Thursday, 25 de April de 2024 ISSN 1519-7670 - Ano 24 - nº 1284

Participação popular não se resume ao voto

Em ano de eleição, destaca-se a importância de votar, mas não a importância de utilizar o voto como instrumento de transformação. Mais um ano de eleição e mais uma vez me pergunto se haverá mudanças. Isso porque a cada dia que passa parece que as pessoas estão cada vez mais distantes de um debate político e de se interessarem por assuntos que realmente importam para que a fome, a falta de igualdade e o abandono de nossas crianças, dentre outras coisas, sejam colocados em pauta.

Parece que as pessoas não percebem o poder que têm em suas mãos. Concordo com Pedrinho Guareschi quando ele afirma que votar é a expressão mínima de cidadania, mas que a participação popular não se resume apenas a esse processo. O cidadão vota de quatro em quatro anos e depois não se lembra sequer quem foi o candidato escolhido. A participação vai muito além disso e ela só acontece quando as pessoas param de se preocupar apenas com os seus problemas e passam a pensar em uma população como um todo.

Com a globalização, tivemos de fato a massificação das ideias, pois os indivíduos parecem estar cada vez mais envolvidos nas teias do capitalismo e cada vez mais adeptos dos produtos simbólicos fabricados pela mídia. Essa globalização me soa um tanto estranha, já que essas mesmas pessoas estão cada vez mais individualistas e cada vez mais longe de se unirem em um pensamento de libertação e construção de uma realidade digna para todos.

Somos conformados demais

Hoje, já existem diversas formas de representação popular como, por exemplo, os conselhos municipais, em que parte de seus integrantes são cidadãos comuns, mas que utilizam determinados serviços e podem através de seu voto definir os rumos da saúde, educação ou assistência social, dentre outras coisas. Mas muitas pessoas não conhecem esses conselhos, sendo que palavras que são jogadas ao vento com o intuito de criticar o governo, poderiam ser ditas de maneira formal e dessa forma provocando mudanças significativas.

Outro exemplo é o Orçamento Participativo, no qual o cidadão pode decidir onde serão investidos os recursos públicos. Todos os anos são chamadas pessoas para que sejam debatidas as prioridades de seus respectivos municípios. Há a eleição de delegados, representantes, para que o projeto seja executado. Esse é de fato um dos maiores instrumentos de participação popular, considerado pela Organização das Nações Unidas (ONU) uma das 40 melhores práticas de gestão publica urbana no mundo.

Esses são somente alguns exemplos de instrumentos de mudança pelos quais os cidadãos poderiam se interessar em conhecer, mas eles estão condicionados a pensar que simplesmente algumas pessoas nasceram privilegiadas e com o direito de serem felizes, enquanto outras são condenadas a viver na miséria sem o direito de sequer tentar alterar essa realidade. Talvez esteja aí o problema. Somos conformados demais.

Só faltam os eleitores se darem conta disso

Aí entra o papel da mídia nesse processo. O jornalista Marcelo Canellas afirma que o jornalismo poderia agir de forma mais efetiva, não se resumindo a falar dos mesmos temas e do mesmo tipo de enfoque, ressaltando sempre escândalos e denúncias de nossos políticos, deixando de mostrar questões que realmente importam e que estimulariam as pessoas num processo de mudança. O jeito pelo qual a mídia retrata assuntos como fome, morte, desastres ambientais etc. faz com que aquilo seja encarado como banal, algo que está presente em nossa sociedade, mas senão me atinge, não é um problema meu. Talvez por isso as pessoas votem sem a consciência necessária.

Estamos pensando apenas no hoje e no agora. Não consigo acreditar que algumas pessoas vendem seus votos por cestas básicas que vão acabar em menos de um mês e depois que seu candidato é eleito voltam a passar forme, mas nas eleições seguintes simplesmente se esquecem desse fato e voltam a cometer o mesmo erro. Mas por que esse cidadão não consegue pensar em ter um emprego e através de seu próprio trabalho conquistar não só comida, e sim, todos seus direitos básicos previstos na Constituição Brasileira e que muitos deles desconhecem?

O conformismo tomou conta de nossa sociedade. Eu queria acreditar que nessas eleições teremos mudanças, mas infelizmente isso está longe de acontecer. Isso porque a maioria das pessoas não está interessada. Principalmente essa minoria que está sendo beneficiada nesse processo. E os engravatados, então? Esses querem mesmo que o povo jamais descubra a sua força e sua capacidade de transformação. Afinal de contas, para eles está tudo bem, pois não utilizam saúde pública, educação pública… enfim, nada público. Que intrigante, não? Será que eles perceberam que para ter saúde de qualidade eles precisam procurar um plano? Ou para que seus filhos tenham uma boa educação e possam ingressar em uma faculdade, precisam estudar em colégios particulares. É, agora só faltam os eleitores se darem conta disso.

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[Laís Cardoso é estudante de Jornalismo]