Thursday, 28 de March de 2024 ISSN 1519-7670 - Ano 24 - nº 1281

Onde está o meu Rio de Janeiro?

Por causa de um congresso sobre Educação, estive no Rio de Janeiro no começo de maio. Fazia algum tempo não aparecia na cidade onde nasci, e da qual, há vinte anos, em nome de uma ilusão, saí para viver em São Paulo, em que depois decidi morar por motivos práticos, afetivos e profissionais.

Evito fazer comparações entre cidades. Expresso tão-somente o que muitas e muitas vezes já se falou: as ruas do Rio não são mais violentas do que as de São Paulo. É fato que a mídia gosta de mostrar um Rio caótico, inseguro, seqüestrado, acossado pelo crime organizado. Muitos paulistas, no entanto (e incluo neste comentário os habitantes de outras metrópoles), também respirariam aliviados se as Forças Armadas passassem algumas semanas por aqui (ou lá).

O problema não é o comportamento parcial da mídia. Nem é sobre política, sociologia ou economia que eu desejaria conversar agora. Meu problema é outro. Meu problema é pessoal, sentimental, ainda que compartilhável.

Andando durante aqueles três dias por aquele Rio que eu conheci quando era adolescente, vi uma outra cidade, vi outros rostos. Rostos tristes. Vi um carioca desanimado, com baixíssimas doses de esperança. Tremo só em pensar que a última a morrer possa, no Rio, estar realmente moribunda. Vi minha cidade silenciosa, com menos música, menos dança. Vi um Rio de Janeiro caminhando para a estagnação.

Ombros curvados

Poderá ter sido impressão passageira de quem, de passagem, estava preocupado com palestras, debates, fóruns e outras atividades de um congresso? Poderá ter sido uma visão influenciada por minha atual vida em São Paulo? Infelizmente, não.

Porque esse tipo de sentimento não é mensurável, não é palpável, mas brota com tanta força, com tanta verdade, que o sujeito já não sabe se é sujeito ou objeto. O objeto de sua dor entra na circulação sangüínea, penetra nos pulmões, nos neurônios, vira carne de sua carne.

Deliciei-me em ouvir o sotaque chiado (que eu há muito já perdi), gostei de rever as belezas naturais, sentir o ar-condicionado do metrô (pequena e justa mordomia numa cidade tão quente)… mas, de resto, devo admitir que o próprio Cristo Redentor pareceu-me deprimido, seus braços quase caindo, seus ombros curvados.

Como nos poemas em que se lamenta a perda de um amor, eu me pergunto: onde está o meu Rio de Janeiro?

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Doutor em Educação pela USP e escritor