ser. O melhor lugar para ouvir música continua sendo a sala de concerto – barulhenta em caso de rock, silenciosa se for jazz – mas fundamentalmente comunitária. Se a música gravada inventou a audição solitária, o mercado de massa tratou de corrigir isto. Todos ouvem solitários os mesmos discos para discuti-lo no dia seguinte.


Gravadoras nunca tiveram nada contra esse fator comunitário da música. Justamente o contrário: quanto mais gente ouve e recomenda e comenta, mais se vende. Daí a esquizofrenia repentina de querer controlar todas as cópias.


Como está, o mecanismo comunitário de audição do Zune não venderá muito mais que uma meia dúzia de aparelhos. E, como está, é só por faz-de-conta que as gravadoras desesperadas tentam impedir que a tecnologia faça o que todos desejam que ela faça. Porque CDs e e-mails e pendrives continuam sendo carregados com MP3s fresquinhas saídas de discos comprados. E, dessas mídias várias, continuarão inseminando iPods, Zunes ou sejá lá quais outros forem.


Compartilhamento comunitário é justamente a essência da internet e do mundo digital ao seu redor. É o que acontece em blogs, que reúnem grupos de amigos ou de gente com interesses similares; é o que acontece em Orkuts ou MySpaces da vida; é o que trouxe sentido à música digital. É a facilidade de compartilhamento de música que dá sentido ao iPod – ou a qualquer mecanismo que possa sustentá-lo.


Tentar controlar isso, no fim das contas, é só faz-de-conta. Não por fingir controlar. Mas por fingir que acredita que conseguirá controlar.


Não conseguirá.’


Maurício Moraes e Silva


‘Processar quem baixa MP3 é um erro’


‘Sem conhecer o presidente do Conselho Nacional de Combate à Pirataria, alguém pode imaginar uma pessoa truculenta, disposta a jogar a polícia em cima dos camelôs e ávida por perseguir quem compra produtos ilegais. Mas a ideologia do ‘prendo e arrebento’ não faz parte do modo de ação do secretário-executivo do Ministério da Justiça, Luiz Paulo Barreto, que ocupa o cargo desde a criação do órgão, em 2004.


Ele defende a adoção de medidas repressivas, com uma diferença: prefere concentrá-las nas máfias internacionais que gerenciam o crime no País. ‘O consumidor não é um bandido’, acredita. ‘Então, você não pode usar a mesma técnica de combate.’ Na sua opinião, a melhor solução para lidar com o problema inclui ações educativas – que conscientizem usuários – e econômicas, como a oferta de produtos a preços baixos.


Não é de se estranhar, portanto, que Barreto ache que a indústria fonográfica tenha tomado uma decisão equivocada ao anunciar, no mês passado, que abriria processos contra 20 brasileiros acusados de fazer download ilegal de faixas em MP3. ‘Se começarmos a tentar penalizar todos os garotos de 15, 12 ou 13 anos que estão baixando música em casa, nós vamos perder essa guerra’, destaca. ‘Esse não é o caminho.’


Engana-se quem pensar que a visão de Barreto desagrade aos empresários. No mês passado, o presidente do conselho viajou até Miami, nos Estados Unidos, para receber o primeiro Prêmio de Combate à Pirataria da Motion Picture Association of America (MPAA), entidade que reúne a nata da indústria cinematográfica norte-americana. A homenagem será dada anualmente a uma autoridade da América Latina pelo trabalho feito no combate ao crime.


Em 2000, a mesma MPAA foi uma das organizações dos EUA que abriram processo contra o Brasil, argumentando que o País era conivente com a pirataria e deveria perder o direito a tarifas preferenciais de importação dadas a nações em desenvolvimento. Se julgada procedente, a ação significaria perdas de US$ 3,5 bilhões por ano. Em fevereiro, porém, o processo foi arquivado. Logo depois, veio o prêmio. ‘O Brasil ainda tem pirataria? Tem’, admite Barreto. ‘Há muito a fazer, mas é o reconhecimento de que nossa política é refinada, pioneira.’


De acordo com o secretário-executivo, o País foi o primeiro a criar um conselho com representantes tanto do governo federal como da sociedade civil. ‘Isso chamou atenção’, afirma. O órgão, ligado ao Ministério da Justiça, surgiu em 2004 com o objetivo de propor medidas que ajudassem a combater a pirataria. Criou-se, então, um plano nacional com 99 ações, divididas em três frentes: educativa, econômica e repressiva. Passados 2 anos, contudo, muitas delas ainda não foram adotadas.


