Friday, 26 de April de 2024 ISSN 1519-7670 - Ano 24 - nº 1285

Valéria Blanc

‘‘O nosso primeiro encontro não me deixara grande impressão’, revela Lily Marinho, referindo-se ao jornalista Roberto Marinho, com quem depois se casou e viveu ‘apaixonada por 14 anos’, como narra no livro Roberto&Lily, da Editora Record. As 182 páginas de texto e as 32 de fotos do álbum de família, com legendas feitas pela autora, são uma homenagem à memória do marido. O lançamento, na quarta-feira 10, no Jockey Club do Rio de Janeiro, será seguido por outro, quarta-feira 17, em São Paulo.

Foram 48 anos de espera. Os dois se encontraram pela primeira vez em 1941, no Copacabana Palace. Décadas mais tarde, com cada um tendo seguido suas vidas e casamentos, o jornalista a reencontrou. Aos 80 anos, o homem que criou as Organizações Globo se declarou e a surpreendeu. Disse que, naquele dia, no Copacabana, sentira amor à primeira vista. Descreveu, em detalhes, a roupa, as jóias e o jeito de cruzar as mãos da amada. Já viúva, com 68 anos, dona Lily não admitia ‘ser a amante’. A questão, observa ela, é que, ‘de repente, ele parecia possuído de um sentimento imperioso, apressado, apaixonado’. Mas contido até o divórcio dele. Casaram-se em 1991, dois anos depois do reencontro. No livro, dona Lily conta ter se apaixonado dia após dia e fala do ciúme mútuo. Orgulhosa do físico ‘fora do comum’ do marido, ela se diverte ao revelar que lhe pedia para ‘mostrar sua panturrilha musculosa’. Ele se aborrecia, mas cedia.

O amor e a dedicação do casal são expressos sem rodeios. ‘Nasci para ser esposa’, escreve Lily. Certa vez, travessa, emoldurou a foto de um lindo cão fitando o dono. Chamou o marido e mostrou a dedicatória: ‘Lily olhando apaixonadamente seu Roberto’. Explicou que se sentia ligada a ele de corpo e alma, feliz em estar dependente.

Roberto Marinho detestava grosserias. Dona Lily diz que ele deixou convidados de uma das sessões de cinema no Cosme Velho porque as cenas o constrangeram. ‘Felizmente, embora sendo muito pudico para certas coisas, tinha – e me sinto encabulada ao dizê-lo – uma vitalidade fantástica.’ A autora espera devolver esperança aos que acham que o amor não chegará. ‘Nós nos bastávamos. Podíamos ficar horas juntos sem nunca nos entediar’, resume. Quem lê fica com a sensação de que essa história de amor não acabou.’



PERFIL / JOEL SILVEIRA
José Castello

‘Doutor em perguntar’, copyright No Mínimo (www.nominimo.com.br), 5/11/04

‘O poeta Manuel Bandeira descreveu, certa vez, o estilo de Joel Silveira como ‘uma punhalada que só dói quando a ferida esfria’. Esse efeito retardado, no qual a ausência de dureza não exclui o vigor, sempre foi, de fato, uma das marcas do repórter Joel Silveira. Tanto assim que, passados sessenta anos de sua afirmação como grande jornalista, ainda hoje suas reportagens guardam a mesma vibração e frescor.

Em sua imagem moderna, o repórter é uma espécie de cientista, um sujeito distanciado, que se apega a documentos, depoimentos e estatísticas, empenhado em observar os fatos ‘de fora’. Para Joel Silveira, 86 anos, último personagem vivo de uma geração de grandes repórteres brasileiros surgida nos anos 40, o repórter só será objetivo se observar os fatos não de fora, mas de dentro. Era, a seu ver, o que faziam também Samuel Wainer, Edmar Morel, David Nasser, homens que sofreram, como ele, a influência do ‘new journalism’ norte-americano. Isso não significa que o jornalista deva emitir opinião, comentar, ou palpitar, faz questão de distinguir. Significa, apenas, que ele deve se ver, a si também, como parte ativa da notícia.

