Friday, 29 de March de 2024 ISSN 1519-7670 - Ano 24 - nº 1281

Folha de S. Paulo

ELEIÇÕES 2006
Michele Oliveira e Paulo Sampaio

Nanicos ganham segundos de fama no ‘Jornal Nacional’

‘Em duas horas de coquetel, apenas 30 segundos são relevantes na inauguração do comitê do candidato à Presidência da República Luciano Bivar (Partido Social Liberal) -aqueles que a Globo gravou para levar ao ar no ‘Jornal Nacional’.

Para que esses instantes pareçam bem naturais, o candidato-traço (0% de intenções de voto no último Datafolha) tem de contar com figurantes que produzam uma espécie de ‘movimento eleitoral’ atrás dele.

‘Nosso voto é muito de opinião’, diz Bivar, 61, sem apontar nenhum exemplo no local.

Moças contratadas para balançar bandeiras amarelas e azuis se misturam a correligionários de outras praças que estendem cartões de apresentação à reportagem, enquanto esticam o pescoço em busca de uma nesga de lente global.

O mesmo esforço de ‘movimento eleitoral’ está presente na campanha do presidenciável José Maria Eymael (Partido Social Democrata Cristão), 1% no Datafolha. Suas caminhadas da última semana foram acompanhadas por sete bandeiras, também amarelas e azuis. Enquanto na terça-feira elas eram agitadas na zona norte da capital por parentes e amigos de candidatos do partido, na quarta, desempregados contratados por R$ 10 por meia hora faziam o serviço no centro da cidade.

Eymael, 66, que tenta pela segunda vez chegar ao Planalto, tem uma equipe de 30 pessoas. Um desses assessores tem, entre outras missões, a de recrutar pessoas na rua para Eymael cumprimentar. ‘Dá um abraço no candidato’, diz. Em seguida, o democrata cristão dispara frases como: ‘Aperta a mão do Eymael, campeão’ e ‘Vamos juntos ganhar a Presidência’. Tudo sob as lentes das câmeras -que não são muitas. Na terça, além da Globo, as emissoras RIT e Record gravaram o candidato. No dia seguinte, só a Globo filmou sua caminhada.

Apesar do espaço diário nos telejornais globais e do eterno jingle (‘Ey-Ey-Eymael, um democrata cristão’), poucos o reconhecem. A reportagem ouviu, em dois dias, três passantes confundi-lo com ‘aquele do aerotrem’ -Levy Fidelix (PRTB).

‘Não olha para a câmera’

A situação de Eymael e Bivar é muito melhor do que a de Rui Costa Pimenta (PCO), que, apesar de ter 1%, não tem direito a cobertura com imagens. Ele está de fora por seu partido não ter eleito nenhum deputado federal em 2002.

Já Cristovam Buarque, igualmente com 1%, recebe os mesmos segundos na TV que Luiz Inácio Lula da Silva, Geraldo Alckmin e Heloísa Helena. Segundo a Globo, a exposição de Cristovam se justifica pelo PDT ter 21 deputados na Câmara.

A cobertura dos nanicos provoca situações inusitadas. No comitê inaugurado de Bivar, na terça, o cinegrafista deu uma bronca: ‘Não olha para a câmera, amigo, conversa com o candidato’, orientou a um emergente que quase colocou toda a espontaneidade do momento a perder. No dia seguinte, foi a vez de Eymael cobrar agilidade da equipe da Globo. Ao se despedir do repórter da emissora, disse: ‘Vamos, para dar tempo, né’. A intenção do candidato era se ver no ‘Jornal Hoje’.

Nos eventos de campanha, perguntas são respondidas com muitas respostas repetidas. Bivar martela sobre o imposto único. ‘Qual a sua proposta?’. Resposta: ‘O imposto único, que substitui os dez existentes e vai resolver o problema de mais de 50 milhões de pessoas que vivem na marginalidade’.

Após a entrevista, deixou o comitê em sua Mercedes Benz CLS 500 (R$ 396 mil; R$ 15 mil de IPVA). Ele é o candidato a presidente mais rico: seu patrimônio é de R$ 8,775 milhões.

Eymael tem uma única frase sobre o escândalo dos sanguessugas: ‘Para mim, para a democracia cristã, todo político corrupto, marginal, é um serial killer, é um assassino em série, é um matador em atacado’.

Eymael diz que a sua candidatura tem o objetivo de chegar ao segundo turno. ‘O sr. acha que é possível?’, diz a Folha. ‘Veja: até há alguns dias atrás eu não tinha nenhuma mídia, zero de mídia. E, mesmo sem mídia, nós já temos 1%.’

Perguntado se ele estava fazendo campanha somente para aparecer na TV, Eymael responde: ‘A minha vida inteira a minha maneira de fazer política sempre foi muito próxima com as pessoas’.’



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Tempo na TV foi negociado com emissora

‘Para tornar o debate de 28 de setembro mais atraente, só com os principais candidatos, a TV Globo fechou um acordo com os políticos que têm menos de 5% nas pesquisas de intenção de voto. Para que aceitassem abrir mão do debate, ofereceu aos nanicos duas reportagens por semana em cada telejornal. Com isso, Luciano Bivar e José Maria Eymael têm direito, duas vezes por semana, ao mesmo tempo de Luiz Inácio Lula da Silva, Geraldo Alckmin, Heloísa Helena e Cristovam Buarque. O pedetista recebe mais espaço por seu partido ter mais de cinco deputados federais, outro critério usado pela Globo.