Antenado em tecnologia – tem desde um iPod onde carrega sua coleção de músicas até um celular de último tipo -, Barreto acha fundamental valorizar a indústria do entretenimento, uma das mais afetadas por cópias ilegais, por conta da importância cada vez maior que terá na sociedade do futuro. ‘O computador, o celular, as redes sem fio fazem com que você fique cada vez mais conectado. Isso traz conforto, mas cria um vínculo maior com o trabalho’, explica. ‘Vai ter uma hora em que você vai querer desligar tudo para assistir a um DVD, para jogar seu videogame numa tela superbonita, com som explodindo pela casa inteira.’


Para tentar evitar que os piratas estraguem a festa, ele aposta em campanhas educativas que mostrem como é errado comprar programas ilegais ou baixar material protegido por direitos autorais. ‘As pessoas viam a pirataria com um benefício, mas hoje começam a ter vergonha de dizer que o CD é pirata’, diz. ‘Continuam comprando por causa do preço.’


Por essa razão, acha indispensável oferecer produtos mais baratos. Barreto não entende, por exemplo, por que ainda não há no Brasil uma loja virtual nos moldes da iTunes Store, da Apple, que vende milhares de faixas por US$ 0,99 cada. ‘Temos umas quatro ou cinco, mas nelas ou não há disponibilidade de artistas ou os preços são caros’, diz. ‘É melhor vender mil a R$ 1 do que 1 a R$ 1.000. Mas parece às vezes que a indústria está concentrando mercado. Isso é suicídio.’’


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Folha de S. Paulo


Segunda-feira, 20 de novembro de 2006


TODA MÍDIA
Nelson de Sá


O anti-Chávez


‘O ‘Washington Post’ saudou ontem o surgimento de um ‘oponente vigoroso’ para Hugo Chávez, afinal, na Venezuela. É o ‘pitbull’ Manuel Rosales. O ‘WP’ ecoou o ‘El País’, que dias antes entrevistou Rosales, ‘o resultado do esforço de milhares para deixar suas diferenças’ e fazer renascer a oposição após o ‘golpe fracassado de 2002’. Como os dois, também o ‘FT’ falou do ‘político enérgico’, até ‘viril’. Mas nenhum dos três arriscou vitória na eleição, bastando, por ora, ‘a preocupação evidente de Chávez com a diferença’.


INTERESSANTE


No ‘Financial Times’, em reportagens desde a sexta, ‘as preocupações voltam ao Equador’. É que ‘o magnata bilionário da banana’ Alvaro Noboa, dado como favorito no pleito do dia 26, foi alcançado -e até ultrapassado- pelo ‘radical com relações com Hugo Chávez’ Rafael Correa. ‘A disputa ficou interessante de novo’, comentou o jornal financeiro, pouco animado.


EVO INSTÁVEL


Dias atrás, o editor para América Latina do mesmo ‘FT’ avaliou que Evo Morales fez uma ‘opção pela Bolívia pragmática’ com o acordo da Petrobras. Está ‘se movendo para perto de moderados’ de Brasil e Argentina e longe de Chávez. Mas veio o sábado e ‘cresceram as preocupações com a estabilidade boliviana’. Morales conseguiu ‘controle completo da constituinte’.


MEIO ANO


Com longa reportagem, a BBC marcou os seis meses das mortes que se seguiram ao ataque do PCC, em maio. Ouviu da mãe Iracy Flauzino, à esq., à Global Justice (‘não vamos nos calar até obter respostas’)


OUTRA TV


Sob o título ‘Sua TV quer trocar uma palavra com você’, o ‘New York Times’ de ontem relatou longamente como vão as experiências de televisão interativa nos EUA. Nos testes com tecnologia mais sofisticada, da Time Warner, elas atingem 160 mil assinantes. Nas operações já em andamento, por DirecTV e outras, até 25 milhões.


No primeiro caso, um espectador da CNN, por exemplo, já escolhe não só o horário para ver um programa, mas como ele virá na tela, seleciona vídeos, dados de mercado, ‘surfando como num site’. Mas o ‘NYT’ destaca, no final, que podem estar ‘tentando forçar demais a TV a ser algo’ que ela não é. E que ‘o computador e a internet’, eles sim, ‘foram criados desde o princípio para serem interativos’.


UM DESASTRE


A estréia do canal em inglês da Al Jazeera deixou uma marca, registrada ontem pelo ‘Observer’. O programa de entrevistas de Sir David Frost conseguiu ‘um belo furo’ -com o primeiro-ministro Tony Blair declarando que o Iraque é ‘um desastre’.


