Thursday, 25 de April de 2024 ISSN 1519-7670 - Ano 24 - nº 1284

Veja

MAINARDI vs. LULA
Diogo Mainardi

Semana histórica

‘Fernando Gabeira acertou um soco num senador. Melhor ainda: ele acertou um soco num senador petista. Melhor ainda: ele acertou um soco num dos senadores petistas que comandaram o banho de descarrego em Renan Calheiros, na última quarta-feira. Epa! Se é assim que funciona, eu também quero entrar na briga.

O banho de descarrego em Renan Calheiros deu certo. Ele saiu purificado do Congresso Nacional. E nem precisou pagar o dízimo. Nós é que pagaremos em seu lugar. O dízimo cobrado pelos bispos petistas tem um nome: CPMF. Que continuará sendo pago por crentes e descrentes, sacramentado por todos os partidos.

Em sua defesa, Renan Calheiros citou Antonio Gramsci, repetindo mais uma vez o argumento de que a imprensa – em particular VEJA – perseguiu-o a fim de desestabilizar Lula. Foi uma das piores semanas de todos os tempos para a intelectualidade de esquerda. Num dia, Osama bin Laden elogiou Noam Chomsky. No outro, Renan Calheiros recorreu a Gramsci. O que restava da esquerda acabou. Depois desses dois episódios, ela nunca mais conseguirá se reerguer.

Renan Calheiros intimidou os senadores prometendo denunciar seus pecados caso eles insistissem em cassá-lo. Nosso papel, a partir de agora, é descobrir os pecados de cada um deles. Descobrir e dedurar. Quanto maior e mais escandaloso o pecado, melhor. Mas defendo a necessidade de denunciar também os pequenos pecados. Nem que seja só para aborrecer. Estupidamente, acostumamo-nos a acreditar que, fora do horário de trabalho, um político tem o direito de se comportar como quiser. Renan Calheiros mostrou que isso é uma tolice, porque um segredo de alcova, por mais ínfimo que seja, sempre pode ser usado como instrumento de chantagem contra a democracia.

Um dos senadores achacados por Renan Calheiros foi Jefferson Péres, que empregou a mulher em seu gabinete. Se isso é verdade, Renan Calheiros está certo, Jefferson Péres está errado. Pena que suas denúncias tenham parado aí. Como reagiram os outros senadores durante seu discurso? O que eles fizeram? Aloizio Mercadante olhou para Patrícia Saboya? Ideli Salvatti pensou nas assessoras de Sibá Machado? Romero Jucá refletiu sobre o destino dos filhos fora do casamento? Edison Lobão foi flagrado por um telefonema de sua mulher?

Quem mais tinha a perder com a queda de Renan Calheiros nem era um senador, e sim Lula. Tanto que ele mobilizou o PT para salvá-lo. O acordo que une Lula a Renan Calheiros parece ser bem mais profundo e temerário do que aquele entre um senador e sua secretária. O acordo tem um aspecto público, ao alcance de todos. Basta analisar o organograma de uma Eletronorte. A dificuldade é tentar desmascarar o que acontece por trás do organograma.

Depois do julgamento no Supremo Tribunal Federal, eu disse que Lula seria lembrado como o presidente dos mensaleiros. Depois do julgamento no Senado, digo que seu legado será Renan Calheiros. Um evento como o de quarta-feira dá uma canseira danada. A gente acaba achando que nem adianta continuar a espernear. Adianta, sim. Adianta para desfazer um monte de crendices que ainda temos sobre o país. Adianta para consolidar a imagem de uma época. Renan Calheiros passa. Lula passa. A gente fica.’

