Tuesday, 16 de April de 2024 ISSN 1519-7670 - Ano 24 - nº 1283

O establishment e uma vanguarda possível

Hoje em Dia, no Estado de Minas – assim como no resto do país, é bem verdade – nenhum jornalista tem mais O Tempo necessário para apurar em profundidade as várias matérias que lhe são encomendadas diariamente. Faltam horas e sobram pautas em face dos constantes enxugamentos promovidos pelos veículos em suas redações, sempre em busca do melhor custo (em detrimento da qualidade) na produção de suas notícias.

Assim, é raro vermos uma reportagem capaz de produzir um conteúdo informativo de real Valor. Hoje, quase toda a produção jornalística é resultado direto da atuação das assessorias de imprensa que, com dedicação, competência, empenho e, claro, ocasionais doses de uma pequena (?) subversão ética, transformam os veículos de comunicação em plataformas de divulgação de seus clientes. A um olhar mais atento, pode-se mesmo perceber que os veículos de comunicação se desvelam em simples ‘replicatórios’ de releases partidariamente (com o perdão do pleonasmo entre o substantivo e o advérbio) escritos.

Quem tem a possibilidade de fazer um acompanhamento Diário do Comércio ou de qualquer outro setor específico de nossa sociedade com o qual esteja envolvido direta e profundamente, como, por exemplo, tecnologia, ciências, saúde, educação, literatura, dentre outros, percebe que vivemos uma Época em que há um total desEncontro entre a realidade idiossincrática desses campos de conhecimento e o que é divulgado pela mídia. Se conseguem (conseguem?) escapar de servir de folder para alguma empresa interessada em divulgar seu produto ou serviço, as matérias, principalmente dessas editorias mais técnicas, quase sempre desprezam a complexidade de cada setor, e acabam prestando um desserviço à população, apresentando informações simplistas, tortas, imprecisas, duras, tendenciosas e superficiais, quando não (na verdade, muitas vezes) inverossímeis.

Uma pitada de indignação

Veja bem, IstoÉ claramente um problema absurdo, mas não é essa a questão que este texto pretende discutir – até porque, nesse aspecto, a Inês já é morta há tempos. A meu ver, a pergunta que cabe é: ‘Existe um outro caminho?’

Para além do mais do mesmo – que seria mais um daqueles infindáveis debates ‘intelectualóides’ que apaziguam os ânimos da massa, mas acabam permitindo que os proprietários e diretores dos veículos de comunicação se desdobrem em retórica para manter o status quo –, é preciso, em minha opinião, que nós, pura geração y, ignoremos o que já está aí e nos voltemos para nós mesmos para perguntarmos: ‘Existe uma saída? E onde ela está?’

No início do século 20, Eric Arthur Blair bem disse que ‘jornalismo é publicar o que alguém não quer que seja publicado; todo o resto é publicidade’, então sob o conhecido pseudônimo de George Orwell. Trazida para o momento atual, a fala do jornalista e escritor talvez indique uma possível saída para esse buraco em que o periodismo mergulhou. Ao que hoje se convencionou chamar jornalismo, entregaríamos o rótulo de publieditorial e o espaço inglório dos cadernos declaradamente pagos e parciais. E, a esse utópico jornalismo idealizado por Orwell, que descobriríamos como (e onde) fazer dia após dia, acerto após erro, restaria, na verdade, quase nada: talvez apenas a glória dos bons.

Utopia socialista? Devaneios de um foca? Falta de assunto no fim de expediente em assessoria de imprensa? Talvez este texto seja mesmo um mexido de tudo isso. Mas, com toda certeza, ele leva também uma importante pitada daquela indignação que, em ao menos um dia da vida de cada um de nós, despontou idealista em nossos corações e que não deveríamos (jamais!) ter deixado se apagar. Uma pitada generosa, por sinal, que hoje estou pra confusão.

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Jornalista e escritor, Belo Horizonte, MG