Thursday, 28 de March de 2024 ISSN 1519-7670 - Ano 24 - nº 1281

Armas, classes e informação

O faro jornalístico deve estar sempre apurado para a infindável sucessão de fatos que ocorrem diariamente, a todo instante, em todo lugar. O faro empresarial deve estar sempre atento às possibilidades lucrativas. Efetivamente, ambos são indissociáveis, pois o jornalismo nasce como uma empresa, cujo bem comercializado é, antes de tudo, a informação. Ora, se o profissional desta área possui, além de sua subjetividade, vínculos empregatícios que o mantêm atrelado à empresa à qual vende sua força de trabalho, então como seria possível alcançar os ideais da objetividade, da imparcialidade e da verdade, tão exaltados pelos meios de comunicação? É evidente que tal falácia é tão-somente um instrumento ideológico da classe dominante.

A lógica utilizada nas grandes coberturas da imprensa deixa transparecer o caráter mercadológico de uma atividade que é vista, muitas vezes, de forma romanceada e, até mesmo, infantil. Para tal afirmação, são inúmeros os exemplos dados pela imprensa.

Seguindo-se passo a passo, o processo de construção da notícia funciona da seguinte forma: 1) escolha do objeto (governo, empresa, movimento popular, classe social etc.); 2) delimitação do tema (que coloque em xeque o objeto escolhido); 3) utilização de fontes comprometidas com os interesses do veículo (vale ocultá-la); 4) início da publicação de matérias em série, como nos antigos folhetins, que só cessará quando o alvo for atingido ou, por motivo de força maior, quando outro alvo precisar ser atingido.

Controle de corações e mentes

Citemos um exemplo prático. Objeto: Movimento dos Trabalhadores Rurais Sem Terra (MST). Tema: suposta irregularidade do MST (na verdade, o pedido feito pelo movimento de revisão do índice que mede a produtividade das propriedades rurais do país não agradou a certos latifundiários; vale lembrar que, conforme informara o Censo Agrário do IBGE, a concentração fundiária no Brasil aumentou nos últimos dez anos. A área ocupada pelos estabelecimentos rurais maiores do que mil hectares concentra mais de 43% do espaço total, enquanto as propriedades com menos de 10 hectares ocupam menos de 2,7%). Fonte: agroempresários, juristas, economistas e simpatizantes da concentração de terra. Pronto, agora é só iniciar a novela.

É importante ressaltar que o exemplo dado acima, embora ganhe ares de novidade, tem lugar cativo, anualmente, nas páginas dos jornalões e das revistas semanais. Tal tentativa de criminalização dos movimentos sociais é legítima, na medida em que na luta de classes não há regras, nem mediadores que invalidem tais ações; é olho por olho, dente por dente. No entanto, se considerarmos o instrumento democrático – que é utilizado para velar as atrocidades do Estado burguês – como arma comum a todos os participantes do conflito, a utilização da via democrática por parte dos oprimidos também terá o devido respaldo legal.

Acrescem às matérias-dossiês do MST as contínuas crises políticas, os surtos de violência (ainda que a sociedade brasileira, conforme analisara Marilena Chauí, seja essencialmente violenta), as meninas anorexias (ainda que o Fantástico, revista-eletrônica-semanal, contribua para tal distúrbio), os romances trágicos e os acidentes aéreos, todos exploradas ao máximo, até que a notícia fabricada alcance as dimensões esperadas, a saber, o controle de corações e mentes.

De fato, se essa for a única maneira encontrada pela mídia para vender seu peixe e de quebra, quem sabe, veicular informações de interesse público, o parecer do ministro do Supremo Tribunal Federal, Gilmar Mendes – que, aliás, desconhece a divisão dos três poderes e possui umas terrinhas por aí –, a respeito do diploma de jornalismo, está, lamentavelmente, correto.

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Estudante de Jornalismo das Faculdades Integradas Helio Alonso e repórter do suplemento cultural ‘O Prelo’, da Imprensa Oficial do estado do Rio de Janeiro, Niterói, RJ