CASO MADDIE
Diogo Schelp

No limite do impensável

‘Os ingredientes de um filme de mistério estão todos aí: um jovem casal de profissionais bem-sucedidos de férias numa paradisíaca praia portuguesa. O desaparecimento inexplicável de sua filha, linda loirinha às vésperas de completar 4 anos. A polícia local, com ajuda da Scotland Yard, lança mão de recursos científicos que lembram o seriado CSI. Com tantos apelos, é natural que o destino da pequena Madeleine e de seus pais, os médicos ingleses Gerry e Kate McCann, tenha eletrizado as pessoas em escala global. Na semana passada, como se houvesse de fato um roteirista nos bastidores desse drama da vida real, as investigações sofreram uma reviravolta chocante. De beneficiários da simpatia mundial, os pais passaram a suspeitos de um crime terrível, na fronteira do impensável: a morte e ocultação do corpo da própria filha.

A suspeita da polícia portuguesa baseia-se em evidências forenses e circunstanciais, nenhuma delas conclusiva na ausência de um corpo. O álibi do casal é igualmente repleto de contradições. Madeleine desapareceu do quarto em que dormia com dois irmãos menores, no Ocean Club, resort na Praia da Luz, a 270 quilômetros de Lisboa, em 3 de maio. Os pais jantavam com amigos – outros três casais ingleses, cujos filhos também dormiam nos apartamentos – a menos de 70 metros de distância, no restaurante do hotel em que estavam hospedados. Periodicamente um dos presentes ia checar se estava tudo bem com as crianças. Kate foi ver os filhos às 22 horas e percebeu o sumiço da criança. Pelo menos é o que contou à polícia portuguesa, à imprensa e até ao papa Bento XVI, com quem o casal se encontrou no fim de maio. Nos últimos quatro meses, ocorreu a maior mobilização internacional já vista para encontrar uma criança desaparecida. Quase 2 milhões de euros foram doados para ajudar nas buscas. E se tudo não passar de farsa?

A polícia portuguesa é proibida por lei de tornar públicas informações sobre um inquérito em andamento. Nos bastidores, porém, abastece a imprensa com abundância de detalhes. Basicamente, os investigadores suspeitam que os pais tenham matado acidentalmente a menina. Podem ter-lhe dado uma bofetada (diz-se ‘estalo’ em Portugal) que fez a menina cair e bater a cabeça. Ou podem ter sedado Madeleine e os irmãos para jantar em paz, mas errado na dose. Assustados com a morte da criança, que a autópsia certamente verificaria ter sido causada por overdose, eles esconderam o corpo durante semanas até poder se livrar dele em definitivo, transportando-o em um carro alugado. No domingo 9, Gerry e Kate – que haviam prometido só deixar Portugal quando sua filha fosse encontrada – retornaram à Inglaterra depois de a polícia portuguesa interrogar cada um deles durante várias horas.

Oficialmente, a única certeza é que a polícia indiciou o casal no inquérito enviado à Justiça portuguesa. Foi o suficiente para desvanecer a nuvem de simpatia que cercava o casal McCann. A rádio BBC, de Londres, viu-se forçada a tirar do ar uma enquete sobre o apoio ao casal devido ao número excessivo (e constrangedor) de ligações iradas contra os pais. De uma hora para outra, o sentimento dominante passou a ser do tipo ‘nunca confiei na história desses aí’. O que chama atenção é o comportamento de Kate, que jamais derramou uma lágrima em público. No passado, foi descrito como nobre, sereno e determinado. Agora, com a virada da maré, é visto como odiosa manifestação de frieza. O cardiologista Gerry e a clínica geral Kate, ambos com 39 anos, esforçaram-se bastante para ter as crianças, que nasceram por reprodução assistida. Há um forte indício de que os filhos já eram vistos por Kate como uma carga pesada. Em seu diário pessoal, que teve trechos publicados na semana passada pela imprensa portuguesa, ela descreve os filhos como ‘histéricos’, reclama de como era exaustivo ficar de olho na ‘hiperativa’ Madeleine e do marido que pouco ajudava a cuidar das crianças. O diário não serve de prova contra Kate, mas ajuda a traçar de forma pouco favorável o seu perfil psicológico.

