Friday, 29 de March de 2024 ISSN 1519-7670 - Ano 24 - nº 1281

Menosprezadas pela imprensa

Não foi ainda em 2008 que as brasileiras se destacaram na mídia por realizações, vitórias eleitorais ou atitudes políticas.

Não foi desta vez que a imprensa designou repórteres e redatores para acompanhar a situação feminina quanto a salário, saúde e violência doméstica.

Infelizmente, na contabilidade do espaço usado para mencionar mulheres – suas conquistas e lutas – o maior destaque foram as ‘celebridades’ e seus romances, as mulheres bonitas flagradas com seio ou bumbum expostos, ou as que se envolveram em crimes, como a torturadora de Goiás, a madrasta da menina Isabela ou a adolescente de Santo André, refém do namorado e morta, num crime que mereceu cobertura ao vivo da televisão com direito a aparições da menina na janela e entrevista do seqüestrador.

Na área política, os destaques não foram por fatos que dão esperanças às mulheres. Ao contrário: primeiro, a demissão da ministra do Meio Ambiente, Marina Silva, que, apesar do reconhecimento internacional, não conseguiu levar adiante todas as suas propostas no Ministério, nem ganhar o espaço merecido na imprensa. Depois dona Ruth, que só após sua morte mereceu, da mídia, o respeito e a reverência que não teve em vida.

Valor da brasileira está nas formas

Na política, a ministra Dilma Rousseff – a ex-guerrilheira – sempre citada por sua atitude firme e dura na Casa Civil, virou notícia quando o presidente da República a transformou na ‘mãe do PAC’. Enquanto ‘mãe do PAC’, Dilma ainda tinha pouca importância. Mas anunciada futura candidata à presidência da República, passou a ser notada: pelas roupas, pela mudança no cabelo, pela troca dos óculos por lentes de contato e, finalmente, semana passada, pela plástica a que se submeteu para enfrentar a campanha presidencial.

Mas será que as mulheres não fizeram nada de importante na saúde, na economia, nas artes? Se somarmos o espaço dado às realizações femininas e o espaço usado com modelos, atrizes e celebridades que posam para revistas masculinas, ficamos com a impressão de que o valor da brasileira está apenas nas suas formas. Profissionais, só se forem as militantes da profissão dita mais antiga do mundo, como a mineira que foi deportada dos Estados Unidos depois do escândalo envolvendo o governador de Nova Jersey.

Sensibilidade e respeito

Isso, pelo menos, com relação às santas de casa. Com santo de fora, o panorama muda.

Este ano, lemos mais sobre Hillary Clinton e Michelle Obama do que sobre todas as governadoras, deputadas e senadoras brasileiras. E embora a mídia também dê alfinetadas sobre o estilo pessoal – roupas, cabelo, maquilagem –, o tom, em geral, é mais discreto. Em matéria de fofoca sobre estrangeiras, a imprensa foi implacável só com Sarah Palin, a candidata a vice dos republicanos. Mas ela bem que deu motivo, gastando 150 mil dólares em roupas.

As democratas Hillary Clinton e Michelle Obama, no entanto, foram tratadas com respeito e muito mais destaque do que já se deu a qualquer brasileira. Nem a senadora Heloísa Helena nem a primeira-dama Marisa Silva foram tão faladas pela imprensa brasileira como as duas americanas. Perfis, idéias, história: hoje podemos dizer que conhecemos melhor a nova secretária de Estado americana e a futura primeira-dama do que qualquer política brasileira. E muito mais ainda, do que qualquer cientista, economista, médica ou secretária de governo do Brasil.

Tomara que 2009 seja um ano de maior visibilidade das mulheres na mídia. Porque, embora nos jornais, revistas e televisão elas já sejam maioria, isso não se reflete nas notícias. Que a mídia tenha uma maior sensibilidade e respeito por metade da população, é o mínimo que se pode esperar.

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Jornalista