Tuesday, 16 de April de 2024 ISSN 1519-7670 - Ano 24 - nº 1283

‘Big Data’ transforma o perfil da publicidade

Como era mais simples a vida para Donald Draper! Na série de TV “Mad Men”, ambientada nos anos 60, o diretor de criação de uma agência de publicidade nova-iorquina consome as tardes desfrutando uísque old-fashioned, Lucky Strikes e beldades até que um slogan genial lhe ocorra, salvando campanhas milionárias e sua reputação na Madison Avenue. Bons tempos aqueles… Hoje, com os consumidores dedicando sua atenção a redes sociais e celulares, o mercado publicitário se vê obrigado a trocar o perfil dionisíaco pelo cartesiano. Agências de todo o mundo, inclusive do Brasil, reorganizam-se para processar terabytes de dados em tempo real na busca pelo consumidor certo, na hora certa. No século XXI, Don Draper atende pelo nome de Big Data.

A expressão abrange novas tecnologias para análise de informações digitais em velocidade e variedade antes inéditas. O interesse em Big Data teria motivado a fusão entre Omnicom e Publicis, anunciada no fim de julho, que resultou na maior agência de propaganda do mundo.

Empresas como essas perceberam que a torrente de dados sobre hábitos dos internautas permite conhecer o consumidor de forma mais precisa e ágil que pesquisas de opinião tradicionais. Pouco tempo atrás, agências dependiam de intermediários na indústria de internet (sobretudo a Google) para explorar essas informações. A mudança de agora é que firmas de publicidade estão se transformando em verdadeiras start-ups, contratando cientistas e desenvolvendo softwares.

A segunda maior agência em operação no Brasil, a Ogilvy, emprega 20 profissionais na criação de modelos matemáticos para orientar suas estratégias. Em vez de publicitários, muitos são estatísticos e matemáticos. Cabe a eles analisar informações como a audiência de sites, o desempenho de propagandas já veiculadas na internet, comentários em redes sociais etc.

– Estamos em um momento de incerteza econômica em que é preciso justificar cada centavo de investimento publicitário. A tecnologia tornou a conversa (com o cliente) muito mais pragmática – explica o diretor de integração digital da Ogilvy, Daniel Tártaro. – O Big Data nos ajuda, por exemplo, a saber com precisão qual dia é mais propício para migrar uma campanha tradicional para a rede.

Mesas de operações

A tendência dá à luz empresas exclusivamente dedicadas à analise de dados para o setor de marketing. Um exemplo é a R18, cujos softwares monitoram redes sociais para saber o que vem sendo dito sobre clientes e qual o potencial de um conceito publicitário junto ao público, conta o sócio-diretor Rodrigo Arrigoni.

O crescimento do filão é reflexo do vigor da publicidade on-line no país. A IAB Brasil, associação que promove o marketing digital, estima que o segmento fechará o ano em R$ 6 bilhões, ou 16% de todo o mercado publicitário. Em 2011, somava 11%.

Com mais informações, as propagandas estão chegando ao consumidor com uma precisão maior. As agências sempre caçaram o público-alvo exibindo anúncios nos sites mais frequentados por ele. Agora, com as novas ferramentas, fica mais fácil encontrar não apenas o veículo para seduzir o consumidor, mas também o melhor horário e forma.

É o caso da compra automatizada de espaço publicitário, conhecida por Real-time Bidding (RTB), que aproxima o marketing de uma Bolsa de Valores. Por meio de um leilão on-line, o anunciante indica o perfil de quem quer atingir (faixa etária, local de acesso etc.) e quanto quer pagar por cada clique. Em milissegundos, o sistema rastreia os hábitos de navegação dos internautas e encontra o público-alvo do cliente. Quando esses internautas acessam sites que vendem espaço publicitário via RTB, o banner é exibido.

É isso que faz com que internautas diferentes vejam propagandas diferentes em uma mesma página. No fim do ano passado, o Facebook aderiu ao RTB, abrindo seu vasto repositório de dados sociais aos anunciantes.

Nos EUA, a consultoria eMarketer estima que o RTB representará 19% da publicidade on-line ao fim do ano e 29% em 2017. Não há números sobre o Brasil, mas as agências apostam na ferramenta. Sinal disso é a corrida para estabelecer mesas de operações (trading desks), que gerenciam diversas operações de RTB simultâneas.

A VML, agência do Grupo Newcomm, implementará no Brasil até o fim do ano uma dessas mesas. Já a F/Nazca S&S experimenta a tecnologia por meio de parceiros internacionais.

– É uma forma de as agências se tornarem mais ativas na cadeia, de não serem apenas usuárias da plataforma de empresas como a Google – afirma Fernando Taralli, presidente da VML.

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Renan Setti, do Globo