A lição, mais uma vez, é repetida por Joel Silveira em duas deliciosas coletâneas de reportagens, no prelo da Companhia das Letras e da Travessa dos Editores, de Curitiba. Em seu apartamento no Rio de Janeiro, Joel Silveira espera, com entusiasmo, a chegada dos dois livros. Apesar da idade avançada, que hoje o mantém preso em seu apartamento de Copacabana por causa de uma fraqueza nas pernas, Joel conserva não só a inteligência cortante, mas o excelente humor. Ainda promete muitos outros livros. Com entusiasmo juvenil, Joel acaba de entregar ao jornalista e pesquisador Genetton Moraes Neto um pacote, de cerca de 5 quilos, com vasto material. ‘São mais de seiscentas páginas, de reportagens, contos, entrevistas. Não tenho nem mesmo uma idéia exata do que é. O Genetton é quem vai me dizer’, determina.

Os dois novos livros ajudam a reavivar a memória curta do leitor brasileiro. Em 2001, numa exceção, Joel ocupou lugar de destaque no noticiário por conta de sua ‘anticandidatura’ à Academia Brasileira de Letras, quando disputou a cadeira número 23, que pertenceu a Jorge Amado, com a viúva do escritor, Zélia Gattai. Foi derrotado, mas teve onze votos e, o principal a seu ver, quebrou a unanimidade que Zélia julgava deter. ‘Ela pensava que, como viúva, era a dona da cadeira. Isso me irritou e foi só para provar que não era assim que me candidatei.’ O episódio é uma prova não só de seu vigor psicológico, mas de seu voluntarismo.

Na casa dos entrevistados

No ano passado, dando início a um trabalho de resgate, a Companhia das Letras lançou uma primeira coletânea dos artigos de Joel Silveira, ‘A milésima segunda noite da Avenida paulista’. No livro, se destaca a reportagem ‘Grã-finos em São Paulo’, escrita em 1943 para o semanário ‘Diretrizes’, seu cartão de entrada na elite dos grandes repórteres. Naquela ocasião, Joel se fantasiou de grã-fino para freqüentar festas e noitadas da elite paulista. Queria descrevê-las por dentro. Sempre o mesmo recurso: em vez de se limitar a ouvir, arriscar-se a viver.

‘Quando o repórter se coloca fora da notícia, ela esfria. Quando ele se coloca dentro, ela ganha mais calor’, Joel explica. Ainda assim, ele se apressa em ressalvar: ‘Mas se colocar dentro da notícia não significa emitir opinião. O repórter não pode ter opinião, o repórter apenas descreve.’ As reportagens reunidas nos dois livros ilustram esse sólido princípio jornalístico. Nada dos recursos grotescos de ‘colocar o entrevistado contra a parede’, como se ele estivesse num interrogatório policial, como fazem muitos repórteres do velho estilo. Ao contrário, para ser ativo, o repórter não deve, nem pode perder a sensibilidade e o equilíbrio. Uma peça exemplar dessa estratégia é a reportagem ‘Antônio Carlos, 1943: Os Andradas nunca se preocuparam com dinheiro’, que abre ‘A feijoada que derrubou o governo’.

Joel Silveira rememora a famosa feijoada organizada por João Pinheiro Neto uma semana antes do golpe militar de 64. A recepção foi na casa de Pinheiro Neto, em Copacabana e, na condição de jornalista, Joel era um dos convidados. Toda a cúpula militar de João Goulart estava presente. ‘Nós, jornalistas, sabíamos que o golpe viria a qualquer momento. Mas os comandantes militares, não’, ele relembra. ‘Para eles, aquilo era só uma fantasia da imprensa.’ A reportagem ilustra uma das mais sagradas e notáveis teses de Joel Silveira a respeito da arte da reportagem: a de que as entrevistas devem ser feitas, sempre, na casa dos entrevistados, onde eles estão desarmados e expõem seus gostos e ambientes. E nunca no escritório de trabalho, que é sempre impessoal e protocolar. ‘Se entro na casa do entrevistado, vejo seus quadros, livros, hábitos, estilo de vida. No escritório, não, todo escritório é anódino, é sempre igual.’

Essa tese vigora na reportagem em que Joel relata uma visita profissional que fez ao presidente Antônio Carlos de Andrada, em sua casa na rua Voluntários da Pátria, Rio, no ano de 1943. O repórter não conseguiu arrancar grandes revelações de seu entrevistado. Ao contrário, sua reportagem mostra como Antônio Carlos conseguia, sempre, inverter o jogo, colocando seu entrevistador no lugar de objeto. ‘É possível que esta entrevista não tenha saído completa e definitiva’, ele escreve. ‘No entanto, o presidente Antônio Carlos ficou com um vasto material para escrever uma reportagem completa e definitiva sobre a minha humilde pessoa.’

