Thursday, 25 de April de 2024 ISSN 1519-7670 - Ano 24 - nº 1284

‘Quanto riso, oh, quanta alegria…’

De um dia para o outro, as manchetes de O Povo (Fortaleza, CE) reorganizam o cenário social. Quinta feira, 6 de março: “Carnaval mais violento dos últimos dez anos”. Um dia antes, na quarta-feira de cinzas, a manchete ufanista foi “A folia resistiu”, por conta do sucesso de público e alegria dos blocos. Entretanto, outros olhares são necessários.

Os blocos se limitaram a áreas centrais da cidade (Benfica, Aldeota, Praia de Iracema). As imagens nos jornais e redes sociais evidenciam a predominância de público do tipo “classe média”. E é provável que boa parte deste permaneceu na cidade por conta de os salários de funcionários federais e trabalhadores no mercado privado terem saído somente depois do carnaval.

Na periferia, nada de festa estruturada. Não por acaso, foi onde se concentrou o maior número de mortes. Os dados da segurança que vieram a público não especificam a cor da pele dos mortos e não seria surpreendente se a maioria for de negros, raros entre os “foliões”, tipo social que emerge uma vez ao ano plasmando uma nação de “iguais”.

Vale comparar Ceará e Bahia, com índice de criminalidade díspare. Salvador: 600 mil turistas, dois assassinatos. Fortaleza: 95 mil turistas, 45 assassinatos. A festa tem potencial de “alegria revolucionária” (Daniel Lins) somente quando promove alterações profundas no contexto de uma sociedade. Senão, evidencia o apartheid social de uma cidade.

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Túlio Muniz é sociólogo, historiador, jornalista e professor visitante da Unilab