Friday, 19 de April de 2024 ISSN 1519-7670 - Ano 24 - nº 1284

Muita fala, pouca informação

É intrigante, na narrativa da imprensa sobre o caso Lupi, a quantidade de fios soltos, perguntas sem resposta e indagações que nem chegaram a ser feitas.

A primeira questão, e mais relevante, é que ninguém, em nenhum momento, se preocupou com a qualidade das políticas públicas a cargo do Ministério do Trabalho e Emprego. O que subentende é que está tudo bem por lá, apenas são cometidas algumas tropelias pelo ministro e assessores seus. Ninguém questiona, por exemplo, o método de credenciamento de sindicatos (de trabalhadores e de patrões), que é do tempo da velha pelegada, mas usado com desenvoltura pela nova.

Dir-se-á o mesmo dos outros ministérios alvo de denúncias de corrupção, assim como dos que não o foram. A verdade é que ninguém parece interessado em avaliar a qualidade do governo de Dilma Rousseff.

Estranho modo de governar

E não faltam evidências de que é um governo confuso, montado com arranjos sobreviventes do primeiro governo Lula (ou, mais precisamente, do governo Lula pré-mensalão), do segundo governo Lula (do qual Dilma foi grande estrela e no qual já figurava, por exemplo, Edison Lobão) e da estrutura inicial do próprio governo de Dilma, na qual Antônio Palocci era figura-chave.

Alfredo Nascimento, Pedro Novais, Wagner Rossi, Orlando Silva, Lupi e Mário Negromonte, entre outros, são expressões de um déficit de qualidade em matéria de concepções, planejamento e gestão. O programa “Segundo Tempo”, por exemplo, que expôs falcatruas do PC do B e de Silva, foi montado de tal maneira que o controle dos recursos é impossível. Muitas políticas seguem trajetória obscura. E o governo como um todo não passa por um escrutínio sério.

O empresário Jorge Gerdau Johannpeter, presidente da Câmara de Gestão, Desempenho e Competitividade da Presidência da República, disse recentemente, coberto de razão, que não faz sentido um governo com 38 ministros. É aritmético: se a presidente concedesse audiência de uma hora por mês a cada um, gastaria só nisso uma semana de oito horas diárias, com direito a duas horas para almoço – por semana.

Sem falar nos ministros da casa, nos mais importantes, nos governadores, nos parlamentares, nas autoridades estrangeiras, nas viagens. Volte-se a um velho bordão: prefeito manda, governador pensa que manda e presidente nem pensa. Mas, falando sério, manda muito. Talvez não saiba exatamente em quê.

De Belchior a Bairros, um abismo

Quando se usa o mecanismo de busca da página do Planalto na internet, as palavras “agenda + Ministro tal” (apenas os que estão desde o início do governo) trazem resultados muito díspares.

Tem a turma das duas dezenas de audiências agendadas (até 2/12): Míriam Belchior (26), Fernando Haddad (21), Guido Mantega (20).

Tem um grupo intermediário: Alexandre Padilha (17) Edison Lobão (16), Antônio Patriota (13), Aloizio Mercadante (11), Afonso Bandeira Florence, Tereza Campello, Fernando Pimentel (10 cada), José Eduardo Cardozo (9).

E tem a turma que só vê a presidente em cerimônias, ou quase: Ana de Holanda, Garibaldi Alves, Mário Negromonte, Iriny Lopes (2 cada), Alexandre Tombini, Luís Inácio Adams, Jorge Hage, Maria do Rosário e Leônidas Cristino (1 cada), Moreira Franco e Luiza Helena de Bairros (nenhuma audiência agendada).

Para quem tiver curiosidade de saber: Lupi foi recebido três vezes antes da crise.

O que detém Dilma?

A segunda questão é saber por que a presidente hesita em despachar Lupi. Todos fazem a pergunta e ninguém tem uma resposta clara e segura.

Ora é para não brigar com o PDT, ora é para esperar uma “reforma ministerial” de janeiro – como se reforma ministerial fosse um apêndice do calendário –, ora é tática para ver se o caso “esfria”, ora é conselho de Lula, ora é para “não ser pautada pela mídia”, ora é irritação com a Comissão de Ética.

Nada disso convence, nada disso explica por que a presidente arrastou o assunto a ponto de ganhar no mesmo dia (2/12) editoriais críticos nos três jornais mais influentes do país: Folha de S.Paulo, Estado de S.Paulo e Globo. E não há repórter que apareça com uma história mais articulada. Talvez saia na revista piauí daqui a alguns meses.

Sociedade civil, cega e surda

A terceira questão tem a ver com outras instituições: partidos políticos, sindicatos, federações e centrais, organizações de estudantes e de profissionais, ninguém disse ai nem ui. Aliás, em nenhum dos casos de corrupção que derrubaram ministros. Claro, tucanos e demos do Congresso vociferaram alguma coisa, mas só o reportariado de política de Brasília consegue ouvir essas pessoas.

Alguns dirigentes de partidos e entidades se manifestaram foi contra o “denuncismo”, dizendo indiretamente que a presidente Dilma entrou na onda e cedeu diante de pressões sem fundamento. O próprio Lupi deu uma declaração assim, quando ainda achava que poderia enfrentar suas agruras “peitando” a mídia e a opinião pública.

Não se questionou a Procuradoria Geral da República (o procurador Roberto Gurgel é aquele que não viu delito no caso Palocci -2), nem a Controladoria Geral da União, nem a própria Comissão de Ética da Presidência, outra que não viu nada de errado no espantoso enriquecimento do consultor Palocci.

Esse colegiado presidido por Sepúlveda Pertence é curioso. Lento e leniente com Palocci, agora correu para emitir um parecer, dando uma rasteira em Dilma, que contava com uma manifestação só no dia 5, a penúltima segunda-feira antes da semana do Natal.

Do romantismo à via judicial

Em Caracas, de onde voltará para sentenciar Lupi, lhe foi feita a seguinte pergunta: “A senhora recebeu uma declaração de amor outro dia e eu queria saber se isso fez efeito nessas decisões até agora sobre o ministro Lupi”.

Pergunta e resposta (“Não sou exatamente uma pessoa romântica”) foram ao ar no Jornal Nacional (2/12). E depois as pessoas querem que as autoridades levem a mídia a sério.

No outro extremo do espectro possível das patetices, um deputado do PSDB do Paraná, Fernando Francischini, de profissão delegado da Polícia Federal, protocolou na Justiça ação em que pede o imediato afastamento de Lupi. Os réus são a União, Dilma e Lupi. Cuide-se, senador Álvaro Dias.

Sobram miuçalhas, falta informação, falta inquietude, falta vontade de mergulhar a fundo na história sem perder de vista a floresta.