Thursday, 28 de March de 2024 ISSN 1519-7670 - Ano 24 - nº 1281

Lula vs. Malafaia

Na quarta-feira (20/5), o ex-presidente Luiz Inácio Lula da Silva palestrou para um grupo de sindicalistas no centro de São Paulo. Durante seu discurso, para aliviar o clima de tensão sobre o futuro do governo, Lula brincou com os métodos adotados por pastores evangélicos das igrejas neopentecostais, quando estes atribuem toda a culpa do mal ao diabo, como se fosse um “inimigo” maior da humanidade.

Segundo a notícia publicada pela revista IstoÉ Dinheiro, Lula estaria relacionando a forma como evangélicos atribuem todos os males a um único culpado, o diabo, à teoria do domínio dos fatos, na qual ex-dirigentes petistas foram condenados por desvio de dinheiro público por seus subordinados no escândalo do mensalão. “Você está desempregado, é o diabo, está doente, é o diabo, tomou um tombo, é o diabo, roubaram o seu carro, é o diabo”, disse Lula, arrancando gargalhadas do público.

Dois dias depois, o pastor Silas Malafaia tomou as dores e publicou um vídeo em seu canal no YouTube em resposta a Lula. O pastou não se limitou a defender os evangélicos e partiu para o ataque elencando falhas e apontando o PT como culpado de tudo o que acontece de ruim no Brasil. Malafaia foi adiante e baixou o nível do discurso com um recado a Lula: “Jesus liberta o homem da cachaça”.

O que o ex-presidente da República disse sobre a doutrina evangélica é verdade. Há, sim, uma demonização de tudo o que os seguidores consideram como “o mal”, e nesse pacote do diabo entram também injustiças, preconceitos contra minorias e discursos de ódio. O erro de Lula foi o tom jocoso durante a palestra. Não se brinca com o credo de ninguém.

Igrejas mantêm contas sob trevas

Por outro lado, Malafaia está entre os menos qualificados no país para proferir qualquer crítica a um ex-presidente da República. Não pelo fato de ser preconceituoso, homofóbico declarado. O incentivo à repulsa em relação às conquistas de homossexuais é até defendido por outros seguidores da mesma religião.

Malafaia não pode criticar o PT porque é envolvido até o pescoço em política partidária. Contra o próprio Lula, Malafaia já pediu votos. Na campanha presidencial de 2002 o pastor deu a cara a favor do candidato Anthony Garotinho. Em seus programas na TV aberta, vez ou outra aborda temas que passam longe da questão religiosa e abordam algum viés político.

Ao que parece, é mais um braço do movimento contra a volta de Lula que já começa a se articular três anos antes do próximo período eleitoral. A fala contra o retorno do líder petista é reproduzida em todos os setores conservadores, nas igrejas, e em sites e páginas nas redes sociais voltadas para o público gospel. A ideia é formar uma opinião sólida em um segmento para que este reproduza o discurso fora dos muros da crença.

Mas voltando ao confronto, se Silas Malafaia quer mesmo bater de frente com um ex-presidente da República, deveria jogar limpo e começar abrindo as contas da sua igreja e da Associação Vitória em Cristo. O pastor é o mesmo que vende bíblias a R$ 1 mil cada unidade, mas não explica para onde vai esse dinheiro. No governo há transparência para gastos e contas públicas, e nos casos de irregularidades é feita investigação. As igrejas gozam de isenção fiscal e mantêm suas contas sob trevas inexplicáveis e socialmente aceitas.

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Felipe Gesteira é jornalista