‘A TV Globo acredita firmemente que não está impulsionando nenhuma das candidaturas. E a prova é que os quatro principais candidatos, tendo o mesmo tempo na TV Globo, têm desempenhos nas pesquisas diferentes’, disse à Folha a Central Globo de Comunicação.’

Fernando de Barros e Silva

‘Caravana JN’ leva circo para dentro da TV

‘Perdemos a Copa, mas a Globo não desistiu. ‘Quais são os desejos dos brasileiros?’, nos pergunta o mesmo Pedro Bial, agora à frente da ‘Caravana JN’. É o nome do ônibus azulão que desde a última segunda-feira começou a percorrer o país na condição de vedete da emissora para a cobertura da campanha eleitoral deste ano.

A escolha do nome talvez venha trair a promessa tão diligente da Globo de isenção jornalística. ‘Caravana’ é uma palavra que no repertório político recente está associada à Caravana da Cidadania, como Lula batizou suas andanças por pequenas localidades do país entre 1993 e 1994. Ato falho ou não, o leitor pode concluir.

A ‘Caravana JN’ evoca ainda, quem sabe com mais pertinência, uma outra também famosa: a Caravana Rolidei, nome do circo mambembe que rodava o país em ‘Bye Bye Brasil’, filme de Cacá Diegues.

Em 1979, a Caravana Rolidei encarnava o esgotamento de uma forma de cultura popular diante da chegada da televisão aos rincões do país. As ‘espinhas de peixe’ -como eram chamadas por artistas desesperados as antenas de TV nos telhados- haviam enclausurado o público dentro de casa.

Mais de 25 anos depois, o que faz a ‘Caravana JN’? Recria o circo, mas o leva para dentro da TV e das casas. O ônibus da Globo é um simulacro tardio da descoberta do Brasil profundo e do reencontro com os anseios do povo. Há uma espécie de pasteurização da vida popular, uma nova ‘poética da miséria’ disposta a nos revelar as riquezas singelas do brasileiro pobre. Nesse pastiche de circo itinerante há números cívicos, truques de entretenimento, malabarismos retóricos -e não falta nem o bom palhaço.

Na noite de estréia, em São Miguel das Missões (RS), anunciado por William Bonner, que apresentava o ‘JN’ de lá, Pedro Bial demorou poucos segundos para soltar a primeira das suas: ‘Partindo do Sul temos mais chances de encontrar o norte da nossa missão’. Dois dias depois, já em Nova Pádua, também no Rio Grande do Sul, podíamos vê-lo sentado numa sala de aula rodeado de crianças pequenas, atirando bolinha de papel nos coleguinhas. Era a abertura da reportagem sobre a importância da educação.

Índios guaranis próximos da extinção, migrantes japoneses adeptos das artes marciais e números, muitos números. O cidadão da ‘Caravana JN’ fica reduzido à sua representação folclórica, vira personagem típico, e a política, por sua vez, fica desencarnada, como se não tivesse sujeitos e conflitos reais. A naturalização da história é uma das mágicas da Globo. As coisas simplesmente acontecem. Temos a impressão de estar ora diante de um programa de auditório, ora vendo Rolando Boldrin ou um ‘Globo Rural’ qualquer.

Até a chegada da ‘Caravana JN’, a cobertura da Globo centrava-se no compromisso de exibir no telejornal, com tempos cronometrados, todos os candidatos à Presidência -fruto de um acordo entre eles e a emissora que a libera de incluir os nanicos nos seus debates.

Tal opção levou os microcandidatos a fingir diariamente que fazem alguma coisa e o jornal a simular ao eleitor que os leva a sério. Temos visto cenas dignas dos melhores momentos de Primo Carbonari. Não deixa de ser uma ironia para um jornalismo que há anos vem perseguindo o objetivo de recontar a sua história à luz daquilo que, hoje, gostaria de ter sido. Tudo, afinal, acaba em circo.’

Andrea Murta e Marcela Campos

Publicidade de candidatos some das ruas de São Paulo

‘Um mês após a liberação da propaganda pela Justiça Eleitoral, as ruas de São Paulo continuam vazias. Raros são os muros pintados e as faixas que faziam parte da paisagem paulistana em outras eleições.

As marginais Tietê e Pinheiros, tradicionais redutos de publicidade eleitoral, têm poucas manifestações, em muros afastados do centro. O mesmo se dá no viaduto do Chá, no vale do Anhangabaú e nas avenidas Paulista e 23 de Maio.

A escassez de propaganda atingiu até mesmo os negócios do setor gráfico. A Abigraf (Associação Brasileira da Indústria Gráfica) reviu para baixo a expectativa de crescimento no faturamento, por conta das eleições, de 3% para 1,5% em 2006 -o incremento previsto é de cerca de US$ 150 milhões. A queda só não foi maior porque a aposta é que, com a proibição de showmícios e outdoors, os recursos sejam redirecionados para confecção de material personalizado, como panfletos.

‘Clean’

O cenário mais ‘clean’ pode ser, em parte, atribuído à minirreforma eleitoral (lei 11.300/ 2006), aprovada em maio e regulamentada pelo TSE (Tribunal Superior Eleitoral). A regra veta veiculação de propaganda de qualquer natureza em bens públicos como postes e viadutos, sob pena de multa de R$ 2.000 a R$ 8.000. A legislação permite, porém, fixação de faixas, adesivos e placas de até 4 m2 em propriedade particular. Os partidos relatam que já há eleitores cedendo seus muros à campanha.