Sem arrancar grandes revelações de Antonio Carlos, Joel – colocando-se como personagem ativo da trama jornalística – conseguiu, ainda assim, expor algo muito importante: suas máscaras, seu poder de manipulação psicológica, a capacidade de dizer sem dizer e, desse modo, manter as notícias sob seu controle. Enfim, seu estilo inconfundivelmente mineiro. ‘Pensando bem, o sr. Antonio Carlos é quem acabou nos entrevistando’, Joel conclui, temperando a decepção com o humor.

Getúlio e a lavanda

Joel sempre preferiu os personagens mais difíceis, mesmo quando tinha por eles grande repulsa – como era o caso de Getúlio Vargas. ‘Continuo a achar que foi um tirano, que fez barbaridades, que foi nazista, mas reconheço que coube a ele descobrir o trabalhador brasileiro’, diz. Numa das reportagens, relata seu único encontro com Vargas. Joel finge que vai pedir um emprego, mas na verdade faz uma reportagem para a ‘Revista da Semana’. Vargas se esquiva das respostas, mas Joel compensa a frustração com seu grande poder de observação. ‘Vargas era um sedutor’, ele recorda. ‘Me chamava de Dr., a mim que tinha só primeiro ano de jornalismo. Eu o corrigia, mas ele não recuava.’ Impressionou-se, sobretudo, com o asseio e elegância pessoal de Vargas, um homem bem vestido, bem penteado, a camisa imaculada, as unhas bem tratadas e cheirando a lavanda inglesa. ‘Aquilo dizia mais do que muitas declarações’, diz.

São aprendizagens como essa, em águas turvas, ele pensa, que fazem um grande repórter. E que o preparam para as grandes aventuras. Ainda que elas se passem, a maior parte das vezes, em lugares conhecidos e previsíveis. ‘É não saindo de casa que a gente acaba sabendo das coisas’, ele diz. Mas, no seu caso, a maior aventura foi a guerra. Durante a Segunda Guerra Mundial, Joel Silveira esteve no ‘front’ da Itália, como correspondente de guerra por nove meses e onze dias. Escapou da morte, atingido por estilhaços de granada na cidade de Gajomontano, e passou por grande sofrimento. ‘Era um trabalho terrível’, ele rememora.

A experiência no ‘front’ é relatada em ‘O diabo é testemunha: não, não foi um passeio’, outra das reportagens na coletânea da Companhia das Letras. Joel já se acostumou a ouvir o pedido, maroto, de que seja franco e confesse que sua aventura na Itália foi apenas ‘um passeio’. ‘Anos atrás, a pergunta me irritava profundamente. E me feria. Agora pouco ligo para ela’, diz. Fez parte de um restrito grupo de jornalistas brasileiros no qual se destacava, ainda, o cronista Rubem Braga, correspondente de guerra do ‘Diário Carioca’. O governo Vargas tentou impedir a viagem desses correspondentes civis, mas não conseguiu. ‘Fui para a guerra com 26 anos de idade, fiquei onze meses, e voltei com 40 anos’, avalia.

Ambiente tenebroso, mas, apesar disso, propício a confissões. Foi no front que ele ouviu de Rubem Braga a declaração de que não conseguira ir além da página 92 de ‘O vermelho e o negro’, de Stendhal – revelação que, provavelmente, jamais faria numa mesa de bar. ‘Tem personagens demais. E ninguém fica parado’, Braga justificou. No entender de Joel, não só a guerra, mas as situações extremas estimulam a revelação dos sentimentos mais íntimos. Foi durante o Bogotaço, que agitou a capital colombiana ainda antes da Revolução Cubana, por exemplo, que Joel Silveira ouviu uma reveladora declaração do escritor João Guimarães Rosa que, na época, servia como primeiro secretário da embaixada brasileira em Bogotá. No meio do tumulto, Joel e seu amigo Antonio Callado resolveram procurar Rosa, em busca de uma opinião mais abalizada a respeito da revolta. Eles o encontraram na embaixada, completamente alheio a tudo. ‘Mas o que você está achando, onde isso vai parar?’, Joel insistiu. E Rosa, com seus modos de príncipe, limitou-se a dizer: ‘Sabe o que eu acho? Que esses colombianos são muito mal-educados.’

