Friday, 29 de March de 2024 ISSN 1519-7670 - Ano 24 - nº 1281

Diferente, crítica e irreverente

Uma amiga, caloura de jornalismo na Universidade Federal de Santa Catarina, perguntou:

– A revista piauí é alternativa?

Fiquei sem saber o que responder. Alternativa, como? Seguindo quais critérios?

Criada pelo documentarista João Moreira Salles, a publicação pertence à Videofilmes – empresa de João e seu irmão Walter – juntamente com a editora Abril, que é responsável pela impressão e distribuição. É um projeto de João e do editor Luiz Schwarcz, da Companhia das Letras.

A revista reúne nomes consagrados – como Ivan Lessa, Marcos Sá Corrêa – ao lado de quem está começando a escrever na imprensa, gente com menos de 30 anos que elabora a seção ‘esquina’: textos não assinados que contam algumas histórias curiosas, por exemplo, as ambigüidades da Vale do Rio Doce – que investe na preservação do meio ambiente ao mesmo tempo em que responde a processos por poluí-lo.

Poderíamos dizer que a revista é alternativa sob o ponto de vista comercial? De acordo com João Moreira Salles, a revista tem cerca de 30 mil leitores, mais do que publicações como a revista Trip e Bravo!, apesar de possuir menor quantidade de anúncios. Em 66 páginas do mês de março, são aproximadamente oito ou nove destinadas a anunciantes, contando as meias páginas.

Fome por textos

Na capa, desde o primeiro número – lançado em outubro de 2006 –, a seguinte frase: de R$9,50 por R$7,90. Ora, como qualquer outro produto, a revista precisa ter lucro para sobreviver. Deve, por isso, se submeter às regras do mercado. Nada de alternativo nisso.

Seria, então, alternativa sob a ótica estrutural? A revista vai contra as tendências da imprensa atual, que prefere diminuir o tamanho dos textos e criar infográficos e ilustrações como opções informativas. Em piauí se vêem blocos de textos com vários caracteres. É para quem não tem preguiça de ler: as várias seções saciam a fome dos leitores por textos – reportagens, ficção, matérias do tipo perfil –, além de fotos, quadrinhos e até um horóscopo irreverente.

Às favas os padrões

piauí – palavra escolhida, de acordo com João Salles, por causa do número de vogais e pela sonoridade – valoriza matérias não-factuais em textos escritos seguindo diferentes pontos de vista, em um estilo autoral: na edição de março, escritores estrangeiros (Marcel Gotlib, Judith Thurman), cineastas (Eduardo Escorel), humoristas (Steve Martin), poeta (o russo Osip Mandeistam), professores (Sérgio de Sá), jornalistas (Cassiano Ellek Machado, Daniela Pinheiro) e até uma seção dedicada ao relato de um dia na vida de uma determinada pessoa, como o diário de Ronaldo Pena, pedreiro que viajou do Rio de Janeiro a Porto Seguro em uma bicicleta.

‘É uma revista diferente’, avalia Miriam Santini de Abreu, professora de jornalismo da Universidade Federal de Santa Catarina (UFSC). ‘Quem faz o arroz-com-feijão do cotidiano, deve estar preparado para comer o filé mignon quando surge a oportunidade’, aconselha a seus alunos.

Alternativa ou não, piauí manda às favas os padrões estabelecidos pela chamada grande imprensa contemporânea. A revista valoriza o leitor do tipo persistente, crítico e exigente. De acordo com Hélio Schuch, coordenador do curso de Jornalismo na UFSC, as pessoas devem, de vez em quando, ‘darem um presente a si mesmas’. O presente é o texto de piauí.

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Estudante do segundo ano de Jornalismo na Universidade Federal de Santa Catarina