Francisco Campos, assessor de comunicação do PT, afirma que, neste ano, a campanha será apoiada na panfletagem e na militância, além de concentração no rádio e na TV.

Paulo Cerciari, um dos coordenadores da campanha tucana em São Paulo, diz que o partido dará mais peso à propaganda na TV e que a prioridade, no momento, é inaugurar os diretórios regionais.

Algumas das restrições da lei, como a outdoors, beneficiaram partidos com menos recursos, na opinião do deputado Babá (RJ), um dos fundadores do PSOL. O partido aposta na militância para conseguir votos. Rubem Fonseca Filho, da coordenação da campanha do PDT, concorda: ‘Achamos ótimo isso [a nova legislação], porque os candidatos maiores levavam uma vantagem enorme’.

Em 2002, as ruas já tinham material de campanha de Lula desde o início de julho. Na segunda metade do mês, o comitê de José Serra havia espalhado 2.100 outdoors por 30 grandes centros urbanos do país, ao custo de cerca de R$ 875 mil por quinzena -período para renovação de contratos com as empresas de propaganda.’



FSP CONTESTADA
Painel do Leitor

Fidel

‘‘Não têm a menor procedência as informações publicadas ontem na Folha de S. Paulo sob o título ‘Cubanos disseram a Lula que Fidel tem câncer’ (Primeira Página). O presidente da República, que acompanha a situação do presidente cubano por meio do Ministério das Relações Exteriores, em nenhum momento foi informado por autoridades cubanas, ou quaisquer outras, sobre o suposto diagnóstico referido no jornal.’

ANDRÉ SINGER , secretário de imprensa e porta-voz da Presidência da República (Brasília, DF)

Resposta do jornalista Kennedy Alencar: As informações da reportagem foram apuradas com auxiliares diretos do presidente Luiz Inácio Lula da Silva.’



GUERRA NO LÍBANO
David Gardner

Verdadeira raiz do conflito foi negligenciada pelos EUA

‘DO ‘FINANCIAL TIMES’ – Nas últimas semanas, o presidente George W. Bush e sua secretária de Estado, Condoleezza Rice, justificaram sua pouca disposição em exigir um cessar-fogo imediato no Líbano citando a necessidade de se lidar com ‘as raízes do problema’. Vamos levá-los a sério, retirar a poeira que recobre o assunto e examinar as tais raízes com cuidado. Como disse Brent Scowcroft, que foi assessor de segurança nacional do presidente George H.W. Bush, é preciso enfatizar que ‘o Hizbollah não é a fonte do problema. É um derivativo da causa, que é o conflito trágico em torno da Palestina que teve início em 1948’. De fato, o Hizbollah foi incubado em conseqüência da invasão israelense do Líbano em 1982, cujo objetivo era destruir a Organização para a Libertação da Palestina. Suas parteiras podem ter sido a Síria e o Irã, mas seus pais foram Israel e um EUA que se negaram a frear seu aliado antes de ele ter quase arrasado a zona muçulmana de Beirute. As repetidas tentativas de Israel desde então para esmagar o Hizbollah fracassaram. Em lugar disso, o elevou ao ápice de seu prestígio no Líbano e no mundo árabe. O Hizbollah, assim como o Hamas e seus aliados na outra frente de Israel, é uma organização que nasceu de um conflito não resolvido. A causa original desse conflito é a disputa entre árabes e judeus em torno de como (ou se) compartilhar a Terra Santa.

Estado palestino

O fracasso em buscar uma resolução desse conflito constitui uma abdicação de responsabilidade, especialmente em relação às gerações futuras. Ademais, não existe mistério nenhum em torno das linhas gerais que tal solução deveria ter. A solução consiste nos parâmetros apresentados pelo presidente Bill Clinton e em conversações entre israelenses e palestinos realizadas em Taba, no Egito, após o fracasso das negociações de Camp David em 2000; no subseqüente, mas informal, acordo de Genebra; e no endosso de seus pontos essenciais pela Liga Árabe em Beirute, em 2002. A iniciativa de paz de Beirute pede o pleno reconhecimento árabe de Israel em troca da retirada israelense dos territórios ocupados na Guerra dos Seis Dias, de 1967. Isso significa, sobretudo, um Estado palestino em quase toda a Cisjordânia e a Faixa de Gaza, tendo Jerusalém oriental, árabe, como sua capital, e algo que o plano de paz árabe descreve como uma ‘solução justa’, o pagamento de compensações à maioria dos refugiados palestinos, em lugar do direito de retorno. Como fórmula para pôr fim ao conflito, isso ainda não foi tentado. Os acordos de Oslo, de 1993-95, apontavam nessa direção. Mas eles expiraram antes de sua morte ser decretada. Foram mortos principalmente pela crença de Israel de que podia continuar a erguer assentamentos em terras árabes sem sofrer qualquer reação dos palestinos.

Assentamentos

Ademais, a maior expansão desses assentamentos ilegais se deu na época áurea do processo de paz. Sob os governos trabalhistas de Yitzhak Rabin e Shimon Peres, em 1992-96, o número de colonos israelenses na Faixa de Gaza aumentou em 50%, quatro vezes o crescimento populacional em Israel. Jerusalém oriental foi cercada por quatro grandes blocos de assentamentos. O outro vilão de Oslo, é claro, foi Iasser Arafat. Tão ansioso estava o líder da OLP em assumir as aparências e os privilégios de um Estado, e tão incompetente era na criação de um Estado, que a principal tática empregada por Israel durante as negociações de Oslo era, como me contou um participante israelense, conseguir falar com ele a sós. Depois, Arafat se sentiu enganado e essa foi uma das razões pelas quais manteve a opção da ‘luta armada’ tão perigosamente à mão.

