Friday, 19 de April de 2024 ISSN 1519-7670 - Ano 24 - nº 1284

Candidatos nem conseguem ‘parecer’

Perguntas simples, mas que refletiram as reais preocupações da sociedade com questões cruciais, como educação, saúde e segurança pública foram capazes de demonstrar a fragilidade dos discursos e, por conseguinte, das candidaturas de políticos que se dizem preparados para governar o estado da Bahia. No debate que foi ao ar ontem à noite (19/9) pela TV Aratu/SBT, dois jornalistas, entre eles a professora doutora Malu Fontes, bem como uma professora universitária que representava o eleitorado baiano, foram suficientes para deixar claro como Paulo Souto, Geddel Vieira Lima e Jaques Wagner não têm bases para sustentar seus discursos de realizadores para pessoas com um mínimo de discernimento crítico.

Integrante de um grupo que governou a Bahia por 16 anos, dos quais oito tiveram a sua participação mais que direta (pois atuou como governador do estado), o candidato dos Democratas, Paulo Souto, não foi capaz de responder, de maneira convincente, à professora Fontes sobre sua capacidade para reverter problemas crônicos ligados a setores como saúde e educação. Com discurso evasivo, próprio de quem não tem argumentos para fundamentar o óbvio, Souto não fez mais do que deixar claro não merecer retornar ao cargo de governador, pois passou oito anos chefiando o governo sem aportar grandes mudanças em setores tão precários.

O atual governador e candidato à reeleição Jaques Wagner, do PT, também não foi muito diferente. Um jovem jornalista e uma professora universitária (cujos nomes me faltam à memória, o que é imperdoável) colocaram o chefe do Executivo contra a parede. Ao perguntar se em vez de propagar medidas ostensivas das forças policiais para combate ao crack não seria mais proveitoso lançar mão de soluções mais estruturantes (como a construção de casas de recuperação para viciado(a)s, bem como ações sociais para impedir a entrada de pessoas no mundo das drogas), o referido jornalista teve como resposta um discurso que pôs em evidência a preferência do petista pela repressão policial e, portanto, sua falta de visão mais ampla em relação a uma questão tão evidente: quanto melhores forem as condições de vida de um indivíduo, menores serão as chances de ele adentrar o mundo das drogas. Quanto à professora, ao indagar ao governador sobre a política de achatamento salarial dos docentes das universidades estaduais, recebeu como resposta que o governo ajudou a trazer duas universidades federais para a Bahia, ficando subentendido que não faz parte das intenções do governo Wagner investir no ensino superior estadual.

Estratégias para construir o consenso

Para coroar a demonstração de que, para estes candidatos, pouco importam os problemas sociais vividos pela cidadania, o ex-ministro da Integração Nacional e candidato a governador Geddel Vieira Lima deixou claro, após pergunta de outro jornalista, que em termos de política o que vale é a construção de acordos e a distribuição de cargos. Fez isso ao revelar que rompeu com o governo de Jaques Wagner porque o governador não teria honrado os compromissos assumidos com ele (Geddel) e com seu partido político, o PMDB.

Para muitos, talvez esses debates com candidatos a cargos eletivos não sirvam como instrumentos de avaliação. No entanto, é evidente que sim. Estes eventos, embora às vezes pareçam pouco relevantes, carregam consigo um potencial deveras revelador. É importante, porém, que o(a)s receptore(a)s estejam imbuído(a)s da atenção necessária a fim de detectarem pequenos-grandes detalhes capazes de revelar quão enganadores podem ser certos discursos.

Na contemporaneidade, é condição sine qua non, entre outros aspectos, que os atores representantes da instância política joguem com as estratégias discursivas com a finalidade maior de construir o consenso. Para isso, conforme nos adverte Patrick Charaudeau, em grande medida buscam parecer. Considerando o debate em questão, nem isso os referidos candidatos conseguiram fazer. É impressionante!

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Doutora em História e Comunicação no Mundo Contemporâneo pela Universidad Complutense de Madrid, professora dos cursos de Comunicação Social da Faculdade 2 de Julho, Salvador, BA e diretora de Agenciencia – Comunicación Científica