Thursday, 25 de April de 2024 ISSN 1519-7670 - Ano 24 - nº 1284

De quem é a credibilidade?

Muito se fala sobre credibilidade desse ou daquele veículo de comunicação, mas pouco se diz de quem é essa credibilidade mesmo. Nem mesmo os jornalistas se dão conta da força e do peso que dão aos veículos. Sempre pensei que difundir notícias é um privilégio e uma responsabilidade e vi essa ideia cristalizada no filme Encontro marcado em frase dita pelo personagem interpretado por Anthony Hopkins, proprietário de um conglomerado de comunicação. Mas o que poucos atentam é que o privilégio é dos donos dos veículos, que amealham um grande patrimônio, e a responsabilidade fica por conta dos seus profissionais que, literalmente, constroem esse patrimônio.

Um dado rápido para essa afirmativa é ver quantos proprietários de veículos de comunicação são processados ou presos. Nenhum. E quantos profissionais de comunicação são processados, ou presos ou mortos por reportagens feitas? Passam dos milhares. Não se tem um dado preciso. Mesmo em tempos de ditadura, apenas os profissionais iam para o xadrez, enquanto os donos eram apenas convidados a sair do país, no máximo.

Recordo de uma vez que fui visitar o jornal Diário do Amazonas, ainda quando o seu proprietário, Cassiano Anunciação, o Batará, figura folclórica e lendária do jornalismo amazonense, semi-analfabeto, passava as tardes de domingo na redação. Mesmo tendo uma bela lancha para passear no rio Negro, deixava os jornalistas na redação entre indignados e humilhados, quando dizia: “O diploma é de vocês, mas o jornal e o dinheiro é meu!” Isso poderia me desviar para a discussão sobre a exigência do diploma e eu acabar fugindo do tema aqui, coisa muito comum entre meus colegas de profissão. Não acontecerá.

Sempre há algo por trás

Olhando para o passado, devemos lembrar que a profissão de jornalista é recente e, quando a imprensa chegou ao Brasil, os poucos jornais eram escritos em sua maioria por médicos, advogados e outros profissionais que tinham formação suficiente para apresentar suas ideias sobre determinado assunto. Os jornais ganhavam mais credibilidade dependendo de quem escrevia para eles.

Isso por si só reforça a tese de que não são necessariamente os detentores da tão propalada credibilidade. Mas devemos colocar em discussão e velha e boa guerra surda que acontece nas redações: o interesse dos proprietários versus a ética jornalista. Invariavelmente a segunda sai maculada ou o profissional é demitido. Já passei por isso! Melhor a rua que ver a informação ser vilipendiada, não acham?

Ora, o interesse do proprietário é apenas um: financeiro. A ética, sempre será uma e se adquire não apenas na academia; é algo que se traz de berço, por formação familiar. Não adianta estudar ética na academia se você não a tem em sua vida. Será apenas um livro na estante que servirá como álibi sem-vergonha: viu, eu estudei ética, tá?

E esse interesse dos proprietários invariavelmente está atrelado aos que estão no poder. Eu poderia citar o exemplo da Rede Globo, que mudou o tratamento dado a Luiz Inácio da Silva quando percebeu que este venceria as eleições em 2002 e deixou de destratá-lo ou sequer ouvi-lo, ou dar-lhe um espaço menor em seus noticiários. Prefiro me referir às manchetes dos jornais de Manaus (ou de qualquer outra cidade do país), que mostram suas tendências no período eleitoral, ou nos pseudo-programas “mundo cão” transmitidos diariamente pelos apresentadores candidatos. Sempre há algo intencional por trás das “séries de reportagens” mostrando um determinado problema da cidade.

Massa de manobra

É assim que é mascarado ao leitor/ouvinte/telespectador o interesse dos proprietários dos veículos de comunicação. Passa-se a ideia de que os casos de segurança, saúde ou educação estão sendo tratados de forma correta. Com os internautas não funciona bem assim, já que a interatividade existe e não tem mediação nem limite de tempo ou espaço.

Não podemos esquecer que de tanto se deixar de lado a importância de quem realmente é a credibilidade, foi se deixando crescer a ideia de que são os veículos de comunicação os detentores da credibilidade, que os profissionais foram aceitando essa ideia e passaram a não mais questioná-la. Pior que isso, passam a defender com todas as suas forças o veículo onde são escravizados, digo, trabalham. Mais horrível ainda, entram no jogo mesquinho e espezinhante dos proprietários, que se divertem eu suas lanchas, sítios ou que tais, enquanto ex-colegas de faculdade se alfinetam e se engalfinham atrás do “furo jornalístico”.

Alimenta-se a rivalidade dos profissionais enquanto os proprietários confraternizam. Mais que isso, repartem-se os profissionais, enfraquece-se a categoria. Não à toa, a decisão do Supremo Tribunal Federal (STF) de não exigir o diploma para o exercício da profissão de jornalista foi aprovada sem nenhuma resistência. A categoria não é unida porque se queima na fogueira das vaidades. Querer trabalhar na Globo é delírio, ops, sonho, de muitos e a maioria está disposta a fazer absolutamente qualquer coisa para atingir esse objetivo. Meus colegas comunicadores devem prestar atenção na dura realidade que os cercam. Todos os anos centenas de profissionais da comunicação são jogados no mercado de trabalho. Esse mercado é reduzidíssimo e já está saturado faz tempo.

Mais uma vez o mundo cibernético vai se mostrando como um espaço alternativo crescente, que não permite manipulação por proprietários. Naturalmente que, por não possuirmos uma internet de qualidade (por que será, né?), a maioria da população não tem acesso. Mas tem espaço para os profissionais que já foram devidamente sugados pelo sistema na rede mundial. Por isso há, nesses tempos, a alimentação de uma nova guerra: se for blogueiro, não tem credibilidade. Vi muitos colegas meus levantando essa bandeira sem nem ao menos se darem conta de que estavam sendo usados como o que eles mais combatiam: serem massa de manobra.

Prestem atenção meus colegas. Reflitam sobre a credibilidade que você dá ao veículo em que você trabalha. A discussão vai longe e está apenas começando. Certamente alguns aspectos não foram abordados aqui, mas cabe a você dar a sua contribuição.

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[Robson Franco é radialista, Manaus, AM]