Mapa de Sharon

Os líderes árabes de modo geral favoreceram essa situação. Ela justifica os poderes de emergência através dos quais eles exercitam seu despotismo. Enquanto isso, os EUA, única potência com o poder de pôr fim ao impasse, vêm se negando a fazê-lo. Uma década atrás, o ex-secretário de Estado James Baker lamentou que ‘passamos de qualificar os assentamentos de ilegais, durante o governo Carter, para descrevê-los como obstáculos à paz, nos governos Reagan e George H.W. Bush, e agora [sob o presidente Clinton] dizemos que eles são fatores complicadores’. O atual Bush foi muito mais longe, autorizando a recaptura de território palestino feita por Ariel Sharon em 2002, apoiando a construção da chamada barreira de segurança em território da Cisjordânia e, em 2004, endossando o objetivo israelense de anexar os assentamentos que separam Jerusalém oriental das áreas palestinas vinculadas a ela. Tudo está pronto para o atual primeiro-ministro, Ehud Olmert, fixar as fronteiras de Israel nos lugares onde Sharon decidiu que ficariam, no mapa que desenhou em 1982. A idéia é deixar aos palestinos cerca de um décimo do que era a Palestina, separado em três bantustões. Isso nunca iria funcionar. Agora é possível que nem sequer seja tentado. Nenhum árabe ou muçulmano o aceitaria. Mas muitos israelenses que antes o apoiavam já deixaram de fazê-lo. Sermos atacados desde territórios que Israel deixou, eles raciocinam, significa que este conflito já não diz respeito à terra, mas é existencial: o Hamas e o Hizbollah querem nos destruir. É possível. Mas, com certeza, o que conferiu a essas organizações poder e prestígio que ultrapassam de longe sua base de apoio natural é o catálogo de fracassos que tem em seu cerne a ausência de uma tentativa honesta de buscar um acordo abrangente baseado na troca de terra por paz.

Tradução de CLARA ALLAIN’



TELEVISÃO
Daniel Castro

Série do ‘Fantástico’ ensina a envelhecer

‘Depois de tratar de obesidade, cigarro, gravidez, contracepção e primeiros socorros, o médico, escritor e colunista da Folha Drauzio Varella estréia em setembro sua sexta série no ‘Fantástico’. Desta vez, Varella, 63, abordará em 12 episódios o envelhecimento.

‘A faixa de população que mais cresce no Brasil é a que tem mais de 60 anos. Já são 17 milhões de brasileiros. No Rio de Janeiro, de cada grupo de quatro pessoas que morre, uma tem mais de 80’, justifica.

Para Varella, já é questionável o conceito de que a terceira idade começa aos 60: graças à medicina, ‘a imagem do velho de pijama’ está dando lugar a idosos ativos, que empurram a morbidez para depois dos 85.

Assim, a nova série não só falará dos cuidados que quem tem mais de 60 deve tomar para se manter saudável, como também dará dicas aos mais ‘jovens’ para passar dos 80. O tom de toda a série será ‘como envelhecer com saúde’.

‘Estou convencido de que o que faz a diferença é a atividade física’, diz Varella, que não freqüenta academias, mas corre de 40 km a 50 km por semana e defende que as pessoas caminhem e subam escadas como práticas de exercícios físicos.

O quadro do ‘Fantástico’ também falará de problemas comuns aos idosos, como diabetes, perda de memória, depressão e quedas. E apresentará uma mulher de 76 anos que trabalha como caminhoneira.

NOVELA DE ÉPOCA 1A atriz Graziela Moretto, que trabalhou em ‘Os Normais’ e nos últimos capítulos de ‘Belíssima’, está confirmada no elenco de ‘Paixões Proibidas’, novela ambientada no século 19 que a Band fará em parceria com uma rede portuguesa.

NOVELA DE ÉPOCA 2Além de Graziela, a produção terá Celso Frateschi e Antonio Grassi. Outro que negocia com a emissora é Eron do Carmo, que fez o peão Zeca de ‘América’ _aquele que não protagonizou o primeiro beijo gay da Globo com Bruno Gagliasso.

NOVA SAFRAA Globo realizará nos dias 14, 15 e 16 seu encontro anual de criação, que reunirá quase todos os roteiristas e diretores da emissora. Lá, serão discutidos novos programas.

VELHO CENÁRIOMárcio Garcia deverá finalmente fazer sua primeira novela na Record (e não apenas uma ponta, como em ‘Prova de Amor’). A direção da rede o quer com um papel central na trama que sucederá ‘Cidadão Brasileiro’, em novembro.

SALTO TEMPORALA novela ‘Páginas da Vida’ dará um salto no tempo daqui a duas semanas. Passará de 2001 para 2006, mas no meio haverá uma cena ambientada em 2003, a do casamento de Carmem (Natália do Valle) com Greg (José Mayer).

CLICHÊ TROPICALTem gente na Globo contra o título da próxima novela das oito, ‘Paraíso Tropical’. Essa turma acha o nome muito clichê. Prefere ‘Copacabana’, que era o ‘nome de trabalho’.’

Laura Mattos

Série investe na experiência das mães

‘Na vida real, partos não são cor-de-rosa, mas cheios de gosmas nojentas e malcheirosas, dignos dos mais assustadores episódios do ‘Plantão Médico’. E aquelas regras ‘infalíveis’ da babá da série ‘Supernanny’ nem sempre funcionam.