CASO DE POLÍCIA


A Agência de Informação Frei Tito para América Latina (Adital) não gostou do ‘Linha Direta’ sobre o frade. ‘Tratou um episódio da história como se fosse externo ao Brasil e explorou o pior lado.’ Virou, na Globo, ‘caso de polícia’.


COMO FARAÓS


‘O que é BRIC?’, indagou o ‘New York Times’ de ontem, para responder que o ‘buzz’ quanto ao ‘ acrônimo para Brasil, Rússia, Índia e China’ vai além da economia e chega à arquitetura globalizada.


‘Há uma mudança cultural em andamento’, avalia uma empresa de ‘levantamento de tendências’ de Londres, de nome Future Laboratory.


Reporta o ‘NYT’, uma a uma, como ‘as nações BRIC estão construindo como os antigos faraós’. Do Brasil, cita entre outros Philippe Starck, recém-contratado de Rogério Fasano para o hotel Ipanema.’


MEMÓRIA / FERNANDO GASPARIAN
Luiz Carlos Bresser-Pereira


Fernando Gasparian


‘EXISTEM FIGURAS públicas que não são reconhecidas devidamente porque não arredam pé de suas posições quando estas entram em crise na sociedade. Fernando Gasparian, morto recentemente, é uma delas. Entre os anos 50 e 70, ele era visto, primeiro, como um modelo de empresário nacionalista, depois, como um político e editor sempre nacionalista, mas, quando as idéias nacionalistas já começavam a sair da ‘moda’, vítimas já nos anos 70 da ‘teoria da dependência’ e, a partir do final dos anos 80, da onda ideológica neoliberal, ele foi equivocadamente visto como alguém ‘ultrapassado’. Eu o conheci nos anos 1950, quando era um empresário nacionalista famoso, o grande defensor da industrialização e da empresa nacional, o representante por excelência da burguesia nacional. Mas já então seus amigos brincavam que ele era ‘o único representante’ dessa burguesia. Não era. Existiam então, como existem hoje, muitos outros empresários também identificados com o desenvolvimento do país; mas essa frase já indicava as incompreensões que enfrentaria.


A vocação de Gasparian era essencialmente para a vida pública. Como verdadeiro republicano, ele se sentia responsável pelos destinos do Brasil. Quando o golpe de 1964 implantou um regime militar, ele criou um tablóide que, conjuntamente com o ‘Movimento’ e o ‘Pasquim’, representou a resistência democrática durante aqueles anos sombrios. Editou também os ‘Cadernos de Opinião’, no qual os intelectuais democráticos tinham um espaço maior para desenvolver suas idéias. Gasparian estava então em seus melhores dias. Alcançada a democracia, candidatou-se a deputado federal e foi eleito constituinte. Trabalhou então com enorme entusiasmo e energia em um grande número de temas, mas afinal ficou com seu nome associado ao dispositivo que limitava constitucionalmente os juros. Seus amigos não o perdoaram por esse equívoco. Gasparian aparecia agora como um político atrasado, que não acompanhara a modernização do país, que ‘ficara nos anos 50’.


Não logrando se reeleger, fundou a Paz e Terra -a grande editora que, afinal, marcaria a última parte de sua vida- e, por meio dela, publicou um grande número de títulos de alta qualidade, inclusive todos os livros de seu grande amigo Celso Furtado. E lançou também a revista ‘Política Externa’, que hoje contribui para um debate maduro sobre a política de relações exteriores brasileira. Ao contrário do que aconteceu com seus amigos -inclusive comigo próprio-, Gasparian não se deixou encantar pelas idéias modernizadoras e liberais que vinham do Norte e que, a partir do final dos anos 1980, tornaram-se dominantes no Brasil. Jamais acreditou que o desenvolvimento do Brasil pudesse depender da poupança externa ou dos investimentos das empresas multinacionais. Como Furtado, manteve-se nacionalista quando o nacionalismo se tornara ‘fora de moda’ tanto para a direita quanto para a esquerda.


Hoje, está claro que o escanteio ideológico em que, de alguma forma, o pusemos foi um erro. Evidentemente ele também cometeu seus equívocos, mas estava certo quando afirmava que o desenvolvimento econômico dependia de um projeto nacional. Como o Brasil já havia completado sua revolução industrial, eu supus que o desenvolvimento econômico se tornara auto-sustentado. Supus, portanto, que bastaria controlar a alta inflação para que a economia voltasse a crescer. Não bastou: como Gasparian nunca deixou de afirmar, seria necessário também reconstruir a nação que os radicalismos de esquerda e de direita haviam desconstruído nos anos 60.