Graciliano e a cachaça

Já o livro da Travessa dos Editores, ‘Diário do último dinossauro’, é um verdadeiro ‘Dicionário Joel Silveira’, montado sobre 274 verbetes. Frases rápidas, flashes, que devassam uma alma. Sobre a velhice: ‘Podem acreditar: já fui muito mais velho do que sou.’ Sobre os sonhos: ‘Como todo palhaço velho, sempre sonhei em ver o circo pegar fogo. Acho que vou conseguir.’ Uma definição de biografia: ‘Vim sem ser chamado, irei sem ser expulso. Eis aí toda a minha biografia.’ Inimigo: ‘Já sei que é meu maior inimigo: a memória.’ Sobre a esperança: ‘O homem é mais livre sem esperança. A esperança é a mãe da ansiedade; e a madrasta do infarto.’ Sobre a seriedade: ‘Falo sério: não me levem a sério.’ Sobre o Brasil real: ‘Vamos deixar de ilusões e cair na real: a capital do Brasil não é Brasília, é Ceilândia.’

Apesar de certo pessimismo, que a idade agravou, Joel jamais perdeu o humor e suas lembranças da história recente se tornam tanto mais saborosas por isso. Gosta de recordar episódios inacreditáveis, que beiram o absurdo, como a frase que ouviu do papa Pio XII quando, com um grupo de brasileiros, participou de audiência no Vaticano. ‘Então vocês são brasileiros?’, teria dito sua santidade. ‘O português é uma língua estranha. Sabia é do verbo saber, sábia é uma mulher inteligente e sabiá é um pássaro’. Joel não esconde, ainda hoje, sua absoluta decepção com o papa. ‘Mas que idiotice!’, diz. ‘Acho que foi o sujeito mais idiota que conheci.’ Agnóstico, ele prefere agora compartilhar da definição mística cunhada pelo poeta Murilo Mendes: ‘Deus existe, mas não funciona.’

É um homem que se atém às próprias limitações e jamais se empenha em escondê-las. Tem, a respeito, uma história exemplar. Há sessenta anos, no vigor de sua juventude, passou por um teste literário que considera decisivo. Certo dia, na livraria José Olympio, encontrou-se com Graciliano Ramos. Hesitante a respeito de sua vocação literária, aproveitou para entregar ao romancista um pequeno conto que acabara de escrever. ‘Ele passava as páginas, o cigarro de palha na boca, lia, lia, e não dizia nada’, recorda. ‘Depois, sem dizer uma só palavra, dobrou o conto e o rasgou, como confete’. Nenhum dos dois perdeu a elegância. Depois de espanar os restos de papel, o velho Graça o convidou para uma cachaça. Ciente da preciosa lição que acabara de receber, e muito grato, Joel imediatamente aceitou.

Ainda assim, a inquietação literária nunca o abandonou. Joel Silveira tem um livro de contos inéditos, ‘O homem na torre’, que deve encaminhar esse mês para o editor Fábio Campana, da Travessa dos Editores. O conto que dá título ao livro, escrito ainda em 1949, é sobre Lampião, que ele considera o homem mais odioso que conheceu. ‘Hoje tentam endeusá-lo, mas para mim Lampião é o que há de pior’, diz. Certa vez, levou o conto ao cineasta Cacá Diegues, que resolveu adaptá-lo para o cinema. ‘Chegaram a escrever um roteiro, mas não deu certo’, rememora. Resumindo: segundo Joel, Cacá teria desistido das filmagens porque no conto todos os personagens são homens. O conto mais recente que escreveu é ‘A enfermeira Esmeralda’, de 1984. Está no mesmo livro. De lá para cá, mais nada. ‘Aos 80 anos, ainda não sei se sou um escritor’, admite. ‘Sou um cronista razoável, existem muitos melhores que eu. Mas como repórter, me perdoe, melhor do que eu não há.’ Joel Silveira continua a ser, antes de tudo, um grande curioso. ‘Sou um homem que faz perguntas – nunca fui mais na vida’, diz.’



JORNAL DA IMPRENÇA
Moacir Japiassu

‘Vitória da pomba!’, copyright Comunique-se (www.comuniquese.com.br), 4/11/04

Deu no Financial Times, em tradução do UOL Mídia Global:

Lula sai fortalecido das eleições municipais

Raymond Colitt

Em São Paulo

Janistraquis não gostou: ‘Considerado, como mentem esses correspondentes estrangeiros, né mesmo? Larry, aquele do NYT, inventa que o presidente bebe; este outro, Raymond, bebe e escreve uma besteira deste tamanho!’

Isso mesmo! Se houve uma criatura que não saiu fortalecida das eleições esta foi o presidente Lula. Mentira contra e mentira a favor, sem dúvida estrumam a democracia e o jornalismo, todavia é certo que não garantem boa colheita.