Na contramão do ‘boom’ de programas de nascimentos emocionantes, bebês fofos ou de ‘auto-ajuda’ para pais desesperados, o GNT lança no próximo dia 19 ‘Mothern’, seu primeiro seriado brasileiro.

Espécie de ‘Sex and the City’ com mães, conta a história de quatro mulheres modernas e bem-sucedidas na profissão que têm de conciliar a vida descolada com fraldas, choradeira e vovós palpiteiras. Em diálogos sem rodeios, as amigas falam da barriga que não vai embora logo que o bebê nasce, gases, seios que diminuem e celulite que aumenta…

Mesmo antes da estréia, ‘Mothern’ já é um fenômeno. Começou em 2002 como um despretensioso blog (http://mothern.blogspot.com) de duas publicitárias mineiras que tinham filhos pequenos. ‘Bombou’ na internet com o boca-a-boca e em poucos meses se transformou em coluna na revista ‘TPM’. Em 2005, foi lançado o livro ‘Mothern – Manual da Mãe Moderna’, que ganha sua terceira edição.

Diretor da série do GNT, Luca Paiva Mello -pai de um menino de três anos e gêmeos de três meses- conheceu o blog e resolveu levá-lo à TV. ‘A idéia é fazer uma contraposição a esses programas que valorizam o agente externo à maternidade. É dizer à telespectadora: ‘Você é mãe, confie no seu taco’.’

As criadoras do blog venderam os direitos de ‘Mothern’ e se tornaram consultoras da série, que traz em seus diálogos grande parte do criativo texto da dupla (veja trechos acima).

Laura Guimarães e Juliana Sampaio defendem que a protagonista de programas de maternidade deve ser a mãe, e não um especialista, como é o caso do ‘Supernanny’. ‘É muito fácil falar: ‘Deixe o bebê chorar por cinco minutos’. O quê?! Você tem noção do que é uma criança chorando no seu ouvido por cinco minutos?! A diferença do ‘Mothern’ é que a mãe não fica apenas absorvendo conselhos que vêm de fora’, diz Juliana, 35, redatora de uma agência de publicidade de Belo Horizonte e mãe de Alice, 6.

‘Para falar sobre maternidade, a TV costuma colocar nutricionista, pediatra, psicólogo, pedagogo. Pode ser homem e não precisa nem ter filho. A palavra quase nunca é da mãe.’

Laura dá um exemplo do ‘saber de mãe’ x ‘ciência’: ‘Um nutricionista nunca vai falar da Festa da Barriga, por exemplo’.

Festa do quê? ‘É um método que criei para fazer as crianças comerem legumes. Na barriga há uma festa, e todos precisam ser engolidos para entrar. A mãe diz a cada garfada: ‘Brócolis, que bom que veio’! [risos]’, explica Laura, 35, mãe de Gabriela, 7, e Nina, 10, e professora de comunicação da UFMG.

Será que a Supernanny aprovaria ou iria preferir pôr o pequeno no ‘banco do castigo’?

Baladas

Além de contar ‘toda a verdade’ sobre a maternidade e compartilhar esse tipo de dica, elas pretendiam mostrar que mães têm interesses além de seus rebentos. ‘Na mídia, a mulher que teve filho costuma ser tratada como doninha, como se só esse assunto fosse do interesse dela. Nós falamos da mãe que quer ir ao show bacana, mas tem de voltar cedo para amamentar’, conta Juliana.

‘Sabe a mãe com batinha xadrez amarela? Queríamos quebrar o mito da mãe perfeita, de que só o fato de ter filho já a faz realizada. Mas, é claro, também falamos do lado ternurinha da maternidade’, diz Laura.

Afinal, como diz o blog, ‘o paraíso onde a mãe padece não é um lugar muito limpinho’, mas não deixa de ser o paraíso.

NA INTERNET – Responda a teste e veja se você é uma mãe moderna

www.folha.com.br/062151′



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BabyFirst TV, canal dos EUA para bebês, estréia no Brasil

‘O BabyFirst TV, um canal norte-americano 24 horas destinado a bebês de seis meses a três anos, terá parte de sua programação transmitida no Brasil pelo Fox Life (Net digital).

A Fox ainda acerta os últimos detalhes para divulgar oficialmente o acordo. Serão três horas diárias, provavelmente no horário da manhã, e outubro, mês do Dia das Crianças, deve ser escolhido para a estréia.

O BabyFirst TV entrou no ar nos Estados Unidos em maio deste ano e é inspirado no Baby TV, lançado há três anos em Israel e distribuído ao Canadá e a países da Europa, Ásia e do Oriente Médio. Os dois canais são polêmicos, assim como é controversa a enxurrada de DVDs especialmente voltados a bebês que chega ao mercado.

Alguns especialistas defendem que não é saudável expor crianças tão pequenas à televisão. Já os produtores afirmam que o conteúdo é educativo e colabora no desenvolvimento.

Para mães

Com o sucesso de audiência, programas para gestantes e mães recentes ganham cada vez mais espaço na TV por assinatura. O Discovery Home & Health é o que tem o maior número de séries com o tema.

O canal leva ao ar em setembro o ‘Mês do Bebê’, com séries como ‘A Chegada do Bebê’, ‘Central de Bebês’, ‘Mãe Modelo’, ‘Vida de Mãe’ e ‘Família Encomendada’.

No estilo ‘Supernanny’, há o ‘S.O.S. Babá’, ‘Anjinhos’ e ‘Anjoadolescentes’, este último para teens problemáticos.