Hoje, depois de um período de quase 50 anos de esquecimento da nação, estamos nos dando conta de que só será possível alcançar maior eqüidade e maior integração social se o Brasil voltar a crescer. Por outro lado, depois de 26 anos de quase estagnação, estamos descobrindo que o desenvolvimento econômico só se torna realidade quando a nação se fortalece e formula solidária uma estratégia nacional de competição internacional. Fernando Gasparian sempre soube disso e, apoiado por sua mulher, Dalva, lutou sem cessar por suas idéias.


LUIZ CARLOS BRESSER-PEREIRA , 72, professor emérito da Fundação Getulio Vargas, ex-ministro da Fazenda, da Reforma do Estado, e da Ciência e Tecnologia, é autor de ‘As Revoluções Utópicas dos Anos 60’.’


TELEVISÃO
Daniel Castro


SBT exibirá shows do hotel de Silvio Santos


‘Diferentemente dos últimos anos, o apresentador Silvio Santos não passará o próximo Réveillon na Flórida (EUA). Ele e toda a sua família são aguardados para a primeira festa do Sofitel Jequitimar, hotel de luxo que começa a operar em dezembro, no Guarujá, litoral de São Paulo, após consumir R$ 150 milhões em investimentos.


Primeiro empreendimento do Grupo Silvio Santos para as classes A e B, o Jequitimar já foi um cassino. Totalmente refeito, ganhou uma arena para 6.000 pessoas, onde serão realizados shows de rock nacional, com transmissão pelo SBT.


Os shows fazem parte do projeto ‘Canto do Mar’ e, como já faz a MTV, devem virar DVDs. De 13 de janeiro a 10 de fevereiro, sempre aos sábados, passarão pelo palco da arena bandas como O Rappa, Paralamas do Sucesso, Detonautas, Jota Quest e Charlie Brown Júnior.


A festa de Réveillon será restrita a 800 pessoas, que poderão se hospedar no hotel por quatro dias pagando de R$ 4.500 a R$ 15 mil por casal.


O hotel começa a funcionar para hóspedes em 2 de dezembro, com diárias de R$ 562 a R$ 2.500. Terá uma primeira inauguração em janeiro e uma inauguração oficial em março.


O complexo inclui ainda uma vila de casas de alto padrão, que custaram de R$ 1 milhão a R$ 1,6 milhão cada e terão entre seus moradores Hebe Camargo, Ratinho, Gugu Liberato e o próprio Silvio Santos.


MÃO-DE-OBRA A Globo ‘importou’ do Acre um seringueiro para ajudar nas gravações da minissérie ‘Amazônia’ no Rio, onde recriou um seringal cenográfico. O seringueiro está ensinando o elenco a retirar leite da seringueira, defumar o látex e transformá-lo numa bola de borracha.


PLÁSTICAO SBT comprou da Fox os direitos de exibição em TV aberta do seriado ‘Nip/Tuck’, sobre o universo da cirurgia plástica. Mas ainda não há previsão de exibição do programa.


VIDA NOVAEx-apresentadora da Rede TV!, onde comandou um game para jovens, Fabiana Saba vive hoje em Nova York. Está fazendo um curso de sotaque americano. Quer virar atriz ou apresentadora de TV nos EUA.


INFLAÇÃO 1A Globo não admite a hipótese de perder a Copa de 2010 para a Record. Está disposta a cobrir todas as propostas da concorrente. Mesmo que isso torne o Mundial da África do Sul mais caro do que a emissora pode faturar com ele.


INFLAÇÃO 2Se isso ocorrer, não será a primeira vez que a Globo terá prejuízo com uma Copa. Em 1998, temendo a Record, comprou a Copa de 2002 por US$ 220 milhões. E teve um prejuízo de mais de R$ 300 milhões.


AMIGO SECRETODe olho no comércio natalino, a Cultura lança em dezembro um pacote de DVDs do arquivo do programa ‘Ensaio’. Estão previstos DVDs de Cartola, Djavan, Nelson Gonçalves, Jamelão e Fundo de Quintal.’


