Friday, 19 de April de 2024 ISSN 1519-7670 - Ano 24 - nº 1284

Crítica se perde na ofensa gratuita

A revista Veja (edição nº 1959, de 7/6/2006) publicou matéria sobre o ex-secretário da Educação de São Paulo, Gabriel Chalita. Os jornalistas Sérgio Martins e Heloisa Joly assinam a página, em que domina em primeiro plano uma foto de Chalita de paletó e gravata, fazendo cara de nojo.

A idéia é ridicularizá-lo. Falar (mal) de seu CD Gabriel Chalita canta o amor. Apresentá-lo como pessoa superficial, vaidosa e sem conteúdo. O título da matéria ‘Gritem, macaquinhos’ tem duplo sentido. Pode ser menção ao verso de uma das canções do CD (a música ‘Linda Natureza’) ou ao fato de ‘60.000 simpatizantes do movimento carismático da Igreja Católica’ terem aplaudido o cantor no show de lançamento.

Dois adjetivos foram escolhidos a dedo para qualificar Chalita: ‘polígrafo’ e ‘polivalente’. Um e outro, com o mesmo antepositivo ‘poli’, poderiam ser positivos em outros contextos. Polígrafo, aquele que escreve acerca de assuntos diversos, recebe aqui conotação pejorativa. Quem escreve sobre educação e ao mesmo tempo compõe letras de música e faz as biografias de Lu Alckmin e Vanusa parece polígrafo demais…

Polivalente, aquele que executa diferentes tarefas, neste momento deixou de ser elogio. A versatilidade de quem escreve, canta, apresenta programa de TV, faz política, ministra palestras etc. parece o cúmulo dos defeitos. De onde vem a má vontade dos jornalistas Sérgio e Heloisa? Chalita poderia responder simplesmente: ‘Vocês estão é com inveja’.

Abstraindo as diferenças

O desdém com que Chalita é tratado manifesta-se, sobretudo, nos diminutivos empregados. Além dos ‘macaquinhos’, a matéria afirma: o ‘disquinho’ lançado tem uma canção ‘Sou Quixote’ e, entre as agressões que o gênio Cervantes já sofreu, essa é ‘a mais tolinha’.

Não sou exatamente um admirador dos livros de Chalita. Faço-lhe muitas restrições como pedagogo, considero seus textos fracos, medíocres mesmo, tangenciando a demagogia educacional. Sua atuação como secretário da Educação não foi nula porque soube cercar-se de bons colaboradores.

O que me incomoda é que o ataque da Veja foi um ataque debochado. Certamente eu não vou comprar o CD do novo cantor, e a biografia de Lu Alckmin soou-me como oportunismo político, mas, a exemplo do advogado Sobral Pinto, católico de quatro costados, que em outras épocas defendeu o comunista Luís Carlos Prestes, abstraindo das diferenças de pensamento, gostaria de defender Chalita.

Se queremos criticar, critiquemos. Com um mínimo de respeito pela pessoa.

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Doutor em Educação pela USP e escritor; www.perisse.com.br