Friday, 19 de April de 2024 ISSN 1519-7670 - Ano 24 - nº 1284

A violência como mercadoria

Todos os dias chega até nossas residências uma enxurrada de programas especializados em notícias relacionadas à violência. São os chamados programas policiais e eles estão em praticamente todos os veículos de comunicação, rádio, televisão, jornais – e agora também em uma multiplicidade de blogs na internet, todos com um único fim: transformar em espetáculo a violência e reproduzir o medo. O medo cria nas pessoas a figura de um abominável inimigo na figura do assaltante, do vagabundo que ganha um estereótipo específico.

O perfil dos apresentadores desses espetáculos é bastante singular, sujeito impecável, capaz de apontar as soluções para todos os problemas da sociedade, mas que na verdade a única coisa que sabe fazer é por a culpa de todo o problema da violência social naquele inimigo, o vagabundo.

Segundo Sharon Zukin (1985), citado por Bauman (2001, p.110), endurecer contra o crime construindo mais prisões e impondo a pena de morte são as respostas mais corriqueiras à política do medo. Prendam toda a população, ouvi um homem dizer no ônibus, reduzindo a solução a seu ridículo extremo. Outra resposta é a privatização e militarização do espaço público – fazendo de ruas, parques e mesmo lojas mais seguros, mas menos livres…

O medo como pretexto

O medo se transformou em mercadoria e a violência é muito rentável. Por exemplo, o programa de TV mais assistido no Rio Grande do Norte no seu horário, segundo o Ibope, foi o policial Patrulha da Cidade, os blogs mais acessados do estado são os que trazem o espetáculo da violência.

O sociólogo polonês Zigmunt Bauman, em seu livro Modernidade Líquida (2001, p.110) mostra a forma como se usa o medo criado para estimular o crescimento da segurança privada. Citando Sharon Zukin, Bauman mostra a aparência dos espaços públicos de Los Angeles. “Os helicópteros zunem nos céus sobre os guetos, a polícia hostiliza os jovens como possíveis membros de gangues, os proprietários compram a defesa armada que podem… ou têm coragem de usar.”

Na medida em que a violência se torna mercadoria, ela precisa ser multiplicada, ao invés de se pedir investimentos em políticas públicas no sentido de eliminar a pobreza, investir em educação de qualidade, a sociedade clama por segurança; a segurança, seja ela privada ou mesmo pública, é essencial para que se estimule a guerra entre o medo da população considerada normal e os monstros, os assaltantes.

Em entrevista à Radioagência NP, após participação no debate “Desmilitarização da polícia e da política”, ocorrido no dia 3/12/2012 na PUC-SP, o advogado que atua na área de direitos humanos Renato Roseno afirmou que “o medo vira pretexto para destituir a liberdade e criminalizar pobres”.

Quando perguntado sobre como a mídia ajuda a sustentar o projeto de Estado assentado na produção de exploração da opressão, Roseno deixa claro que a mídia cria o inimigo. “Ela produz legitimidade sobre quem é o perigoso, quem é o suspeito e quais são os mecanismos que devem ser dirigidos a ele. Por outro lado, ela produz e reproduz medo. O medo é uma ideia política fundamental. Como a classe trabalhadora está com medo, não produz rupturas. O medo é o pretexto para destituir a liberdade.”

Referências

BAUMAN, Zigmunt. Modernidade Líquida. Rio de Janeiro: Zahar editora, 2001.

ROSENO, Renato. Medo vira pretexto para destituir a liberdade e criminalizar pobres: Rádio Agência NP, São Paulo, 05 dez 2012, Entrevista concedida a José Coutinho Júnior e José Francisco Neto. Disponível em: http://www.radioagencianp.com.br/.

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[Luiz Junior é jornalista e estudante de Direito, Caicó, RN]