BLADE RUNNER REVISITADO
Nelson Ascher


Olhos nos olhos dos andróides


‘POUCAS SEMANAS após sua estréia, ‘Blade Runner – O Caçador de Andróides’ (1982) já era o filme mais comentado pelos cinéfilos nacionais daquela época e, alcançado rapidamente o estatuto de ‘cult movie’, continua, até hoje, a ser uma das produções mais discutidas da história do cinema


‘Blade Runner’ se popularizou de início (pelo menos em São Paulo) devido antes a espectadores que, após entrarem no cinema sem saber o que os aguardava e esperando uma obra convencional de ficção científica, saíam de lá boquiabertos e o recomendavam, de imediato, aos amigos. Isto, mais que a publicidade ou a crítica em jornais e revistas, é que, fazendo dele o assunto das conversas, garantiu seu sucesso.


Requer hoje em dia certo esforço de memória, recordar que, na virada dos anos 70/80, o cinema americano, desdenhosamente considerado ‘comercial’ então, relegado pelos entendidos de plantão a uma categoria inferior à do ‘cinema de arte’ ou das obras cujos diretores eram famosos e venerados (Buñuel, Fellini, Bergman, Kurosawa), passou por uma transformação revolucionária graças a diversos saltos tecnológicos, à incorporação de novos temas diferentemente abordados e, sobretudo, pela entrada no mercado de outra geração de diretores, roteiristas e atores.


A reunião desses elementos, subitamente materializada numa obra como ‘Blade Runner’, pegou de surpresa inclusive o público bem informado. Fosse apenas isto, porém, não teria se patenteado sua durabilidade ou longevidade. Ocorre que essa foi também a época em que se difundiu o uso do videocassete e ainda era possível alugar cópias importadas do filme, que não apenas sobrevivia a suas diversas repetições caseiras, mas convidava igualmente a ser acompanhado atentamente, com o controle remoto em mão.


Daí que logo se tenha percebido que a criação de Ridley Scott dialogava com um filme anterior, que não havia causado menos sensação: ‘2001 Uma Odisséia no Espaço’. À utopia clara, branca e higiênica de Stanley Kubrick, o diretor mais jovem respondia com uma distopia poluída, chuvosa e escura. O centro de ambas as tramas era, no entanto, ocupado pelo mesmo tipo de personagem: uma inteligência artificial que, destinada a auxiliar seus criadores humanos, revolta-se contra eles. Embora o gigantesco ‘cérebro eletrônico’ do primeiro retorne, no filme seguinte, sob a forma de organismos vivos, ainda assim é a mesma pergunta que se coloca, a saber: quando é que a mera inteligência, convertendo quantidade em qualidade, se humaniza e adquire vontade própria?


O tema, é claro, remonta ao ‘Frankenstein’ (nome, aliás, do criador, não da criatura) escrito no princípio do século 19 por Mary Shelley, livro que, por seu turno, não deixa de ser a versão moderna, científico-industrial, seja do mito grego de Prometeu, seja da própria história bíblica do homem que, cometendo o pecado original da desobediência, acaba expulso por Deus do Paraíso. Cada andróide do filme é um Adão e um Prometeu, melhor em quase tudo que seu inventor e os demais humanos de verdade, mas revoltados por terem sido condenados a uma vida tão curta que faz a humana se assemelhar à imortalidade.


Os efeitos especiais de ‘Blade Runner’, assim como toda sua estética visual, bastante criticada na época por parecer ‘publicitária’, não foram menos inovadores e se tornaram, por assim dizer, simbólicos dos anos 80. Acrescente-se que o futuro próximo sugerido ali tem mais a ver com nossa atualidade do que aquele preconizado por Kubrick e a obra ganha, retrospectivamente, uma aura quase profética.


E, tal qual tantos filmes rebuscados, este é, a seu modo, uma discussão acerca da arte cinematográfica, um exemplo de meta-cinema ou de cinema sobre cinema que se realiza, no entanto, de forma substancialmente mais sutil do que os produtos europeus com os quais competia. Pois, entre tantas outras coisas, a obra de Ridley Scott ‘fala’ incessantemente sobre o olhar. E, enquanto nós a assistimos, olhos e mais olhos aparecem e se multiplicam na tela, olhando-nos. Os olhos do filme estão em toda parte: os andróides são reconhecíveis por meio de um exame de retina; eles matam suas vítimas furando ou espremendo seus olhos; o principal andróide, conforme agoniza, com suas lágrimas misturando-se à chuva, relata aquilo que viu.


Seu recente lançamento em DVD é a oportunidade para vê-lo e/ou revê-lo de modo a continuar uma discussão que não vai se encerrar tão cedo.’


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