São três os indícios mais consistentes contra os pais de Madeleine, a julgar pelas informações vazadas pela polícia. O primeiro são as contradições nos relatos das testemunhas. Kate e Gerry afirmam ter chegado às 20h30 ao restaurante para jantar com os amigos. Pelo que estes contaram à polícia, parece que o casal só chegou meia hora mais tarde. Apenas cinco minutos depois, Gerry foi ver como estavam os filhos. Às 21h30, foi a vez de um dos amigos ir ao apartamento onde estavam Madeleine e seus irmãos Sean e Amelie, gêmeos de 2 anos. O amigo apenas checou se havia barulho dentro do quarto, sem chegar a olhar para as crianças adormecidas. Meia hora depois, Kate foi ver os filhos e voltou desesperada, dizendo que Madeleine havia desaparecido. Em vez de chamarem a polícia, os pais avisaram parentes na Inglaterra, que, por sua vez, telefonaram para o canal de notícias inglês Sky News. Só às 22h30 a polícia portuguesa foi avisada. Por que a demora?

O segundo indício contra os McCann são cabelos e fluidos corporais (conceito amplo que pode incluir sangue, saliva, urina, vômito e até líquidos resultantes da decomposição de corpos) encontrados no bagageiro do Renault Scénic alugado pelo casal quase um mês depois do desaparecimento de Madeleine. Em teoria, exames de laboratório podem indicar se o corpo da menina esteve no carro e até se tomou uma overdose de soníferos. Na realidade, o material parece estar demasiado degradado para permitir até mesmo a identificação por DNA. O terceiro sinal comprometedor é o comportamento de cães treinados para encontrar cadáveres. Emprestados da polícia inglesa, parecem ter sentido o cheiro da morte em um bichinho de pelúcia de Madeleine, em roupas de Kate, nos arredores de uma igreja próxima ao resort – onde recentemente foram fechadas valas de uma obra de esgoto – e na areia da praia.

Tão misterioso quanto o paradeiro de Madeleine é entender que motivos seus pais teriam para agir como a polícia acredita que eles agiram. ‘A frieza demonstrada pelo casal só se costuma ver em pais que não nutrem nenhum afeto pelos filhos’, diz Antonio de Pádua Serafim, coordenador do Núcleo de Psiquiatria e Psicologia Forense da Universidade de São Paulo. Em muitos países, os pais são os primeiros a ser investigados quando uma criança desaparece. A polícia portuguesa não pensa assim. A primeira reação foi investigar o que parecia ser um seqüestro. Quando finalmente mudou de rumo, praticamente todas as evidências forenses já estavam degradadas. ‘Essa é a investigação de maior repercussão de que participei na minha carreira. Perto de 10% de nosso contingente foi mobilizado nas buscas’, disse a VEJA Olegário Souza, inspetor-chefe da Polícia Judiciária portuguesa. Quase nada do que a polícia reuniu contra o casal poderá ser usado num tribunal enquanto não for encontrado o corpo de Madeleine. Sem ele, não há como saber se está morta nem como acusar formalmente seus pais pelo crime. Se a menina jamais for encontrada, morta ou viva, Gerry e Kate carregarão para sempre a mancha da suspeita de ter cometido o mais terrível dos crimes.

Com reportagem de Paulo Passos, de Lisboa, e Daniel Salles’

