Saturday, 20 de April de 2024 ISSN 1519-7670 - Ano 24 - nº 1284

Os descaminhos da informação

Ao sentar para escrever este texto, há redações preparando-se para cobrir pautas, editores finalizando textos, fotógrafos registrando momentos através de um olhar único, há também leitores desfrutando de informação e críticos indignados com determinadas posições. Há ainda José, que com seu ‘E agora?’, assemelha-se a Poe, o do corvo.

É quase automática a lembrança de sua figura em meio ao vasto universo da imprensa – ou, se preferir, da comunicação –, no qual os jornais paulistas falam somente de Brasília, da violência alarmante (nunca vi uma violência branda) ou da tensão econômica que, com os novos acordos, pode levar o mercado a uma ascensão favorecendo a concentração de papéis em prospecções futuras (não, me desculpe, horóscopo é na coluna ao lado).

A festa acabou e ninguém ficou para ajudar você, José, a limpar a sujeira que deixaram por conta de sua diversão. Sei que ontem todos os editoriais e colunistas falavam dos índices do PIB e de seus ridículos números, mas nem um deles, um único que fosse, foi capaz de se perguntar quais os parâmetros utilizados para a amostragem da pesquisa.

Calma, José, não é tão óbvio assim, além do mais, sempre há uma tendência a não refutar a verdade se esta condena. Sei que é função da imprensa zelar pela informação e que a ela é atribuída uma análise imparcial dos fatos, mas José, a festa foi ontem, a luz já apagou e o povo sumiu.

Sei que você protesta, José. Afinal, naquela conversa no domingo, dia 18/03, com o Marcelo Beraba, vocês lembraram, dentre outras coisas, o quão imenso era aquele continente que já não existe mais e que costumavam chamar de África. Mas fazer o quê, né, José, se agora só circulam os mesmos bondes da linha Bush, Oriente Médio com breve escala na Venezuela, vai ver que como o bonde não veio e a noite esfriou, tudo mofou e ele fugiu.

Extinção do coronelismo digital

Não adianta ir a Minas, José, lá, como aqui, ouvem-se as críticas sem que nenhuma atitude seja tomada, tipo ouvir os dois lados da questão, fugir do senso comum nos comentários, não tomar partido nas matérias, não usar sensacionalismo como argumento de venda, não falar que se sentiu emocionado ao fazer entrevista com a mãe das vítimas (que bom que o ser humano tem emoções), sabe, José, estas coisas simples que tem naqueles manuais de redação que são como a porta que alguém quer abrir e não existe mais.

Lembre-se, José, que o Cony falou com você sobre a ‘Redundância e Chatice’ na sociedade quando estavam, naquela sexta-feira (30/3), a dialogar sobre as conseqüências advindas caso você gritasse alguma coisa fora do comum. Ele procurou te convencer que tudo parecia o mesmo, como se as coisas costumassem se repetir como aquele sinistro ‘Nunca mais’, mas você exigia que fosse diferente, que os donos de jornais e de televisão não se escondessem atrás da ‘liberdade de imprensa’ e refletissem sobre si próprios e seus erros; você exigia que a informação não fosse deturpada, que o coronelismo digital fosse extinto, que outras vozes fossem ouvidas, eu sei, José, você é duro.

Uma coisa é uma coisa…

Seja otimista, José, e pense naquele poeminha besta (que na voz do Pedro Bial fica mais bobo ainda) que o conclama a aceitar verdades inescapáveis, como a de que os políticos sempre vão ‘saracotear’ (na versão do Bial), aceite, José, que a televisão nunca vai procurar esclarecer o povo sobre a realidade além da novela, que a Rede Globo nunca vai fazer do Jornal Nacional um instrumento de imparcialidade, que a mídia impressa vai reduzir custos, mesmo que isso significa perda de informação.

Aceite, José, que Carlos Maurício de Souza, em artigo (‘Corporativismo e acúmulo de funções‘) no Observatório da Imprensa (27/3/2007), diga: ‘Como pode uma categoria profissional defender a obrigatoriedade do diploma de jornalismo com uma mão, enquanto com a outra tira os direitos de outras profissões?’, não se importando nem um pouco que um problema seja uma coisa e outro, outra. Vai ver, José, e o problema é mesmo com os jornalistas, e não com a política de exploração dos empresários. Aceite, senão, José, você vai continuar marchando.

José, para onde?

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Coordenador de Comunicação, Jundiaí, SP