São exibidos ainda ‘Histórias de Adoção’ e ‘Maternidade’, com os momentos mais dramáticos do trabalho de parto em maternidades dos EUA.’



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‘Superbabá’ vira best-seller e chega ao Brasil

‘Controvérsias à parte, o sucesso de ‘Supernanny’ na TV virou best-seller. O livro da famosa babá Jo Frost, que já vendeu 500 mil exemplares nos Estados Unidos e na Inglaterra, chega ao Brasil pela editora Seoman (240 págs.; R$ 32).

‘Superbabá – Como Tornar Seu Filho a Melhor Criança que Ele Pode Ser’ traz a mesma filosofia de disciplina do programa. Na linha de outros livros de auto-ajuda, apresenta listas batizadas de ‘Minhas 10 Regras de Ouro’, para que os pais lidem com o sono, a alimentação e até a troca de roupa dos filhos.

Na introdução, Frost conta que costuma ser questionada por não ter filhos e diz que seus métodos são eficientes pela experiência de 15 anos como babá e justamente porque não tem com as crianças ‘o intenso apego emocional dos pais’. ‘Apesar de nós, babás, também termos sentimentos’, ameniza.

No Brasil, o programa volta ao GNT em agosto e setembro, com a reapresentação das duas primeiras temporadas. Em outubro, mês do Dia das Crianças, estréia a terceira, ainda inédita.

No SBT, até a reapresentação da primeira temporada da versão brasileira, comandada por Cris Poli, vai bem no Ibope.’



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Justus alfineta ex-sócio e Galisteu em biografia

‘Roberto Justus, que volta à televisão nesta noite com ‘O Aprendiz 3’, é o verdadeiro ‘merchand’ -termo que big brothers inventaram para quem adora se promover.

O publicitário aproveitou o lançamento do ‘reality show’ da Record à imprensa para fazer merchandising do livro que lançará amanhã. E carregou de pimenta a propaganda: ‘Tem um capítulo em que falo como o meu relacionamento com pessoas famosas ajudou ou atrapalhou minha vida profissional’.

Ele se referia aos romances com duas apresentadoras loiras que tornaram o seu topete grisalho famoso no universo das celebridades: o casamento-relâmpago com Adriane Galisteu e o namoro com Eliana.

O babado é mesmo forte em ‘Construindo uma Vida – Trajetória Profissional, Negócios e ‘O Aprendiz’ (ed. Larousse do Brasil, 232 págs., R$ 29,90). Além de comparar Adriane com Eliana -e não esconder sua preferência pela segunda-, trata o ex-sócio, o publicitário Eduardo Fischer, como se estivesse na sala onde demite os candidatos do programa.

Justus entrou no mercado publicitário ao se associar a Fischer, na década de 80. A sociedade acabou no final dos anos 90, de forma nada amigável. Sobre o episódio, Justus afirma no livro: ‘Lembro até hoje da última frase do Eduardo Fischer, depois de meses de negociações terríveis e desgastantes. ‘Agora que vamos competir no mercado, eu vou te destruir’, ele disse. O tempo se incumbiu de dar a resposta’.

Justus também fala que Fischer tinha fama de ‘irresponsabilidade, tagarelice e leviandade’. Procurado pela Folha, o proprietário da Fischer America rebateu: ‘As declarações são tão absurdas e patéticas que eu nem vou comentar, meus advogados responderão por mim. Mas acho uma pena que ele ainda precise de mim e de outras pessoas que passaram pela vida dele para se promover’.

À Folha, Justus diz que as frases a respeito do ex-sócio ‘não podem ser tiradas do contexto’. ‘Em muitos momentos, eu o elogiei também. Mas é claro que temos grandes diferenças no estilo de trabalho’ (num trecho, conta que ‘o grande mérito’ numa importante apresentação da empresa a um cliente foi de Fischer).

Afirma também que não poderia ter sido ‘politicamente correto’ num livro como esse: ‘O leitor quer saber o que a gente pensa e tive que ser sincero, mesmo correndo o risco de ferir um ego ou outro’.

E se preocupa: ‘Mas a reportagem não é sobre isso, né? Esse não é o foco do livro’. ‘Construindo uma Vida’ tem pinta de auto-ajuda empresarial, como o de Donald Trump (criador de ‘O Aprendiz’), e agrega pitadas da vida pessoal e bastidores das duas primeiras temporadas do ‘reality show’.

Com as ex-mulheres famosas, Justus pegou mais leve. ‘Minha vida com Eliana era bem mais próxima do normal que a com a Adriane -que é muito menos regrada, muito mais diferente de mim e com hábitos muito mais distantes dos meus (muitas vezes ela costumava jantar, por exemplo, às três, quatro da madrugada- horário em que eu já estou dormindo faz tempo).’ À Folha, Nelson Sacho, assessor de Adriane, disse que não ‘era o caso de ela comentar’.

No mesmo capítulo, afirma ter tido dificuldade para se adaptar aos holofotes que cercavam sua relação com as apresentadoras, mas admite vantagens: ‘O nome de alguém mais conhecido costuma abrir portas com mais facilidade -se pedia para alguma secretária fazer contato com o diretor de marketing da empresa, podia perceber que certo encantamento cercava meu nome. Toda essa notoriedade acabou me tornando uma pessoa instantaneamente bem-vinda em praticamente todos os lugares a que fosse. Não é desagradável’.

