Friday, 19 de April de 2024 ISSN 1519-7670 - Ano 24 - nº 1284

Marcelo Beraba

‘Embora a circulação da Folha esteja estagnada nos últimos três anos, o número de leitores que se comunicam com o jornal por meio do ombudsman vem aumentando sem interrupção.

Em 2004, quando assumi a função, 7.286 leitores enviaram críticas, queixas, comentários e sugestões. A circulação média diária daquele ano foi de 307,7 mil exemplares. Em 2005, com a circulação de 308,2 mil exemplares por dia, o número de mensagens pulou para 10.706 (crescimento de 47%). E, em 2006, para uma circulação calculada (ainda não definitiva) em 309 mil exemplares diários, o ombudsman recebeu 13.280 mensagens -um aumento de 24% sobre 2005 e de 82% sobre 2004. Atribuo tal crescimento contínuo a três fatores principais:

1 – a agenda de 2006 (eleições presidenciais, escândalos políticos, ataques do PCC em São Paulo, Copa do Mundo);

2 – a expansão da internet e a facilidade de acesso à rede;

3 – uma mudança de atitude dos leitores, cada vez mais informados (portais e blogs de notícias, telejornais, TVs a cabo, rádios, celulares), exigentes e ciosos de seus direitos de informação e de crítica.

O segundo ponto, a explosão da internet, é seguramente a causa imediata do fenômeno, o meio que tornou possível a crescente participação de leitores que atordoa os jornais e os jornalistas -atordoa porque é uma participação que cresce em progressão geométrica e porque é majoritariamente questionadora. Essa participação retira do jornalista a condição de senhor absoluto da notícia, de dono da verdade, de único ator na produção jornalística.

O peso da internet na comunicação com o ombudsman vem crescendo nos últimos dez anos. Em 1996, quando os primeiros leitores começam a se manifestar por e-mail, o jornal vendia um média diária de 519 mil exemplares e o ombudsman recebeu 6.201 mensagens, 19,32% pela internet. Dez anos depois, em 2006, a circulação do jornal foi 40% menor, o número de mensagens mais do que dobrou e o percentual via internet pulou para 97,71%.

Das mensagens recebidas ao longo do ano passado, 40% foram de críticas e protestos, 8% continham sugestões, 11% apontavam erros de informação ou de português, e 11% traziam comentários sobre diversos temas. Apenas 3% faziam elogios ao jornal, o que é compreensível: o ombudsman é um canal de defesa para os que estão insatisfeitos ou se sentem prejudicados.

Os grandes assuntos podem ser divididos em dois grupos: os que provocaram apenas comentários e análises dos leitores (como os ataques do PCC, a Copa do Mundo, o acidente com o avião da Gol e a crise nos aeroportos que se seguiu) e os que geraram críticas em relação às coberturas da Folha (eleições, escândalos políticos e Oriente Médio, principalmente).

Há um dado relevante que merece a análise cuidadosa do jornal: 1.062 mensagens consideravam que o jornal, diferentemente do que propaga, é parcial nas suas coberturas políticas (não restritas às páginas do caderno Brasil). É um número que o jornal pode ser tentado a considerar pequeno diante de sua circulação e inexpressivo frente à pesquisa do Datafolha, de setembro, em que 70% dos assinantes moradores na Grande São Paulo avaliaram que a Folha não favorecia nenhuma das candidaturas à Presidência da República.

Mas, para o volume de mensagens que recebo, considero o número expressivo e merecedor da atenção e de reflexão do jornal. São leitores que participam da vida do país e do jornal.

E é bom que o jornal e seus jornalistas se acostumem com o volume de mensagens via internet e com as críticas que trazem. Elas vieram para ficar. A relação dos leitores com os jornais (e não me refiro apenas à Folha) desde sempre foi carinhosa, de fidelidade. Estavam acostumados com a diagramação, a linha editorial, os colunistas, as seções, o jeito e a alma do jornal que escolheram e que era praticamente o único canal de informação que tinham. O cidadão elegia um diário por uma destas razões, seguia com ele por longas décadas e o hábito da leitura passava para os filhos.

Essa fidelidade se desmanchou. Os leitores têm hoje mais fontes de informação -e podem, portanto, comparar com mais propriedade a qualidade das apurações e das edições. E têm mais facilidade para cobrar dos veículos que escolheram. É uma relação de amor e ódio.

O grande desafio dos jornais é manter esses leitores e se abrir para as gerações que estão sendo formadas com outros hábitos, mas que têm em comum o espírito crítico e o impulso incontrolável de participação.’

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‘O painel dos leitores’, copyright Folha de S. Paulo, 14/1/07.

‘A correspondência para o ‘Painel do Leitor’ não cresceu na mesmo proporção que a recebida pelo ombudsman, mas também vem aumentando. Em 2004 foram 31.455 mensagens; em 2005, 33.005 (um crescimento de 4,7%); e agora, em 2006, 34.239 (mais 3,7%).

Os principais assuntos tratados foram as eleições presidenciais, os escândalos políticos, o governo Lula, os ataques do PCC e a Copa do Mundo.

O grande problema do ‘Painel do Leitor’, e que a reforma gráfica de setembro não resolveu, é o de espaço. O aproveitamento das mensagens continua baixo: apenas 9,17% das cartas foram publicadas em 2004; este índice caiu para 8,25% em 2005 e fechou 2006 em 8,78%. Ou seja, apenas uma em cada 12 cartas recebidas foi publicada no ano passado.

O jornal criou uma extensão da seção na sua versão eletrônica (www.folha.com.br/paineldoleitor), mas não é a mesma coisa. As queixas de que é difícil publicar uma carta e de que freqüentemente o ‘PL’ é ocupado por assessores de imprensa e notáveis, deixando de fora os leitores ‘comuns’, continuam. Em 2006 recebi 155 mensagens referentes à seção, e metade delas continha protestos contra os critérios de edição do jornal.

Os leitores querem mais espaço (no papel) para comentar os assuntos do dia e para se manifestar. É legítimo, e o jornal deveria tentar atendê-los, até por questões de mercado.’