Thursday, 18 de April de 2024 ISSN 1519-7670 - Ano 24 - nº 1284

O papel do jornalista é informar

Assiste aos jornalistas a obrigação de informar a população, dando-lhe meios de exercer a cidadania. Salvo melhor juízo, isso não pode se confundir, jamais, com militância política. Logo, o que dizem as autoridades é, sim, uma informação relevante a ser levada às pessoas. Se a análise dessa informação pressionará ou não uma autoridade ou qualquer que seja o partido político a tomar determinada decisão, não é culpa do jornalismo. O jornalismo carrega culpa quando, indevidamente, age como se fosse um dos três poderes constituídos.

Declarações de ministros do Supremo Tribunal Federal nas últimas semanas – corretamente divulgadas pela imprensa, diga-se – dão conta de que o tribunal não aceitará pressões externas para decidir o caso que ficou conhecido como mensalão. É justo – aliás, é prudente – que os ministros não acatem pressões e decidam neste ou em qualquer outro caso sob seus cuidados, de acordo com o ordenamento jurídico vigente no país. Como se trata da última instância do Poder Judiciário, não convém que as decisões sejam tomadas de acordo com pressões de ocasião, venham elas de onde vierem.

Mas é preciso deixar claro que o caso em debate não é comum, não é simples e talvez seja um dos mais importantes da história republicana brasileira. Será a primeira vez que, de forma concreta, um pernicioso esquema de corrupção será destrinchado e julgado pela corte maior. Dada a importância do julgamento, é crucial a cobertura independente da imprensa e que essa cobertura deixe explícita a importância do momento histórico para a sociedade, mesmo que o ministro Marco Aurélio Mello diga que o processo “é um processo como outros 700 que temos que apreciar. Por que pinçar este para julgar a toque de caixa?”

Instituições democráticas

A própria sociedade civil tem se organizado pelo país nos últimos dias, legitimamente, para pedir celeridade à tramitação do processo e essa celeridade não se confunde com julgar a toque de caixa, como diz o ministro Mello. Até porque o escândalo, que veio à tona em 2004, foi transformado em processo em 2007 e desde então já ocorreram duas eleições, nas quais os eleitores foram às urnas sem a certeza da não culpabilidade dos partidos políticos envolvidos com o chamado mensalão e, o mais grave, sem saber se é contumaz o Legislativo receber benesses para atender aos pedidos do Executivo.

O próprio ex-presidente Lula, em discurso realizado na Granja do Torto em 12 de agosto de 2005 – portanto há quase sete anos – deu a devida dimensão da importância de se esclarecer a denúncia feita pelo ex-deputado Roberto Jefferson, de que congressistas recebiam dinheiro para decidir em como votar determinadas matérias de interesse do Palácio do Planalto. Dizia Lula:

“Estou indignado pelas revelações que aparecem a cada dia e que chocam o país. (…) Esta é a indignação que qualquer cidadão honesto deve estar sentindo hoje diante da grave crise política. Se estivesse ao meu alcance, já teria identificado e punido exemplarmente os responsáveis por esta situação. Por ser o primeiro mandatário da nação, tenho o dever de zelar pelo Estado de direito. O Brasil tem instituições democráticas sólidas. O Congresso está cumprindo com a sua parte, o Judiciário está cumprindo com a parte dele.”

Jornalismo exerce o seu papel

Portanto, ao abordar criticamente o caso, a imprensa não esta fazendo nada mais do que cumprir com a sua obrigação de bem informar a população sobre os acontecimentos relacionados com o caso para que a própria população tire as suas conclusões. Não se trata de pressionar as instituições democráticas, mas sim, de um dever de ofício. O que se espera é que os 11 ministros do STF julguem o processo, condenando ou absolvendo os envolvidos com base nos autos, independentemente de suas posições ideológicas e político-partidárias, e deixem claro, do ponto de vista jurídico, quais práticas serão aceitas daqui por diante.

E nessa espera, cabe ao jornalismo noticiar todo e qualquer fato novo que tenha relação com o caso sempre que este fato se torne público. Ao cumprir com sua obrigação de forma independente, o jornalismo não está pressionando ou interferindo no julgamento, e sim, apenas exercendo o seu papel.

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[Marcelo Feitoza é jornalista, Rio de Janeiro, RJ]