Friday, 26 de April de 2024 ISSN 1519-7670 - Ano 24 - nº 1285

Cobertura mistura alhos e bugalhos

Nossa mídia não sabe cobrir a mídia. Perdeu a prática. Edições de terça-feira (9/12) de jornais e programas jornalísticos de rádio e TV apresentaram o pedido de concordata feito pelo grupo do Chicago Tribune como se estivesse relacionado com o pedido de hipoteca do New York Times, em Manhatan. Nada mais errado.


Os dois fatos ocorreram quase no mesmo dia, mas não fazem parte do mesmo processo nem constituem uma tendência. O grupo do que edita o Chicago Tribune está enrolado há alguns anos, tanto que foi vendido exatamente há um ano, em dezembro de 2007, ao magnata de imóveis Sam Zell.


Como o negócio de mídia não tem qualquer semelhança com o de imóveis, é evidente que Sam Zell não poderia acertar. Seus antecessores tentaram resolver os problemas do grupo como se fosse um negócio de matinais ou supermercados. A dívida de 13 bilhões de dólares vem sendo rolada há anos – começou antes mesmo do último boom da internet.


Mais úteis


O caso da hipoteca do prédio do New York Times é completamente diferente. O valor é irrisório, apenas 225 milhões, quando comparado com os 13 bilhões do buraco da empresa editora do Chicago Tribune e do Los Angeles Times. Além disso, o prédio a ser hipotecado é recente, ficou pronto no ano passado, e a parte pertencente ao jornal teve a construção bancada com recursos próprios.


O conglomerado do Tribune tem 23 emissores de TV, o New York Times saiu deste ramo há algum tempo. A empresa não está ameaçada: seu principal produto, o jornal diário, é o mais prestigiado do mundo, ao contrário do Chicago Tribune e do Los Angeles Times, que nos últimos anos, justamente por causa das sucessivas trocas acionárias, sofreram razoáveis desgastes.


A crise não é sistêmica como sugeria o noticiário de terça-feira no Brasil. A mídia americana sofrerá fatalmente os efeitos da crise financeira mundial, mas também a internet. A diferença é que os jornais são mais úteis como ferramenta para enfrentar a crise do que os blogs. Menos no Brasil, onde a mídia tradicional, por falta de prática, já não consegue enxergar os seus próprios problemas.