VEJA vs. ZÉ DIRCEU
Veja

Ainda chefe, mas de outra turma da pesada

‘A Operação Perestroika, a mais recente investigação da Polícia Federal, trouxe à tona o submundo do futebol. Com base em escutas telefônicas, a PF descobriu que, desde 2004, os dirigentes do Corinthians paulista, um dos clubes de futebol mais populares do Brasil, faziam de tudo para esconder a origem do dinheiro que abastecia os cofres do clube. Oficialmente, os recursos eram da empresa MSI, uma off-shore com sede em Londres e sócios ocultos. Mas, nas conversas gravadas, fica claro que o verdadeiro dono da bola é o magnata russo Boris Berezovsky, enroladíssimo em seu país natal. As escutas levaram o Ministério Público Federal de São Paulo a denunciar, em julho, oito pessoas por crimes que vão de lavagem de dinheiro a formação de quadrilha. Os dirigentes corintianos são acusados de realizar pagamentos a jogadores em contas não declaradas no exterior. Mas a coisa não parou por aí. VEJA teve acesso a um segundo relatório produzido pela Polícia Federal em 12 de julho deste ano, dois dias após a denúncia oferecida pelo Ministério Público (veja quadro). Nele, são descritas as atividades de uma turma da pesada que, conectada à quadrilha que maculava a história do Corinthians, praticava ‘tráfico de influência, advocacia administrativa e favorecimento pessoal’. O chefe dessa turma é ninguém menos que José Dirceu, o comandante do bando do mensalão.

O relatório em questão é uma decorrência das investigações sobre o Corinthians. Lista uma série de outros crimes descobertos ao longo dessa investigação e sugere que eles também sejam devidamente apurados. Dirceu entrou na mira da PF porque esteve no centro de uma operação de lobby que chegou ao gabinete da Presidência da República. Em parceria com amigos petistas, ele tentou fazer com que Berezovsky conseguisse se instalar no Brasil, na condição de asilado político. Berezovsky, que vive na Inglaterra, não pode pisar na Rússia, onde é acusado de fraudes financeiras e até assassinato. O magnata, cuja fortuna é estimada em 10 bilhões de dólares, diz que é tudo mentira. Alega ser perseguido pelo presidente Vladimir Putin. Fosse um gatuno brasileiro, Berezovsky poderia culpar também a ‘mídia golpista’ russa.

De acordo com agentes que participaram da investigação, o trabalho do ex-ministro-chefe da Casa Civil para a máfia que tomou de assalto o Corinthians começou depois de um incidente ocorrido em maio de 2006. Nessa ocasião, Berezovsky foi detido pela PF durante uma viagem a São Paulo e teve de prestar um depoimento de oito horas sobre a parceria MSI/Corinthians. Em seguida, as remessas da MSI começaram a rarear. Isso alarmou os dirigentes do clube, que então contataram Dirceu e seus petistas para uma dupla missão: fazer gestões no governo federal para evitar outros contratempos em visitas futuras do russo ao Brasil e, ainda, conseguir a condição de asilado político para Berezovsky, o que eliminaria de uma vez por todas os problemas do magnata com a Justiça brasileira. A essa altura, as fraudes no Corinthians já eram alvo de investigação, no âmbito do Ministério Público de São Paulo. Os promotores José Reinaldo Carneiro e Roberto Porto foram os primeiros a suspeitar que Berezovsky era o verdadeiro dono dos 32 milhões de dólares investidos pela MSI no clube. Foi a partir de uma apuração iniciada pelos promotores que a polícia conseguiu finalmente desbaratar a máfia instalada no Corinthians. Além disso, Carneiro e Porto descobriram que, em 2004 e 2005, a Agência Brasileira de Inteligência (Abin) havia produzido relatórios listando crimes financeiros praticados por Berezovsky na Rússia. Ainda assim, Dirceu operou no Palácio do Planalto para que se fizesse vista grossa ao prontuário do bilionário.

A nova turma da pesada de Dirceu tem, entre seus integrantes, o jornalista Breno Altman, amigão do ex-ministro e colaborador da Secretaria de Relações Internacionais do Partido dos Trabalhadores. Coube a Breno manter contatos com uma peça-chave no esquema: Renato Duprat. Ex-dono de uma empresa de planos de saúde, Duprat era o elo entre a MSI e os corintianos. Foi ele quem apresentou o iraniano Kia Joorabchian, representante da MSI no Brasil (e apontado como laranja de Berezovsky), ao presidente do Corinthians, Alberto Dualib. No relatório da PF, há a informação de que Breno manteve contatos com Gilberto Carvalho, chefe do gabinete pessoal da Presidência, para tratar do asilo ao russo. Outro alto funcionário do governo contatado foi José Antonio Dias Toffoli, chefe da Advocacia-Geral da União.

