Thursday, 18 de April de 2024 ISSN 1519-7670 - Ano 24 - nº 1283

Verdade, um produto em falta no Liberal

 Na terça-feira (7/3), a Assembléia Legislativa declarou o empresário Cecílio do Rego Almeida persona non grata ao Pará, por comandar a maior grilagem de terras do mundo, através da qual tenta se apropriar de 7 milhões de hectares do patrimônio público no vale do Xingu. Ao mesmo tempo, se solidarizou com cinco pessoas que foram ofendidas pelo dono da Construtora C. R. Almeida, justamente por se terem tornado uma barreira aos seus propósitos, defendendo o domínio do Estado sobre a área ameaçada de grilagem. Por essa atuação, mereceram o título de ‘defensores dos mais altos interesses do povo paraense’. A manifestação se originou de iniciativa da deputada Sandra Batista (PC do B), referendada por seus pares.

Na sexta-feira (10/3), O Liberal noticiou o fato numa página par (que é menos lida) do primeiro caderno, em nota sem qualquer destaque. Mas só fez referência a três dos personagens que receberam o apoio do parlamento estadual: o procurador federal Felício Pontes Júnior, o procurador estadual Carlos Alberto Lamarão Corrêa e o defensor público estadual Paraguassu Éleres. Omitiu o meu nome, o que não é de estranhar nem constitui novidade: ordem superior proíbe minha citação. No entanto, o jornal da família Maiorana também suprimiu do press-release distribuído pela assessoria de imprensa da Assembléia Legislativa, que reproduziu parcialmente, o nome do jornalista Carlos Mendes.

Mendes é um dos mais antigos repórteres em atividade em O Liberal, além de ser correspondente em Belém de O Estado de S.Paulo. Já escreveu várias reportagens sobre a grilagem de Cecílio do Rego Almeida, todas publicadas em O Liberal. Se o jornal aprovou essas matérias, por que expurgou o nome de seu destacado funcionário do noticiário justamente quando ele recebe o apoio da Assembléia Legislativa?

Leitor desrespeitado

Uma hipótese é de que o jornal pode ter mudado de posição, substituindo o critério estritamente jornalístico, que o fez acolher as reportagens de Carlos Mendes, por um outro qualquer, que nada tem a ver com o conteúdo das matérias. Nesse caso, está – para todos os efeitos práticos – favorecendo um personagem que o Legislativo considera nocivo aos interesses do Pará, enquanto pune quem, por sua atuação em favor da causa pública, mereceu a solidariedade dos deputados.

Outra hipótese seria talvez uma atitude de defesa tácita: para não abrir o precedente de citar um jornalista e excluir o outro, o jornal pode ter preferido cortar logo os dois. Assim preveniria eventual demanda judicial que eu pudesse intentar para obrigar a empresa a me incluir no seu noticiário.

Para o público menos informado ou atento, ou para quem não se interessa por especulação, por mais fundamentada que seja, parecerá simplesmente que o Legislativo paraense se solidarizou apenas com os três servidores públicos, mas não com os dois jornalistas que mais têm combatido a grilagem da C. R. Almeida. Afinal, nossos nomes não aparecem na reconstituição jornalística dos fatos. Logo, há uma moção de censura ou uma restrição do parlamento ao nosso trabalho, o que, evidentemente, não é verdade.

Carlos Mendes, com a agravante de ser funcionário da casa, e eu fomos vítimas de um ato deliberado de censura da direção de redação de O Liberal. Houve dolo da parte de quem sabia que estava contrariando a verdade dos fatos e adulterando o material de divulgação que lhe foi transmitido e que acolheu, mas o desnaturando quando suprimiu os nomes de dois dos cinco cidadãos que receberam a solidariedade dos deputados. É claro que o jornal, perfeitamente consciente do que fazia, atingiu nossa honra, nossa dignidade e nosso conceito – pessoal e profissional. Está suscetível de ser levado aos tribunais para responder por seu ato de vilania.

Mas o leitor também foi desrespeitado. A direção de redação do jornal não tem o menor pudor de violentar a integridade dos fatos conforme sua vontade e conveniência. Priva a opinião pública de saber o que realmente acontece. Fornece-lhe a mais nefanda das informações: a informação truncada, manipulada, a meia-verdade que distorce mais do que a mentira assumida, aberta, escancarada.

O jornal perdeu o sentido de sua responsabilidade. Vive a se superar nessa sucessão de desrespeitos ao compromisso profissional, ético e moral. A que andar do subsolo da descrença descerá no próximo episódio?

******

Jornalista, editor do Jornal Pessoal (Belém, PA)