Thursday, 28 de March de 2024 ISSN 1519-7670 - Ano 24 - nº 1281

A festa de abertura

Profissionais estrangeiros, sem muito conhecimento de causa, apresentando o Brasil ao mundo. E, aparentemente, sem muita grana – irônico, numa Copa famosa por seus gastos faraônicos. O resultado foi uma festa de abertura morna, na tarde desta quinta-feira, no Itaquerão, assinada pela coreógrafa belga Daphné Cornez e pelo diretor italiano Franco Dragone. A previsão de 25 minutos já fazia antever uma festa modesta, e foi o que o público que chegava ao ensolarado estádio testemunhou: participantes muito alegres, com fantasias simples (nível Intendente Magalhães, em termos do carnaval carioca) e ideias básicas sobre o que seria o tal do Brasil.

O bloco inicial, que tinha como intenção resumir o país – uma espécie de “Peguei um Ita no Norte”, mas sem o carnavalesco Mário Borriello –, foi o mais longo, com cerca de 15 minutos. Roupas típicas da Amazônia, do Nordeste, dançarinos de frevo, tudo bonitinho, mas não muito diferente do que se verá nas festas juninas das escolas pelo país nas próximas semanas. A parte alegórica contava com instrumentos gigantes (berimbaus, reco-recos, certamente ferramentas tribais aos olhos dos europeus), estátuas e a famosa bola ultratecnológica que seria inspirada em um elemento cenográfico das turnês do U2. Pelo tamanho da bola (sem esquecer que ela estava no centro de um estádio que comporta mais de 60 mil pessoas, e não em uma quadra poliesportiva), a banda irlandesa talvez a usasse quando ainda não era um gigante do rock, lá pra 1980. Apesar do tamanho modesto, o objeto tinha lá sua graça (um pouco ofuscada pela luminosidade do estádio), com imagens eletrônicas diversas que remetiam aos temas tratados, como o ocre da Amazônia e o colorido do Nordeste. Regiões menos “exóticas” do país, como Sul e Sudeste, não tiveram muito destaque.

Brasil, futebol e a música “We are one” foram os pontos fortes

Em seguida, veio a paixão nacional, o futebol, no que talvez tenha sido o melhor da festa: meninos com camisas que representavam as 32 nações (custava usarem as oficiais?) fizeram malabarismos com bolas presas a barbantes, enquanto a esfera eletrônica mostrava padrões que remetiam ao esporte, até formar a multicolorida Brazuca, a bola oficial da Copa. Tudo isso era embalado por uma música com arranjos inofensivos e volume não muito alto. Algo como um elevador gigante.

Encerrada a homenagem ao futebol, surgiu dentro da bola a baiana (que na entrevista coletiva de quarta-feira havia se declarado carioca, embora seja fluminense de nascimento, de São Gonçalo) Claudia Leitte, cantando “Aquarela do Brasil” em uma versão de dar orgulho a Ray Conniff. Linda em um micromacacão azul, ela era acompanhada pelos ritmistas do Olodum e suas coreografias suingadas – o som dos tambores, infelizmente, não era muito audível.

Logo Claudinha foi reforçada por Jennifer Lopez e pelo rapper Pitbull (ambos americanos de origem latina, ela, porto-riquenha, ele, cubano) na fraquinha canção “We are one”, tema da Copa do Mundo. Em um honesto playback, os três deram seu recado, J-Lo com a roupa curta, justa e decotada que se espera dela, e Pitbull com uma calça branca pescando siri e uma camisa da seleção brasileira um pouco justa para seu shape atual. Simpáticos, os três acabaram de cantar e saíram pelo gramado, acenando para o público. Ficou mais claro do que nunca que o espetáculo começa quando a bola rolar.

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Bernardo Araujo, do Globo