Friday, 26 de April de 2024 ISSN 1519-7670 - Ano 24 - nº 1285

Laranjas e fantasmas

À medida que as investigações avançam, documentos são apreendidos e a imprensa cumprindo sua democrática e vital finalidade útil de informar a sociedade sobre os escândalos de desvios havidos na Assembleia Legislativa do Pará, o povo tem a concreta noção de que hoje a nação brasileira, em relação ao que é público, transformou-se em podre maçã, cujo micróbio da corrupção a deteriorou amplamente e, ao que tudo indica, integralmente.

Não faz muito tempo, na mesa de sinuca da roubalheira nacional descarada, a bola da vez era o INSS. Dia após dia, estourava a descoberta e queda de uma quadrilha roubando os cofres previdenciários, tendo como ícone delas todas aquela comandada pela Georgina. As fortunas roubadas não retornaram ao caixa do Instituto e há muito o órgão vive, segundo os “bambas” que o administram, no fio da navalha.

Hoje, a bola sete são as assembleias legislativas, executivos – quer municipal ou estadual – e a Alepa daqui do nosso Estado, lamentável e infelizmente, ocupa a condenável situação de destaque sob a mira do taco dos órgãos de segurança e investigação, da qual em termos de milhões subtraídos, da quantidade de laranjas e “fantasmas” e mui especifica e estranhamente mutismo ou autismo de 30 parlamentares que lá têm assentos, os quais agem como se um céu de brigadeiro pairasse sobre o poder legislativo tucupi e, portanto, nada de anormal houve ou está ocorrendo.

Nenhum deslize

Quando viramos os olhos para Brasília, testemunhamos quase a integralidade do Congresso Nacional atuando como escudo, em defesa ou costurando o cobertor do abafa em proteção do ministro da Casa Civil, Antonio Palocci, já com passado borrado ao invadir o sigilo bancário do caseiro Francenildo na Caixa Econômica e hoje envolto em explicar quem lhe pagou 20 milhões de reais – valor até aqui admitido – por consultorias prestadas enquanto desempenhava o mandato de deputado federal e simultaneamente de coordenador da campanha eleitoral da hoje presidente eleita Dilma Rousseff.

A sociedade brasileira tem certeza de que não foi nenhuma pessoa física ou jurídica com o perfil econômico financeiro do humilde caseiro que contratou a Projeta, do deputado Palocci, porém quando o mesmo diz que os contratos tem cláusula de sigilo, tem-se a nítida sensação de que os contratantes sejam laranjas ou fantasmas, pois pelo que se sabe é lícito qualquer cidadão constituir uma pessoa jurídica individual, Ltda. ou S/A, registrar a constituição ou contrato social, ou ata, na Junta Comercial da jurisdição em que há o domicilio, apresentar documentos ao estado ou ao município, imprimir notas fiscais para recolhimento de ICMS ou de ISS e legal, normal e democraticamente, à luz do dia atuar, emitindo os documentos fiscais pelo que vender, recolher os devidos tributos e encargos a que estiver obrigada por lei, pagar o pro-labore dos titulares. Nada disso é procedimento de outro mundo, mas sim, de um mundo que trilha pelos caminhos da lisura. E este é o Brasil do cidadão de bem e que tem responsabilidade com a pátria.

O que é estranho é Romero Jucá, o ministro da Justiça, por exemplo, todos os políticos da base governista e até mesmo a presidente afiançarem peremptoriamente que o ministro Palocci não cometeu nenhum deslize e que legalmente já fez o que havia de fazer. E a esse coro junta-se o ex-presidente Lula, que a essa altura já deve ter obrigado os filhos a devolverem os passaportes diplomáticos a que não têm direito, para ter coerência em falar em defesa de quem quer que seja.

Banana em vez de laranja?

No entanto, já que grande quantidade de aliados viram os documentos das transações – logo, perderam o caráter de sigilosos – e que lhe embasam os testemunhos com convicção, por que a nenhum parlamentar da oposição foi apresentado aos documentos que dão a segurança com a qual o grupo governamental afirma a lisura do ministro? E por que o mesmo é blindado de todas as maneiras? E barram a convocação do mesmo a qualquer comissão? Isso é jogo democrático ou é conivência com desmandos?

Convenhamos. Se os documentos têm sigilo fiscal, como se explica então que os defensores do Palocci têm conhecimento dos mesmos? E assim, se não há sigilo para eles os quais não têm interesse nenhum em relação a esclarecer à opinião pública, por que então os mesmos não são mostrados aos políticos da oposição? Parecem perguntas bobas e inocentes, mas é o que resta desse puxa-encolhe na cabeça do cidadão comum.

Que o ministro ganhou, na pior das hipóteses, 20 milhões, isso não é novidade. Que ele comprou dois imóveis ao valor de mais de sete milhões e meio de reais, isso também já é de conhecimento público. A novidade, por consequência e exclusão, está exatamente em quem contratou a Projeta e a participação desses clientes na campanha eleitoral presidencial, pois mais logo faturas serão apresentadas e quem arca com esses custo é o povo, através dos impostos que paga.

Abuso de poder econômico em campanha política eleitoral com o emprego de laranjas e fantasmas tem como causa portas de cemitérios abertas e feiras ao ar livre dos abusos e o resto é ver e acreditar que a nação brasileira é constituída de mortos-vivos, ou seja, zumbis da ignorância. Portanto, quem sabe seria mais produtivo falar de banana ao invés de laranja e, desta feita, noticiar o que de bem ocorre no Brasil?