Friday, 29 de March de 2024 ISSN 1519-7670 - Ano 24 - nº 1281

Ações de terrorismo jornalístico

A denúncia publicada na edição desta semana da revista Veja (‘Terrorismo biológico’, edição nº 1961, de 21/6/ 2006), dando conta de que petistas liderados por Geraldo Simões [presidente da Companhia das Docas do Estado da Bahia (Codeba)] teriam introduzido a vassoura-de-bruxa de forma intencional na lavoura cacaueira do Sul da Bahia, teve o efeito de uma hacatombe. Natural que seja assim. A chegada da vassoura-de-bruxa dizimou o que restava de uma lavoura já em decadência, empobreceu produtores e deixou um saldo de 200 mil desempregados.

A publicação da reportagem vem provocando reações diversas, da ira ao descrédito. Produtores se mobilizam para não pagar dívidas e exigem reparações por eventuais danos. Políticos adversários aproveitam para desgastar Geraldo Simões. O PT e a direção da Comissão Executiva do Plano da Lavoura Cacaueira (Ceplac), diretamente atingidos pela denuncia, alegam que tudo não passa de fantasia, politicagem.

A verdade é que, seguindo uma prática que vem sendo regra desde que abriu mão do jornalismo para se transformar num veículo francamente anti-PT, a revista não se preocupou em obter provas, documentos que sustentassem aquilo que ela qualificou como ‘terrorismo biológico’. Ao se basear no depoimento de uma só pessoa, igualmente desprovida de provas e provavelmente marcada pelo ressentimento, Veja praticou uma espécie de ‘terrorismo jornalístico’.

O repórter da revista, que esteve diversas vezes na região, não levou em conta o quanto o tema vassoura-de-bruxa é delicado. Não se importou em acusar sem provas, mesmo tendo a dimensão do tamanho da dor de cabeça que imporia aos acusados, gente que, até prova em contrário, tem um histórico de serviços prestados à região.

Contra todas as evidências de que a denuncia não se sustentava, que os lapsos de memória do denunciante são freqüentes, o repórter da Veja comportou-se como um Nero que põe fogo na cidade, no caso, numa região inteira, e depois fica a admirar a obra, ciente de que os fins (atingir o PT) justificam os meios (dar tons de verdade a uma conspiração delirante).

Labaredas intensas

Apenas um exemplo de como é fácil distorcer a verdade. Como base para a denuncia, a revista cita uma reunião no restaurante Caçuá, em Itabuna, no distante ano de 1987, onde foi decidida a operação para disseminar a VB. A reunião, segundo o denunciante, teria contado com as presenças de Geraldo Simões, Wellington Duarte, Everaldo Anunciação, Elieser Correia, Jonas Nascimento e Josias Gomes. O detalhe é que Josias só chegou ao Sul da Bahia dois anos depois de tal reunião.

Providencialmente, Veja driblou a verdade (ou a mentira) omitindo o nome de Josias Gomes. Caso contrário, ficaria evidente que a reportagem é mais um exercício de suposições e afirmações em provas, típicos da Veja. Numa completa inversão de valores, os acusados lançados na fogueira inquisitória da revista é que tratem de provar sua inocência.

Tarefa inglória, ao menos nesse momento de labaredas intensas, em que sobram incendiários e escasseiam os bombeiros. Restabelecer a verdade é uma tarefa árdua, mas necessária. Nem que para isso tenham que ser acionados a Polícia Federal, o Ministério Público e a Justiça. Uma caça às bruxas como a que se tenta impingir aos petistas pode ter conseqüências imprevisíveis. Ou previsíveis, a depender do ponto de vista.

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Jornalista, Itabuna, BA