Friday, 19 de April de 2024 ISSN 1519-7670 - Ano 24 - nº 1284

Sobre piratas e analogias

Barack Obama declarou guerra à pirataria no Golfo de Áden. A imprensa brasileira fez eco. Não entendo por que os gringos implicam tanto com os piratas somalis. E também não entendo por que a imprensa brasileira é incapaz usar a analogia para tratar situações análogas.

Há bem pouco tempo, os EUA destruíram toda a infra-estrutura do Iraque (com base numa campanha mentirosa), privatizaram as reservas de petróleo daquele país em benefício de companhias americanas e o dinheiro que o governo do Iraque recebe da extração de petróleo é usado para pagar outras empresas americanas que reconstroem aquilo que os gringos destruíram.

Se isto não é pirataria em escala industrial e planetária eu não sei mais o que quer dizer o vocábulo ‘pirataria’. Os somalis estão fazendo exatamente o que os gringos fizeram no Iraque, só que numa escala menor. Além disto, os somalis demonstram ter mais ética que os americanos. Eles admitem publicamente que são apenas ‘piratas’ e os gringos são piratas que gostam de dizer que são ‘bons cidadãos que difundem a democracia’. Curiosamente, a imprensa nacional trata alguns piratas como ‘menos iguais’ e outros como ‘mais iguais’.

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Observei uma crítica feita por Emanuelle Najjar, jornalista, a respeito de artigo redigido por mim (‘Malhação, a lavagem cerebral nos jovens‘). Em um determinado ponto da crítica, ela cita o seguinte parágrafo: ‘Polêmicas de nível anti-Globo minimizam a discussão, fornecendo argumentos vazios. Discussões sérias ocorreriam caso as razões fugissem daquilo que parece ser algo pessoal contra a emissora. Para falar do assunto, é preciso sair do âmbito teimoso de anti-fã e procurar pontos individuais de questionamento, caso contrário todo texto e toda crítica será vazia’.

Em primeiro lugar não tenho nada em particular contra a Globo ou qualquer outra emissora de televisão, acho que o artigo que publiquei no Observatório da Imprensa foi mal interpretado pela jornalista.

No artigo, eu relato o conceito contra a telenovela em si. Em nenhum momento foi citado a emissora na qual ela é transmitida. Por que eu teria algo contra a Globo? Existiria algum motivo pra ser um ‘anti-Globo’? Essa telenovela retrata alguns assuntos do nosso cotidiano sim. Agora, ela retrata da forma que a realidade mostra? Ou teríamos que acreditar que a telenovela não influenciou em nada o modelo de gravidez na adolescência ou o de ‘ficar’ em nossos adolescentes. Isso seria menosprezar a minha capacidade de raciocínio ou talvez um alto grau de ingenuidade.

Poderíamos fazer uma pesquisa de campo, checar in loco a realidade nos colégios da nossa cidade, por exemplo, para não virar uma discussão leviana, como alguns dizem. Podemos fazer um levantamento de índices dos principais temas debatidos, antes e depois da telenovela. Só acredito que temos que tomar o máximo de cuidado em ler e compreender um texto, para que não façamos uma interpretação errada. (Adriano Degra, estudante de jornalismo, Taboão da Serra, SP)

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São públicos e notórios em Brasília os registros de suicídios e tentativas de suicídio de jovens, ocorridos no Shopping Pátio Brasil nos últimos anos. Fala-se numa significativa média anual de 12 a 13 eventos dessa natureza. No entanto, a imprensa e as TVs locais não fazem – jamais fizeram – qualquer menção ao assunto, que acabou chegando ao conhecimento da população pela internet, inclusive em um e-mail postado recentemente pelo pai de um dos suicidas.

Fico me perguntando se o silêncio obsequioso da mídia tem como único objetivo proteger interesses econômicos, financeiros e comerciais. Como frequentador habitual daquele shopping, não notei a adoção de qualquer medida para reforçar a segurança e prevenir novas tentativas, como, por exemplo, a colocação de grades ou coisa parecida. Afinal, o papel da mídia não é manter informada a população sobre o que acontece em sua cidade? Será que fatos semelhantes vêm ocorrendo em outras cidades brasileiras e são igualmente encobertos ou abafados por uma espécie de autocensura que faz lembrar os tempos da ditadura militar? Ou estaremos vivendo tempos de ditadura econômica? O que é mais importante, a vida humana ou os lucros das lojas e estabelecimentos comerciais? Com a palavra os profissionais da comunicação de massa. (Ivan Mangeon Werneck, aposentado, Brasília, DF)

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Chama a atenção a escassa aparição do presidente Lula na televisão brasileira. Um líder apreciado no exterior é ignorado em seu próprio país. A imprensa brasileira, em sua maioria, se ocupa de escândalos – reais ou supostos – envolvendo pessoas de diversos escalões do governo, o que, em si mesmo, nada tem de errado.

Errado é ignorar o que este governo, liderado por um trabalhador que não perdeu sua moral nem seus princípios, seu jeito e sua inteireza, tem feito, em conjunto com a população mobilizada de norte a sul deste imenso país-continente, para melhorar as condições de vida dos seus cidadãos e cidadãs. Um semi-analfabeto (Collor dixit) dando lições de ética ao seu antecessor, um ‘doutor’ dito estadista, na prática repetidor dos piores vícios da política brasileira: oportunismo, fisiologismo, atitudes contrárias ao interesse nacional e popular, um tal Fernando, que pediu para ser esquecido. Esqueçam o que escrevi. Esqueçam o que escrevi. Esqueçam.

Lula não será esquecido, embora, contrariamente a FHC, que aparecia em revistas e jornais constantemente, posando disto e daquilo, recebendo títulos e mais títulos lá e cá, quase não apareça positivamente nas TVs, nas revistas, nos jornais, nos portais. Por que será? (Rolando Lazarte, sociólogo, João Pessoa, PB)

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Um jornal, em princípio, é isso: a arte de dar voz a um olhar, dar letra, dar corpo. Observo o Brasil pela imprensa. Noto a falta dos discursos de representação (credibilidade) no que seriam os chamados ‘discursos oficiais’. Acusações de oposição, respostas chistosas do poder. Sei o que Juscelino via (Brasília, progresso), ele transmitia isso. Vargas via o trabalhador. Lacerda via Vargas. Independente de filiações partidárias, sabíamos as posições éticas das pessoas. Os objetos que atraíam desejos (o poder, esse vago sonho de uma noite de verão era um poder de ser). Caíram os grandes oradores, cultuamos o funk, microorganizamo-nos pós ditadura. O Senado parece um júri: quem é o próximo réu? A vítima é sempre o povo. O que é ‘jornal de direita ou esquerda, volver?’ Como fazer imprensa depois da morte das grandes ideologias? O poder está sempre aí. Qual é a do jornal? (Thalita Prado da Silveira, psicanalista e professora, Niterói, RJ)

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Os três principais jornais de Belém estão proibidos de publicar imagens chocantes de vítimas de acidentes e mortes. A decisão dos desembargadores do TJE, que pode resultar na censura dos principais jornais do estado, está disponível no site do TJE. Só faltava colocar um censor em cada redação para escolher o que é chocante ou não. Os jornais vão recorrer. (Márcio Baena, jornalista, Belém, PA)

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Advogado, Osasco, SP