Friday, 19 de April de 2024 ISSN 1519-7670 - Ano 24 - nº 1284

O intelectual e a liberdade de expressão

Nessas sacudidas semanas em curso no Brasil, vem a propósito evocar Alceu Amoroso Lima (1893-1983), o Tristão de Athayde. Este intelectual católico carioca, articulista dos dois jornais de maior tiragem nacional de seu tempo, o JB e a Folha, ensaísta e o grande crítico literário do Modernismo, no dizer de Antonio Candido foi “… num momento terrível, a própria consciência do país”. Antonio Candido refere-se aos artigos de Tristão, com ousadia para nos anos sinistros da década de 1970, do auge da ditadura, por exemplo, denunciar na imprensa o desaparecimento definitivo do deputado Rubens Paiva, sequestrado por milícias paramilitares amparadas por altas patentes na Aeronáutica.

No tempo de Alceu o principal anseio dos intelectuais brasileiros era a liberdade de expressão. O problema da corrupção já existia, naturalmente, embora diluído no sofisma da cultura tolerante com o “rouba mas faz”. Porém, para que falcatruas viessem à tona impunha-se o pré-requisito da liberdade de imprensa e por ela Tristão se bateu corajosamente.

Andou o tempo, foram-se três décadas e o Brasil agora dá mostras de estar decidido a extirpar o compadrio e as negociatas particulares em prejuízo dos cofres da Nação. Estou convencido de que vovô estaria animado com tais gestos de purga, embora exigindo que a faxina não cuide de um grupo político apenas.

Pensando em tudo isso, onze pesquisadores da obra de Alceu montaram a Jornada Tristão de Athayde, a acontecer no Rio de Janeiro, na Casa de Rui Barbosa, na sexta-feira 11 dezembro, entre 10h e 18h.

Os trabalhos abrem-se com o depoimento de biógrafos de Alceu, começando pelo acadêmico Candido Mendes de Almeida, autor de Da Persona à Persona. Em 1983, Alceu chamou o professor a seu leito de morte no Hospital Santa Thereza, em Petrópolis, e convidou-o a dar continuidade ao trabalho na Ação Católica. Em seguida apresentarei Memórias de meu avô, Tristão, uma coleção de memórias domésticas intercaladas com uma tentativa amadora de formular o pensamento de Alceu. Este módulo fecha-se com a palavra de Guilherme Arduini, PHD da tristania pela USP, cobrindo o pensamento social do homenageado, começando da legislação social inspirada a Getúlio Vargas pela Igreja de espada.

O segundo bloco, conduzido pelos professores doutores Leandro Garcia (UCM) e Marcelo Timotheo da Costa (UCM), versa sobre os diálogos intelectuais de Alceu. Depois de mergulharem na correspondência passiva de Alceu (36 mil cartas, incluindo remetentes como os Andrade, Mario, Oswald e Carlos Drummond ) ambos publicaram livros de excelência : Drummond & Alceu e Um itinerário no Século: mudança, disciplina e ação em Alceu Amoroso Lima. Leandro abordará os correspondentes brasileiros, Marcelo tratará de Thomas Merton, o monge trapista norte-americano.

O terceiro bloco das apresentações traz assuntos ouriçados, elas reportam vivas polêmicas. Duas professoras, Agueda Bittencourt (Educação, Unicamp) e Christiane Jalles de Paula (Ciência Politica, UFJF) discorrerão sobre os embates de AAL com Anísio Teixeira e Gustavo Corção.

Vem bem a propósito dos exercícios conceituais acima um intervalo para fruição melódica. Pois o neto de Alceu, o flautista Mauro Senise, nos dará uma canja repetindo o Bach que tocou no quarto do Santa Thereza para o avô agonizante.

Encerra-se a sessão na Rua São Clemente com o painel Alceu e Otavio de Faria. Alceu era guru do cunhado caçula. Este best-seller dos anos 1950, autor da Tragédia Burguesa em 15 volumes, hoje pouco falado, deixou um retrato fundamental da sociedade brasileira. Ele nos será apresentado por Alessandro Garcia da Silva, (Literatura, IFF)mestrando na tristania e hoje desenvolvendo doutorado em Otavio. A bagagem de Alessandro acumula sólido conhecimento dos ensaios de GK Chesterton.

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Xikito Affonso Ferreira é neto de Tristão de Athayde