Thursday, 18 de April de 2024 ISSN 1519-7670 - Ano 24 - nº 1284

O dia em que o ônibus da seleção atropelou a Globo

Cerca de 300 profissionais, cinco câmeras exclusivas, duas de apoio, helicóptero, 34 câmeras da HBS (emissora geradora de imagens da Fifa) e a Globo foi atropelada, praticamente ignorou um dos momentos mais esperados da cerimônia de abertura da Copa: o chute inicial do Mundial de futebol, dado por um paraplégico vestindo um exoesqueleto.

Sim, amigos da Rede Globo, no momento exato do chute, a Globo dividiu a tela de transmissão para mostrar a imagem aérea – mais uma – do ônibus da seleção brasileira entrando no estádio, com Galvão, narrador da cerimônia na emissora avisando: “E vem chegando a seleção brasileiraaaaa.” E lá se foi um projeto de uma vida inteira do neurocientista brasileiro Miguel Nicolelis. Nem uma citação, nem uma palavra sobre o exoesqueleto, nada sobre o tal chute.

A Band exibiu rapidamente, sem dividir a tela, e os canais pagos também não fizeram alarde algum.

O mea-culpa veio minutos depois, pouco antes de o jogo da seleção começar. A Globo tentou se redimir com um replay da imagem em câmera lenta, três vezes, com direito a Galvão de voz embargada narrando tardiamente o momento “histórico”.

O narrador do apocalipse diário

Antes Galvão e Patrícia Poeta, sua companheira na transmissão na Globo, tivessem se calado em outros momentos da cerimônia. Pois vieram deles constatações da festa que mudaram as nossas vidas como: “Sim, é uma samambaia”, sobre um bailarino vestido de verde.

Desanimada com a abertura, a turma do SporTV cortava a todo momento a transmissão para mostrar entrevistas de técnicos, jogadores e imagens da seleção. ESPN e Fox Sports deixaram o áudio sofrível da festa correr solto, rezando para acabar logo. Eles e a audiência que, mesmo assim, compareceu. Na Globo, a cerimônia de abertura registrou prévia de 27,4 pontos de audiência, com 52% de share (participação no total de televisores ligados no horário).

Na Band, a transmissão marcou oito pontos de ibope. Cada ponto corresponde a 65 mil domicílios na Grande São Paulo.

Mas, para Datena, o que valeu foi a festa, mesmo que simples, pois ela teve “a cara do povo brasileiro”. Segundo o âncora, a abertura estava “animada demais”, “linda” e “pegando fogo”. Pois é. Escalado para transmitir a cerimônia pelo BandSports, o narrador do apocalipse diário na cidade tentou fazer milagre com santo de casa. Não deu.

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Keila Jimenez é colunista da Folha de S.Paulo