Além de Breno, havia mais uma peça importante na turma da pesada: o deputado estadual do PT paulista Vicente Cândido. Aliado de Dirceu na corrente Campo Majoritário, a maior do partido, Cândido fez gestões para que o próprio Lula recebesse Berezovsky no Palácio do Planalto. Felizmente, não foi bem-sucedido. Mas o deputado chegou a ir a Londres para participar de reuniões com o russo, sob a justificativa de que Berezovsky teria interesse em investir no país nas áreas de energia e aviação. Sabe-se que Dirceu queria participar de eventuais negócios fechados pelo russo no Brasil. Outro petista que trabalhou por Berezovsky, de acordo com a PF, foi Hélio Madalena. Entre abril de 2003 e junho de 2005, Madalena dirigiu o Centro Gestor e Operacional do Sistema de Proteção da Amazônia, órgão ligado à Casa Civil, então presidida por Dirceu.

Com a denúncia apresentada à Justiça, os projetos de Dirceu e companhia envolvendo Berezovsky naufragaram. Mas esse não era o único negócio no qual a turma da pesada apostava. O relatório da PF diz textualmente que Dirceu atuava como ‘lobista’, ‘aparentemente praticando tráfico de influência’. E dá como exemplo os contatos entre o ex-ministro-chefe da Casa Civil e Darc Costa, que já ocupou a vice-presidência do BNDES. A conversa, acompanhada pela PF, aconteceu quando Darc já não exercia esse cargo. A idéia era que Dirceu fosse apresentado a um empresário que tinha firmado um contrato de 40 milhões de dólares com a República Dominicana. Dirceu tem ótimas relações com o presidente do país, Leonel Reyna, a quem já apresentou projetos na área de exportação do etanol brasileiro.

O outro negócio de Breno Altman é mais obscuro. De acordo com a PF, o jornalista alardeava ter influência sobre juízes do Tribunal Regional do Trabalho (TRT) de São Paulo, já que ‘os juízes são indicados por Brasília’. A polícia só conseguiu obter informações sobre essas atividades porque pediu autorização judicial para grampear Dirceu e Breno. A PF tomou essa decisão ao perceber que o trabalho da dupla para os cartolas do Corinthians tinha um forte odor de ilegalidade. A nova turma da pesada de Dirceu não foi denunciada pelos crimes apurados pela Polícia Federal. Isso não quer dizer que escapou da Justiça. ‘Os fatos que não estão relacionados diretamente ao Corinthians ainda terão uma apuração específica’, avisa o procurador Rodrigo de Grandis, um dos autores da denúncia do caso MSI.’

TELEVISÃO
Marcelo Marthe

O bazar eletrônico

‘Vinte anos depois de seus primeiros passos na televisão brasileira, o telecomércio está ativo como nunca. Numa estimativa conservadora, movimenta 1 bilhão de reais por ano. Alguns canais se dedicam exclusivamente a ele. Além disso, a TV aberta e a TV paga cedem largas fatias de sua programação a essa atividade que se desdobra em duas formas básicas: a televenda e o infomercial. Os programas de televenda são como lojas: neles, bugigangas são vendidas de fato. Os infomerciais são vitrines nas quais empresas exibem os seus produtos, em formato bem mais mambembe do que num anúncio-padrão da TV. Nesse bazar eletrônico, os bons mascates se tornam famosos: a comerciante Sylvia Araújo, por exemplo, virou hit no YouTube graças às propagandas de sua rede de lojas de móveis em São Paulo, nas quais ela surge fantasiada de Mulher-Gato. Enquanto isso, os donos das câmeras faturam alto. Alguns são figuras estabelecidas, como o apresentador Luiz Galebe, do canal Shop Tour, e João Carlos Di Genio, dono da MixTV (e também dos colégios Objetivo). Mas há espaço para novatos. É o caso de Carlos Carreiras, ex-vendedor de sapatos que se tornou o maior comprador de horários na televisão depois de bispos como RR Soares. Carreiras ocupa atualmente 500 horas de programação por mês, em várias redes. Os infomerciais que ele produz podem ser vistos na RedeTV!, na Bandeirantes, na Gazeta e na Rede Mulher.