‘O Aprendiz 3’

Desta vez, ‘O Aprendiz’ concorrerá com o ‘Fantástico’ e terá outra edição às terças. O prêmio é um contrato de R$ 500 mil por um ano, com emprego em Nova York. Justus anunciou que será seu último ‘Aprendiz’, mas não o último programa de TV. Aguardem novos passos do ‘merchand’.’

Antônio Gois e Cristina Tardáguila

Brasil arcaico estranha TV moderna

‘A vida que passa nas novelas da Globo é mais moderna do que a real. Em muitos aspectos, o cotidiano retratado na televisão se mostra mais avançado em relação a alguns temas tabus do que a média da população brasileira.

No mundo real, pesquisas de opinião mostram uma rejeição alta da população brasileira, especialmente masculina, aos homossexuais. No mundo das novelas, várias produções nos últimos dez anos abordaram, com maior ou menor abertura, o tema. Quase sempre, os personagens gays terminavam bem aceitos e com um final feliz, ainda que, para não chocar a audiência, as demonstrações de afeto nunca ultrapassassem a barreira do beijo.

A atual novela das oito, ‘Páginas da Vida’, não fugiu à regra das polêmicas recentes. O primeiro protesto de parte dos telespectadores surgiu logo na semana inicial, quando a personagem interpretada por Ana Paula Arósio apareceu nua numa cena de striptease. Dias depois, a novela voltaria a ser comentada por causa do depoimento de uma mulher de 68 anos sobre masturbação.

Para especialistas ouvidos pela Folha, há uma distância cultural entre aqueles que produzem novela e os que as assistem. No entanto, como esse é um produto de massa, eles apontam que há sempre um limite até o qual se pode ir.

A vice-coordenadora do núcleo de telenovelas da USP e professora da Escola de Comunicação e Artes (ECA), Maria Lourdes Motter, diz que essa diferença sempre existiu e deve continuar existindo, mas que é preciso achar o ponto de equilíbrio: ‘É preciso sempre produzir algo novo, mas mantendo uma parte conhecida para que você não afugente as pessoas pela falta de compreensão. A indústria cultural prevê a existência de um pêndulo entre a conservação e a mudança. Os artistas têm que conservar e inovar ao mesmo tempo’.

Final feliz

O cientista político Alberto Almeida, autor de uma pesquisa de opinião que comparou vários hábitos e comportamentos do brasileiro por nível de escolaridade, diz que as polêmicas recentes em novelas são um reflexo do que ele chamou, em sua pesquisa, de choque entre o Brasil arcaico e o moderno. Ele concorda, no entanto, que a novela acaba conciliando, no final, o interesse de todos.

‘O final das novelas sempre reflete uma visão conservadora de felicidade, com casamentos e uniões, o que em geral é uma preferência bem sedimentada da classe baixa. Se o final refletisse a elite escolarizada do Rio e de São Paulo, teria separações e pessoas refazendo suas vidas. Assim, em alguma medida, a novela concilia os dois conjuntos de valores. Mas certamente a classe baixa não é atendida quando se trata de moralidade sexual’, diz Almeida.

Para o dramaturgo Rubens Rewald, que integra o Nudrama (Núcleo de Pesquisa em Dramaturgia Audiovisual da USP), é muito difícil dizer até que ponto a novela reflete a realidade ou indica novos caminhos para ela: ‘Uma obra é sempre fruto de um meio, de uma época. E, por mais ficção que seja, reflete uma questão aparente ou sublimada na sociedade. As obras de arte, e dentro delas as novelas, sempre dialogam com seu tempo’.

Rewald diz que o que se vê nas novelas são espelhos da sociedade urbana, mas destaca que, mais do que indicar modelos de comportamento, elas acabam gerando discussões sobre esses modelos.

Para o dramaturgo, no entanto, o público de novela no Brasil ainda é muito conservador e faz com que a televisão seja conservadora também.

Intenção

Na opinião da demógrafa Paula Miranda Ribeiro, do Cedeplar (Centro de Desenvolvimento e Planejamento Regional), da UFMG, a Rede Globo tem consciência do papel indutor que as novelas podem ter em relação a alguns temas. Isso fica claro, segundo ela, quando a novela faz merchandising social e inclui, muitas vezes a pedido da rede, temas como dependência química, leucemia ou deficiência nas tramas de novela.

Ribeiro diz não acreditar, no entanto, que as polêmicas relacionadas a sexualidade apareçam por causa de uma orientação da emissora. Para ela, trata-se muito mais de uma iniciativa dos autores.

O escritor Gilberto Braga confirma a tese. ‘Nunca tive notícia de que a emissora pedisse para incluir personagens gays, por exemplo. Quem propõe é o autor, às vezes com o objetivo de contribuir para a discussão sobre preconceito, salvo em algumas novelas em que esses personagens eram mostrados para fazer graça’, diz o autor.’



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Novela ajuda na secularização da sociedade

‘A TV, apesar de sua superficialidade, é um importante meio de informação para populações menos escolarizadas. É por meio dela que alguns assuntos, pouco presentes no cotidiano de alguns, são comentados. Ela tem também contribuído para um processo de secularização da sociedade brasileira, mas sua influência é limitada por filtros individuais e é mais visível quando se trata de valores mais voláteis ou efêmeros.

Essas foram algumas das conclusões de um estudo realizado durante a exibição da novela ‘O Rei do Gado’ (1996). Por meio de entrevistas e grupos de discussão realizados pelo Centro de Desenvolvimento e Planejamento Regional da UFMG em três localidades do Brasil -uma favela em São Paulo, uma cidade do interior do Rio Grande do Norte e um município do interior de Minas-, foi possível identificar nos telespectadores de que maneira as mensagens da TV influenciavam seu cotidiano.

