Friday, 29 de March de 2024 ISSN 1519-7670 - Ano 24 - nº 1281

Eles não se regeneram

Há recomendações de sobra sobre o bom comportamento que se deve ter na internet. Talvez por não serem compreendidas, algumas são pouco observadas, como a que aconselha, por precaução, retirar todos os nomes precedentes antes de repassar uma mensagem. Negligências como essa são lamentáveis, porque a boa conduta não é apenas uma questão de cortesia ou delicadeza. Educação sempre tem um significado funcional positivo.

A maioria da correspondência dos internautas, pelos diversos canais disponíveis na rede, troca-se com muita informalidade, entre amigos, descartando-se antigas fórmulas da via postal, como amabilidade, reverência, urbanidade e respeito. O que é compreensível, devido à familiaridade tão comum entre os usuários de computador, e por ser a internet um veículo de comunicação basicamente livre e rápido. Até nas comunicações oficiais ou comerciais dispensam-se as regras antes observadas como exigências protocolares relativas ao cerimonial ou à etiqueta.

A linguagem utilizada, especialmente pelos jovens, tem sido muito simplificada, a ponto de constituir verdadeiros códigos privados de grupos que se identificam pela idade, pela profissão ou, simplesmente, pela moda. Uma vantagem para quem não deseja ser prolixo ou tem pressa.

Confirmação de recebimento

Além disso, os formatos padronizados, em uso na rede, facilitam a composição dos textos e sua leitura, permitindo ao destinatário responder com atenção e presteza ao remetente. Ressaltam o espírito prático que envolve toda a sistemática da internet.

Entretanto, os pontos onde se concentram as principais falhas de uso do sistema são: a entrega das comunicações e a sua resposta.

Mensagens são devolvidas porque ‘a caixa postal está cheia’, por exemplo, evidenciando certo desmazelo de quem não examina diariamente sua correspondência pessoal. Isso é freqüente entre os internautas que gostam de manter diversos domínios. Há os que trocam seus endereços sem comunicar a mudança aos seus destinatários habituais, contribuindo assim para frustrar as entregas. Essas perdas são, muitas vezes, atribuídas a falhas operacionais dos provedores, sempre negadas por estes em nome da suposta infalibilidade da informática. Que não é infalível e pode conter, em seus programas, deficiências e erros que provocam desencontros, prejuízos ou constrangimentos.

Mas é nas respostas às mensagens escritas que está a pior parte; excluídas as coletivas que, evidentemente, não pedem resposta

Se você manda um artigo para o jornal; se responde a uma consulta ou envia dados solicitados; se pede alguma informação de que necessita para uma parceria; enfim, se quer estar certo da entrega ou teme que haja extravio, deve sempre pedir ao destinatário a confirmação do recebimento, como está previsto na formatação usual da rede.

Inconscientes de sua inferioridade

Nesses casos, seu destinatário pode adotar diferentes posturas, a saber: (1) Confirmar o recebimento e mandar a resposta imediatamente, o que é correto e bastante raro. (2) Não confirmar o recebimento, se ele acha desnecessário por responder na hora, o que é satisfatório. (3) Não confirmar e responder tardiamente, desculpando-se, o que é razoável. (4) Não confirmar nem responder, o que deixa você na dúvida sobre: (a) se houve extravio da mensagem; ou (b) se ele a recebeu, mas não lhe deu a mínima importância!

Neste último caso, há falta de respeito ou inferioridade psicológica própria dos tipos que rejeitam qualquer obrigação, pois se sentem forçados a fazer algo não espontâneo! Também pode ser ignorância ou preguiça, se não há qualquer vantagem em sonegar recebimento ou resposta.

Como devemos proceder, então?

Temos um bom conselho na obra Apologia de Sócrates, de Platão. Conta ele que, um dia, o mestre andava pelas ruas e jardins ensinando os discípulos que o acompanhavam, como era o costume naquela época. Passou por eles um homem importante, a quem Sócrates cumprimentou com respeito e elegância. O indivíduo, porém, olhou para ele com desprezo, desviou o olhar ostensivamente e seguiu seu caminho sem responder à saudação. Os alunos ficaram descontentes e ofendidos, e pediram ao mestre:

‘Dê-nos a sua autorização, e vamos dar uma boa surra nesse sujeito, para que ele aprenda a respeitar os outros.’

Sócrates, sempre sábio e calmo, perguntou:

‘Se nós encontrarmos, em nosso caminho, um homem gravemente enfermo, vamos odiá-lo por ter menos saúde do que nós?’

‘Claro que não’, responderam os discípulos, ‘teremos pena dele!’

‘Então’, completou Sócrates, ‘não devemos ficar com raiva de um homem só porque ele tem menos educação do que nós.’

Portanto, devemos seguir o conselho do sábio, que é magnífico! Certamente, aqueles que nos dão as costas, ao ignorar ou desprezar nossas comunicações, são carentes de educação. E essa falta requer paciência, compreensão e, sem dúvida, nosso perdão, pois eles são inconscientes de sua inferioridade. Se você for religioso, faça uma oração por eles. E não os incomode mais com suas mensagens. Eles nunca se regeneram.

Esqueça. Melhor deixá-los em paz!

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Aposentado, contador e administrador, Valinhos, SP