A televenda é uma operação pesada, que obriga a lidar com fornecedores e estoques, além da logística de entrega dos produtos. Não à toa, por trás das principais operações de televendas há grandes redes de varejo. O Shoptime, por exemplo, pertence ao mesmo grupo que controla as Lojas Americanas e o site Submarino. Já os infomerciais, por serem um negócio de estrutura mais leve, oferecem oportunidades para um empreendedor como Carreiras. A fórmula de trabalho que ele desenvolveu é curiosa. Para usar a linguagem do mercado de ações, ele compra horários das redes de televisão ‘na baixa’, quando elas precisam de dinheiro para cobrir seu caixa. E os revende na alta às concessionárias de automóveis e fabricantes de bijuterias que desejam incrementar seus negócios por meio da televisão. Além de ajudar as emissoras a fechar as contas no fim do mês, Carreiras dá aos seus anunciantes a garantia de que eles terão certo retorno em número de telefonemas: sua propaganda continua no ar até que essa cota seja alcançada.

Há cinco anos, Carreiras começou uma rede própria de pequeno alcance (seus canais só estão em alguns pacotes da TV paga), na qual mesclou o formato dos infomerciais à programação local. Além do ABC, a TV+ transmite para cidades como Curitiba e Niterói. Há dez dias, chegou a Salvador. ‘Meu mote é falar da esquina, não da China’, diz. Em meio a propagandas de churrascarias e bufês, seus canais têm programas trash. Na última terça, o veterano Dárcio Arruda, ex-Globo, fazia uma mesa-redonda sobre ‘cemitérios modernos’. A montagem da rede é um passo arriscado, como mostra o exemplo de Luiz Galebe. Por dezoito anos ele reinou no universo dos infomerciais com o canal Shop Tour. Em 2005, foi desalojado da freqüência UHF que alugava. O dono dessa freqüência era João Carlos Di Genio, que decidiu pôr no ar o seu canal, a MixTV, abocanhando boa parte do público que antes assistia ao Shop Tour. Começou aí uma briga que ainda corre na Justiça. ‘Galebe queria o monopólio. Mas ele virou passado para nós’, diz Fernando Di Genio, sobrinho do dono e administrador do canal. Carreiras também teve uma rusga com os donos da MixTV, dos quais foi parceiro. ‘Eles sugaram todo o meu know-how’, diz Carreiras. ‘A saída foi natural’, retruca Fernando Di Genio. ‘Ele já tinha o canal no ABC para se ocupar.’

Aos 37 anos, casado e sem filhos, Carreiras administra seu negócio em família. O pai, que foi ajudante geral, é o mensageiro. Duas irmãs são diretoras e uma terceira ‘cuida do rango da galera’. Embora seja uma figura de bastidor, Carreiras não fica a dever a Galebe em lábia de vendedor. Bem como no consumismo. Nesta semana, ele se dará um presente de aniversário: um iate de 48 pés de 2,5 milhões de reais. Era para ser uma surpresa para a família. Mas esta reportagem acaba de cortar sua graça.’

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Folha de S. Paulo – 1

Folha de S. Paulo – 2

O Estado de S. Paulo – 1

O Estado de S. Paulo – 2

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