Saturday, 20 de April de 2024 ISSN 1519-7670 - Ano 24 - nº 1284

Especialista alerta que situação já é de calamidade pública

Somente nos últimos dias foram publicadas reportagens mais esclarecedoras na grande imprensa sobre o sério problema que envolve o sistema Cantareira, responsável pelo abastecimento de água de São Paulo. No entanto, a única questão levantada até o momento tem sido a falta de chuvas no período adequado, como se esse fosse o único motivo. Há dois problemas graves aqui: a falta de questionamentos sobre a má gestão política do governo do estado de São Paulo e o fato de o governador Geraldo Alckmin não assumir a necessidade imediata de racionamento, por claros motivos eleitorais – o que só piora a situação para a população daquele estado.

Em relação ao fornecimento de energia elétrica, é correta a preocupação da grande imprensa e os vários questionamentos que já foram feitos ao governo federal, sabendo-se que a média nacional das hidrelétricas está em 40% de sua capacidade. Mas por que este mesmo vigor da grande imprensa não ocorreu em relação ao governo do estado de São Paulo, quando o sistema Cantareira estava em 40%? Agora, o Cantareira conta com apenas 8,2% de sua capacidade e já começa, perigosamente, a sugar água de níveis considerados impróprios para o consumo, o chamado volume morto.

Em artigo publicado no Le Monde Diplomatique, Delmar Mattes, geólogo, consultor e professor aposentado da Escola de Engenharia de Lins, diz o seguinte “Era evidente a impossibilidade de manter o suprimento para quase a metade da metrópole de São Paulo com a água retirada da região de Campinas, via transposição pelo sistema Cantareira, considerando o aumento da demanda populacional, industrial e agrícola de todas essas regiões. (…) Ainda que pouco eficiente a esta altura, a tentativa do governo de São Paulo de circunscrever as causas a fatores meteorológicos busca evitar o questionamento das políticas produtoras dessa crise, que vêm sendo concretizadas há décadas”, destacou.

Compromisso com o interesse público

Fica claro que o problema já estava sendo anunciado por especialistas há muito tempo. Mas ainda assim, mesmo diante deste quadro drástico, o governo Alckmin não assume a necessidade de um racionamento. Nem mesmo os riscos sérios à saúde da população sobre o uso do volume morto vêm sendo abordado com o devido merecimento. Merece destaque a matéria do portal UOL, que em abril já havia manchetado o problema envolvendo os riscos para a saúde pública em consumir o volume morto. Já no portal G1, a manchete destacou inacreditavelmente que, com o uso do volume morto – que nunca fora usado antes –, a capacidade do Cantareira teria sido elevada para 26%, como se isso fosse confortável.

Em entrevista à Revista Fórum, a bióloga Silvia Regina Gobbo, da Universidade Metodista de Piracicaba (Unimep), diz que há dez anos o sistema Cantareira não chega a 60% de sua capacidade e já se sabia que chegaríamos a esse ponto. A especialista alerta que “o que estamos vendo agora não é um racionamento, é um estado de calamidade pública. O volume morto vai me dar quantos meses de sossego? A Sabesp fala em vida do volume morto até outubro, a USP até setembro. Se pensarmos que o período de chuva começa em novembro, vamos ter um período de crise aí”.

Além disso, ela destaca que o racionamento já deveria ter se iniciado em novembro de 2013. “…Esse racionamento teria que ter começado antes, novembro ou dezembro de 2013. Já temos registros de que há racionamento nas cidades, mas o governo não admite e não tem condições de armazenar os recursos. Ficamos dependendo da torcida pela chuva. Porém, já é possível saber, com a utilização da climatologia, que esse ano será de escassez de chuva”, ressalta.

Em março deste ano, o jornal Folha de S.Paulo destacou que o uso do volume morto pode acabar de vez com o sistema Cantareira. Afinal, o que falta para os questionamentos mais diretos surgirem para o governador Geraldo Alckmin, e por que ele não assume a necessidade de racionamento e seus erros administrativos? O colapso da economia paulista significa prejuízo para todo o país. O jornalismo deve cumprir seu compromisso com o interesse público, que tem muitos questionamentos aos administradores de São Paulo.

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Bruno Barros Barreira é jornalista e professor de História