Tuesday, 16 de April de 2024 ISSN 1519-7670 - Ano 24 - nº 1283

A Primeira Guerra Mundial da Globo

As Organizações Globo estão enfrentando sua Primeira Guerra Mundial desde que tiraram da Tupi o cetro de emissora de maior audiência do país – nos longínquos anos 70. Nos próximos dias será decidida a questão da transmissão do campeonato de futebol brasileiro. Não se trata de um mero evento esportivo. Se perder a disputa, a Globo colocará em xeque toda sua programação do horário nobre – baseada no hábito diário de acompanhamento de novelas e de jornais televisivos. Pela primeira vez, poderá perder a liderança de audiência no país.

A ameaça é da TV Record, que promete uma proposta de R$ 550 milhões para conseguir os direitos de transmissão junto ao Clube dos 13. Por trás da disputa, há mudanças relevantes na legislação de direito econômico brasileiro. Cada clube esportivo detém direitos de imagem sobre seus jogos. Para administrar seus interesses, anos atrás a Globo incentivou a formação do Clube dos 13, incumbido de negociar em bloco os direitos dos seus associados – maiores clubes nacionais. Nos Estados Unidos, por exemplo, grandes clubes recebem direitos de arena superiores aos pequenos clubes.

Sob o argumento de que as condições brasileiras eram diferentes, a Globo conseguiu equalizar os direitos de transmissão – todos recebendo a mesma quantia, tática fundamental para transmissões pela televisão aberta, na qual não é possível o pay-per-view (pagar para assistir). Se um clube com maior audiência reclamasse, era encaminhado ao Clube dos 13, que tratava de demovê-lo de suas pretensões. Mais ainda. Através de um contrato leonino, a Globo tinha uma cláusula de preferência, direito ao último lance em cada leilão de transmissão de campeonato. Ou seja, depois do último lance, ela tinha o direito de cobrir a proposta apresentada.

Um capítulo central

Esse modelo foi questionado no Cade (Conselho Administrativo de Direito Econômico). A Globo e o Clube dos 13 foram obrigados a assinar um termo de compromisso estabelecendo condições transparentes de disputa. Isto é, cada concorrente chegando com um envelope com sua proposta. Primeiro, a Globo chamou os clubes e tentou convencê-los a baixar o preço, sob a alegação de que a audiência do futebol vem caindo há tempos e o mercado não aceitaria pagar grandes lances pelos direitos de transmissão. Não conseguiu disfarçar sua preocupação maior: no mundo todo, a emissora que tem o esporte mais popular lidera a audiência. Se perder o futebol, perde a liderança.

O problema maior surgiu na sequência. Em outros tempos, não haveria competidores. Apenas uma vez o SBT ousou competir, levando o Campeonato Paulista. Band e Rede TV nunca tiveram bala na agulha. Agora, apareceu a TV Record dispondo-se a elevar o lance a R$ 550 milhões para a TV aberta. No setor de TV fechada, começa a competição com as teles e, na área da Internet, com os portais.

A reação da Globo foi tentar implodir o Clube dos 13. Através de Ronaldo e de comentaristas esportivos, conseguiu cooptar o presidente do Corinthians. Seja qual for o resultado da pendenga, trata-se de um capítulo central nas transformações pelas quais passa a mídia brasileira.

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Jornalista