Friday, 29 de March de 2024 ISSN 1519-7670 - Ano 24 - nº 1281

Idioma cresce e mexicanos lêem pouco

Divulgados no mesmo dia na Espanha e no México, sem uma estreita relação direta, os números e conclusões dão, tomadas certas liberdades comparativas e contrastantes, uma idéia dos rumos futuros da língua espanhola e os frágeis hábitos de leitura na região latino-americana, com ênfase no México: enquanto o espanhol segue crescendo no mundo, já ocupando o terceiro lugar depois do inglês e do chinês mandarim, a média anual de livros lidos pelos mexicanos continua baixa – 2,9 por pessoa. Bem inferior portanto ao índice recomendado pela Unesco, de 25 volumes por ano, e muito longe de países como Japão, Noruega, Finlândia e Canadá, onde se lêem 47 livros por ano, em média.

Incomodadas pelas conclusões de um estudo anterior da Unesco, que conferia ao país o índice de 1,5 livro por ano, as autoridades culturais mexicanas fizeram sua própria pesquisa, em nível nacional, tarefa há pouco concluída pela respeitável Unam – Universidad Nacional Autónoma de México. O resultado melhorou um pouco, é verdade, mas, reconhece o governo, ainda é insatisfatório esse índice de 2,9 livros por ano. Números tampouco compatíveis com os esforços do programa ‘Hacia um País de Lectores’, criado pelo governo atual, do presidente Vicente Fox.

Algumas informações do estudo da Unam revelam dados curiosos e também inquietantes: quatro de dez adolescentes, maiores de 12 anos, nunca entraram numa livraria; os livros mais lidos são os escolares, algo de literatura em geral e obras sobre carreiras profissionais. Preferem, no lugar dos livros, ler revistas, principalmente as de fofocas televisivas e as femininas. Lêem também jornais, preferência para os esportivos, e, com avidez, histórias em quadrinhos, entre elas as cômicas e as pornográficas.

Para os especialistas do ramo, esse pobre panorama se deve aos fatores de sempre, bem conhecidos na América Latina: distribuição desigual de renda (preço proibitivo do livro, por exemplo), políticas educativas deficientes, fechamento crescente de livrarias, má conservação de bibliotecas públicas, falta de tempo ocioso para a leitura (é preciso dar duro no dia-a-dia), domínio da internet e seus encantos gráfico-visuais. Ácidos abacaxis agora entregues ao novo presidente, Felipe Calderón, que a um mês da posse, em 1º de dezembro, ainda não nomeou os dois ministros encarregados da área – o da Educação e o da Cultura.

Saber escrever

Mas, por outro lado, nem tudo vai tão bem na área do idioma espanhol. Embora a língua avance de forma notável – calcula-se que 5,5% dos habitantes do mundo falem o idioma, dado significativo considerando que 96% das línguas são faladas por só 4% da humanidade – as publicações no setor de ciências e tecnologia representam somente 0,5% em nível mundial. E esse número pode baixar ainda mais, avisam alarmadas as autoridades lingüísticas de Madri.

Adverte o lingüista Víctor García de la Concha, diretor da Real Academia Española (RAE):

‘O espanhol está hoje diante do desafio de se converter numa língua de comunicação internacional, mas só se for capaz de superar suas duas fraquezas: ciência e tecnologia.’

Essas constatações contudo não desanimam as mesmas autoridades lingüísticas espanholas, que não param de produzir livros sobre o bom e correto uso do idioma e promover a difusão desse material didático ao redor do mundo, sobretudo nos Estados Unidos e, também, futuramente, no Brasil, onde o idioma é agora obrigatório no segundo ciclo.

O Instituto Cervantes acaba de anunciar a publicação do livro Saber Escribir (Aguilar, Madri, 2006), que, segundo o coordenador da obra, Jesús Sánchez Lobato, não é…

‘…um manual de estilo, nem de criação literária, nem de correção idiomática, tampouco um dicionário para tirar dúvidas. É tudo isso, e muito mais… É também um livro dirigido tanto a estudantes como a professores, que pretende ensinar a escrever de todos os ângulos da escrita’.

Acrescenta o diretor do Instituto Cervantes, César Antonio Molina:

‘É um erro pensar que uma língua se conhece só porque se fala. Um idioma não se conhece bem até que não se saiba escrever bem, e essas duas coisas é o que fazemos no Instituto Cervantes, em várias partes do mundo’.

De acordo com as tendências modernas da comunicação, o livro traz, no último capítulo, textos e instruções sobre as novas tecnologias – as páginas web, os blogs, os e-mails e as mensagens nos telefones celulares (72 milhões de hispânicos têm acesso à internet). Nessas páginas, o leitor pode aprender a mandar e decifrar uma mensagem abreviada através de seu celular.

******

Jornalista e escritor radicado na Cidade do México