Thursday, 18 de April de 2024 ISSN 1519-7670 - Ano 24 - nº 1283

Audiência do horror

O ciberespaço é terra de ninguém. Nesta perspectiva de um ambiente livre da realidade física, muita gente se aventura em dar asas aos seus pensamentos, ações e desejos constrangedores ao livre arbítrio. O navegante se tornou elástico, plástico, criou suas necessidades de embrenhar-se em contatos com outras sociedades e outros contornos em se comunicar.

Mas o usuário se esquece, muitas vezes, que na extensão dos periféricos (teclados), está um ser social, que tem quer arcar com as consequências dos seus atos na sociedade real e que deve se dispor a administrar o caminho de ida e volta destes alargamentos.

O real não se tornou virtual! Os retraídos – os que estão inibidos de falar em público o que pensam – recriam sua personalidade quando saltam do corpo físico e vão se jogar nas redes, nas navegações desacerbadas pelo que ele nem mesmo sabe com o que vai deparar.

O filme americano Sem Vestígios (Untraceable) mostra uma ficção virtual desnorteante, mas que não chega a ser tão absurda assim se analisarmos por um plano mais rigoroso. Como na televisão, a audiência na internet puxa para cima o que está para baixo no senso lógico dos fatos. O óbvio e o sensato nos abandonam nos 140 caracteres; nos sentimos órfãos em uma curtida trágica ou no pulo do anúncio do YouTube. Jovens se desnudam, ao passo que se multiplicam os olhos defronte às lentes de contato de milhares de insanos virtuais.

Crueldade e falta de “humanidade”

Os critérios de seleção dos meus cliques no teclado virou uma questão matemática. Muitos acessos a uma janela da rede é a carta capital para adentrarmos nas loucuras desleais da falta de discernimento. Olhamos para trás e analisamos se houve algum desvirtuamento no processo de evolução, de milhares de anos em peregrinação sobre a terra água.

Parece até, na verdade, um contrassenso. O humano virtual é mais curioso; corajoso; passa tranquilamente pelas barreiras que o separam do pífio aforismo da animalidade. Curtir o grotesco reality show sexual; a morte como pico de visualizações foge de uma realidade já alcançada. “Sexo verbal” faz o estilo de muitas redes sociais.

A aldeia global de Marshall McLuhan, pelo que parece, desconectou-se da fidedigna sociabilidade e passou a dar acesso demasiado aos desejos curiosos e sanguinários de um espaço, esse sim, muito vivo e legítimo. A crueldade fica mais aparente na internet, ao passo que é mais espontaneamente vista, compartilhada com a falta de “humanidade” global.

O cômico é trágico. O ridículo se “confunde” com a falta de respeito. A morte revive os tempos de aplausos, quando era contemplada entre gritos e vivas nas arenas e ao contemplar as chamas nas fogueiras medievais.

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Francisco Júlio Xavier é estudante de Jornalismo