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Deu leão

A Folha Online, que quanto mais reza mais assombração lhe aparece, divulgou a seguinte notícia:

Leão ataca taiwanês que tentou converter animal ao cristianismo

Um homem foi atacado por um leão nesta quarta-feira no zoológico de Taipé [capital de Taiwan] ao tentar converter o animal ao cristianismo. Ele foi mordido no braço e na perna.

‘Jesus vai salvá-lo!’ gritava o homem de 46 anos a dois leões africanos que estavam deitados sob uma árvore, a alguns metros dele.

Janistraquis leu e, calmamente, orou:

‘Considerado, não deram o nome da criatura mas, pela insistência, deve ser aquele deputado carioca, Édino Fonseca, pastor da Assembléia de Deus, também empenhado na ‘conversão’ dos homossexuais.’

Uma coisa, porém, é certa: o sujeito nunca viu Spartacus, com Kirk Douglas.

(A notinha sobre Édino Fonseca, intitulada ‘Trabalho Inútil’, está na coluna de 15/10/04)

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Desarmamento

Deu no Jornal da Globo desta terça-feira, dia de Finados:

Escalada de violência

Os assaltantes estão agindo com mais violência em São Paulo, mostra uma pesquisa da Secretaria de Segurança Pública do Estado. O roubo seguido de morte aumentou 80% na capital paulista. A insegurança e a violência levaram a população a protestar nesta terça-feira de finados.

(…)Mas a estratégia da polícia não conseguiu impedir o crescimento de um outro tipo de crime na capital paulista: os seqüestros. Foram 22 casos entre julho e setembro, contra 18 em 2003.

(…)A estatística da violência seria ainda pior se nela fossem contados os casos de seqüestro relâmpago, crime comum nas ruas de São Paulo. Segundo a SSP, só em agosto a Polícia Civil começou a fazer este levantamento.

Janistraquis, que jamais confundiu banquete com boquete, balançou a cabeça:

‘Considerado, somente uma anta com mestrado em Harvard não iria prever o sucesso da bandidagem depois que o governo festejou os números do chamado desarmamento civil.’

É verdade; agora, o assaltante tem certeza de que a vítima não pode se defender. Viva o Brasil!!!

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Sentença

Janistraquis lia a Folha de S. Paulo quando, de repente, queixou-se:

‘Considerado, a velhice é mesmo uma tragédia, né não?’.

Imaginei que o afligissem alguns desses males próprios da idade, como a repentina visão dupla que nos impede de ler, ou uma desumana manifestação hemorroidária, ou ainda os prenúncios de um achaque qualquer, mas meu secretário não se referia à sua própria velhice, esclareceu, e sim à do excelente crítico literário Antônio Cândido, 86 anos, também fundador do PT.

O professor é responsável pela seguinte frase, sem dúvida a mais doce e ingênua já pronunciada numa entrevista à imprensa desde que a revista O Cruzeiro descobriu os discos voadores:

Os menos favorecidos da cidade de São Paulo vão sentir muito a falta da Marta.

Com esta lapidar sentença, a honorável figura das letras pátrias adverte que todos nós, veteranos desse pesado exercício de viver, devemos lutar sempre pelo direito à solidão e ao silêncio.

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Cabritinha

O considerado Camilo Viana, diretor de nossa sucursal em Belo Horizonte, ainda não se recuperou inteiramente da leitura de uma notícia do caderno Eleições 2004 da Folha de S. Paulo.

Sob o título Prefeita mais jovem é símbolo de continuidade, o texto dizia que Aline Veras foi eleita em Barroquinha, cidade com o pior IDH do Ceará. E apresentava o Raio X desta que também atende pelo carinhoso apelido de ‘Cabritinha’:

Nome: Aline Veras

Idade: 21 anos

Partido: PSDB

Ídolos: Deus e sua família

Hobby: cantar e assistir videoclips

Cantores: The Calling, Creed, Avril Levigne;

Prato principal: arroz, feijão, macarrão e bife. Mc Donald’s e China in Box;

Autores preferidos: Sidney Sheldon e Danielle Steel;

Guarda-roupa: sempre calça jeans

Acessórios: brincos e pulseiras de prata.

Camilo bradou, rigorosamente à mineira:

Uai! Por momentos pensei que Barroquinha fosse lá daquelas bandas do Missouri, Ohio ou Texas. Depois vi que a cidade tem 51,57% de analfabetos e entendi tudo. Salve a nação brasileira, porém faço votos pela ‘descontinuidade’.

