Saturday, 20 de April de 2024 ISSN 1519-7670 - Ano 24 - nº 1284

Para juntar as pontas de um mesmo enredo

Dezembro começou com manchetes sombrias sobre o quadro econômico brasileiro, depois da divulgação das contas nacionais do terceiro trimestre. A Folha de S.Paulo juntou no mesmo título os maus resultados de 2011 e 2012: “PIB decepciona, e Dilma deve ter ‘biênio perdido’” (1/12). O Globo, uma exceção, deu mais destaque na primeira página a um assunto de interesse local, o veto presidencial à redistribuição dos royalties do petróleo. A notícia sobre os dados de produção, consumo, investimento e relações com o exterior apareceu logo abaixo e ficou em posição secundária também no caderno de Economia.

Um dia antes, na sexta-feira (30/11), dois relatórios de peso haviam sido divulgados, um com os números do PIB de julho a setembro, outro com o resultado das contas fiscais de outubro. Os dois documentos foram publicados de manhã e houve muito tempo para examiná-los. Apesar disso, o exame parece ter falhado e mais uma vez faltou juntar os pedaços do noticiário.

Editores, pauteiros e repórteres deram muito mais atenção, como seria natural, aos números divulgados pelo Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE). No terceiro trimestre, o PIB cresceu apenas 0,6%. O resultado ficou abaixo da pior previsão corrente no mercado financeiro, onde as projeções oscilavam entre 0,9% e 1,4%. O consumo privado e o custeio do governo continuaram crescendo, mas o investimento produtivo, o motor principal da economia, encolheu mais uma vez.

Política anticrise

Um outro grande relatório de conjuntura, publicado pelo Banco Central (BC), mostrou os números consolidados das contas públicas até outubro. Em dez meses, o setor público, nos três níveis de governo, conseguiu acumular R$ 88,2 bilhões de superávit primário, aquele dinheiro separado para os compromissos da dívida pública, ou, em alguns países, também para a formação de uma reserva de segurança para tempos difíceis. A meta oficial para o ano é R$ 139,8 bilhões. Dificilmente será alcançada, mesmo com desconto do dinheiro investido no PAC, o Programa de Aceleração do Crescimento. O assunto é árido e em geral discutido só por especialistas, mas, neste momento, tem vínculos muito estreitos com o lento crescimento do PIB.

As contas públicas foram duplamente afetadas pela crise econômica, neste ano. O mau desempenho da indústria prejudicou a arrecadação de impostos e contribuições. Isso ocorreu ao longo do ano e o governo atenuou o efeito, contabilmente, incluindo em sua receita um volume considerável de dividendos das estatais (bem maior que em outros anos). Ao mesmo tempo, o Tesouro reduziu os impostos cobrados de alguns setores, como o automobilístico, para estimular o consumo e a produção. Dentro de algum tempo, a recuperação da atividade propiciaria um aumento da arrecadação, se tudo corresse bem.

Até agora, os resultados foram decepcionantes, como indicam os números do IBGE. Houve alguma reação da indústria, no terceiro trimestre, mas insuficiente para compensar o mau desempenho acumulado em mais de doze meses. Recentemente, estimativas oficiais indicaram uma renúncia fiscal (com a redução de impostos) de cerca de R$ 45 bilhões como parte do esforço para estimular a atividade. Se todos esses dados fossem reunidos, o leitor teria um quadro muito mais organizado e mais completo para entender e avaliar a política anticrise adotada pelo governo. Afinal, a política de estímulos foi bem calculada e baseada num diagnóstico certo?

Montar as peças

Essa questão é especialmente importante porque, diante dos números do terceiro trimestre, o governo, segundo informaram os jornais, já começou a examinar a possibilidade de mais incentivos nos próximos meses, para tentar mais uma vez impulsionar a produção. Será o caso de insistir no mesmo tipo de estímulos? A contração dos investimentos torna especialmente importante essa discussão.

A divulgação dos números do PIB alimentou imediatamente especulações sobre os rumos da política de juros. Na última reunião do ano, encerrada na quarta-feira (28/11), o Comitê de Política Monetária do BC manteve em 7,25% ao ano a taxa básica. Já se discute a hipótese de nova redução no começo do ano. Muitos especialistas descartam a possibilidade de alguma alta ao longo de 2013. No entanto, a inflação permanece bem acima do centro da meta, 4,5%, e isso complica o debate.

Com um pouco de esforço para juntar e articular as peças do quadro, o jornais poderão produzir um material estimulante nos próximos meses.

Joelmir

A grande pauta econômica dos próximos meses seria enfrentada com resultados melhores e mais estimulantes com Joelmir Beting no dia a dia da cobertura e da análise. Sem ele, perderão os meios de comunicação e perderão os leitores. Dar duro para fazer um trabalho decente será a melhor maneira de celebrar sua memória.

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[Rolf Kuntz é jornalista]