Thursday, 28 de March de 2024 ISSN 1519-7670 - Ano 24 - nº 1281

Morre a polêmica jornalista e escritora italiana

Morreu na sexta-feira (15/9), em Florença, a jornalista italiana Oriana Fallaci. Oriana tinha 77 anos e lutava contra um câncer de pulmão desde o início da década de 1990 – adquirido, acreditava ela, por ter aspirado fumaça da queima de poços de petróleo quando cobria a primeira Guerra do Golfo.

Oriana trabalhou como correspondente em conflitos no Vietnã, Ásia Central e América Latina. No México, em 1968, foi baleada e espancada por soldados durante confrontos que deixaram milhares de manifestantes mortos. Mas foi por sua habilidade de entrevistadora dura e polêmica que a jornalista entrou para a história. Certa vez, o Los Angeles Times a descreveu como “a jornalista para quem, virtualmente, ninguém diria não”.

Sem papas na língua

Não importava quem era o entrevistado, Oriana não se deixava intimidar. Pelo contrário, perguntava e falava o que queria, para quem queria. Em 1979, ao entrevistar o líder iraniano aiatolá Ruhollah Khomeini, questionou: “Como é possível nadar com um chador [traje feminino que cobre todo o corpo, deixando apenas os olhos de fora]?”. A resposta do líder, Oriana escreveu depois no New York Times, foi que ela não era obrigada a usar um, já que se tratava de uma peça de roupa para mulheres islâmicas respeitáveis. A jornalista, então, rasgou seu chador na frente de Khomeini.

Henry Kissinger, então secretário de Estado do presidente Richard Nixon, definiu sua entrevista com Oriana em 1972 como “a mais desastrosa conversa que já tive com um profissional da imprensa”. A jornalista provocou Kissinger ao compará-lo a um cowboy e não descansou até fazê-lo admitir que a guerra do Vietnã havia sido “inútil”.

Oriana nunca se casou, mas se apaixonou por um de seus entrevistados, o poeta e ativista grego Alekos Panagoulis, condenado por tentar assassinar o líder militar George Papadopoulos, em 1967. Panagoulis morreu em 1976 num acidente de carro – que Oriana alegava se tratar de assassinato. Um de seus 16 livros publicados, Um Homem, foi baseado no poeta grego.

Campanha contra o Islã

Recolhida em seu apartamento em Manhattan na última década, Oriana resolveu romper anos de silêncio após os ataques terroristas de 11 de setembro de 2001. Nos livros A raiva e o orgulho e A força da razão, e em muitas entrevistas, a jornalista passou a criticar duramente não apenas os extremistas islâmicos, mas o Islã como um todo. Ela acusava o Ocidente de ter se tornado complacente e tolerante demais para compreender a ameaça que, alegava, o Islã representa – ao “cultivar o ódio no lugar do amor e a escravidão no lugar da liberdade”.

Oriana condenava a crescente imigração de muçulmanos no continente europeu. “A Europa não é mais a Europa”, afirmou em 2005, ao Wall Street Journal. “Virou a ‘Eurábia’, uma colônia do Islã, onde a invasão islâmica não ocorre apenas fisicamente, mas também em um senso mental e cultural. A servidão aos invasores envenenou a democracia, com conseqüências óbvias à liberdade de pensamento e ao próprio conceito de liberdade.”

Controvérsias e acusações

Ateísta, Oriana chegou a se encontrar com o papa Bento 16, em 2005, por conta de seus apaixonados protestos. Mas ela também foi acusada de racismo e processada na Itália e Suíça por violar leis contra “difamação de religião”. Em 2003, o jornal italiano La Repubblica a chamou de uma “exibicionista posando de Joana d’Arc do Ocidente”.

Apesar de ter conquistado muitos fãs ao longo dos anos, Oriana era acusada por críticos de calúnia e de tirar citações de contexto para “esquentar” uma matéria. Ainda assim, a importância da controversa italiana não pode ser negada. “Com Oriana Fallaci, perdemos uma jornalista de fama global, uma escritora de grande sucesso, uma apaixonada protagonista de intensas batalhas culturais”, resumiu o presidente da Itália, Giorgio Napolitano. Com informações de Sophie Hardach [Reuters, 15/9/06] e Ian Fisher [The New York Times, 16/9/06]. (Tradução e edição, Leticia Nunes)