Friday, 29 de March de 2024 ISSN 1519-7670 - Ano 24 - nº 1281

Com a palavra as feministas católicas

O que os católicos pensam sobre aborto? A resposta foi publicada no domingo (27/5) no ‘Caderno Feminino’ do jornal O Estado de S.Paulo:

** 95% dos católicos concordam com a distribuição de métodos anticoncepcionais;

** 97% são a favor do uso de preservativo no combate à Aids e doenças sexualmente transmissíveis;

** 82% dos católicos são favoráveis à interrupção da gravidez em caso de risco de morte da mulher;

** 80% aprovam a interrupção da gravidez em caso de má formação fetal grave;

** 67% admitem o aborto quando a gravidez for decorrente de estupro.

Estes dados são resultado de uma pesquisa feita em 2005 pelo Ibope para a organização não-governamental Católicas pelo Direito de Decidir (CDD). E foi com base neles que as participantes da ONG criaram cartazes para mostrar na frente da Catedral da Sé, em São Paulo, durante a visita do papa Bento 16 ao Brasil. Sabiam que as chances de chamar a atenção do papa eram quase nulas. Mas esperavam que a mídia, sensibilizada, desse alguma atenção a elas.

As manifestações mereceram, quando muito, uma ou duas linhas na imprensa – que preferiu falar do ministro da Saúde e sua posição favorável a um plebiscito, e do Papa, que reforçou a posição da igreja católica contra toda forma de aborto. A imprensa, enfim, optou por dar a visão masculina do assunto, como se as mulheres não tivessem o direito de se manifestar sobre um problema que diz respeito diretamente a elas.

Sem questionamentos

O pensamento das mulheres – pelo menos o das integrantes do CDD – na edição de domingo do Estadão por Regina Soares Jurewicz, a coordenadora da ONG:

‘Acreditamos que a mulher tem capacidade moral para tomar decisões sérias e responsáveis sobre sua vida, em particular no que se refere à reprodução. Com a legalização do aborto, diminui a mortalidade materna, quesito no qual a maioria das vítimas são mulheres pobres, que não têm acesso a serviços dignos e recorrem a clínicas clandestinas. Ninguém interrompe uma gravidez por prazer, mas sim por necessidade, como uma saída para problemas financeiros, falta de condições psicológicas, etc. Mas claro que isso deve vir com um programa de prevenção, que inclui acesso a métodos contraceptivos’.

Mas os repórteres de rádio e TV, preocupados em preencher o tempo com comentários sobre a emoção do público, a simpatia do papa e suas aparições de surpresa na sacada do mosteiro de São Bento, nem repararam na manifestação ocorrida na Catedral da Sé, perto dali. Não viram ou receberam orientação para não ver qualquer acontecimento que pudesse tirar o brilho da visita papal e do tipo de cobertura programada.

Tem razão a Regina Soares Jurewicz quando diz que…

‘…a mídia investe muito no lado mágico da imagem do Papa, criando uma comoção social. Não se fala – ou se fala muito pouco – da questão política dessa visita, que é a abertura do Conselho Episcopal Latino-Americano (Celam), no qual serão elaborados documentos norteadores das práticas da Igreja nos próximos anos na América Latina’.

E, se depender da imprensa, dificilmente as mulheres ficarão sabendo se há alguma perspectiva de mudança quanto ao seu papel na igreja católica – muito embora, como diz a coordenadora da ONG Católicas pelo Direito de Decidir, as mulheres sejam as principais ‘consumidoras dos bens espirituais, pois são a maioria nas igrejas’.

A igreja não aceita questionamentos. Mas a mídia bem que poderia abrir espaço para as mulheres, senão todo dia, ao menos quando há um mega-espetáculo em curso como foi a recente visita de Bento 16 ao Brasil.

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Jornalista