Friday, 26 de April de 2024 ISSN 1519-7670 - Ano 24 - nº 1285

Democratização passa pela participação popular

A comunicação é um instrumento fundamental na organização, na política e uma ferramenta de apoderamento dos trabalhadores. A afirmação é da secretária nacional de Comunicação da Central Única dos Trabalhadores (CUT), Rosane Bertotti, socióloga e agricultora familiar, que está há um ano à frente da secretaria. Sua entrevista:

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Nos últimos tempos, a CUT vem se mobilizando e dando mais atenção a questões relacionadas à comunicação no Brasil. Por quê?

Rosane Bertotti – A comunicação sempre esteve presente nos nossos debates, tanto é que na sua fundação, a CUT definiu que precisava ter uma secretaria de comunicação.
Acho que ela consegue ocupar esse espaço a partir de uma nova realidade no Brasil, aonde a gente percebe com mais clareza que a mídia tem a capacidade de intervir nas decisões econômicas, políticas e do poder de influenciar a opinião pública. A partir disso, os movimentos sociais conseguem perceber que a comunicação, além de ser um instrumento de apoderamento, um utensílio que vai dialogar com sua base, seu espaço de atuação, é um instrumento que disputa projetos, disputa a concepção de Brasil e da sociedade como um todo.

Qual a avaliação que a Central faz sobre a convergência dos meios de comunicação, e o seu impacto?

R.B. – A questão da convergência dos meios de comunicação traz muitos benefícios, pois possibilita uma gama nova de informações e de acesso aos meios de comunicação. Mas a convergência ainda não se traduz para a realidade, acesso dos trabalhadores e do povo brasileiro. Por exemplo, a internet, que se tornou em um amplo mecanismo, que deu um pouco de margem para essa linha de convergência, mas que não está ao alcance de todos. Na minha opinião, os movimentos sociais precisam se apoderar mais desse debate e a partir daí mudar essas relações com a sociedade, para que a mesma tenha acesso à tecnologia advinda desse projeto.

A televisão é a principal fonte de informação e entretenimento no Brasil, mas é explorada por monopólios. Como seria possível mudar esse quadro?

R.B. – Primeiro, através da mudança no marco regulatório das concessões de rádio e TV, que são os grandes meios de massa. Hoje, as concessões, que são públicas, não passam por nenhum critério ao serem destinadas e nenhum processo de avaliação durante o período de suas vigências. Teríamos que começar garantindo critérios claros para essas outorgas, com base na Constituição. A partir desses critérios, criar mecanismos de avaliação para ver se de fato eles estão sendo observados pelas emissoras. Para mim, quem faz essa avaliação é a sociedade e não apenas os instrumentos oficiais ou de poder público.

Passa também pela construção e estruturação da TV Pública – que ela garanta a inserção da diversidade cultural do país, qualidade de informação e diálogo com a sociedade. E ainda pelo fortalecimento das redes de rádios comunitárias. Que haja efetivamente a participação popular garantindo que os meios realmente sejam um bem público. E há também o financiamento público desses meios. Então seria esse tripé: a concessão com critérios e avaliação do processo, acesso a outras manifestações e o financiamento da comunicação.

Quais os caminhos a serem trilhados para a democratização da comunicação e qual o papel do Estado?

R.B. – O tema é muito abrangente. Um dos principais pontos que estão pairando nesse momento é o processo de construção de uma grande Conferência Nacional de Comunicação, onde poderemos debater todos esses pontos específicos de comunicação, quer seja convergência de mídia, das concessões públicas, e a discussão em torno de uma televisão pública com gestão e participação dos movimentos e de toda sociedade organizada.

Nós representamos a classe trabalhadora e queremos que a sociedade, como um todo, participe do processo. Isso não significa que os empresários e o governo fiquem fora do debate. Eu acho que o Estado tem um papel importante enquanto gestor e executor de políticas públicas, que é o de promover o debate com a sociedade e junto com ela construir políticas públicas efetivas para a comunicação e propor instrumentos de ponderação.

Qual sua avaliação sobre a mídia nacional na questão da democratização?

R.B. – A mídia brasileira não é nada imparcial, ela tem uma visão própria e trabalha em cima disso, geralmente promovendo apenas um lado da história, deixando de lado questões importantes para a sociedade brasileira. A mídia tem o papel de dar visibilidade ao fato, e a partir disso, a população avaliará e opinará sobre o mesmo. A avaliação não é de um veículo por si só, que alega o direito de fazer sua opinião valer e a partir dela influenciar na decisão da sociedade brasileira. Com isso, o meio deixa de promover temas essenciais como cultura, educação e de dar voz às diversas opiniões sobre temas variados que estão inclusos no contexto social.

Na sua opinião, o que precisa ser feito para garantir o pluralismo e a liberdade de expressão na comunicação?

R.B. – Primeiro, parto do princípio que não existe uma coisa assim: vamos fazer isso, vamos cortar as concessões de televisão que isso vai mudar, até por que, isso faz parte de um processo histórico, de uma realidade brasileira. A luta social que nós viemos travando com todas as relações é fundamental, mas o ponto eminente é garantir que as concessões no Brasil, sendo públicas, precisam de critérios, processos de avaliação e de participação social. E, no decorrer de tudo isso, que nós pudéssemos estar garantindo a pluralidade das opiniões e manifestações. Há várias ações e não podemos apontar um único caminho para garantir a democratização.

Hoje eu acho que o mote principal é o diálogo com todos e por isso defendemos com grande força a realização de uma Conferência Nacional de Comunicação. Como alternativa de comunicação, o portal Mundo do Trabalho, criado pela CUT, traz notícias que interessam não só aos militantes mas a toda população, traz mobilizações e práticas que ajudam a garantir a diversidade dos meios.

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Da Redação FNDC