Saturday, 20 de April de 2024 ISSN 1519-7670 - Ano 24 - nº 1284

A imprensa se sentiu derrotada

A bola da vez é a eleição no Irã. Contra todas as expectativas do governo americano, inglês e israelense, Mahmoud Ahmadinejad ganhou a eleição. Os partidários de Mir Hossein Mousavi contestaram o resultado, realizaram manifestações violentas e foram reprimidos pelas autoridades.

Mousavi, candidato preferido pelo Ocidente, é proprietário de jornal e usou-o para alardear supostas irregularidades nas eleições. O jornal foi fechado e isto causou estranhamento na mídia internacional. O fato de um candidato usar seu jornal em benefício próprio não deveria ser considerado ainda mais estranho?

A imprensa internacional parece ter se alinhado a Mousavi e hostiliza abertamente Ahmadinejad e a maioria dos iranianos que votou nele.

Não tenho razões para gostar do presidente reeleito do Irã. Sou, entretanto, um ardoroso defensor da autodeterminação dos povos. O povo iraniano fez sua escolha e a mesma deve ser respeitada. Em razão do resultado das eleições, Mahmoud Ahmadinejad é o legítimo interlocutor do Irã. E ninguém tem o direito de ignorar este fato ou pode desestabilizar aquele país só porque seu candidato preferido foi derrotado.

Ciclo de desconfiança e isolamento

Ao agredir Ahmadinejad e seus eleitores, a mídia despreza o princípio da autodeterminação dos povos e planta as sementes de uma nova desgraça. Na verdade isto já começou. Em razão do comportamento da mídia, que o considera leviano, segundo seus critérios – gostemos ou não, os iranianos têm todo direito de ter seus próprios costumes e crenças –, o Irã começou a restringir o trabalho dos jornalistas internacionais e a voltar ao isolamento.

Os escrúpulos do Irã em relação ao Ocidente são conhecidos e compreensíveis. Afinal, todos sabemos que a Inglaterra e os EUA fizeram de tudo para derrubar Mossadegh. Os jornalistas deveriam saber que não são poucos os iranianos que ainda têm presente na memória a brutalidade do regime pró-Ocidente do xá Reza Pahlevi, que foi derrubado por um movimento do qual Mahmoud Ahmadinejad participou.

O isolamento do Irã não interessa a ninguém. Não interessa especialmente ao Ocidente, pois muitos ocidentais desejam comprar petróleo iraniano e muitos mais precisam vender produtos industrializados àquele país. Mas para que este ciclo de desconfiança e isolamento seja detido ou rompido, a imprensa ocidental precisa conter sua agressividade em relação a Ahmadinejad. Nós temos que admitir que os motivos para os iranianos terem escrúpulos em relação ao Ocidente foram dados pelo próprio Ocidente. É tão difícil assim respeitar a vontade do povo iraniano e negociar com o líder que foi escolhido?

Mais risos do que indignação

Ahmadinejad é desagradável, fala coisas que não gostamos, mas até o presente momento tem mantido uma atitude bastante pacífica. Apesar das bobagens que falou sobre Israel, o presidente reeleito do Irã não iniciou nenhum conflito armado na região. É verdade que Ahmadinejad tem cuidado das defesas de seu país, mas é exatamente isto que se poderia esperar de qualquer líder em razão da ilegítima, ilegal e injustificada escalada de violência americana e inglesa no Iraque.

No mais, é caricata a reação da mídia dos EUA às supostas irregularidades nas eleições iranianas. Os jornalistas norte-americanos se esqueceram que Al Gore venceu as eleições e George W. Bush foi empossado apenas porque o derrotou no tapetão? Quem legitimou irregularidades em seu próprio país não pode ficar apontando o dedo no nariz de ninguém. Enquanto a imprensa dos EUA não fizer um mea culpa, produzirá mais risos do que indignação.

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Advogado, Osasco, SP