A pesquisa mostrou que determinados assuntos são comentados principalmente por causa da TV. Foi perguntado, por exemplo, se os moradores já tinham ouvido falar de homossexualidade. Entre os que responderam sim, a principal fonte apontada foi a TV. Isso não significa que os valores sejam afetados de forma imediata.

‘A TV tem impacto imediato em atitudes e opiniões mais efêmeras, como opiniões sobre vestuário, gírias, bijuterias, músicas etc. Isso atinge uma grande massa, mas é muito volátil e pouco duradouro. Na área de valores e comportamentos, o impacto é menos direto’, diz Eduardo Rios-Neto, um dos autores da pesquisa.

Outras realidades

Rios-Neto explica que boa parte da influência da TV é no sentido de dar conhecimento sobre situações pouco presentes no cotidiano de alguns. ‘As pessoas de uma determinada área, principalmente aquelas de baixa escolaridade, aprendem com as tramas mostradas na TV, ‘scripts’ de como é o mundo dos outros -ricos ou gente das grandes cidades. Estas informações servem de repertório para que eles se posicionem diante de situações externas’.

Paula Miranda-Ribeiro, que também participou da pesquisa, acrescenta que a audiência não é passiva. ‘Todos assistem ao mesmo programa, mas cada telespectador decodifica a mensagem de acordo com a sua bagagem.’

Para Rios-Neto, o apelo ao consumo e ao hedonismo presente na TV tem um papel transformador ao enfatizar a autonomia individual. ‘O romantismo e a fantasia são libertadores porque permitem o sonho, e no sonho você transgride. Muitos intelectuais consideram o pop e o kitsch como elementos alienantes das massas, mas outros, nos quais me incluo, consideram que este prazer aparentemente grotesco é democrático e transformador. Esse sonho permite quebra de tabus, como os da religiosidade e sexualidade.’’



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Escolaridade define valores morais, segundo pesquisa

‘A distância entre o Brasil moderno e o arcaico foi pesquisada pelo cientista político Alberto Almeida na Pesquisa Social Brasileira. Ao comparar respostas de brasileiros com nível superior de escolaridade com os demais, Almeida verificou que os mais escolarizados têm visões radicalmente opostas em relação a temas como a sexualidade, o papel do Estado e os valores éticos e morais.

Para 81% dos brasileiros que completaram somente até a quarta série do ensino fundamental, a masturbação feminina não é bem aceita. Essa porcentagem cai para 23% quando se trata de brasileiros com nível superior. Entre os menos escolarizados, 45% concordam com a idéia de que o governo censure programas de TV que façam críticas a ele. Entre os com nível superior, 8%.

Na opinião de Almeida, o Brasil caminha lentamente para uma sociedade mais moderna e a TV tem um papel nesta transformação, ainda que o principal fator de mudança seja o aumento da escolaridade.’

Bia Abramo

‘Bicho’ faz dramaturgia de resultados

‘A RECORD está botando para quebrar na guerra das novelas. Contrariando a pudicícia evangélica, ‘Bicho do Mato’ tem como principal (e talvez única) atração a nudez de André Bankoff. De tanto aparecer sem roupa, o moço loiro, alto e forte que faz Juba tornou-se campeão de cartas da emissora.

A verdadeira operação de guerra montada pela Record para ameaçar a liderança da Globo não tem tido trégua. Observando o modelo da concorrente, a Record vai testando os elementos um a um e, com isso, fazendo uma dramaturgia de resultados muito eficiente, mas também seca, descarnada.

Se o segredo é tratar o Brasil com realismo, que se faça uma novela com violência urbana a rodo, como foi ‘Prova de Amor’. Se é para ter nudez, que se invente uma trama em que seja natural que os corpos apareçam despidos, como nos tempos primitivos. Que tal índios?

De quebra, que se estabeleça uma ponte com outra experiência bem-sucedida de concorrência, a lendária ‘Pantanal’, de Benedito Ruy Barbosa. E não se deve deixar despercebidas as coincidências com ‘Uga-Uga’, novela de Carlos Lombardi que também tinha um loiro-índio e apimentou o horário das sete com homens de peito e bunda à mostra.

É evidente que essas referências fazem parte de uma estratégia muito cuidadosa, que retoma cada elemento de acerto ou sucesso numa nova combinação. O diabo é que isso pode resultar em novelas com boa audiência, mas dificilmente fará com que o canal crie um estilo próprio.

Nem é preciso voltar à concorrência para entender a diferença -mesmo porque a Globo também anda abusando das estratégias em detrimento das narrativas. O contraste fica até mais evidente comparando ‘Bicho do Mato’ e ‘Cidadão Brasileiro’. Mesmo com alguns tropeços e uma ambição questionável de contar a trajetória moral de um brasileiro comum nos últimos 40 anos, a história está mais liberta da aplicação mecânica de fórmulas, mais solta para falar à emoção.

Por que é disso também que se trata, de criar algum tipo de ficção que não se contente com o impacto e a impressão imediatos e permaneça um pouquinho que seja na imaginação do espectador, permitindo algum nível de fantasia.

A Globo, nos anos 70, fez isso ousando contrariar alguns cânones; hoje em dia, vez por outra, relembra-se de seu passado. A Record, por sua vez, não vai chegar lá se continuar tão preocupada com os números e navegando em águas conhecidas.’



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