Friday, 29 de March de 2024 ISSN 1519-7670 - Ano 24 - nº 1281

Como sempre, o retrato do atraso

Nos últimos anos, pude constatar o grande avanço da TV brasileira, principalmente tecnológico, o que a tornou uma exportadora de programas, com grande audiência até no exterior, no caso das novelas. Da mesma maneira, tanto no rádio como nos jornais os avanços tecnológicos aconteceram, permitindo melhor recepção de som e melhor impressão dos jornais.

Entretanto, sempre há um entretanto, a mídia esportiva brasileira, seja na TV, no rádio ou em jornal, é o melhor exemplo de atraso, profissionalismo de baixa qualidade e falta de isenção no apresentar dos fatos. Lamentavelmente, são pequenas e honradas as exceções. No caso dos jornais há um problema maior ainda, pois as camisas-de-força em determinadas redações levam sempre parcialidade à informação. O inadmissível clubismo, na hora de descrever os fatos, chega a cansar o pobre leitor.

Claro está que os anunciantes pesam na hora das opiniões, assim como os clubes de maior torcida pesam quando os profissionais emitem um conceito. Afinal, é melhor garantir as vendas do que fazer uma análise imparcial dos fatos ocorridos.

Vejamos o Lance!, que é dominado pela turma da ‘privatização’ do futebol pelas empresas. Seus colunistas, capitaneados pelo Juca Kfouri, só conseguem enxergar benefícios na Lei Pelé, não tendo um mínimo de isenção para dizer que erraram em apoiá-la sem restrições, possibilitando uma enorme desorganização na malha clubística, o que resultou em perda dos valores individuais para a Europa e campeonatos de técnica medíocre em nossos campos.

No caso da maioria das rádios (veículos poderosíssimos na formação de conceitos por parte das torcidas dos clubes), encontramos sempre benevolência com os ‘amigos’ e a parcialidade com os ‘inimigos’. Na hora dos gols, determinados clubes são agraciados com quase um minuto de urros e elogios – outros, a gente mal consegue saber que saiu um gol!

Porém, estes fatos são fichinha perto das TVs, em que as opiniões são dirigidas com freqüência, narra-se mal e os grandes centros de audiência recebem tratamento melhor do que os outros. Reclamo especialmente da TV a cabo: pagamos por um serviço que deveria ser bom e, na hora dos jogos, é uma lástima de erros. Vou concentrar minha atenção no futebol, pois, se a gente for falar de outros esportes, os erros de transmissão e as bobagens ditas são tamanhas que seria maldade especificar.

Não raro, as imagens do jogo são completamente ignoradas por narradores e comentaristas, que partem para tentar convencer o telespectador de suas convicções.

Comentaristas de arbitragem parecem mais uma piada, pois afirmam que houve erro ou acerto por parte do juiz e logo após, no replay, a TV mostra tudo ao contrário. E pensam que os caras se desculpam? Negativo, inventam coisas mirabolantes e, por fim, dizem que o ‘pobre’ juiz não teria tempo de ver , pois eles mesmos não viram com o replay! Ora, para um serviço destes era melhor não dizer nada e deixar o telespectador formar suas próprias convicções.

Diferença clara

No caso dos narradores, com honrosas exceções, encontramos um deserto de competência. Os lances narrados não correspondem ao que claramente se viu na tela, os nomes dos jogadores são trocados numa freqüência apavorante. Pior do que isto, troca-se o nome do atleta que teria interferido na jogada, mete-se o pau nele e depois nem pedido de desculpa há pelo erro da narração.

Temos também os narradores de jogo com neurose de comentarista: o jogo está lá transcorrendo e o ‘brilhante’ narrador, esquecido disto, deita falação com suas opiniões, que vão da organização das federações a dirigentes e jogadores. Eles se acham verdadeiros formadores de opinião, mas, na verdade, são uns chatos de galocha.

Não dá mais para que tenhamos uma imprensa esportiva baseada em jeitos do século passado, querendo balizar a opinião de leitores, ouvintes e telespectadores da nova era.

O mínimo que se pede é imparcialidade na descrição dos fatos e narração na hora de narrar, deixando bem clara a diferença entre o que é opinião (comentário, ou seja lá o que for) e a realidade dos fatos. Os consumidores merecem que a qualidade até agora apresentada seja melhorada. Merecem que sejam encarados com respeito, como usuários de um serviço de grande relevância, e não como massa de manobra.

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Médico, Rio de Janeiro