(Durante a campanha, carros de som tocavam um forró conhecido na região: ‘Eu gosto de mamar na cabritinha…’)

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Chiquérrimo

A história é a seguinte:

O cavaleiro Rodrigo Pessoa, prata nos saltos, estava perto de herdar o ouro da Olimpíada após o cavalo do campeão, o irlandês Cian O’ Connor, ter sido flagrado por doping, mas agora a história se complicou. O segundo frasco da urina, com o qual seria feita a contraprova do exame, desapareceu.

Então o portal Terra, autor do textinho acima, perpetrou este que a considerada leitora Christina Pinto e Janistraquis consideraram o mais elegante e chique dos títulos publicados durante a última semana:

Urina de cavalo some, e Pessoa deve ficar sem ouro.

Este colunista discorda de ambos; afinal, urina assenta-se melhor do que mijo.

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Videogame

O considerado Roldão Simas Filho, diretor de nossa sucursal no Planalto, de onde se vê o presidente e seus auxiliares a contar os votos da vitória eleitoral, Roldão lia o caderno Cidades, do Correio Braziliense, quando levou um choque de muitos volts ao ler, abaixo do título A história da energia no Brasil:

Por meio de um aparelho parecido com um videogame, o visitante comanda um helicóptero sobre a floresta amazônica, a dez mil metros de altura (altitude).

Roldão, como sabemos, perdeu a paciência com o jornalismo há décadas, porém neste episódio manteve uma serenidade de matar de inveja o senador Aluísio Mercadante:

‘Ora bolas! Os helicópteros voam em geral a baixa altitude, sempre com contato visual com o solo e não acima das nuvens, como os aviões a jato.

A dez mil metros não se vê o solo e, além disso, seria preciso suplementar a respiração com máscaras de oxigênio e aquecer a aeronave face às baixíssimas temperaturas que ali ocorrem.’

É nisso que dá essa tal de ‘cultura de videogame’…

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Amigão

O considerado e sempre alerta Luiz Astorga leu em O Globo, abaixo do título Auditor quer devolver US$ 350 mil que estão na Suiça:

Advogado que representa Rômulo Gonçalves não descarta a possibilidade de fuga do país dos fiscais libertados.

Astorga puxou o arquivo de seus roteiros de viagem:

‘Onde diabos fica esse tal país? Ou será que já libertaram tanto fiscal que eles povoaram alguma ilha no Pacífico? Ora, bastava escrever assim, com o mesmo número de toques:

Advogado que representa Rômulo Gonçalves não descarta a possibilidade de fiscais libertados fugirem do país.’

Janistraquis está com você e não abre, Astorga: ‘Ah!, o infinitivo flexionado, esse amigo de toda hora!’

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Bush rides again

Meu secretário leu os diários, escutou as principais emissoras de rádio, acompanhou os telejornais e suspirou: ‘Considerado, a imprensa brasileira fez o possível para livrar o mundo desse tal de Bush, não fez? Para aumentar o poder de fogo, o Jornal Nacional até deslocou meia Redação pros EUA, tudo comandado por nossa correligionária vascaína Fátima Bernardes, porém o sonho naufragou. Que peninha, que peninha…’

Foi deveras doloroso, mas previsto pelos mais veteranos analistas da cena política; é que, desde o Correio Braziliense de Hipólito José da Costa, a imprensa brasileira ganhou apenas uma eleição, a do Fernando Collor, em 1989. E deu naquilo.

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Nota dez

O melhor e mais instigante texto da semana foi colhido na vasta cultura de Affonso Romano de Sant’Anna em sua coluna d’O Globo:

Bienal: modelo exaurido

(…)Há quase 150 anos que se estabeleceu oficialmente essa simbiose entre arte e escândalo. E de tal modo a sociedade do espetáculo cultivou isto, que o escândalo passou a substituir a arte. Qualquer escândalo. E ficando nus, tocando fogo, pichando, urinando, defecando, cortando partes do corpo e até se matando, muita gente passou a ser considerada artista(…)

A íntegra do brilhante artigo está aqui.

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Errei, sim!

‘PREJUÍZO CERTO – Esclarecimento do Jornal da Praia, suplemento do Jornal da Tarde: ‘Para chegar à Tailândia não é preciso nenhum curso de meditação transcendental’. Janistraquis, que estudava a cansativa matéria havia seis meses, vociferou: ‘Considerado, o que a gente joga de tempo e dinheiro fora por causa desses jornais!…’. (abril de 1990)’